Neste ano, a Capcom decidiu lançar versões remasterizadas dos jogos de Resident Evil e de Dead Rising para aproveitar o interesse natural que quem gosta de videogame tem por Dead Rising 4 e Resident Evil 7, que serão lançados nos próximos meses. Ambos prometem trazer novas abordagens e quebrar regras clássicas das franquias, então, revisitar os jogos antigos e acompanhar a evolução de cada série em versões remasterizadas é uma ideia que mexe com a nostalgia dos fãs do genocídio de zumbis.
A experiência com Dead Rising Pacote Triplo, que reúne o primeiro e o segundo jogos, mais o spin-off Dead Rising 2: Off the Record, foi bastante curiosa para mim. Nunca havia jogado sequer um único Dead Rising, não por falta de interesse, mas por azar mesmo. Dez anos atrás, eu não tinha dinheiro para comprar um console e jogar o primeiro (que só saiu agora para o PC, nesta versão remasterizada), e quando veio o Dead Rising 2, novamente, estava duro, na faculdade, sem tempo algum para jogos.
Com esta resenha, delfonauta, analisarei os aspectos técnicos deste relançamento, mas também o quanto os jogos se sustentam hoje em dia; se envelheceram muito ou não. Após quase 30 horas de matanças sádicas, inclusive de NPCs imbecis, tenho diversas considerações sobre cada um dos três jogos em suas versões remasterizadas.
DEAD RISING
No primeiro jogo, o protagonista é Frank West, um fotojornalista que chega à cidade de Willamette para cobrir algum acontecimento do qual uma fonte o informou. Depois de fotografar o caos da cidade pelo helicóptero e chegar ao shopping, onde a maioria das pessoas está reunida, ele descobre que não se trata de manifestações ou cidadãos malucos, mas sim do próprio Dia Z! Frank, como todo ótimo repórter, quer descobrir o que aconteceu e precisa sobreviver, resgatar sobreviventes e estar no heliporto ao final do terceiro dia, quando o helicóptero irá buscá-lo.
Dead Rising é todo construído a partir da necessidade de correr contra o tempo e ser multitarefas. Há apenas 72 horas para realizar todas as missões e cada hora no jogo corresponde a cinco minutos do tempo real. Conforme você cumpre os objetivos principais, novas missões de história (chamadas em Dead Rising de cases) são habilitadas. Porém, a caminho delas, o segurança Otis sempre avisa que alguém está em perigo ou alguma coisa estranha está acontecendo em um canto do shopping.
A versão original do jogo possuía um único slot de salvamento, o que deve ter garantido uma das experiências mais brutais dos videogames. Se você salvasse sem tempo necessário para completar uma missão da história, não haveria jeito, você perderia e seria obrigado a reiniciar o jogo desde o começo (!). A sacada é que o seu nível, suas habilidades e pontos de experiência permaneceriam (basicamente, um new game plus por fracassar).
O jogo remasterizado não é tão cruel assim. Ainda há a mesma mecânica de reiniciar com o progresso de seu personagem caso perca, porém, com cinco slots de salvamento, não é necessário recomeçar desde o começo e é possível, sim, remanejar o tempo e refazer as missões de um jeito mais rápido, considerando que você se lembre de sempre salvar o jogo nos banheiros. Sim, delfonauta, autosaves não eram a norma em 2006 e não foram adicionados nesta versão. A boa notícia é que os loadings, pelo menos, são bastante rápidos, apesar de frequentes.
A mudança mais perceptível é a dos gráficos e do desempenho. Mais antigo dos três jogos, Dead Rising, em resolução de 1080p e a 60 fps, padrão do pacote, é o que mais teve benesses por ser remasterizado. O jogo carrega muitas centenas de zumbis ao mesmo tempo e é possível vê-los a grandes distâncias, o ambiente interno das lojas pode ser visto dos corredores do shopping, todas características que não estavam presentes na versão original. No entanto, não é perfeito: é possível perceber alguns zumbis sendo carregados conforme você anda e as texturas originais não foram trocadas por outras de padrão de qualidade atual. Os modelos dos personagens tampouco receberam melhorias. Quedas de framerates são incomuns, mas bugs ainda ocorrem, especialmente com os NPCs, que são bastante idiotas. Odeio esses caras.
