118 Dias

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Para quem sempre achou que o ator mexicano Gael García Bernal tem a maior cara de árabe, este filme é para você! Contudo, apesar da decisão questionável do casting do protagonista, 118 Dias é um filme bem legal. Tanto, na verdade, que esse pequeno equívoco de elenco acaba não influindo em nada. Só toquei nisso porque não sabia como começar a resenha. Mas agora que já passei pelo difícil primeiro parágrafo, posso seguir para a sinopse.

Bernal é Maziar Bahari, um jornalista iraniano que vive em Londres e trabalha para a revista Newsweek. Ele retorna a seu país natal para cobrir a controversa eleição presidencial de 2009, onde Mahmoud Ahmadinejad foi reeleito debaixo de fortes suspeitas de fraude. O povo foi às ruas protestar e as autoridades responderam com violência.

Bahari registra imagens fortes das manifestações e da truculência dos órgãos de repressão, algo que pode desagradar muito o governo iraniano, mas acaba preso mesmo é sob uma absurda acusação de ser um espião a serviço dos porcos capitalistas ocidentais. Ele é então levado para uma prisão onde passa os 118 dias do título sendo interrogado, espancado e mantido em confinamento solitário.

Pela sinopse, este é o tipo de longa que se imagina ter o maior jeitão de oscarizável, manipulando as emoções do espectador milimetricamente para conquistar sua simpatia e mostrar as desgraças que a humanidade é capaz de cometer. Mas não é, apesar do tema forte e de tratar de todas essas coisas. Surpreende como a condução do longa, baseado em livro escrito pelo próprio Maziar Bahari, é muito mais leve do que se poderia imaginar.

Desde o começo, quando o jornalista chega ao país e vai retratando um povo desejoso por mudança e liberdade, até quando ele vai preso, tudo é mostrado de uma maneira mais documental e arejada, equilibrando bem a seriedade da situação ao mesmo tempo em que reforça também seu absurdo.

E nisso, acaba sobrando espaço para o humor (este longa marca a estreia do comediante Jon Stewart na direção), o que deixa a mistura bem mais interessante e ajuda a destacar esta película de outros exemplares do gênero “a humanidade é podre”, apresentando cenas que beiram o surreal, como a revista no quarto de infância de Bahari, com as “autoridades” considerando praticamente tudo que encontram lá pornográfico, de filmes de arte italianos a graphic novels do Tintim. Ou quando eles revelam ao jornalista um vídeo que teria sido uma das principais causas dele ter ido em cana.

Também dá um sopro de ar fresco ao focar mais nos mecanismos encontrados pelo jornalista para aguentar a horrível situação em que se encontra, como as conversas imaginárias com seus já falecidos pai e irmã, que passaram pela mesma situação que ele, ou a esperta e hilária sacada de engabelar seu interrogador com histórias eróticas inventadas.

Por conseguir misturar momentos de mais leveza, investir na psique do personagem principal e tornar o drama da história menos pesado e exagerado, além de escancarar o absurdo de certos governos totalitários, acaba conseguindo uma mescla de elementos que poucos dramas estadunidenses conseguem atingir, tornando o longa cheio de bem-vindas nuances. Por isso mesmo, 118 Dias acabou sendo uma boa surpresa para mim e também acredito que o será para quem lhe der uma chance. Vale uma ida ao cinema para quem quiser ver um bom drama que foge do padrão de dramalhão mexicano dos oscarizáveis.

REVER GERAL
Nota
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Carlos Cyrino
Formado em cinema (FAAP) e jornalismo (PUC-SP), também é escritor com um romance publicado (Espaços Desabitados, 2010) e muitos outros na gaveta esperando pela luz do dia. Além disso, trabalha com audiovisual. Adora filmes, HQs, livros e rock da vertente mais alternativa. Fez parte do DELFOS de 2005 a 2019.
118-diasPaís: EUA<br> Ano: 2014<br> Gênero: Drama<br> Duração: 103 minutos<br> Roteiro: Jon Stewart<br> Elenco: Gael García Bernal, Kim Bodnia, Dimitri Leonidas, Haluk Bilginer e Shohreh Aghdashloo.<br> Diretor: Jon Stewart<br> Distribuidor: Diamond<br>