Helloween

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O Helloween é uma banda bem especial para mim. Se o Van Halen é a banda que me trouxe para o Rock, podemos dizer que o Helloween é a banda que me trouxe para o Metal. Infelizmente, assim como o Iron Maiden, os shows da banda alemã sofrem por uma irracional recusa em tocar o que o público quer ouvir, ou seja, as músicas das duas maravilhosas primeiras partes do Keeper of the Seven Keys. Contudo, dessa vez, os caras viriam para nossas terras na turnê da terceira parte do clássico sagrado. Isso poderia significar mais músicas daquela época? Da última vez que passou por aqui, Weikath e companhia surpreenderam os brasileiros ao incluir a longa Keeper of the Seven Keys inteira no setlist. O que os alemães poderiam estar preparando de novo dessa vez? Infelizmente, muito pouca coisa, o que é até estranho, considerando que um DVD seria gravado nessa data.

Com cerca de 20 minutos de atraso, as luzes se apagam e começa a tocar For Those About to Rock. Sim, AC/DC. Um tanto estranho e, por melhor que seja essa composição, tocar uma música de outra banda na íntegra como introdução é um pouco chato. O bom é que como a introdução era longa, os fotógrafos tiveram bastante tempo para se ajeitar no chiqueirinho. Por causa da gravação do DVD, havia ali um trilho para que a câmera transitasse livremente de um lado para o outro, obrigando o pessoal a ficar ou no canto esquerdo ou no direito por razões de segurança (ou seja, para evitar ser atropelado pela câmera). Estranho, já que nos outros shows gravados que cobri, nunca vi isso, mas imagino que tudo depende da forma escolhida para se registrar o evento.

No final da intro, a cortina se abre, revelando um belíssimo palco, com um pano de fundo muito bonito e diversas outras decorações. É então que aparece no palco o próprio Guardião das Sete Chaves, carregando um livro, possivelmente com dicas de como utilizar a Santa Granada de Mão. Infelizmente, para quebrar o clima, o Guardião estava usando tênis. Começa então a narração que abre a melhor música do Helloween em muito, MUITO tempo, King for a 1000 Years. Pena que com a gritaria do pessoal, mal deu para ouvir a voz do Guardião. Quando chega ao início da música propriamente dita, Sascha (que não é a filha da Xuxa), Dani e Andi sobem ao palco para a parte lenta. Quando ela fica pesada, os integrantes remanescentes, Markus e Weiki entram e aí sim começa o show propriamente dito.

Com uma abertura dessas, admito que fiquei bem animado para ver o que mais aconteceria. Infelizmente, o resto do show foi sem demais apetrechos visuais. Aliás, faz bastante tempo que não vejo nenhuma banda utilizar fogos e coisas do tipo nos shows. Por que será? Bom, a música agitou bastante o público enquanto os fotógrafos tentavam se desdobrar para fazer o melhor possível dadas as limitações de espaço e movimentação. Enquanto eu fotografava, um cara da primeira fila pediu para eu tirar uma foto para ele. Ok, tirei, afinal, não custa nada. E depois o cara pediu de novo, e de novo, e de novo, até que tive que virar para o dito cujo e dizer: “amigão, preciso trabalhar”. É incrível a falta de semancol desse povo. 🙂

Segundo a assessoria, poderíamos fotografar as três primeiras músicas, como é normal em shows. Quando estávamos no chiqueirinho, um dos seguranças avisou todo mundo que seriam só duas. Ok, considerando que a King for a 1000 Years é longa, isso não seria um problema. Porém, assim que esta acabou, os seguranças começaram a nos expulsar dali. Quando estava saindo, um cara (outro fotógrafo) estava parado na minha frente. Como a maior parte do espaço estava ocupado pelo trilho da câmera, não teria como eu passar por ali a não ser que o tal fotógrafo saísse antes. Um dos seguranças, aparentemente desconhecendo a lei da física de que dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço, ficou me empurrando para cima do colega lerdo de forma desnecessariamente agressiva. Virei para ele e falei: “Por onde você quer que eu passe?” ao que o animal respondeu como se eu fosse um marginal: “É só três músicas. Agora sai daqui!”. Ora, já não basta ele ser incapaz de entender uma das coisas mais básicas do mundo material (a tal lei da física), o imbecil também é incapaz de contar? Tudo bem que a música em questão é longa, mas acreditar piamente que se trata de três músicas é denotar falta de massa cinzenta.

