Delfos, Dexter em Cena

Demorou sete livros e muitas centenas de páginas, mas finalmente Jeff Lindsay acertou a mão e escreveu o melhor livro da série Dexter, um patamar superior a todos os seus antecessores. Estou falando, claro, de Dexter em Cena, o sétimo volume da saga do assassino serial fanfarrão.

A essa altura, falar sobre os defeitos de Lindsay como autor é chover no molhado. Ele continua com todas as suas falhas recorrentes, especialmente no modo exagerado e deveras irritante como trata Rita, um estereótipo ambulante da mulher aporrinhadora.

Sem falar em coisas como personagens que somem de um livro para o outro e não são nem mencionados, como Brian, o irmão igualmente psicótico de Dexter e que vinha ganhando uma importância maior nos dois volumes anteriores. Nesse, é simplesmente como se ele nem existisse, o que é uma escolha bastante estranha do autor.

DEXTER EM CENA

Mas se ele continua errando devido às suas próprias limitações narrativas, ao menos foi esperto o bastante para focar no que ele melhor consegue fazer, e é justamente isso que coloca este tomo um patamar acima de todos os seus antecessores. Não só já dominou o senso de humor mórbido de seus enredos, como também o de seu protagonista, muito mais cínico e malicioso que sua contraparte televisiva.

E também conseguiu finalmente balancear a trama, equilibrando bem os exageros com o suspense e o senso de humor negro característico da série literária, desta vez sem descambar para o puramente absurdo, como já aconteceu em livros anteriores. E o faz tirando sarro de Hollywood, onde sua maior criação ficou famosa graças à adaptação para a televisão.

Delfos, Dexter em Cena, Capa

Acontece que na trama, um novo seriado policial está sendo filmado em Miami e os produtores conseguem a cooperação e a assistência da polícia local para que os atores possam acompanhar de perto o trabalho policial, e assim fazer o chamado laboratório. Dexter fica então encarregado de mostrar os meandros da perícia forense para o astro do seriado, enquanto sua irmã Deborah não fica nada contente em ter de servir de babá para a protagonista feminina da série, que irá encarnar uma detetive de homicídios.

E, claro, como não poderia deixar de ser, no meio disso, mais um serial killer começa a se divertir por aí, ou este não seria um livro de Dexter. O mais legal, contudo, é a direção inesperada para a qual a história leva seu personagem principal, mostrando que nem mesmo o frio e desprovido de emoções Dexter é imune ao universo glamoroso das celebridades.

HOLLYWOOD

Primeiro, ao sentir uma grande atração por Jackie Forrest, a estrela da série, revela-se mais mundano do que imaginava. E depois, ao ele próprio se surpreender ao se dar conta de quanto está gostando de ficar perto do estilo de vida dos ricos e famosos debaixo dos holofotes. Percebe, com o máximo de ironia, que justo ele, uma pessoa que por motivos óbvios tem de levar uma vida discreta e low profile, sem chamar atenção, está adorando estar no centro da ribalta desejando seus quinze minutos de fama.

É essa dualidade entre a obrigação de se resguardar para não revelar seu grande segredo e o recém adquirido gosto pelo estilo de vida chamativo das estrelas que move o livro e gera seus melhores momentos, tornando este o melhor aspecto da leitura, muito mais até do que o desfecho da história principal e seu mistério, muito mais óbvio e fácil de matar para quem já está familiarizado com os outros livros.

Dexter em Cena repete os muitos defeitos frequentes que assolam a série desde o começo, mas ao apresentar uma boa história, que leva o personagem numa direção inesperada, fazendo-o descobrir coisas sobre ele mesmo que sequer sabia que existiam, acaba se colocando num caminho muito mais interessante. E é isso que faz valer a leitura e, pela primeira vez, ser um livro da série que realmente merece ser indicado. Assim, aos que quiserem conhecer a série literária, esta é a pedida.

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