Sabe aquele jogo que você joga por “currículo”? Tipo, na época do lançamento ele não te interessou, mas depois se tornou muito querido e veio a vontade de conhecer. Daí, anos depois do lançamento, você dá um jeito de jogá-los. Eu já tive várias experiências assim. A Link to the Past e Super Metroid são dois exemplos relativamente recentes na minha vida. Mas o assunto de hoje, claro, é Mass Effect.

A Link to the PastSuper Metroid eu não joguei no lançamento porque era uma criança com um Mega Drive. Assim, meu tempo com o Super Nintendo dos amigos era muito limitado. Quando Mass Effect saiu, em 2007, eu já era um adulto. Não jogá-lo foi uma decisão consciente, simplesmente porque eu não jogava RPGs.

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Quando eu ainda comprava jogos, eu obviamente mirava como um sniper só nos meus gêneros preferidos!

Com a idade, e a imensa quantidade de RPGs saindo desde The Witcher 3, eu comecei a jogar o gênero. E daí fiquei com vontade de experimentar Mass Effect e ver por qual motivo ele mora no coração de tanta gente.

Este é o tipo de matéria que só é possível no DELFOS. Em geral, os jornalistas tentam esconder quando não têm experiência com uma grande franquia. Aqui, eu sempre gosto de deixar isso claro. Não tenho interesse em parecer um especialista e enganar meu público. Pelo contrário, prefiro tratar meus leitores como amigos, e a primeira coisa que você fala quando um amigo cita uma obra cultural que você não experimentou ainda é justamente isso.

Portanto, espero que você me acompanhe neste humilde textinho detalhando como foi minha experiência jogando Mass Effect pela primeira vez em 2021, na Mass Effect Legendary Edition.

PEGANDO O BONDE ANDANDO

Apesar de nunca ter jogado um Mass Effect, em 2021 eu já joguei muitos outros RPGs. Eu não sei quão único era Mass Effect no seu gênero em 2007, mas em 2021, ele é absurdamente comum. Desde o enorme sucesso de The Witcher 3, tenho a sensação que a indústria de jogos AAA se especializou unicamente nesses jogos. A Ubisoft, por exemplo, só lança coisas desse gênero há muitos anos. Isso sem falar de jogos que são realmente muito parecidos com Mass Effect, não apenas no gênero, mas mesmo na ambientação, como The Outer Worlds.

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Mass Effect é um daqueles jogos onde você passa mais tempo conversando com NPCs do que de fato explorando e atirando. Tem uma infinidade de personagens aqui, e eles são incrivelmente bem escritos e bem atuados. Mesmo o design das muitas espécies alienígenas que você encontra na campanha são muito legais.

Quando cheguei à Citadel, o primeiro grande hub, onde você conhece uma enorme galera do universo inteiro, me senti existindo no universo de Star Wars. Diria até que, graças ao seu foco em narrativa, Mass Effect dá mais a sensação de viver em Star Wars até mesmo do que os próprios jogos de Star Wars.

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Conhecer os embaixadores das muitas espécies, sua cultura e jeito de falar, é um grande destaque das primeiras horas.

Uma dessas raças, por exemplo, é um monstrão que poderia ser um boss em outros jogos. E eles falam narrando seus sentimentos. Tipo “Cumprimentos empolgados. Bem-vindo à embaixada”. Eu achei isso deveras simpático e essa logo se tornou minha espécie favorita de Mass Effect.

SACO X GAMEPLAY

Apesar de quão legal é a criação do universo, e quão bem escritos e atuados os personagens são, Mass Effect é, para mim, um jogo cansativo. Para falar bom português, falta-me saco para um jogo tão lento.

Quando se critica walking simulators, é comum o povo falar “andar não é gameplay“. Apesar de eu entender essa crítica, eu não me sinto, digamos, impedido de jogar, quando estou fazendo a campanha de um Firewatch. Porém, em um jogo verborrágico como Mass Effect, em que você passa literalmente horas seguidas apenas conversando (minha primeira visita à Citadel durou seis horas), eu fico ansioso. Tipo “caramba, me deixa jogar!”. Isso significa que, para mim, andar até é gameplay, mas conversar não é.

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E é curioso, porque eu adoro filmes verborrágicos, cheios de diálogos. Mas se eu estou com um controle na mão, eu quero usar esse controle para de fato agir, não apenas escolher opções de diálogos. Especialmente se boa parte das opções envolve coisas intercambiáveis, tipo “sem dúvida” e “com certeza”, como é o caso aqui. Também é estranho que muitas vezes o teor do que a protagonista fala é bem diferente da opção escolhida.

O GAMEPLAY DE MASS EFFECT

Quando de fato te deixa jogar, o gameplay de Mass Effect, para ser sincero, não é muito bom. Ele tenta ser um cover shooter, mas dá tanto trabalho entrar em cobertura que eu acabei não usando isso. Falta impacto nos tiros e, na dificuldade normal, os inimigos precisam de tiros demais para morrer. Pelo que li por aí, o gameplay melhorou muito em Mass Effect 23, mas por enquanto eu só joguei o primeiro. E fica extremamente claro que o foco da Bioware foi na história e principalmente na construção de mundo, não nos tiroteios.