Com exceção dos slots e dos gráficos, não há outras melhoriassignificativas, ou seja, a experiência é basicamente a mesma de 2006. Isso realmente é um problema, pois muitas características do jogo não são apenas ultrapassadas, como também negativas para a própria proposta oferecida por Dead Rising. A interface do jogo e as suas regras ainda são complicadas de entender, o tempo para realizar as atividades é extremamente limitado, especialmente se você não souber o que fazer. Armas de fogo e a câmera são controlados por direcionais diferentes, o que cria uma baita confusão a todo momento. São vários probleminhas de game design que deixam nítida a impressão de que se trata de um jogo de dez anos.
O curioso é que os principais defeitos do original foram corrigidos em Dead Rising 2 e são coisas que poderiam (e deveriam) ter sido trazidas ao jogo original para este relançamento, da mesma forma que outros remasterizados e coletâneas já fizeram (por exemplo, Uncharted: The Nathan Drake Collection e The Legend of Zelda: Wind Waker HD).
DEAD RISING 2
Em Dead Rising 2, seu personagem é Chuck Greene, um pai de família que sobreviveu a um outbreak da cidade de Las Vegas, após o primeiro jogo, mas não sem perder a esposa. Sua filha Katey foi mordida pela própria mãe e sobreviveu graças ao caro medicamento Zombrex. A cada 24 horas, ele precisa aplicá-lo nela para impedir que a menina se torne um zumbi. Apesar da contextualização mais genérica (homem branco que perdeu a família), os personagens e a localização (Fortune City) são tão interessantes quanto as do primeiro.
O tratamento que Dead Rising 2 recebeu para este relançamento é bem menos evidente do que para Dead Rising. Embora os gráficos estejam melhores, eles fazem menos diferença para o segundo jogo, de 2010. Fora isso, é bem provável que você encontre problemas graves de quedas de framerate, pelo menos na versão do Xbox One, embora você encontre gente por aí que sofreu da mesma coisa com a versão para PS4 e PC. Isso é muito estranho, pois não parece ser um erro relacionado a uma seção ou área do jogo.
As quedas de framerate duram longos períodos e dão a impressão de que o personagem está constantemente travando enquanto anda. Normalmente, encontrei esses problemas quando salvava dois sobreviventes ou mais, ou logo após cutscenes. Eles eram frequentes, apesar de aleatórios. Sair do jogo e reiniciá-lo trazia os mesmos problemas, que só eram resolvidos após desligar e ligar o console de novo.
Mesmo assim, foi mais prazeroso jogar Dead Rising 2, porque ele é um jogo absolutamente melhor do que o primeiro. Desenvolvido pela Blue Castle Games, a segunda empreitada contra os zumbis corrige os inúmeros defeitos de Dead Rising, sem abandonar as coisas que o tornavam especial.
As melhorias notáveis de Dead Rising 2 em relação a Dead Rising são várias. É possível atirar enquanto anda, o que torna isso uma opção viável para abrir caminho pelos zumbis e vencer alguns psicopatas. Há mais conveniências que tornam o jogo mais equilibrado: quando há novas missões, você recebe uma mensagem, e não é obrigado a atender ao telefone, sem poder pular ou atacar, como em Dead Rising. O mapa e o tempo restante das missões são mais simples de entender também e, a melhor de todas, é possível pular diálogos com NPCs! De novo, todas essas evoluções poderiam ter sido aplicadas na versão remasterizada de Dead Rising.
A curva de dificuldade é melhor também. Com pouco tempo de jogo, o primeiro jogo já jogava psicopatas e inimigos ridiculamente overpowered, como aqueles três babacas em cima de um jipe na área do parque. Os psicopatas do segundo são mais claramente puzzles, que exigem uma determinada estratégia para serem vencidos (e o jogador não é punido caso se atenha a esse jeito certo de vencê-los). É só perceber, por exemplo, como é arbitrário que alguns deles sofrem muito dano com armas de fogo, e outros não (essa é a dica para enfrentá-los de longe ou no combate corpo a corpo).
Ao mesmo tempo, o que era excelente no primeiro volta no segundo. A história e o mundo da série Dead Rising são fantásticos. O humor negro, a clara influência de George A. Romero, a violência exagerada, a sexualidade e os personagens estereotipados combinam para criar um jogo irreverente, politicamente incorreto, mas que manda a mensagem certa: uma parte considerável da humanidade é podre. Não à toa, os piores inimigos são os humanos, completamente malucos.
