Hugo Mariutti – A Blank Sheet of Paper

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Ouvir disco solo de guitarrista costuma ser uma experiência bastante previsível. Sejam músicos nacionais ou internacionais, famosos ou não, o fato é que a grande maioria deles, ao fazer um álbum solo, segue um tradicional esquema: fazer músicas instrumentais, com longos e intrincados solos de guitarra que parecem ser feitos mais para serem ouvidos por guitarristas do que pelo público em geral.

Porém, como toda regra tem suas exceções, é óbvio que alguns discos saem do lugar comum e possuem características bastante distintas. Álbuns como o Book Of Shadows do Zakk Wylde ou o Brainworms I do Rafael Bittencourt (guitarrista do Angra) fogem desse padrão e são ótimos trabalhos. Muito disso se deve ao fato de estes discos mostrarem facetas musicais diferentes das que os seus fãs estão acostumados. Porém, devo confessar que fazia tempo que eu não via um trabalho solo tão surpreendente quanto A Blank Sheet of Paper.

THE OPPOSITE SIDE OF MIGHT

Hugo Mariutti é bastante conhecido pelos seus trabalhos no Shaman e no Andre Matos, mas no seu disco solo ele traz algo completamente diferente. Aqui você vai encontrar baterias eletrônicas, vocais bastante intimistas e muita influência do rock inglês (como disse o guitarrista em sua entrevista exclusiva para o DELFOS), mas nada de metal. Aliás, para não falar que não tem nada, tem alguns segundos de um solo um pouco mais técnico na faixa título, mas é tão ínfimo que nem faz diferença.

E isso nos traz a um ponto importante desta resenha: o que você vai ler aqui é a opinião de um fã de metal que não conhece nada do que este disco apresenta. Com essas tantas influências de música eletrônica e rock inglês, talvez as melhores pessoas para resenharem este disco fossem a Joanna, o Allan ou o Cyrino. Porém, assim como a Joanna já resenhou um disco de metal, por que eu não poderia resenhar o disco do Hugo? Opiniões diferentes são sempre interessantes, não é mesmo? Pois vamos ao faixa-a-faixa.

AFTER THE RAIN COMES THE SUN

O disco começa com a faixa-título, e é interessante como as primeiras notas dessa música já dão a sensação instigante que vai permear o álbum inteiro. A introdução da música soa extremamente experimental, e ainda hoje, após muitas ouvidas, sinto alguma estranheza ao ouvi-la. Mesmo assim, a faixa é muito consistente, e quando a introdução passa e ela chega à sua segunda parte mostra de fato a que veio. Repleta de texturas, é uma das melhores músicas do disco, sem dúvida.

As faixas seguintes, Breakdown e The Opposite Side of Might, são bastante intimistas e também com muitas texturas. A imersão que essas faixas causam me lembrou bastante das músicas do Pink Floyd – não porque pareçam com as músicas da banda, mas porque trazem tantas sensações quanto elas. São bastante experimentais, e talvez por isso difíceis de assimilar, mas ainda assim são ótimas faixas.

Erase Me é um caso à parte. Ela seria uma balada normal se não fosse pela batida eletrônica ao fundo, acompanhando a voz e o piano. Essa singularidade dá uma pegada bastante diferente na música e torna ela ainda mais interessante do que seria normalmente. Os vocais de Hugo Mariutti, que cantou neste disco, também merecem destaque, pois funcionam muito bem. A julgar pelo fato de seu ofício ser a guitarra e não o canto, Hugo tem uma performance surpreendente.

A seguir vem Thanks For Your Existence, que é dedicada ao filho do guitarrista. Esta música é bastante diferente das baladas que normalmente os músicos fazem para filhos, mas também funciona muito bem. Infelizmente ela é bem curta (menos de três minutos) e deixa a sensação de que poderia ter ficado ainda melhor, mas mesmo assim é uma ótima música.

WHAT ELSE CAN I SAY?

Depois vem Save My Brain, que é a música mais “normal” do disco – e talvez por isso escolhida como um dos singles. Nela, Hugo tem uma de suas melhores performances vocais em todo o álbum e a animação que permeia a faixa é contagiante. Vale a pena conferir.

Dummy também traz o clima de imersão das outras músicas, porém não soa tão interessante. Já Out, a faixa seguinte, tem tantas sonoridades diferentes e tantas nuances quase ao mesmo tempo que também a colocam em destaque, sendo uma faixa bastante progressiva.

E o disco se encerra com Here Now, que é a que melhor representa o disco como um todo. Com um inicio melancólico, a faixa cresce de uma forma muito peculiar e atinge seu auge de forma grandiosa. Com muitas texturas e muitos detalhes, é sem dúvida a melhor faixa do álbum.

DON’T TURN AWAY

A Blank Sheet of Paper é surpreendente do início ao fim e completamente inesperado, o que é muito bom. Se você gosta do guitarrista, vale a pena ouvir o disco e descobrir este lado diferente. E se você não gosta, talvez esta seja a chance de se tornar fã do músico.

CURIOSIDADES

– O disco teve sua produção financiada pelos fãs através do site Catarse, onde eles pagam valores pré-determinados e assim podem adquirir o CD em primeira mão, além de contribuírem diretamente para a produção do trabalho. Isso permitiu que o álbum fosse mixado no famoso Estúdio Abbey Road.

– A imagem que ilustra a chamada desta resenha foi feita pelo filho de Hugo e se encontra no encarte do CD e também nas palhetas produzidas pelo músico com o tema do álbum.