Escrever uma análise Elden Ring – ou qualquer jogo da From Software – é uma experiência bem diferente. Aliás, simplesmente jogar qualquer um da From é. Todas as coisas boas e ruins que fazem parte de uma obra deles se somam para criar um jogo envolvente, que será lembrado por anos. Eu os amo. Eu os odeio. Às vezes os dois ao mesmo tempo. E eu vou elaborar estes sentimentos contraditórios na minha análise Elden Ring. Me acompanha?

ANÁLISE ELDEN RING

Comecemos pelo básico. Elden Ring é praticamente um Dark Souls 4. Ou melhor, se você imaginar como seria um Dark Souls em mundo aberto, teria uma boa ideia de como é Elden Ring, mesmo que ainda não o tenha jogado.

Artisticamente, é um jogo lindo e envolvente, como absolutamente tudo que a From Software fez na última década. Porém, graficamente ele deixa muito a dever. Para ser sincero, ele não parece muito mais avançado do que Dark Souls 3 ou Dark Souls Remastered. E é muito, MUITO inferior ao remake de Demon’s Souls feito para o PS5.

ANÁLISE ELDEN RING: ARTE X TÉCNICA

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Uma imagem para ilustrar o que quero dizer.

A imagem acima mostra bem isso. Tipo, olha essa NPC. É um design MUITO legal. Criativamente é excelente, passa muito sentimento e muita história mesmo parada. Porém, tecnicamente, ela parece um boneco de plástico, não uma criatura viva. Personagens humanos ficam ainda mais estranhos. Veja.

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O NPC acima parece um boneco de porcelana, não um ser humano. E embora ele mexa a boca quando fala, o faz sem expressões faciais e mesmo sem sincronia labial alguma. Apenas abre e fecha a boca, literalmente. Outros problemas técnicos incluem uma neblina bem forte que permeia todo o mundo, impossibilitando de enxergar longe, ou mesmo uma draw distance extremamente curta, que dá a sensação de que a vegetação é construída conforme você se aproxima dela.

Na verdade, é incrível que Elden Ring seja tão lindo e envolvente com um trabalho técnico tão precário. Mesmo jogando no Xbox Series X, ele simplesmente não parece um jogo next-gen. Porém, o primeiro Dark Souls é lindo até hoje, e se mantém assim não porque era um jogo extremamente técnico quando saiu, mas pela criatividade e qualidade absurda dos artistas da From Software. E no aspecto direção de arte, a From ainda é uma das melhores. Em um exemplo totalmente oposto, veja isso.

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Olha esse design, meu camarada! Coisa fina!

ANÁLISE ELDEN RING: TERMINANDO A PARTE TÉCNICA

Antes de entrarmos no núcleo dessa resenha, deixa eu falar de outros aspectos em que Elden Ring fica devendo tecnicamente. Ele tem dois modos de jogo: qualidade e framerate. O qualidade roda destravado, mantendo uma taxa de quadros entre 40 e 45 por segundo, com algumas caídas pontuais abaixo dos 30. O modo performance diminui a qualidade gráfica para aumentar o framerate, mas não consegue chegar a 60fps em nenhum momento. Assim, alternar entre os dois torna o modo performance consideravelmente mais feio sem o ganho de movimentos perceptivelmente mais suaves. Eu sei que a opinião geral é que é melhor ter 30fps travado do que algo flutuante acima disso. Porém, aqui isso não me incomodou. Os movimentos estão suaves o suficiente no modo qualidade, e meus olhos nus não perceberam grande variação de taxa de quadros, a não ser em pontos específicos, com muitas partículas.

O que realmente pegou para mim são as telas de carregamento. Aparentemente no PS5 são bem mais rápidas, ainda que não tão rápidas quanto Demon’s Souls. Porém, no Xbox Series X elas chegam a durar quase 30 segundos. É um tempo considerável, especialmente em um jogo em que você está constantemente morrendo ou usando fast travel. E é bem mais do que eu esperava ver em um jogo da próxima geração instalado em um SSD potente.