Esse incidente me fez acreditar que os seguranças estão instruídos para pedir para os fotógrafos saírem depois de três músicas, mas que estes o fazem quando estão a fim, independente da quantidade de tempo, e com muito mais agressividade do que necessário. Um pouco de treinamento seria extremamente recomendado e benéfico para todos os envolvidos, seguranças, jornalistas e público, já que não conheço um headbanger que nunca tenha sido destratado sem motivo por um segurança estúpido. Mas os incidentes não parariam aí, então continue lendo.

Depois da primeira música, Deris explica que estava sendo gravado um DVD. Aparentemente, ao contrário do que havia sido anteriormente divulgado, o disquinho não trará apenas o show do Brasil, mas também gravações na Bulgária e no Japão. Depois da conversa, começam a ultra-mega-hiper-thunder-tremendona Eagle Fly Free, uma das minhas músicas favoritas de todos os tempos. Agora convenhamos, um clássico desses e uma das preferidas de todos deve fechar o show, não ser a segunda música.

A seguir vem a apagada Hell Was Made In Heaven, uma escolha estranhíssima para representar o disco anterior, Rabbit Don’t Come Easy. Mas a música é legal e ainda manteve a adrenalina alta.

É então que chega a hora da mais esperada por mim: Keeper of the Seven Keys. Logo no início, algumas fileiras à frente, uma garota sobe no ombro do namorado (atitude que já vem me dando nos nervos há bastante tempo) desrespeitando completamente todas as pessoas que estavam atrás dela. Ora, se ela não consegue enxergar, tem muitas formas de ver melhor: indo mais para trás, pedindo para o namorado levantá-la pela barriga por alguns segundos e coisas do tipo que não atrapalham ninguém. Mas por que pensar nas outras pessoas que querem assistir ao show, não é mesmo?

Tentei convencer a mim mesmo de que ela ficaria pouco tempo ali e tentei ignorá-la olhando para o outro lado do palco. Chegou o primeiro refrão e ela não saía. Veio o segundo e ela ainda lá. Então fiquei realmente de saco cheio, fui até lá e parei bem na frente do namorado dela, fechando completamente a visão dele. O desgraçado começou a usar o joelho da vadia como arma para ficar batendo em mim e eu, que já estava nervoso, fui ficando cada vez mais. Realmente achei que ia sair na mão com o cara, coisa que não sou de fazer e que, para falar a verdade, sou completamente contra. Mas imbecis como ele têm que aprender a viver em grupo de alguma forma.

Um tempo depois, vi que ele tinha colocado sua vadia no chão, então voltei para o lugar em que estava, onde a visão era bem melhor. Um minuto depois, a nojenta sobe de novo. Como pelo jeito não podia vencê-los, afinal, pessoas que querem ficar na sua sem atrapalhar os outros são sempre as erradas nesse país em que vivemos, decidi sair da pista, atravessar o Credicard Hall e ficar do outro lado, onde aparentemente estavam pessoas que sabiam coexistir em grupo.

Pena que não fiz isso antes. Daquele lado estava bem mais tranqüilo e o único problema era justamente a câmera que passava de um lado para o outro. Esse, contudo, é o preço de se ir a um show que será gravado. Pena que a essa altura eu já estava completamente mal-humorado, já tinha perdido a música que mais queria ouvir e estava quase tão desiludido com o público do Heavy Metal como estava quando escrevi esse texto.

Mas como diria o Queen, o show deve continuar e, conseqüentemente, o trabalho dos jornalistas que estão cobrindo esse show. Mas fica a promessa: um dia vou escrever um texto sobre os tipos de pessoas que impedem que a vida em sociedade seja uma experiência agradável e grupal como deveria.

