Sabe a forma mais eficiente de se sentir velho? Lembrar de um filme cujo lançamento eu cobri outro dia, inclusive de todos os pormenores da cobertura. Daí chega a continuação, eu olho a data achando que faz uns dois ou três anos, apenas para constatar que 11 fuckin’ anos separam esta crítica Gato de Botas 2 da minha patetada anterior. Pelo papagaio do benedito, delfonauta!

Inclusive, menos tempo se passou entre Shrek 2, a primeira aparição deste Gato de Botas, e o primeiro filme do gato do que entre estes dois. E eu podia jurar que era o contrário. Acho que estou num ponto da vida em que, literalmente, daqui a pouco já me aposento. Mas enquanto isso vamos lá!

CRÍTICA GATO DE BOTAS 2

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Isso é que é uma barba gloriosa!

Ao contrário do primeiro filme, Gato de Botas 2: O Último Pedido não é uma prequência. Ele acontece cronologicamente depois de todos os Shreks. Nosso amigo cafajeste fofinho viaja pelo planeta curtindo seu status de lenda. Fora da lei para alguns. Herói para outros. Amado por todos.

Porém, depois de um acidente, ele morre. Ao fazer as contas, percebe que esta foi sua oitava morte. Ou seja, mais uma e é game over. Felizmente, tem uma estrela mágica que realiza pedidos, e o gato vai em busca dela para poder ganhar mais alguns continues. O problema é que ele não é o único personagem de contos de fadas a fim de a kind of magic.

Neste ponto, o delfonauta esperto deve estar questionando. “Mas, Corrales”, diz meu novo amigo enquanto acaricia seu longo bigode imaginário, “gatos não têm sete vidas?”. Pois é, meu camarada. Gatos brasileiros de fato têm apenas sete vidas. Mas os gringos jogam no easy, então os gatos lá da gringolândia desfrutam de duas 1Ups extras. É o tipo de diferença cultural que não dá para ser modificada na tradução do filme, até porque ele mostra as oito mortes anteriores do Gato de Botas.

JOÃO TROMBETA

O Gato de Botas será acompanhado em sua quest por dois relutantes amigos. Kitty Patamansa, uma crush do passado. E um fofo e carinhoso cachorrinho sem nome, que praticamente substitui o espaço deixado pelo Burro do Shrek.

No corner oposto do ringue temos a temida Cachinhos Dourados e seus três ursos. E, claro, o verdadeiro vilão, João Trombeta. Este eu nunca tinha ouvido falar. Fiz uma busca no Google, e o pai da internet disse que ele tem alguns processos contra ele no Brasil. Pensei que poderia ser uma tradução bizarra, mas procurei pelo nome original, Jack Horner, e a página da Wikipedia com este nome é de um paleontólogo.

Aparentemente, não é um vazio cultural apenas meu. O tal João Trombeta realmente não é conhecido, o que me faz pensar que a franquia Shrek realmente raspou o tacho dos contos de fadas. Lembra como personagens enormes, como Peter Pan e Pinóquio eram apenas pontas? Pois é, agora João Trombeta é o grande vilão do filme. E o lado ruim disso é que muito do humor do longa deriva das histórias originais. Então, se você não as conhece, parte da graça vai embora.

Crítica Gato de Botas 2, Gato de Botas 2, Gato de Botas, Shrek, Universal, Dreamworks, DelfosTHE QUEST FOR MORE LIVES

Felizmente, mesmo assim Gato de Botas 2 é muito engraçado. Tem ótimas piadas e um tremendo estilo visual. Em seus melhores momentos, ambos andam juntos, tornando assistir ao filme no cinema um prazer.

É inclusive surpreendente que o filme seja tão legal com o argumento que tem. Sinceramente, a história é tão batida que parece ter sido feita por uma inteligência artificial ou ser um exemplo de argumento de cinema infantil usado em aulas de roteiro. E até faz sentido, porque o argumento é de dois caras (Tommy SwerdlowTom Wheeler), mas o roteiro é de um terceiro (Paul Fisher). É bem claro quem tem o talento neste trio.