Agora sim vamos falar do jogo em si. Elden Ring tem muitas qualidades. E suas qualidades são absurdas. Porém, quase todas elas vêm com um enorme porém. Daí o título dessa resenha ser “entre o amor e o ódio”. Vamos começar com a parte boa.

AMOR: O MUNDO ABERTO

Você sabe que eu não sou fã da modinha de tudo hoje em dia ter que ser mundo aberto. Estou empapuçado do gênero e exausto de jogos de limpar o mapa estilo Horizon Forbidden West ou qualquer coisa da Ubisoft. Pois aqui começa o meu enorme amor por Elden Ring. Pela primeira vez desde, sei lá, Far Cry 3, eu senti um verdadeiro tesão em explorar o mundo. Em escolher uma direção e ir andando a esmo, para ver o que iria encontrar lá. Rumo à aventura, sabe? Como diria o Calvin, “o mundo é mágico! Vamos explorar!”.

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Dragões? Monstros? Amigos? Você nunca sabe o que vai encontrar em Elden Ring. Mas sempre vai encontrar algo!

Junte essa minha sede por aventura, e meu desgosto por ficar morrendo repetidas vezes em um chefe pentelho, e minhas primeiras dezenas de horas com Elden Ring foram basicamente explorando. Antes mesmo de fazer o primeiro dungeon da história, eu já tinha encontrado várias regiões diferentes e dado de cara com muitos mistérios que provavelmente nunca vou solucionar.

Sim, é verdade que a eterna hostilidade da From Software está presente aqui. É comum ter um chefe no meio do mundo aberto que você simplesmente não vai conseguir vencer. E mesmo inimigos mais genéricos são capazes de te matar em poucos golpes, se não em um único ataque. Porém, o mundo ser aberto e você ter o cavalo a qualquer momento, permite escapar mesmo das lutas contra os chefes. Estando no cavalo, acredito que nenhum inimigo consegue te perseguir por muito tempo. Então é perfeitamente viável passear pelo mundo e coletar itens, armas e armaduras com relativamente pouco perigo.

AMOR: TENTATIVA DE ACESSIBILIDADE

De mãos dadas com o mundo aberto convidativo, temos a From pela primeira vez colocando algo de acessibilidade em seus jogos. Foi uma das primeiras coisas que eu senti quando comecei minha aventura. Há fogueiras (em Elden Ring chamadas de “graça”) relativamente próximas pelo mundo aberto, e há também “estacas”, que funcionam como checkpoints que você não precisa ativar. Se morrer perto de uma estaca, poderá reviver nela, mesmo que sequer a tenha visto. Isso é ótimo, e é algo que sinceramente demorou muito para acontecer, sendo que até no Mega Man de Nintendinho você revivia na sala anterior ao chefe, sem precisar navegar por boa parte da fase de novo.

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Uhn… não sei se eu quero passar por essa porta não.

Infelizmente, a From não foi tão fundo nesse aspecto como outras desenvolvedoras costumam ir. E aí começamos nossos poréns…

ÓDIO: ACESSIBILIDADE COMPROMETIDA PELA REPETIÇÃO

Essas estacas funcionam basicamente no mundo aberto. Em dungeons, até tem algumas. Mas elas são raras e dificilmente te colocam na sala anterior ao chefe. É muito comum que tenha uma fogueira ou uma estaca várias salas antes do chefe, exigindo passar por um monte de inimigos correndo, ou vencê-los um a um antes de poder tentar de novo.

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Um raro caso de uma fogueira imediatamente antes da cortina de fumaça de um chefe.

Aliás, a disposição de fogueiras e estacas é bem estranha. No primeiro castelo/dungeon, por exemplo, tem um chefe que guarda a entrada, com uma fogueira imediatamente antes dele. Ao vencê-lo, uma nova fogueira aparece na arena. Desnecessário. Afinal, você poderia simplesmente voltar uma sala para fazer seus upgrades. Daí você de fato entra no castelo, e na primeira sala, literalmente uma porta depois da fogueira anterior, tem mais uma. Ou seja, são três fogueiras seguidas, onde apenas a primeira poderia fazer o mesmo trabalho das três.

