Outriders era uma incógnita para mim. Embora eu tenha jogado parte do demo, eu sempre vou ter o pé atrás com esses jogos de loot, mesmo que a desenvolvedora jure de pés juntos que não é um “serviço”. Pois várias dezenas de horas depois, eu posso afirmar com a mais absoluta certeza: leia nossa análise Outriders e você vai descobrir que esse jogo é maior legal.

ANÁLISE OUTRIDERS

Outriders é um jogo de tiro com superpoderes. À primeira vista, você pode achar que se trata de um cover de Gears of War, mas a principal inspiração da People Can Fly foi Diablo. Pois é, pois é, pois é, delfonauta.

Isso porque, apesar de ter metralhadoras, escopetas e o escambau – e o cenário ser salpicado com paredinhas na altura da cintura –, o foco aqui é nas magias. Após o prólogo, você escolhe uma de quatro classes e isso vai determinar FORTEMENTE sua experiência a partir daí. No demo, eu escolhi o pyromancer e, embora pudesse continuar meu save no jogo final, resolvi reiniciar com uma trickster.

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Um dos primeiros poderes do trickster envolve paralisar inimigos e balas.

Na real, apesar de ter o loot e as magias com cooldowns curtos de um Diablo, o combate de Outriders o deixou, para mim, bem semelhante ao dos Doom modernos. Isso se deve ao fato de que é um jogo de ação extremamente rápido, com uma enorme mobilidade. Ou seja, apesar de ter coberturas, usá-las é morte certa. Você precisa estar constantemente em movimento.

CURA SEXUAL

Em outras palavras, tomar uns pipocos faz parte do combate, e os modos de cura equilibram tudo. A trickster, por exemplo, se cura quando mata meliantes a curta distância. Então, se manter vivo com ela envolve estar sempre próximo dos inimigos, de preferência com uma escopeta automática, e sempre assassinando gente.

pyromancer, por outro lado, é mais complicado. Ele só se cura quando mata inimigos que estejam pegando fogo, e esse foi um dos motivos que me fez abandoná-lo. Cada classe tem uma forma diferente de se curar, que é potencializada pelos seus poderes. O poder mais útil da trickster, por exemplo, não é nenhum ataque: é simplesmente um teleporte que a coloca atrás do inimigo escolhido, pronta para a violência.

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Ka-bláuie! (isso foi uma onomatopeia de escopeta).

Outras magias da trickster envolvem paralisar os inimigos, levitá-los, usar balas mais poderosas e, as duas mais legais, girar e causar dano em tudo (golpe bem parecido com um disponível em Castlevania Lords of Shadow), além de uma superfacada.

ALAKAZAM

Essa facada é sua primeira habilidade, e ela tem um efeito muito marcante: paralisa os inimigos e mostra seus esqueletos. Em seguida, eles explodem. No início do jogo, ela mata de uma vez qualquer inimigo-padrão, e é uma mão na roda.

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Quando o relógio bate as quatro, todas as caveiras tiram retrato.

Infelizmente, como não poderia deixar de ser, Outriders é um RPG. Isso significa que absolutamente tudo, dos seus tiros à sua armadura, passando, claro, por suas magias, vai perdendo utilidade com o tempo.

Essa “facada espiritual” vai de matar inimigos normais em um golpe para tirar 80% da vida. Depois, metade. Logo, ela se torna quase inútil. A mesma coisa acontece com suas armas, mas essas são mais fáceis de “subir os números”.

Como qualquer RPG focado em loot, você pode ter uma escopeta dourada linda de doer, que rasga inimigos como manteiga. Porém, avance no jogo e ela vai ficando cada vez mais fraca. Logo, você vai precisar substituí-la por uma escopeta azul. Ou pior, um rifle verde. Simplesmente porque o jogo decidiu aumentar a vida dos inimigos para te forçar a trocar de equipamento.

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Imagino que minha faquinha faz cócegas nesse monstrão.

Como as armas dropam O TEMPO TODO, é mais fácil resolver esse problema do que as magias. Conforme o jogo avança, eu comecei a substituir as magias de ataque da minha trickster por magias de movimento, simplesmente porque o dano das de ataque passou a ser ineficaz contra os inimigos.

Até dá para contornar isso com mods que “upam” suas magias. Porém, seus slots de mods são limitados, então não é viável ter todos os upgrades que deseja para manter tudo igualmente eficaz.

