O novo Rock bunda-mole

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RECAPITULAÇÃO

No já longínquo ano de 2005 (como o tempo passa), escrevi para o DELFOS um artigo sobre as então chamadas “salvações do Rock”. Nele, falava dessa ânsia da imprensa musical por, a cada semana, eleger um messias que iria resgatar o Rock da beira da morte e devolvê-lo a seu posto de direito, como um dos gêneros musicais mais populares e energéticos que existem.

Defendia a tese de que o Rock não precisava ser salvo porque, a meu ver, nunca esteve a perigo. Para ilustrar essa teoria, citava e analisava algumas bandas novas (para a época) que conferiam um novo sopro de frescor, renovando constantemente o gênero. Longe de serem salvadores, eram bons grupos que faziam um bom som e não iriam revolucionar nada, apenas contribuir para dar outras boas opções a um estilo já recheado de ótimas alternativas.

Anos depois, digo com toda certeza que, se fosse hoje, jamais teria escrito aquele ensaio. O tempo de fato é cruel. Dizem que ele também deixa as pessoas mais intolerantes e sem paciência. Se é verdade eu não sei, mas no meu caso acredito que sim. Naquele texto criticava as pessoas que diziam coisas como “no meu tempo é que era bom” e “hoje em dia não tem mais nada que preste”. Hoje vejo que me tornei uma dessas pessoas. Isso é triste, mas há argumentos para essa transformação. O principal: hoje em dia não tem mais nada que preste!

DESILUSÃO

Vejamos: a esmagadora maioria das bandas novas que eu citei naquele texto já acabaram. Poucas passaram do terceiro disco. E as que sobreviveram andam bem mal das pernas. Desde então, que eu me lembre, não surgiu mais nenhuma banda que eu tenha ouvido e pensado: “puxa, isso é bem legal”. Sete anos, cara! É todo um período de azar para quem quebrou um espelho!

Confesso que não tenho mais saco nem vontade para garimpar novidades. É coisa da idade (no momento que escrevo este texto, estou a poucos meses de completar 30 anos). Por outro lado, é culpa também da cultura do MP3. É uma corrida que não dá pra vencer. Hoje em dia qualquer um grava sua música e joga na internet. Não há um crivo. É muito mais trabalhoso peneirar as porcarias até encontrar alguma pérola. Experimente escutar umas 30 tranqueiras seguidas e nenhuma coisa realmente boa e você também vai desistir de procurar.

Cansei. E eu realmente gosto de escutar coisas novas. Uma das melhores sensações que eu tenho com música é quando eu descubro algo novo, ou que não conhecia, que seja excitante. Que faça bater aquela empolgação juvenil. Que faça eu querer contar pra todo mundo a respeito dessa descoberta. Nesses sete anos, talvez eu só tenha sentido isso com o Guillemots, mas por causa de um disco específico (Red). A banda em si não é tão empolgante em seus outros trabalhos. Convenhamos, um disco é muito pouco.

A NOVA REGRA

De saco cheio de correr atrás e não achar nada, decidi desencanar dessa busca cada vez mais infrutífera e, do alto da minha rabugice, estipulei uma regra para mim mesmo. A partir de então, só escutaria bandas com mais de três discos lançados. Seria uma garantia de que elas não sumiriam do mapa na semana seguinte e de que pelo menos alguma qualidade mínima possuiriam. Pois bem, eis que o tal do Black Keys passa a ser laureado como a nova salvação do Rock (sim, ainda não desistiram de salvá-lo).

Eles têm sete discos lançados. Perfeito para minha nova regra. Trouxe toda a discografia deles da Argentina. Um Blues Rock a la White Stripes (o fato deles serem uma dupla, embora aqui sejam dois homens, não ajuda a diminuir as comparações). A diferença é que o baterista realmente sabe tocar e as músicas não têm aquela urgência que as canções dos White Stripes (descansem em paz) tinham. Ouvi os sete discos e depois ouvi de novo para me certificar. Nenhuma canção ficou na minha cabeça. Talvez se eles tivessem surgido antes de Jack e Meg White, poderiam ter pegado o lugar deles. Hoje, é apenas mais um hype exagerado. A banda é competente, mas não me causou nem um comichão no dedinho do pé. Sinceramente, acho que nunca mais vou ouvir os discos deles. Há muita coisa melhor que merece mais minha atenção, ainda que nenhuma dessas coisas seja novidade.

Recentemente quebrei minha autoimposta regra. Grande parte da imprensa musical vem falando muito bem do tal do Howler, uma banda de moleques estadunidenses que têm sido chamados de “os novos Strokes”. Geralmente isso não é um bom sinal (alguém ser chamado de “os novos X”), mas estava tão a fim de escutar algo novo que fui em frente. São os novos Strokes não porque injetam novo ânimo e energia num Rock estagnado, mas porque fazem um som idêntico. Mas os Strokes ainda estão por aí. Se eu quisesse escutá-los, iria à fonte original. Isso é a tal banda mais empolgante do momento?

Admito que minha primeira impressão com bandas geralmente é péssima. Simplesmente odiei Echo & The Bunnymen e Radiohead a primeira vez que as escutei, só para ficar em dois exemplos. E olha que hoje são duas das minhas favoritas de todos os tempos! O caso é que mesmo tendo essa péssima primeira impressão, ambas tinham um algo a mais que me fez persistir e escutar um pouco mais antes de formar minha opinião definitiva. E conseguiram rapidamente me fazer mudar de ideia. Tanto os Black Keys quanto o Howler (e qualquer outra bandinha nova do momento) não tem esse algo capaz de pedir por uma segunda chance. Não merecem uma reavaliação.

O LADO BOM DA SITUAÇÃO

Conclusão: escutei o disco do Howler, achei uma porcaria, deportei-o de volta à terra dos hermanos, e em seguida fui redescobrir o The Jesus and Mary Chain, uma banda que eu sempre gostei, mas não conhecia tão a fundo. Resultado: estou ouvindo os caras enquanto escrevo este texto. Cada vez mais buscando coisas no passado e não no presente. Não é questão de nostalgia. É falta de opção mesmo.

Pelo menos isso tem um lado bom, o do resgate (no caso do The Jesus and Mary Chain) e de correção de algumas injustiças. Cito o caso do AC/DC como exemplo. Que me desculpem os muitos fãs da banda, mas eu nunca fui muito com a cara deles. Sem nada de novo para ouvir enquanto trabalhava, por algum motivo resolvi lhes dar outra chance e dessa vez pegou. Estou curtindo bastante, e o som de Angus Young e companhia também anda em alta rotação aqui em casa.

Por essas e outras, talvez não devesse ficar tão bravo com o atual estado bunda-mole do novo Rock, e sim agradecê-lo por oferecer a oportunidade de me reapresentar ótimas bandas que talvez, de outra maneira, eu nunca fosse reavaliar. Então obrigado pela chance, mas seria pedir muito por uma bandinha nova legal de vez em quando ou isso já seria exigir demais? Enquanto a resposta não chega, The Jesus and Mary Chain vai estalando nas minhas caixas de som.

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