Veio, então, a única novidade do show em matéria de setlist, a baladinha da primeira parte do Keeper, A Tale That Wasn’t Right que, embora tenha sido tocada em alguns shows das últimas duas turnês, nunca o foi em São Paulo. Aí era a hora do solo de bateria. Curiosamente, essa foi a primeira vez que eu vejo um solo de bateria não seguir a fórmula que entreguei aqui

A diferença foi que o baixista Markus montou uma pequena bateria e começou a desafiar Dani. Essa brincadeira deixou o solo um pouco menos chato do que o tradicional, mas ainda assim é algo que não deveria ter durante o show.

A banda volta para nos levar a uma Dark Ride com algumas músicas mais sombrias. E começa a irregular Occasion Avenue, irregular porque ela altera momentos bem legais com outros entediantes, que acredito que todos que a conhecem já sabem a quais me refiro. Essa música deu uma esfriada legal e nem a execução da boa Mr. Torture recuperou o público. Obviamente, também não seria a baladinha If I Could Fly que faria isso e muito menos o solo de guitarra que se seguiu. O solo também teve uma “inovação”, com a presença do baterista desafiando Sascha com uma guitarra de brinquedo (!), daquelas que você mexe nas cordas e ela toca uma música sozinha, manja?

O que acho mais curioso é ver que realmente tem gente que curte esses solos a ponto de ficar muito empolgado durante suas execuções. Fico pensando em qual seria a reação dessas pessoas caso percebessem que, não fosse os 15/20 minutos ocupados por esses dois solos, poderíamos ter ouvido clássicos do Heavy Metal como I’m Alive, Twilight of the Gods, Rise and Fall e Save Us. Talvez aí esteja o segredo: as pessoas não pensam nisso. Como dizem por aí, “ignorância é uma benção”. 🙂

Depois dessa seqüência chatíssima do meio do show, voltamos ao que todo mundo espera de um show da abóbora germânica: composições representando o bom e velho Happy Happy Helloween. E nada melhor para representar a alegria e a diversão da banda alemã do que uma das preferidas dos fãs, a tremendona Power e suas guitarrinhas cantantes. Com uma música tão legal como essa, não há mau humor que resista e o meu finalmente começava a se dissipar.

Como se não bastasse, já emendam outra das preferidas de todo mundo: Future World e sua maravilhosa letra boba (e digo isso da forma mais positiva possível). É curioso como, quando eu tinha meus 16 anos ouvia essa letra e realmente acreditava que um mundo onde as pessoas vivem em união e felicidade estava no futuro de todos. Hoje, infelizmente, penso que o único lugar para esse “mundo do futuro” é no passado, nas utopias daquele adolescente sonhador que tinha acabado de descobrir as alegrias que o Metal pode nos proporcionar e que hoje não para de se decepcionar ao perceber que quase tudo que acreditava que esse estilo de música representa e fala em suas letras parece não ser assimilado pela imensa maioria que o ouve.

Logo no início da Future World, jogaram uma abóbora que foi recebida por Andi Deris que a utilizou como chapéu durante um bom tempo. É por coisas assim que eu comecei a gostar dessa banda. 🙂

Pela primeira vez em São Paulo, a Future World foi estendida para que rolasse a tradicional brincadeira com a galera. Começou com Deris apresentando a banda e cada um fazendo um pequeno solo após seu nome ser chamado. Quando chegou a vez de Michael Weikath, este foi até o microfone e fez um solo masturbatório à la Malmsteen com a boca enquanto apenas fingia tocar a sua guitarra.

Aliás, aproveitando a pausa, Michael pela primeira vez não parecia estar com aquela cara de quem comeu e não gostou que costuma fazer em todos os shows. Parecia estar mais divertido do que das outras vezes que passou pelo Brasil e em alguns momentos, tive até a impressão que ele sorriu. Seu companheiro de longa data, o baixista Markus Grosskopf, continua sendo o cara mais chamativo da banda. Fica correndo pelo palco, pulando, batendo a cabeça e tudo isso com um sorriso que vai de orelha a orelha o tempo todo.

