O delfonauta dedicado sabe que eu não curto cinebiografias. Mesmo quando o artista é alguém muito importante para a minha vida, como o Queen em Bohemian Rhapsody, não é meu tipo de filme. Porém, esta crítica Elvis terá um gostinho especial. Embora eu não seja nenhum grande conhecedor do cantor, ele era o ídolo da minha mãe. E ela me contou muitas das histórias presentes no filme – e até me levou pessoalmente para Graceland (um passeio claramente mais focado nela do que em mim). Então o que eu achei da biografia do rei do rock Elvis Presley? Bem…

DEDICADO À MINHA MÃE

Uma coisa que acho que torna o DELFOS especial, pelo menos para mim, é a pessoalidade que damos aos textos. E, por isso, eu nem vou tentar esconder aqui as sensações que tive durante a projeção. Sensações estas que eu mesmo não esperava ter. Sim, eu sabia que o filme me faria lembrar com saudades da minha mãe (que morreu alguns meses antes de eu criar o DELFOS). Mas não esperava que me tocasse tanto.

Eu passei a sessão inteira lembrando da minha querida progenitora. De conversas, de passeios, de ouvir as músicas com ela. E, claro, de histórias pessoais, formas que o Elvis afetou a vida dela indiretamente… Isso fez com que Elvis conseguisse o que nenhuma cinebiografia conseguiu antes: me emocionou.

CRÍTICA ELVIS

Elvis é uma cinebiografia bem completa. Ao contrário de filmes como o próprio Bohemian Rhapsody, que preferem terminar na metade, em um momento inspirador, aqui toda a carreira do Elvis Presley é apresentada. Tudo através dos olhares interesseiros do seu empresário (Tom Hanks), que narra a história.

O filme começa quando o empresário, chamado de “Coronel”, ouve uma gravação do Elvis pela primeira vez. Ele logo vê potencial naquele galã branco, que canta e dança como os negros. É a oportunidade que ele estava procurando, de vender entretenimento que faça as pessoas se sentirem como não sabem se deveriam se sentir. No caso, a sociedade “de bem” da época, predominantemente careta e branca, veria pela primeira vez o efeito sexual do rock. A cena do primeiro show, em que as mulheres parecem não conseguir evitar soltar uns gritos diante dos rebolados do galã é bem sintomática disso.

CRÍTICA ELVIS: UMA VIDA, MUITAS HISTÓRIAS

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As moças vão à loucura.

E é curioso o quanto a vida real de Presley de fato parece uma produção artística. Filmes como o Bohemian Rhapsody mostram o sucesso, problema e a reviravolta. Um arco dramático bem básico, bem roteiro 101 (e isso é um dos motivos que me fazem desgostar de cinebiografias). Mas aqui muita coisa acontece. A ponto de que parecem várias histórias mesmo.

A coisa começa com a sensualidade do cantor, derivada de suas influências de música negra, criando problemas legais. Para lidar com isso, ele recebe a opção de ir para a cadeia ou para o exército. Aí tem os filmes que ele fez, o casamento com a Priscilla Presley (que marcou minha vida como o par romântico do Leslie Nielsen em Corra que a Polícia Vem Aí). Eventualmente, a temporada em Las Vegas com uma superprodução de palco, mas considerada por muitos como o fim de sua carreira. Eu já conhecia todas essas histórias de conversas com minha mãe, mas o filme se diferencia das minhas histórias de infância ao colocar tudo em ordem cronológica e fácil de digerir.

Não está tudo aqui. Em especial, embora o romance com Priscilla seja importantíssimo no filme, em nenhum momento ele aborda o fato de que eles começaram a namorar quando ela era menor de idade. Ainda assim, tanta coisa acontece que eu me surpreendi ao constatar que o Elvis morreu com apenas 42 anos. Eu sinceramente achava que ele tinha ficado muito mais velho. Se bem que, quando ouvia essas histórias, 40 anos para mim provavelmente era a idade do Merlin ou de outros velhinhos da ficção.

AUSTIN BUTLER CANTOU AS MÚSICAS DA CINEBIOGRAFIA ELVIS?

Ajuda o fato de o filme trazer uma enorme quantidade de músicas famosas e muito legais. Eu posso nunca ter comprado um álbum do Elvis Presley para mim mesmo, mas conheço e gosto de muitas das canções presentes aqui.

Respondendo a pergunta do intertítulo, a resposta é “mais ou menos“. As canções mais antigas, cujas gravações estavam mais deterioradas, foram totalmente regravadas pelo ator Austin Butler. As mais recentes aparecem como uma mistura da voz do ator com a original do cantor. Aliás, apesar de galã, achei que Austin Butler está aqui mais parecido com o John Travolta do que com o Elvis Presley propriamente dito.

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Não acha?

FOME DE PODER

Por ser contado através do ponto de vista do empresário, Elvis lembra bastante aquele filme sobre o McDonald’s, Fome de Poder. É aquela história… Elvis tinha o talento, a sensualidade e a aparência para fazer sucesso. Mas será que teria alcançado tamanho estrelato e importância para a cultura pop mundial se não fosse seu empresário?

Não que o “Coronel” seja romantizado. Muito pelo contrário, aliás. Acredito que é a primeira vez que vejo o Tom Hanks fazendo um vilão. Mas as contribuições do cara para faturar em cima do talento são claras. E isso mesmo ele sendo apresentado como o responsável por alguns dos momentos mais questionáveis da carreira do cantor.

Inclusive, quando Presley passa a questionar e se rebelar contra seu empresário, a coisa fica até meio estranha. Afinal, tudo parece acontecer em um especial de natal que é um daqueles enormes espetáculos, com dezenas de músicos e dançarinos, mas que o empresário parece só tomar conhecimento das músicas e coreografias no dia da gravação. Racionalmente, não faz sentido, já que esse tipo de show precisa de semanas ou meses de ensaio. Mas, ei, deve ser licença poética. Afinal, a reação dramática dele fica melhor dessa forma.

A CINEBIOGRAFIA ELVIS

Como filme, a obra também me agradou muito. A direção de Baz Luhrmann é precisa e estilosa. Há vários quadros, cortes e angulações realmente muito bonitos. Imagino que Elvis vai levar, no mínimo, alguns prêmios técnicos no Oscar.

Como história… sim, acontece bastante coisa, mas o filme é bem longo também, então não é corrido. E no final das contas, o que temos aqui continua sendo um arco dramático básico. Ou melhor, alguns arcos dramáticos básicos seguidos.

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Porém, o filme acabou me marcando mais mesmo pela saudade que sinto da minha mãe, e do quanto me lembrou dela. Para mim, assistir a Elvis foi como se alguém fizesse uma versão live-action em alto orçamento de histórias que minha mãe contava. E isso fez com que o filme falasse comigo de forma sentimental, batendo forte na tecla da saudade de uma pessoa querida que se foi cedo demais.

Então permita-me terminar este texto com uma pequena mensagem: dedico esta crítica à minha querida mãe, Ana Maria, a quem devo muito do que sou hoje. Provavelmente se o Elvis não fosse tão importante na sua vida, o rock não seria na minha. Entre muitas outras coisas. Você esteve poucos anos comigo nesta vida, mas estará para sempre no meu coração.