Fisher pegou uma história sem absolutamente nenhuma criatividade e preencheu todos os buracos com piadas e referências que acabaram se tornando muito mais interessantes do que a história. Ainda bem, porque se fosse para julgar apenas o argumento em si… Ih, rapaz…

ESTILO

Outra coisa que me chamou atenção foi o estilo visual do longa. Claro, o design dos personagens segue aquilo que foi estabelecido em Shrek, mas o estilo narrativo é totalmente seu (no caso, dos diretores Januel Mercado e Joel Crawford). É diferente até do filme anterior do Gato de Botas.

O filme mistura alguns estilos artísticos e de animação, mas o que mais me chamou atenção foram suas cenas de ação, que têm uma cara totalmente diferente do resto. Cores são diferentes, traços são mais estilizados. O mais curioso, no entanto, é que essas cenas parecem ser animadas com menor taxa de quadros.

FRAMERATE

Você deve saber que cinema, tradicionalmente, é feito a 24 quadros por segundo. Isso é abaixo da televisão (30) e de videogames (30 ou, idealmente, de 60 para cima). Porém, as cenas de ação parecem rodar a uma taxa bem mais baixa – arriscaria que a 12 quadros por segundo. Obviamente, isso é um filme, não um videogame. Então performance não é uma preocupação. Isso foi uma decisão artística. E a considerei bem interessante.

Isso dá às cenas de porrada do filme um jeito meio stop motion antigo. Uma cara que remete velhos como eu imediatamente a Jasão e os Argonautas. E, meu amigo, eu gostei.

Adoraria conversar com os diretores para saber as motivações que levaram a esta decisão estética tão inesperada. Especialmente em um filme para crianças. Tanto, aliás, que eu normalmente recuso quase todas as ofertas de entrevistas que chegam aqui no DELFOS, mas esta eu aceitaria com prazer só para fazer essa pergunta. E será que eles diminuíram mesmo a taxa de quadros, ou só usaram um estilo diferente que passa esta impressão? São perguntas que provavelmente ficarão sem resposta dos criadores, mas cá estão, se você quiser papear comigo nos comentários sobre a técnica cinematográfica deste filme de criança.

CRÍTICA GATO DE BOTAS 2 E A DUBLAGEM

Por fim, também gostaria de comentar a dublagem brasileira. Eu normalmente sou bem crítico em relação a isso, mas este é um caso em que ela realmente merece elogios. Parece-me que todos os personagens que apareceram antes, mesmo que aqui role só uma ponta, têm as mesmas vozes conhecidas. E deve ser difícil chamar atores que fizeram um papel mais de dez anos atrás para fazer apenas uma ou duas frases. Eu aplaudo este comprometimento com a continuidade.

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Kitty, o cachorrinho, e o gato que dá nome ao filme.

A única exceção, e infelizmente, é uma exceção forte, é a Cachinhos Dourados. A dubladora brasileira arrasta o filme para baixo sempre que aparece. Ela faz em Gato de Botas 2 mais ou menos o que o Bussunda fazia em Shrek. E sinceramente fiquei com a impressão o filme inteiro que chamaram uma celebridade qualquer, não uma atriz profissional, para o papel.

Enfim, fui atrás e a voz da Cachinhos Dourados no Brasil é da Giovanna Ewbank. Não ouvi falar dela antes (sou péssimo para celebridades brasileiras, especialmente globais) então não sei se ela entrou pelo star power como o Bussunda, mas cá está a página da Wikipedia dela se quiser saber quem é.

CRÍTICA GATO DE BOTAS 2: O ÚLTIMO PEDIDO

Acho que fazia tempo que não fazia uma crítica tão longa a um filme, mas dessa vez realmente tinha muito a dizer sobre ele. Se você gostou, curta, comente, compartilhe e, principalmente, assine nossa campanha de financiamento coletivo no Padrim. Seria ótimo começar 2023 com novos assinantes. Ou não, eu me sinto super mal fazendo autopromoção, por isso mesmo quase não faço. Deveria fazer mais, né? Já teve gente que me falou que nem sabia que a gente tinha um financiamento coletivo. Enfim, como diria minha filhinha, Gato de Botas 2 é legal. Não é o melhor filme do ano passado nem será deste, mas vale a assistida.