Agora permita-me dizer que checkpoint nunca é demais. Eu sou totalmente a favor do estilo Darksiders 2, em que cada porta que você atravessa é um checkpoint. Mas é muito estranho ter três fogueiras seguidas e desnecessárias, e depois você entrar no castelo e ter um espaço enorme até encontrar outra. Sem falar que quase todos os chefes de história NÃO têm um checkpoint na sala anterior.

ÓDIO: INCONSTÂNCIA NA DIFICULDADE

Este também é um problema antigo que eu tenho com a série Souls. Você nunca sabe se é possível vencer um inimigo até atacá-lo. Em alguns casos, um ataque seu tira 1/3 da vida. Às vezes dá para matar em um único ataque. Porém, é também absurdamente comum que seu ataque mais poderoso sequer movimente a barra de vida do meliante.

Veja bem, eu não me refiro àquele tipo de escolha como no início do primeiro Dark Souls. Lá, ir para baixo te coloca frente a frente com esqueletos que são basicamente invencíveis. Ir para cima é consideravelmente mais fácil. Isso é uma forma de o jogo te falar para onde ir, e é uma tática de gamedesign totalmente válido.

Meu problema é quando você está em um dungeon ou em uma fase relativamente linear. A dificuldade está aceitável, os inimigos estão sentindo seus golpes. E daí rola um chefe ou outro tipo de inimigo que é quase invencível. Ora, se for para fazer assim, para incentivar que você fuja dele, faça logo um Mr. X. Mas não, é comum que o invencível seja um chefe obrigatório. Ou até mesmo o contrário. Em um dungeon em que você está penando para vencer os inimigos normais, o chefe morre super rápido.

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Nesse chefe, por exemplo, um único golpe meu tirou toda essa vida em amarelo.

Diga o que quiser, mas para mim é um erro grave de gamedesign colocar um inimigo/chefe não opcional com 10.000 HP na mesma fase em que os outros têm apenas 100 HP.

ÓDIO: MOMENTOS IMPOSSÍVEIS DE PASSAR SEM AJUDA

Ainda nessa pegada, eu tive um momento de empaque forte na segunda grande chefe, a Rennala. Nenhum dos meus ataques a machucava. Cada golpe fazia coisa de 50 de dano, e ela parecia ter milhares de HP. Era impossível. Eu conversei bastante com meu colega de DELFOS Daniel Villela enquanto jogávamos, e comentei isso com ele. Ele a matou sem grande dificuldade, e atribuiu essa diferença à nossa escolha de classes. Eu escolhi jogar com um feiticeiro, enquanto ele optou por uma classe mais guerreira. Imaginamos que a Rennala tem grande resistência a mágica. E ok, resistências e vulnerabilidades fazem parte do combate de um RPG. Mas da forma como a From estrutura isso, torna simplesmente impossível para determinadas classes passarem de alguns desafios.

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O jeito foi apelar para o gangbang na Rennala.

Eu simplesmente não via nenhum jeito de conseguir vencê-la com meus ataques que tiravam 50 HP. Eu só passei dali porque o jogo dá a possibilidade de pedir ajuda. Mas eu sinceramente acho que isso não substitui uma dificuldade melhor tunada, ou mesmo a opção de jogar num modo fácil escolhido pelo menu. Convenhamos, se o jogo permite jogar com um feiticeiro, eu deveria ter alguma possibilidade de vencer a Rennala que não seja pagar a Microsoft pela oportunidade de chamar outros jogadores para virem fazer o serviço não remunerado de vencer o chefe para mim. Eu preferia ter vencido por conta própria, mesmo numa dificuldade mais baixa, do que passar o controle para “irmãos mais velhos” passarem dali para mim. E isso nos leva a um momento relacionado de amor, e a um de ódio. Comecemos pelo sentimento bonito.

AMOR: A COMUNIDADE

Apesar de ser um jogo basicamente single player, você não se sente sozinho em nenhum jogo da From. E entendo que isso é um reflexo direto da absurda hostilidade da desenvolvedora. Seus jogos serem tão difíceis, e tão punitivos, criam uma comunidade que simplesmente gosta de se ajudar.