O mapa de Dead Rising 2 também faz mais sentido. Como é necessário voltar à safe house constantemente, seja por resgatar sobreviventes ou para entregar o medicamento a Katey, as localizações são mais próximas e é fácil cortar caminhos pelo complexo de lojas e cassinos.
Dead Rising 2 é um jogo divertido e interessante, porém, há um aspecto dele que envelheceu bastante. A história tem uma péssima virada no final. Além de ser incompatível com tudo que fora feito, ela muda o tom das últimas três horas de jogo drasticamente, que fica sério e pesado. O equilíbrio entre o humor nonsense e a seriedade é deixado de lado, mas o pior mesmo é como essa virada é tão mal-executada, com técnicas de roteiro que são criticadas há muito tempo. Como a história é uma parte importante da experiência da série Dead Rising, a falta de qualidade no encerramento deixa uma má impressão e enfraquece bastante a obra, e o final de Dead Rising 2 diminui bastante a minha vontade de voltar a jogá-lo.
DEAD RISING 2: OFF THE RECORD
Lançado em 2011, Dead Rising 2: Off the Record é uma versão de Dead Rising 2 com o protagonista do primeiro, Frank West, no papel principal, e basta dizer que tudo a respeito de Dead Rising 2 vale para Off the Record. É, basicamente, o mesmo jogo, e os problemas de framerate da versão remasterizada reaparecem e incomodam em proporções iguais. Os gráficos têm o mesmo nível de Dead Rising 2, mas as cores são um pouco diferentes. Com Frank West, há um tom avermelhado no shopping e cores mais contrastantes.
Off the Record é o único dos três jogos que tem checkpoints, e as comodidades do menu, mapa, entre outras, são as melhores do pacote. Com isso, quero dizer que elas também poderiam ter sido aplicadas no mínimo a Dead Rising 2, que roda na mesma engine.
A principal adição a Off the Record é que, como o protagonista é Frank West, a mecânica de tirar fotos do primeiro jogo retorna. Registrar a experiência em Off the Record é ainda melhor do que no primeiro. A ideia de fotografia é tão boa que renderia até um jogo próprio. Imagine um spin-off de Dead Rising com o objetivo de apenas fazer fotos, sem combate, como um Pokémon Snap. O jogador poderia escolher entre salvar sobreviventes ou deixá-los morrer para tirar a melhor pose. Seria um jogo com grandes possibilidades.
CONTEÚDO ADICIONAL
O delfonauta deve ter percebido que não mencionei até agora o conteúdo novo destes relançamentos. O motivo é que não há muitos deles. Cada jogo traz novas opções de roupinhas para selecionar em cada safe house e, bem, é apenas isso. O pacote não vem com as expansões Case Zero e Case West, ambos de Dead Rising 2, não há nenhum tipo de bônus, vídeos e artes conceituais, ou algo assim. Os jogos são versões remasterizadas, e nada mais do que isso. Felizmente, todas as funções online do segundo jogo e de Off the Record voltam e estão funcionando normalmente.
EXPLORAR VS TEMPO REAL
O que é tão interessante na jogabilidade de Dead Rising e Dead Rising 2 é que os zumbis são empecilhos permanentes que lhe retardam e, para se livrar deles, você precisa utilizar qualquer arma que encontrar. Com o tempo real e diversas missões para cumprir, isso gera pânico e, mais importante, improviso. A sensação ao resgatar um sobrevivente ou matar uma horda de zumbis com pouca vida, para mim, é muito semelhante a vencer um chefe da série Dark Souls.
As outras qualidades da série Dead Rising, como as ótimas cutscenes, que até ensinam como jogar, são outro motivo para se interessar pelos jogos ou jogá-los novamente. É só uma pena, então, que a Capcom não realizou mais melhorias, que não tirariam a dificuldade dos jogos, mas tornariam a experiência menos frustrante e acessível a novos jogadores. Estas estão longes de serem versões definitivas de Dead Rising, Dead Rising 2 e Off the Record, mas ainda assim, são ótimas, e valem se você gostar da experiência ou quiser conhecer uma excelente franquia dos games.
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