ANÁLISE OUTRIDERS: MODS

Vale desenvolver mais essa história de mods, né? O loot de Outriders segue aquela tradicional classificação por cores. Em ordem de pintudice: branco, verde, azul, roxo e dourado. Equipamentos azuis trazem um espaço para mod. Roxos e dourados têm dois slots. Você ganha um mod desmontando um equipamento que venha com ele. A partir daí, pode usar esse mod através do crafting.

Os mods modificam consideravelmente o gameplay. Por exemplo, eu coloquei o mod Minefield na minha escopeta, arma que tradicionalmente mata com um único tiro. Esse mod faz com que cada tiro mortal solte uma pá de explosivos. Assim, cada tiro meu tem o efeito literal de um lança granadas, despedaçando grupos de uma vez.

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Literalmente despedaçando.

Esses mods são a única forma de upar suas magias, então você acaba tendo que escolher se quer manter sua facada tão útil quanto era no começo do jogo, ou usar outros efeitos potencialmente mais destrutivos e divertidos.

UM APPROACH MUITO LEGAL PARA DIFICULDADE

Outriders faz um excelente trabalho em fazer o jogador se sentir poderoso. O som, as animações, os inimigos explodindo em chuva de sangue. Mesmo quando você está literalmente sofrendo para sobreviver, desesperado em busca de cura, você nunca se sente indefeso.

O que eu gostei é a proposta de Outriders para a dificuldade, que é também semelhante a Diablo. Conforme você joga em determinada dificuldade, vai “destravando” dificuldades maiores. O padrão é que o jogo mude automaticamente para a maior dificuldade destravada, mas dá para desligar isso. Dificuldades maiores aumentam o nível dos inimigos, mas também a qualidade do loot. Assim, o jogo desafia e incentiva a aumentar sempre a dificuldade, mas permite diminuí-la de volta a qualquer momento.

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A tela de equipamento.

Eu fui subindo a dificuldade constantemente até chegar ao nível 6, em que fiquei travado por um bom tempo. Acontece que, se você morrer na dificuldade mais alta, perde parte da XP acumulada para subi-la novamente. E o nível 6 estava bem desafiador para mim.

Dito isso, era ótimo saber que eu podia diminuir a dificuldade em vários níveis para passar de uma cena de ação mais difícil ou de um chefe mais cascudo. Jogar no nível 1 quando você já está devidamente upado deixa seu personagem ridiculamente poderoso, possibilitando passar de qualquer desafio sem esforço algum, se é o que você procura.

ANÁLISE OUTRIDERS: SINGLE PLAYER E COOP

Uma das coisas que me deixavam cabreiro com Outriders é o fato de ele ser um jogo pensado para coop. E, de fato, suas cenas de tiroteio são bem longas, não raro envolvendo o assassinato de 100 ou mais inimigos para prosseguir. Ainda assim, ao contrário de Anthem, por exemplo, eu não senti necessidade ou vontade de abrir meu jogo, e fiz a campanha toda sozinho, sem problemas de dificuldade (até porque eu adaptava o nível de acordo com o desafio).

O que me deixou injuriado, e você provavelmente já leu sobre isso, é o servidor.

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Eu passei tanto tempo olhando essa tela que a logo Outriders literalmente fez burn-in na minha TV.

Outriders exige conexão constante, mesmo que você jogue sozinho, com seu jogo fechado. Isso não seria um problema se ele funcionasse. A tela acima, por exemplo. Você nunca sabe quanto tempo vai ficar nela. Eu cronometrei aqui, e a média parece ser cerca de 10 minutos. Às vezes é mais rápido, às vezes mais lento, mas durante minha campanha eu nunca consegui jogar sem ficar um bom tempo esperando minha vez de conectar.

Quando você finalmente conecta, entra na tela de seleção de personagem, onde deve clicar em “continuar”. E daí o jogo faz uma contagem de dez segundos, para só depois disso começar o carregamento propriamente dito. Dez segundos parece pouco considerando que você esperou dez minutos para poder chegar nessa contagem, mas por que diabos programaram isso no jogo? Por que tem que ter uma contagem regressiva antes de carregar? Eu já vi isso em outros jogos on-line, como Destiny ou Halo, mas normalmente são apenas três segundos, e já são três a mais do que deveria ser. E daí…

VOCÊ FOI DESCONECTADO

Uma vez que você conecte e esteja jogando, é só alegria, certo? Não, não é. É extremamente comum que, durante sua campanha, você seja desconectado. Nesses casos, é retornado para a tela-título, onde tem que entrar novamente na fila dos dez minutos.

