Lanterna Verde e os maiores êxitos de Geoff Johns

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No final do mês passado foi publicado por aqui a revista Lanterna Verde 20, que trazia não só o final do arco A Ira do Primeiro Lanterna, como também marcou a despedida do roteirista Geoff Johns da série e do personagem após nada menos que nove anos escrevendo suas histórias.

Nem preciso dizer que hoje em dia um roteirista passar tanto tempo assim numa mesma HQ de super-heróis é algo bem incomum, para não dizer raro. Assim de cabeça, eu só me lembro de outro caso similar, o de Brian Michael Bendis com o Homem-Aranha Ultimate, personagem que escreve há inacreditáveis 14 anos!

Por isso mesmo, não é nenhum exagero afirmar que sua despedida do Gladiador Esmeralda marca o fim de uma era. E que era! Se você acompanha o título, sabe exatamente do que estou falando. Johns revolucionou o personagem e, por isso, uma homenagem é mais que bem-vinda. Nesta matéria relembrarei seus principais marcos comandando o Lanterna Verde, fazendo uma retrospectiva de seus mais importantes êxitos nesses nove anos. Então coloque seu anel energético, recite o juramento da Tropa e vamos em frente:

ELE TROUXE HAL JORDAN DE VOLTA

Sua primeiríssima tarefa quando assumiu o personagem em 2005 já foi bem desafiadora: trazer Hal Jordan, o mais conhecido (e querido pelos fãs) dos Lanternas Verdes de volta da morte que vira e mexe assola os personagens de HQs. Na época, Jordan havia morrido na saga A Noite Final, e sua alma estava servindo de hospedeira para a entidade da vingança divina conhecida como Espectro.

Geoff Johns, que sempre teve notoriedade dentro da DC Comics por conseguir arrumar a casa de personagens bagunçados (seja por cronologias complicadas ou más decisões editoriais), arregaçou as mangas e fez o serviço de forma bem-feita na minissérie Renascimento. Não teve medo de sujar as mãos e até mesmo usar retcons (que sempre me deixam com um pé atrás) para trazer Jordan não só de volta à vida, mas à própria Tropa dos Lanternas Verdes, deixando-o pronto para estrelar seu próprio título mensal e dando o pontapé inicial em seus nove anos comandando suas aventuras.

TRANSFORMOU HAL JORDAN EM UM PERSONAGEM INTERESSANTE

Contudo, não bastava apenas trazer o personagem de volta. Se você clicou no link da resenha da minissérie, leu que minha opinião a respeito do personagem à época não era nada boa. E não mudaria uma linha do que escrevi ali. Para mim, Jordan era até então um personagem sem graça e unidimensional.

O escritor parece ter ouvido meus pensamentos, pois durante sua passagem pelo título, uma das melhores coisas que fez foi não só desenvolver bastante o personagem, finalmente transformando-o em alguém tridimensional, como ainda conseguiu a proeza de me fazer gostar dele. Sim, eu admito, hoje gosto tanto de Hal Jordan quanto de Kyle Rayner (o qual ainda é meu favorito, mesmo tendo perdido bastante espaço dentro das tramas do núcleo dos Lanternas). E isso é mérito unicamente do roteirista.

Seja nas primeiras histórias da revista mensal, onde mostrava um Jordan reintegrado à Tropa que ele mesmo havia destruído e tendo de lidar com a desconfiança e mesmo o ódio de seus colegas, seja no arco Origem Secreta, que mostrava os fatos que definiram seu caráter, finalmente foi possível compreender e até se relacionar com o que o move. Finalmente transformou-o num herói interessante e humano. Em suma, um personagem digno de ser lido todos os meses.

EXPANDIU SUA MITOLOGIA E O ELENCO DE PERSONAGENS

Talvez a característica dessa passagem que mais rapidamente salte aos olhos seja a expansão tanto da mitologia quanto da galeria de personagens. Johns, um autêntico nerd que conhece toda a história dos personagens que gosta e com os quais trabalha, pegou todos os melhores elementos da mitologia já estabelecida tanto da Tropa dos Lanternas Verdes quanto de Hal Jordan, e os retrabalhou, seja modernizando-os, seja interconectando-os. E sem forçar a barra, deixando tudo orgânico e natural, o que é ainda mais impressionante.

E tudo isso criando e acrescentando também seus próprios elementos inéditos. O resultado é uma mitologia coesa e plenamente compreensível tanto para o leitor de longa data quanto para o neófito que acabou de comprar seu primeiro título.