Teve vários momentos no jogo em que eu só encontrei um item, uma fogueira ou um segredo, seguindo as mensagens escritas por outros jogadores. E sim, tem uma enorme quantidade de babacas, como em qualquer lugar com seres humanos. Porém, para cada mensagem de “tenta pular” na beira de um abismo, tem dezenas que avisam de armadilhas ou checkpoints próximos. E isso é sensacional.

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Jogos da From são cheios de armadilhas.

Jogos da From são cheios de armadilhas. Um exemplo é a imagem acima. Se você for correndo pegar o tesouro, os bichos vão pular da parede e te matar. E isso é injusto. Mas muito provavelmente haverá uma ou mais mensagens te chamando atenção para a armadilha. Assim, você pode usar feitiços ou flechas para derrotar os inimigos sem eles te pegarem de surpresa. E ao mesmo tempo que eu odeio a armadilha em si (fatalmente você vai cair em algumas), eu amo essa possibilidade de todo mundo se ajudar. Cria uma comunidade mais legal do que qualquer outro jogo, e eu tenho plena noção de que isso só acontece por causa da enorme hostilidade que a From nutre contra seus clientes.

Inclusive, enquanto eu jogava para review, o Daniel Villela jogava em seu tempo livre. E a gente todo dia se falava, dizendo lugares legais que descobrimos, bons equipamentos e boas magias. Inclusive foi o Daniel que me guiou para um chefe opcional que dava uma habilidade para o escudo que diminuía o gasto de stamina ao bloquear um golpe, e isso foi extremamente útil. É uma versão mais próxima – afinal, somos amigos, não desconhecidos – da comunidade, mas é algo que só acontece em jogos da From. Fizemos a mesma coisa em Sekiro, por exemplo, mas não foi necessário em um mais amigável como The Last of Us Pt. 2.

ÓDIO: SISTEMA DE AJUDA NÃO FUNCIONA DIREITO

Então estabelecemos que os jogos da From são feitos supondo que você pague o serviço online e tenha acesso à comunidade. Inclusive, há chefes como a Rennala que são simplesmente invencíveis se você estiver com a classe errada. Então pedir ajuda não é opcional, é esperado.

Porém, todos os jogos da From fazem isso muito mal. Você precisa consumir um item para ter a possibilidade de pedir ajuda. E só depois de consumir, você descobre se tem gente oferecendo. Mais grave ainda é quando tem gente oferecendo, mas o jogo simplesmente não faz o que deveria. É muito mais comum ver mensagens de erro como essa abaixo do que de fato ativar o coop.

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O amigo que eu consegui chamar já está de saco cheio de esperar eu chamar outro. As mensagens de erro são constantes e inexplicáveis.

Compare isso com Nioh, por exemplo, que seguiu a mesma escola de design, de coop ser ativado com um item consumível. Lá, você oferece o copo em um altar, e o jogo fica, em segundo plano, procurando alguém para ajudar. Enquanto isso, você continua jogando, e o copo só é consumido quando o jogador entra – e vai para o jogador que ofereceu ajuda.

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Ao mesmo tempo, em Nioh, se você quer ajudar alguém, simplesmente escolhe isso no menu e o jogo faz o matchmaking automaticamente. Em Dark SoulsElden Ring, é necessário você colocar seu selo no chão e esperar outro jogador chamar você especificamente. Mesmo que isso funcionasse direito, você precisaria saber o lugar certo para procurar esses símbolos, e torcer para ter alguém oferecendo ajuda naquele momento para aquele chefe específico.

É uma enorme quantidade de “se…” para algo tão comum quanto coop. E, para completar, mesmo que tudo dê certo, e você chame alguém, há 95% de chance de receber a mensagem de erro ao invés de chamar o jogador em questão. E esse é um problema que existe nos jogos da From desde Demon’s Souls, em 2009! São 13 anos que o problema está sem solução, e eles não parecem dispostos a resolver. Estamos num ponto em que até as cópias, como Nioh, já mostraram formas melhores de fazer isso. Curiosamente, é extremamente difícil dar certo chamar ajuda, mas basta usar o item que possibilita isso que alguém invade seu jogo. E se o invasor te matar, você perde o item que usou, sem nem ter a possibilidade de tentar o chefe de novo.

