As tribos e as generalizações

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Quando se critica um grupo, as pessoas que fazem parte daquele grupo imediatamente se armam e criticam pessoalmente o autor. A coisa mais comum nesse aspecto é dizer “ele generalizou e portanto se perdeu em seus argumentos”, obviamente de forma muito menos polida. Porém, será isso mesmo?

A meu ver, a divisão da humanidade em grupos é positiva. Quando você diz para alguém que é nerd ou headbanger, você está falando muito mais do que simplesmente uma palavra. Você está se identificando com um grupo de pessoas, grupo este que tem uma série de características, e está passando todas essas características em apenas uma palavra. O mesmo também é passado quando você decide deixar seu cabelo crescer, usar roupas pretas, ou qualquer outra coisa que o identifique como parte de algo maior do que sua pessoa.

Algumas vezes, essa classificação vem de fora (a turminha da escola chamando o carinha estudioso pejorativamente de nerd, por exemplo), mas em grande parte das vezes, o indivíduo é que opta por elas. Ninguém obriga alguém a deixar o cabelo crescer, por exemplo. Se tanto, a sociedade obriga é a cortarmos os cabelos.

Fazer parte de um grupo, ou de uma tribo, não significa que você abre mão da sua individualidade. Significa apenas que sua personalidade, em grande parte, se assemelha à daqueles indivíduos, mas de forma alguma torna você igual a eles. Por mais que façamos parte da mesma tribo, somos diferentes. Nossos gostos, opiniões e personalidades se diferenciam em muitos aspectos.

Porém, quando se junta uma grande quantidade de pessoas da mesma tribo, surge um novo organismo – o grupo. E este se comporta de um jeito característico. Ou seria certo dizer que o comportamento do público de um show de metal é exatamente igual ao de um concerto de música clássica? Não, não é, ainda que seja possível que exista uma intersecção considerável de pessoas entre eles.

Entrando num ponto mais específico, é possível criticarmos a atitude do público de um show sem criticar cada indivíduo que estava lá. É óbvio que nem todos os presentes fizeram parte do tumulto supralinkado, mas também é fato que algo assim seria consideravelmente mais difícil de acontecer – para não dizer impossível – em um concerto feito no Theatro Municipal.

Um sujeito fanático por Iron Maiden não é APENAS um fã de Iron Maiden. Ele também é filho, pai, marido, enfim… E, no show de sua banda preferida, ele não vai se comportar da mesma forma do que no casamento de sua filha. E isso é natural, não o torna menos trüe. É importante para qualquer indivíduo que viva em sociedade saber diferenciar a hora de bater cabeça ou a hora de prestar atenção em silêncio. E, obviamente, saber que nunca se deve colocar a vida de outras pessoas em risco em nome da sua diversão – ou de qualquer outro motivo.

É possível que você se identifique mais com uma tribo do que com as outras, mas se reduzir a apenas um headbanger é reduzir a si mesmo como pessoa. Seja um headbanger, mas seja também outras coisas. Seja um estudante, um escritor, um músico ou um engenheiro. Seja um amigo, um marido, um pai, enfim… Seja você. Abrace as classificações com as quais se identifique, seja em gostos, visual ou personalidade, mas não se limite. Não seja APENAS elas. Se encarar dessa forma, logo vai perceber como vai incomodar cada vez menos quando alguém falar mal dos “metaleiros” – ou seja lá de qual tribo você faça parte.

Quando falamos sobre grupos (seja em matérias críticas ou humorísticas), não estamos falando especificamente de você, o indivíduo que faz parte dessas tribos, mas dos comportamentos que observamos deste organismo coletivo, que se forma quando se juntam muitas pessoas da mesma tribo em um mesmo lugar.

Assim, é estúpido ficar criticando as generalizações. O que seria da antropologia e da história se fôssemos falar apenas de indivíduos? Graças às atitudes coletivas de grupos – e ao estudo delas – podemos ter uma ideia de como as pessoas viviam no Egito, na Grécia, na época do Renascimento, entre os Maias ou até sobre os povos indígenas que existem até hoje. Absolutamente todos que faziam parte dessas sociedades agiam exatamente da mesma forma? É claro que não – e nem por causa disso nossos historiadores devem perder o respeito por terem, supostamente, generalizado.

Da mesma forma, se queremos estudar, criticar e entender a sociedade contemporânea, precisamos dividi-la em grupos e analisar as atitudes destes grupos, como um coletivo, não de cada membro individual. Seja para fins históricos, humorísticos ou mercadológicos, isso não é negativo nem feito por inimigos do Deus Metal. Muito pelo contrário – é analisando nossos erros e os erros de nossa civilização que podemos evoluir. Como sociedade e como pessoas.