Já em se tratando de personagens, o resultado de sua passagem é ainda mais visível. Utilizando-se do conceito do espectro emocional, cuja própria luz verde da força de vontade é o que abastece os anéis energéticos da Tropa dos Lanternas Verdes, Johns criou outras facções de diferentes cores, cada uma representando uma emoção universal. Assim surgiram os Lanternas Vermelhos (ira), Azuis (esperança), a Tribo Índigo (compaixão), a Tropa Sinestro (medo), o Agente Laranja (cobiça) e as Safiras-Estrelas (as quais eram as únicas que já existiam, mas foram integradas a este novo conceito, representando o amor). Criou também os Lanternas Negros e Brancos, simbolizando, respectivamente, morte e vida. E, mais recentemente, criou também Simon Baz, um novo Lanterna terráqueo, de ascendência islâmica, contribuindo para a maior diversidade racial que as editoras de HQs almejam já há algum tempo.

São tramas e personagens que podem ser retomados e reutilizados de várias maneiras possíveis, deixando muitas possibilidades para os roteiristas que vierem depois. Um legado considerável.

SINESTRO VIROU UM DOS MELHORES VILÕES DA DC

Sinestro sempre foi o principal arquiinimigo de Hal Jordan, mas antes da chegada de Geoff Johns, era apenas um alienígena de pele roxa (às vezes perigosamente próxima do rosa) e bigodinho latin lover, um visual bastante risível, sem dúvida. Após a passagem de Johns, no entanto, você pensará duas vezes antes de dar risada da cara dele.

O roteirista dedicou um tempo considerável de sua passagem a Sinestro – aquele que já foi considerado o maior Lanterna da Tropa, até que os Guardiões descobriram que ele mantinha a ordem em seu setor espacial através de uma ditadura e o expulsaram da corporação – transformando-o num sujeito verdadeiramente perigoso, temível, imprevisível e… nobre. Pois Sinestro agora é um daqueles vilões que não são maus. Na verdade, seus ideais são bastante louváveis, são os métodos que emprega para atingi-los (medo e totalitarismo) que são equivocados.

Johns reforçou essas características, bem como a soberba e excesso de confiança do personagem e também desenvolveu bem a relação de rivalidade e admiração mútua entre ele e Jordan (que roubou seu título de maior dos Lanternas Verdes), tornando este um dos pontos mais interessantes em muitas das histórias. A última coisa que diz a Jordan em Lanterna Verde 20, quando este lhe pergunta se algum dia eles foram amigos, chega a ser emocionante.

Sinestro ficou tão popular e badass que, não à toa, a partir dos Novos 52 foi ele a verdadeira estrela da revista, quando foi reintegrado à Tropa dos Lanternas Verdes numa decisão controversa dos Guardiões do Universo. E também possui um papel de destaque em Forever Evil, a primeira megassaga da editora pós-reboot, que está sendo publicada lá nos EUA, e deve chegar em breve por aqui.

A GUERRA DOS ANÉIS

Lembro-me de ter lido muitos anos atrás (se não me falha a memória, numa revista Wizmania) uma entrevista do Geoff Johns onde ele dizia que tinha planejado três grandes eventos para o Lanterna. O primeiro foi o próprio retorno de Hal Jordan em Renascimento.

O segundo foi a primeira grande saga envolvendo os títulos da linha LV, que aqui no Brasil foi chamado de A Guerra dos Anéis (Sinestro Corps War no original), evento que deu a largada no primeiro título nacional e exclusivo do personagem em Dimensão DC: Lanterna Verde 1 (de setembro de 2008). E até hoje é o meu arco favorito da passagem do escritor.

Basicamente, Sinestro cria sua própria tropa (a qual leva seu nome, porque vaidade é isso aí), que porta anéis amarelos do medo, e parte com tudo contra a Tropa dos Lanternas Verdes, em vingança contra sua expulsão da mesma e por ele achar que os Guardiões são muito autoindulgentes e não fazem um bom trabalho protegendo o universo.

É uma saga cheia de ação, drama e suspense, com a presença (e desenvolvimento) de todos os Lanternas humanos e outros coadjuvantes alienígenas populares (como Kilowog), numa história épica que me lembrou muito, mas muito mesmo, os melhores momentos de Star Wars. O que só me faz pensar como um filme baseado nesse arco (desde que feito direito) poderia ser fantástico. Mas o fracasso da porcaria do longa-metragem que deveria começar a franquia no cinema, acabou por deixar essa possibilidade mais distante. Pena.

A NOITE MAIS DENSA

Este aqui é o terceiro evento que ele havia planejado. E envolvia não só uma grande sacada, como também uma mudança de escala. A sacada foi justamente em cima das constantes mortes e ressurreições de personagens de HQs, sendo que ele próprio trouxe Hal Jordan de volta (e posteriormente também ressuscitaria Barry Allen, o Flash da Era de Prata). E aproveitou-se também da popularização dos zumbis na cultura pop.