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A ação também nunca dura muito. Você entra em uma sala, tem um punhado de inimigos, e na sala seguinte você encontra reféns ou bandidos que querem conversar. E sim, isso é um tanto mais realista, e mais consistente narrativamente do que um Uncharted, em que você mata centenas de pessoas sem falar com nenhuma delas. Porém, para um videogame, não é tão legal. Isso ajuda Mass Effect a ser mais “sério”, mais “adulto”, mas também o deixa menos dinâmico e divertido.

MASS EFFECT E O CARRINHO

E daí tem o Mako, um carrinho do qual eu já tinha lido muitas reclamações antes mesmo de jogar. E de fato controlá-lo é terrível. Boa parte do conteúdo opcional de Mass Effect envolve pousar em planetas abertos e dirigir o carrinho através de montanhas rumo aos objetivos.

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Esta imagem ficou muito legal, mas controlar o carrinho é um tédio.

O problema é que o carrinho não pesa nada, capota com uma tremenda facilidade e, especialmente, não te obedece quanto a ir de frente ou de ré. Ele confunde a direção apertada no controle com a direção da câmera, o que faz com que coisas como girar 180 graus sejam extremamente trabalhosas.

Felizmente, a coisa funciona bem melhor no conteúdo não opcional. Nas missões de história, quando tem partes de carro, você deve dirigir por estradas, seguindo um caminho mais linear, e daí é até legal. Digo mais, apesar da quantidade de conversas, eu gostei muito de todos os planetas de história de Mass Effect. Eles trazem uma enorme variação de objetivos, de cenários e situações que fazem com que, mesmo tudo envolvendo conversar, nunca fique repetitivo. Em especial, os dois últimos planetas são excelentes. Eles me deixaram animado para jogar logo o Mass Effect 2, na esperança de que ele siga mais por essa linha.

QUALIDADE DE VIDA

O que mais pegou para mim em Mass Effect, e que eu realmente não esperava, é a tremenda falta de qualidade de vida. O jogo é todo muito mal explicado. Por exemplo, você pega um monte de upgrades para suas armas e armaduras, mas ele nunca ensina você a usar isso. Eu fiquei esperando por horas encontrar um NPC que me permitisse equipar essas coisas e só um bom tempo depois descobri, totalmente por acaso, que bastava apertar quadrado na tela de equipamentos.

Os objetivos secundários, em especial, são bem chatinhos para alguém impaciente como eu. Eles dizem para você explorar uma galáxia em busca de X. Daí você entra na galáxia e dentro dela tem dois sistemas e dezenas de planetas. Dificilmente dá para saber de antemão em qual planeta está o objetivo. E mais, não dá para pousar na maior parte dos planetas. Você pode apenas selecioná-lo e ler uma seleção de fatos sobre ele. E só nessa tela dá para saber se dá para pousar lá ou não.

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Clicar em um planeta apresenta um textão sobre ele, mas nem sempre opção de pousar. Legal para construção de mundo, ruim para o gameplay.

Falta de qualidade de vida é um enorme problema. Você e seus NPCs têm uma infinidade de poderes, mas descobrir o que cada poder faz exige navegar por uma quantidade absurda de menus. O jogo permite usar skill points automaticamente, tanto em você quanto nos seus coleguinhas, mas não dá opção de equipar os itens de forma automática, o que considero muito mais importante. Afinal, escolher upgrades é mais interessante, estratégico e divertido do que trocar uma escopeta por outra levemente mais poderosa.

Acredito que tudo isso deve ter sido simplificado e melhorado nas continuações, mas arrastam o primeiro para baixo com força.

VISUAL

O primeiro Mass Effect ganhou um belo retratamento nesta Legendary Edition. Vídeos de comparação mostram o quanto ele está mais bonito agora do que era originalmente. Mesmo assim, os gráficos envelheceram bem mal. As espécies alienígenas ainda são bem legais, mas especialmente os modelos humanos são feinhos e robóticos. O curioso é que não parece que Mass Effect é velho. Ele parece um jogo moderno de baixo orçamento. E claro, a gente sabe que isso está longe de ser verdade. Mass Effect é uma tremenda superprodução, e isso fica claro nos seus aspectos que não envelheceram nada, como no som e nas atuações.

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Apesar disso, a Citadel é bem bonita.

MASS EFFECT EM 2021

Eu acredito que Mass Effect em 2007 deve ter sido muito impressionante. Porém, o tempo não foi gentil para ele. Desde então, RPGs se tornaram o principal gênero dos games, e com isso vieram muitas melhorias de qualidade de vida e gameplay.

Por um lado, é legal ver onde essas influências modernas começaram. Por outro, simplesmente como jogo, games mais modernos como The Outer Worlds, fazem bem melhor o que o primeiro Mass Effect pretendia fazer.

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Ele ainda impressiona em design visual, história e principalmente criação de mundo. Mas como jogo, devo ser sincero e dizer que fiquei um tantinho entediado durante boa parte da sua duração. E também que não tive vontade de fazer nenhum conteúdo que não fosse parte da campanha principal, já que os primeiros que fiz foram chatos demais.

Eu estou até empolgado para continuar a história, e acredito que vou gostar muito mais de Mass Effect 23 do que desse primeiro. Mas ainda não os joguei, e estes foram meus pensamentos sobre Mass Effect 1 ao terminar sua campanha.