Na primeira vez em que joguei, estava no final do prólogo quando perdi a conexão. Quando voltei, vi que minha campanha estava zerada, como se não tivesse jogado nada. Desisti e fui jogar Ty The Tasmanian Tiger e esperar uns dias para ver se o servidor melhorava. Quando voltei, de fato tinha melhorado, mas durante toda a minha campanha perdi a conexão sem motivo no meio do jogo mais de 20 vezes.

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O “golpe Castlevania” faz miséria com os inimigos, mas só no começo do jogo.

Fico pensando na situação de um adulto normal, que tem, sei lá, 30 minutos para jogar. O cara ficou empolgado que no PS5 os loads seriam mais rápidos, mas daí pega um jogo que só para entrar nele demora 10 minutos. E um pouco depois perde a conexão. Assim, seus 30 minutos de diversão eletrônica acabam indo embora sem você ter jogado quase nada.

Ah, e é claro, como não poderia deixar de ser, Outriders segue aquela babaquice de não ter pausa. Aliás, dizer isso não é justo. Se você jogar no PC, e tiver uma placa de vídeo específica, poderá pausar normalmente. Olha o ponto a que chegamos. Pausa agora é exclusividade de um produto. Se continuar assim, pausar vai virar DLC pago. E ainda tem gente que defende essa ideia de que a desenvolvedora pode escolher não colocar pausa no seu jogo single player por algum argumento falho de integridade artística.

OUTROS PROBLEMAS TÉCNICOS

Além do servidor, há outros problemas com Outriders. Por exemplo, você depende de uma habilidade que mostra seu caminho, já que algumas partes do mapa têm várias saídas, e o mapa não mostra sua localização exata. Porém, é comum o waypoint mostrar o caminho para uma missão já concluída, não para a que está selecionada como ativa.

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Vai encarar, brôu?

Isso – e acredito que os problemas de servidor – deve ser resolvido eventualmente, mas acaba servindo como um aviso de que é melhor esperar alguns meses para jogar Outriders. Mas não espere muito. Afinal…

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Isso é o que acontece com quem me encara! Boo-yah!

Também me preocupa o fato de ele ser sempre on-line. Afinal, daqui a dez anos, ou menos, a Square Enix pode (e convenhamos, vai) resolver desligar os servidores, tornando Outriders um peso de papel digital. Considerando que, para mim, ele foi um jogo totalmente single player, vou dizer que não vi absolutamente nenhuma vantagem em sua proposta “sempre on-line“. Na prática, isso fez com que eu tivesse que esperar muito para começar a jogar, perdesse progresso a toda hora e, eventualmente, vai matar o jogo inteiro. E que benefício isso trouxe? Literalmente nenhum.

CUTSCENES E NENÊS

Normalmente isso vem mais no começo do texto, mas eu não quero encerrar antes de falar da história. Outriders é um jogo muito focado em sua narrativa. Tem cutscenes frequentes e bem longas. E isso deixa ainda mais pentelho o fato de não ter pausa. Se minha filha vem pedir atenção no meio de uma cena de ação, eu posso simplesmente morrer e tentar de novo depois. Mas e se for em uma cutscene super importante para a história? Como eu faço para deixar uma nenê quieta por cinco minutos até os personagens pararem de avançar a trama?

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Depois de uma batalha: o único momento em que eu conseguia largar o controle por alguns minutos sem prejuízo.

Sim, eu sei que é um problema específico meu, mas eu diria que muita gente que joga videogame tem filhos pequenos e pouco tempo para jogar. E coisas como demora para conectar e inexistência de pausas atrapalham consideravelmente a experiência para essas pessoas.

HISTÓRIA

Falando da história em si, Outriders acompanha um grupo de pessoas que fugiu da Terra após esta ser destruída. O plano parece sólido, eles até fizeram backup da internet inteira. Porém, como sempre acontece quando humanos estão envolvidos, ao chegarem no novo planeta, eles começam uma guerra. Seu personagem é congelado nesse ponto e acorda décadas depois, quando todo mundo está sofrendo por falta de recursos, mas a guerra continua.

