Vamos discutir a (quase) reunião do Angra

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Semana passada aconteceu algo um tanto inesperado no mundo do Metal Nacional. Andre Matos anunciou, através de sua página oficial no Facebook, que faria uma turnê de comemoração do lançamento de 20 anos do álbum Holy Land. Foi anunciado ainda que Andre e sua banda tocariam o álbum na íntegra, aos moldes do que foi feito com Angels Cry na turnê anterior – cuja resenha delfiana você confere aqui.

Até aí, nada demais. O incomum foi que Rafael Bittencourt, guitarrista do Angra, comentou no post em questão, questionando o fato de Andre fazer uma turnê exatamente como o Angra vem fazendo. Bittencourt disse, ainda, que seguir com algo em separado seria “alimentar um separatismo na mente dos fãs”.

E a confusão foi plantada. Apesar do tom verdadeiramente respeitoso utilizado por Rafael, as discussões surgiram – bastou ficar claro que o convite havia sido feito e que Andre recusou promover a reunião para que o incêndio começasse entre os fãs. Mas, por detrás de tudo isso, é fácil ver que as coisas são bem mais simples do que parece.

COMEMORAÇÃO É COMEMORAÇÃO, NÃO IMPORTA O ANFITRIÃO

A primeira coisa que a gente tem que derrubar é o pensamento de que Andre usurpou a ideia do Angra. Ora, turnês de comemoração acontecem aos montes, e em todas as bandas possíveis. Não só no Rock ou no Metal, mas em qualquer gênero é possível ver artistas promoverem verdadeiras odes aos seus trabalhos de maior sucesso – e, logo de cara, já me lembro de Moraes Moreira comemorando o aniversário de 40 anos do disco Acabou Chorare.

E mesmo a ideia de se excursionar um disco na íntegra não pode se dizer que foi roubada. O Megadeth já fez isso com Rust in Peace e Countdown to Extinction. O Stryper já fez isso com To Hell With the Devil. O Dream Theater – ainda que por um motivo diferente – fez isso recentemente com o The Astonishing. Além disso, outras bandas já fizeram shows únicos tocando discos na íntegra, como Pearl Jam e Korn.

Andre fazer isso não é uma apropriação do que o Angra se propôs, mas sim trilhar um caminho já pavimentado por outros, um caminho que funciona. Aliás, eu nem precisava ir tão longe – antes do Angra fazer uma turnê com um disco na íntegra, Andrejá havia feito isso duas vezes, tanto com o Viper e com sua banda solo.

Então, dá para ver que não é uma questão de um roubar a ideia do outro, mas sim de escolhas profissionais. Seguir uma tour como essa é algo natural, ainda mais quando se sabe que costuma dar certo no mercado. Mas aí você pode me perguntar “Pô, Luiz, mas eles não ganhariam muito mais dinheiro se tocassem juntos?” Com certeza, disso ninguém tem dúvidas. Mas, se tem uma coisa que o business ensina é que nem tudo pode ser medido aos cifrões.

A TURNÊ MAIS ESPERADA DA HISTÓRIA DO ROCK

Não dá para não falar dessa história do Angra sem citar o Guns N’ Roses, porque existem muitas similaridades entre os dois casos: são bandas grandes, fizeram muito sucesso, lançaram discos épicos, se separaram, e os fãs passaram anos esperando por uma reunião. A única diferença é que, no caso do Guns N’ Roses, essa reunião se tornou real – e este redator que vos fala, por sinal, está realmente ansioso para conferir isso ao vivo.

Mas veja bem, a banda só se reuniu por um motivo muito simples: eles resolveram suas diferenças pessoais. Não importava a quantidade de milhões de dólares que estivessem em jogo, nada aconteceu enquanto eles não fizeram as pazes. Se eles só se aturam ou se voltaram a ser melhores amigos, pouco importa – tudo dependeu de a relação pessoal ser restabelecida, seja de uma forma ou de outra.

Pois vamos dar uma olhada no caso do Angra. Não existem só as tretas relacionadas à banda em si, mas também outras. Vale lembrar que, para além dos problemas que fizeram Andre, Ricardo Confessori e Luis Mariutti saírem, ainda houve outro grande problema que fez com que Andre e Mariutti saíssem do Shaman, e isso também deve ser considerado. O retorno de Andre para shows comemorativos envolveria reatar relações não apenas com Rafael e Kiko, mas também com Ricardo, e não dá para saber se isso é algo próximo de acontecer ou não.

O ponto é que todos os envolvidos já deixaram bem claro que a relação pessoal sempre foi a principal barreira para que a reunião acontecesse. E isso, apesar de não parecer, é um empecilho e tanto. Não importa o quanto a música esteja profissionalizada hoje em dia, não podemos ignorar que ela vai além do contrato e do dinheiro. Em última instância, a sua função maior é despertar emoções, sentimentos, e não há como pensar em uma reunião tão importante sem que todos da banda estejam em sintonia. Não é assim que a música funciona.

ESPERANDO PELO DIA EM QUE CÉU E MAR COBRIRÃO A TERRA

O bom é que, como a história do Guns mostra, essa barreira pode ser grande, mas não intransponível, e não são poucos os detalhes que mostram que esse reencontro da formação clássica do Angra pode estar mais próximo do que parece. Ambos já falam abertamente que os convites para a reunião aconteceram e acontecem. Rafael, quando se manifesta, o faz de forma bastante sóbria, e a participação confirmada de Luis Mariutti e Ricardo Confessori em alguns shows já demonstra que os ânimos não estão tão acirrados como já estiveram. Pouco a pouco, o clima vai se construindo para que esse reencontro seja possível.

E, na minha opinião sincera, essa reunião só não aconteceu agora por um motivo muito simples: não seria uma turnê conjunta, seria uma participação especial. Antes de surgirem os nomes de Confessori e Mariutti, a turnê já estava preparada e agendada – ou seja, já aconteceria independentemente da presença deles ou de Andre. Não me parece do feitio do vocalista, que sempre demonstrou ter grande integridade artística e um apreço muito grande pela sua obra, topar fazer apenas uma participação ao invés de uma comemoração completa. Estamos falando do seu álbum favorito do Angra, afinal de contas.

Tendo isso em vista, fica muito claro pensar que uma reunião poderia acontecer se fosse bem estruturada. Basta que alguns detalhes se alinhem e que haja respeito mútuo, e algo assim se torna bem possível. Será que uma eventual pausa, com Lione indo se dedicar ao Rhapsody of Fire, não abriria a porta que falta para que pudessem planejar algo completo? Ou será que a aproximação de Mariutti e Confessori não seria um pontapé interessante para possibilitar as conversas entre ambos? Para descobrir isso, teremos que esperar.