AMOR: NPCS QUE SERVEM DE IRMÃOS MAIS VELHOS

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Esses não são almas, mas vale para mostrar como é legal a animação de morte dos chefes.

Elden Ring traz uma nova mecânica que possibilita chamar “almas” que você pega pelo mundo para te ajudar nas batalhas. Isso é feito em troca de mana ou de saúde, e só funciona em áreas e chefes específicos, marcados no hud quando um túmulo aparece no lado esquerdo da tela.

No começo isso ajuda bastante, especialmente porque você dá um outro alvo para os chefes e não depende de outros jogadores reais. Porém, não demora para as almas serem mortas muito rapidamente, e isso se tornar quase inútil. O lado bom é que uma alma específica (mimic tear, caso você queira procurar como encontrá-la) é mais barata de upar, dura mais e faz muito mais dano nos inimigos. Você precisa jogar boa parte de Elden Ring para poder pegá-la. Mas quando pega, todos os chefes ficam consideravelmente mais fáceis. A diferença de dificuldade depois de ter essa alma no repertório é simplesmente brutal.

ÓDIO: ELDEN RING EXIGE ATENÇÃO TOTAL

Outro problema que já é reclamação velha em games da From é a babaquice da falta de pausa. Estamos falando de um jogo basicamente offline, em que você fica 99% do tempo sozinho, e precisa ativamente usar um item limitado para jogar com outras pessoas. Elden Ring facilmente poderia só proibir a pausa quando este item fosse usado. Mas não, você não pode pausar nunca. Nem em cutscenes, nem em conversas, nem em combate. Inclusive, se você, por reflexo, apertar start durante uma cutscene para tentar pausá-la, vai pular e nunca mais vai assisti-la de novo. Precisa ser tão hostil?

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Tem muitos personagens que não te atacam em Elden Ring. Mas se você iniciar o combate, eles te matam em segundos.

Elden Ring exige um nível de atenção que simplesmente não é justo, nem justificável. É ridículo eu ter que avisar minha esposa e filha para que não falassem comigo quando eu estivesse em combate ou quando tivesse algum personagem falando – o que é quase o tempo todo.

Teve uma vez que minha filhinha, fofinha como é, veio correndo na minha direção e me deu um beijinho no pé. O tipo de carinho que eu incentivo e que eu amo que ela faça naturalmente. Mas é uma distração considerável em um jogo tão hostil quanto este, que fatalmente faz você perder um momento de história não repetível – ou até mesmo um combate inteiro. É injusto, é babaca, e não combina com algo feito para diversão e entretenimento, mesmo que sob a desculpa de ser “arte”. Ora, hoje em dia é possível pausar até TV ao vivo, por que não um videogame single player?

AMOR: UM COMBATE ENTRE OS MELHORES DA CATEGORIA

Um dos motivos que fizeram os soulsborne atingirem o status que têm hoje é como o combate é bom. Ele se manteve praticamente igual em Demon’s Souls, nos três Dark Souls e em Elden Ring, com diferenças pontuais em Bloodborne. E este é um daqueles casos de “em time que está ganhando”. O combate é simplesmente delicioso.

Ao contrário de games como Devil May CryNinja Gaiden, aqui estilo, velocidade e combos não são uma questão. Aqui você deve escolher a hora certa para atacar. Tanto inimigos comuns quanto chefes são duelos de paciência e resistência, não de reflexos. Ambos têm seu valor, mas Demon’s Souls e suas continuações espirituais conseguiram criar um tipo de combate novo e igualmente prazeroso. Essa paciência é medida pela sua barra de fôlego e pelos ataques lentos e telegrafados. Não à toa, o combate brilha em duelos de um contra um. O problema é quando a barra de vida dos inimigos é enorme.