Porém, a história não segue o caminho que você espera. Você não se envolve, pelo menos não muito, na guerra. Logo você tem a missão de seguir um sinal, que vai possibilitar trazer recursos que vão ajudar todo mundo. Assim, a história é basicamente uma road trip. Você vai seguindo o sinal através de boa parte do planeta, encontrando pessoas e histórias diferentes ao longo do caminho.

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As primeiras 10/15 horas do jogo são bem marrons, mas depois ele fica consideravelmente mais colorido e mais bonito.

Uma crítica que pode ser feita à narrativa de Outriders é a quantidade de plot points que ele utiliza. Tem a guerra, daí tem os desertores, os ferais. Muita coisa acontece aqui, e nada é especialmente desenvolvido. Você está sempre avançando, de uma área para a próxima. Personagens que no início da campanha parecem que serão muito importantes somem para nunca mais aparecer. E sim, isso é um problema.

Outro problema é que os sistemas exigem voltar constantemente para as cidades do início do jogo para entregar quests e vender seu loot. Isso não faz nenhum sentido narrativo. Cada nova área conquistada na sua viagem vem a muito custo para os personagens. Eles não ficariam voltando para o início a toda hora só para vender umas arminhas.

ULTIMATO

Dito isso, devo dizer que eu até curti a narrativa. Gosto de histórias estilo road trip e, se você já fez algo assim na vida real, sabe que conhece muita gente diferente, com quem passa alguns dias, e depois elas somem completamente da sua vida. Assim, Outriders tem um quê de The Last of Us, ainda que, obviamente, seja muito menos habilidoso em sua narrativa e construção de personagens.

Também quero elogiar que, em nenhum momento da história, Outriders toma atalhos. Todos os diálogos são animados e dublados. Em todos as bocas se movem de forma apropriada, e sempre há enquadramentos bem pensados e bem-feitos. Em uma época na qual jogos vivem tomando atalhos, contando partes de suas histórias sem vozes ou com imagens estáticas, isso merece ser valorizado.

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Eu odeio muito esse mosquito!

Outra coisa que vale elogiar é que Outriders termina. Ele é consideravelmente longo, mas é divertido o tempo todo. Há uma atividade de endgame para aqueles que quiserem continuar jogando, mas ela é muito menos importante para a experiência do que em jogos como The Division ou Avengers.

ENDGAME: EXPEDITIONS

Depois que você termina a história, destrava uma série de missões. Essas são time trials. Quanto mais rápido você vença, melhores as recompensas. A ideia aí também é jogar na dificuldade mais alta, pois daí você consegue subir de nível. Ao chegar no máximo, há um chefe final e até mesmo a experiência de endgame acaba.

Essas fases são bem pentelhas para jogar sozinho, pois seguem aquele tradicional gamedesign de cooperativo. Por exemplo, os jogadores devem ficar em uma pequena área matando inimigos até “encher a barrinha”. Dá para se divertir com essas fases, mas elas são SÓ mata-mata e só fazem sentido em coop (é possível jogar sozinho, só é muito chato).

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Esse cenário me lembrou uma fase específica do Star Wars Jedi: Fallen Order.

Minha experiência com coop foi basicamente apenas nas expeditions, e essas também sofrem muito com servidor. É comum seus tiros demorarem um segundo para chegar nos inimigos ou outros tipos de problemas de conexão como esse.

Outra coisa bem comum é que o jogo pode te juntar com alguém que está fazendo a história, mesmo que você tenha escolhido “expeditions“. E, claro, há o “problema humano”. Em especial, só o host pode iniciar uma missão e é extremamente comum você ser juntado com um host que fica parado. Tipo, o cara provavelmente deixou o jogo ligado e foi embora. Isso aconteceu comigo três ou quatro vezes a cada cinco tentativas, então aparentemente tem muita gente curtindo deixar Outriders como um protetor de tela.

Esse problema poderia ser resolvido permitindo que qualquer jogador iniciasse a atividade, mas da forma que está, encontrar um jogo não é garantia que você vai conseguir jogar.

ANÁLISE OUTRIDERS: THE END

Assim, a People Can Fly cumpre a promessa de que Outriders é uma experiência completa. Um jogo com começo e fim, apesar de seu loot. Tecnicamente, eles ainda têm que mexer, especialmente no servidor, mas a campanha que vem com o jogo é perfeitamente satisfatória e, se você curte a ideia de dar uns tirinhos turbinados por poderes mágicos, vale muito a pena.