Usando como ponto de partida um vilão até então pé de chinelo do Lanterna, o Mão Negra (para o qual Geoff conseguiu conferir muito mais dignidade do que jamais havia tido), Johns criou uma entidade chamada Nekron, quase uma encarnação da morte. Ele comanda a Tropa dos Lanternas Negros, e seus anéis energéticos ressuscitam os mortos como zumbis superpoderosos e indestrutíveis a serviço dele. Basicamente todos os personagens da editora que estavam mortos à época levantaram de suas sepulturas como Lanternas Negros, com o objetivo de exterminar a vida em todo o universo. Foi um dos maiores desafios já enfrentados pela Tropa dos Lanternas Verdes.

Desafio tão grande, aliás, que ela não deu conta sozinha e precisou convocar a ajuda de todos os super-humanos disponíveis. Este foi o megaevento da DC na virada de 2009 para 2010 (no Brasil, foi publicado entre 2010 e 2011), envolvendo todos os personagens da editora e não mais ficando restrito apenas ao núcleo do Lanterna Verde como em A Guerra dos Anéis.

Contudo, devo dizer que acho a ideia melhor do que a execução. Não gostei tanto do evento, o qual achei mal desenvolvido, desnecessariamente longo e não tão épico quanto se fazia acreditar que seria. Ainda assim, por ser um megaevento envolvendo todo o cast de personagens da editora, mas ainda totalmente centrado no Lanterna Verde, algo até então inédito, é um dos marcos mais importantes e lembrados da era Johns.

TRANSFORMOU O LANTERNA EM UM DOS PERSONAGENS MAIS POPULARES DA EDITORA

Você já viu os indícios nos tópicos anteriores, mas vale o reforço: nunca o personagem e seu núcleo foi tão popular. Claro, ele teve várias fases lembradas e elogiadas (como a lendária parceria com o Arqueiro Verde nos anos 70 e Crepúsculo Esmeralda, por exemplo), e apesar de ser um dos sete grandes personagens da editora (ao lado de Superman, Batman, Mulher-Maravilha, Flash, Aquaman e Caçador de Marte) nunca foi exatamente um dos mais populares. Na fase Johns, angariou inúmeros elogios, conquistando crítica e público.

A linha Lanterna Verde, que então contava com dois títulos, Green Lantern (Lanterna Verde, a revista de Johns) e Green Lantern Corps (Tropa dos Lanternas Verdes) ganhou mais revistas: Green Lantern: Emerald Warriors (Lanterna Verde: Guerreiros Esmeralda, cancelada quando houve o reboot dos Novos 52), Green Lantern: New Guardians (Lanterna Verde: Novos Guardiões) e Red Lanterns (Lanternas Vermelhos) e seus títulos passaram a figurar entre os mais vendidos da editora.

Diabos, como disse no tópico acima, todo um megaevento foi planejado com a mitologia do personagem como ponto de partida. Quer mais prova de popularidade do que isso? Então tá: foi durante a era Johns que finalmente decidiram fazer o filme do personagem. Sua qualidade é outro assunto, mas é fato que aquele era o momento certo (com o personagem bem mais conhecido do grande público) para se produzi-lo.

SOBREVIVEU ILESO AOS NOVOS 52

Talvez a prova definitiva e coroação do trabalho do escritor seja justamente o tratado neste tópico. Para quem não sabe que diabos é esse tal de Novos 52, vale uma rápida explicação: em 2011 (2012 por aqui) a DC resolveu apertar o grande botão de reset, apagando toda sua cronologia e recomeçando seu universo do zero. Novas origens, personagens modernizados e todos os novos 52 títulos de sua linha começando do número um e com um novo arco.

Só foram abertas duas exceções, justamente para os personagens que mais vendiam e eram os mais populares antes do reboot: Batman e Lanterna Verde. Os títulos do Batman puderam manter toda sua cronologia anterior (embora agora deva-se considerar que tudo que ele viveu até o momento aconteceu em apenas cinco anos), mas todos começaram os Novos 52 com novos arcos de história.

O Lanterna Verde também pôde manter sua cronologia original (também condensada em cinco anos), mas diferente do Batimão, o título Green Lantern, o de Geoff Johns, não abriu a nova edição número 1 com uma história zero bala. Muito pelo contrário, ela continuou exatamente do ponto onde havia parado antes do reboot, como se nenhuma reformulação houvesse sido feita. Eis aí uma prova inconteste do prestígio do personagem pelas mãos do roteirista.

CONCLUSÃO

Bem, esses foram alguns dos principais e mais marcantes momentos de sua passagem pelo personagem. O futuro é uma incógnita. É difícil acreditar que alguém vá voltar a fazer um trabalho tão bem-sucedido com o herói, mas é possível. Afinal, tudo que Johns trouxe de bom permanece. Todos os elementos que alçaram o personagem a outro nível continuam lá, só esperando para serem utilizados por quem o suceder. Basta saber como. E se você acompanha o personagem e achou que faltou algum momento especial dele nesta matéria, o espaço de comentários é todo seu.

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