ÓDIO: DIFICULDADE INJUSTA

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Vários cenários em Elden Ring são literalmente de pirar o cabeção.

Meu build foi de inteligência, mas mesmo com mais de 1000 pontos de vida, a imensa maioria dos inimigos me matava com um ou dois golpes. Isso funciona bem quando os inimigos morrem rápido, mas no caso de chefes com 10.000 HP, em que seus ataques tiram 100 ou menos, e ele, por outro lado, tira 800 pontos dos seus 1000 com um único ataque, a coisa fica injusta.

Há um chefe, por exemplo, em que você luta com duas gárgulas ao mesmo tempo. Eu venci uma. Estava com vida e fôlego cheio, e a habilidade do meu escudo ativada para me proteger. Parecia promissor. Daí a gárgula que sobrou me atacou com um combo de três golpes seguidos. Eu defendi. Os dois primeiros golpes acabaram com meu fôlego e quebraram minha defesa. O terceiro golpe tirou TODA minha vida.

Eu fui de estar a segundos da vitória, com as melhores estatísticas possíveis, para perder de uma vez todo o fôlego e, em seguida, toda a vida. De virada é mais gostoso? Talvez, mas não quando você está do lado que apanha. Os fãs da From costumam dizer que, quando você morre em um desses golpes, a culpa foi sua, e que o jogo é justo. Bom, eu não considero isso justo. Pode ser uma história divertida de contar porque, afinal, é engraçado. Mas não foi legal viver isso e voltar à estaca zero, precisando matar as duas gárgulas de novo.

ÓDIO: ERA TÃO FÁCIL PARA ELDEN RING SER PERFEITO

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Cheats em Elden Ring. Créditos da imagem: Bruno Sanchez.

O que me deixa mais bravo nessa história toda é que nem todas as versões de Elden Ring são criadas igualmente. Os jogadores de PC têm opções que a From Software se recusa a dar para quem prefere jogar nos consoles. A imagem acima, por exemplo, foi enviada para mim pelo amigo Bruno Sanchez. Ela mostra cheats que podem ser ativados com um plugin de Steam. Entre esses cheats, tem HP infinito. Essa opção, apenas essa, seria suficiente para fazer com que Elden Ring levasse o glorioso Selo Delfiano Supremo.

Eu estou plenamente ciente que muitos dizem que a morte faz parte do estilo da From, que eles te ensinam através da morte. Porém, a insistência nessa hostilidade mantém muita gente fora de suas obras. Eu mesmo adoro os jogos da From, mas a hostilidade é tanta que eu sinceramente não sei se vou ter paciência para encarar o próximo jogo deles, daqui a alguns anos. Ter a opção de tirar a morte de Elden Ring, eliminaria toda a hostilidade do Miyazaki e sua turma, e assim quem desejasse poderia curtir o jogo como uma aventura de exploração, o que ele claramente almeja ser. E como já falamos muitas vezes por aqui, dá para fazer isso sem afetar a experiência de quem “acha o abuso gostoso” (TM Daniel Villela).

Jogar Elden Ring é jogar um game que não quer ser jogado. É como namorar uma pessoa por quem você tem atração, mas que não gosta de você. É aquela minha velha metáfora do relacionamento abusivo. Assim, se você tem acesso à versão de PC, essa é a que recomendo. Jogue como você quiser, não como o Miyazaki quer que você jogue. E daí você pode se surpreender e saborear todo o amor de Elden Ring, sem se preocupar com o ódio que ele exala por todos os poros.

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CURIOSIDADES PARA FINALIZAR A ANÁLISE ELDEN RING:

  • O placar ficou sete pontos para ódio e cinco para amor. Mas não se limite a isso para decidir. Leia todos os pontos e pese quanto cada um deles interfere na sua diversão. Quero deixar claro que Elden Ring é um jogaço, e seu aproveitamento vai depender diretamente da forma que você lida com a frustração e o quanto “perder tempo” te incomoda.
  • Eu fiquei o texto inteiro sem falar da participação do autor George R.R. Martin na história do jogo, e isso te dá uma boa ideia de quão pouca diferença ele fez na obra final.