Andi Deris também continua o mesmo. Criticado por muitos por causa de sua dificuldade em cantar as músicas mais antigas da banda, eu admito que sou um grande fã desse cara e de sua voz 100% Hard Rock (e talvez justamente por isso ele seja tão criticado, já que as vozes de Metal costumam ser bem mais limpas que as desse estilo). Gostos pessoais à parte, ninguém pode negar que Andi é um dos vocalistas mais carismáticos da cena e sabe como fazer um show ser divertido. Parece ser justamente o membro que mais se diverte com a imagem de Happy Happy Helloween que a banda criou para si mesma. E digo mais, não acho que um vocalista de Metal conseguiria encarar isso tão na boa já que, historicamente, o estilo mais festeiro de Rock é mesmo o Hard Rock (para quem não sabe, antes do Helloween, Andi foi vocalista da banda de Hard Rock deveras legal chamada Pink Cream 69).

Dos membros mais novos, o baterista Dani Löble é um cara discreto que quase não chama atenção para si no palco. O outro guitarrista, Sascha Gerstner, bem… admito que já não era fã do cara desde a época em que ele era membro do Freedom Call e não acho que seja uma boa escolha para ocupar o lugar outrora de Kai Hansen e Roland Grapow. Sobre sua aparência e presença de palco, devo dizer que ele parece um Mini-me do Michael Weikath, o que você pode decidir por si mesmo se é bom ou ruim.

Durante a Future World, reparei em um grupinho algumas fileiras à minha frente que ficavam constantemente fazendo coreografias engraçadas e divertidas. A partir daí, passei o resto do show indeciso se olhava para eles ou para a banda no palco. É uma pena que não é todo o público de Metal que tem essa capacidade de brincar e se divertir, não apenas sem incomodar ninguém, mas também divertindo as pessoas que estão ao seu redor.

Depois de Future World, vem mais uma do disco novo, a legalzinha The Invisible Man, que é uma das piores músicas que consigo pensar para fechar o show. Fechar naquelas, já que ninguém mais acredita que o show acabou na primeira vez que a banda sai do palco. É só ver que o pessoal nem pede mais bis, simplesmente espera calmamente a volta da banda. Aliás, esse é um assunto que ainda devo abordar em uma futura Pensamentos Delfianos.

O bis conta com a comercial Mrs. God, música que odiei na primeira vez que ouvi, mas que admito que acabou se tornando uma das minhas preferidas no disco novo. Depois dela, vem a unanimidade I Want Out e a banda sai do palco de novo.

Alguns minutos depois, retornam com a fofa Dr. Stein, talvez uma das músicas mais bonitinhas que o Metal já criou e outra das preferidas dos fãs. Dessa vez, sim, o show terminou. A banda tira uma foto com o público, como já é praxe fazer em shows que são gravados e sai do palco ao som da balada chatinha Light the Universe em playback.

Quando estava me dirigindo para a saída, ouço aquele grito de empolgação da galera e pensei: “A banda voltou ao palco. É agora que ouço Rise and Fall ao vivo” e viro na maior das expectativas para ver uma mulher mostrando os peitos no telão. Nunca pensei que fosse ficar decepcionado ao ver peitos, mas admito que foi o que aconteceu. 🙂

Ela ainda mostraria seus atributos mais uma vez e então o telão se apagaria e o show deixaria um gosto agridoce em mim. Por um lado, como já era esperado, faltaram várias músicas que todo mundo gostaria de ouvir. Por outro, foi talvez o melhor setlist que a banda já executou em São Paulo e não acho que vão executar outro tão bom no futuro. Por um lado, teve algumas pessoas idiotas e egoístas que não se preocupam em atrapalhar os outros. Por outro, teve o grupinho das coreografias engraçadas. E para completar, teve peitos no telão. Não dá para não pensar que o Helloween tem capacidade de fazer um setlist bem melhor e o público de São Paulo tem a capacidade de ser bem mais civilizado. Mas como a possibilidade de ambos acontecerem é bem remota, temos que nos concentrar no positivo: um bom setlist, uma banda carismática, um grupinho de pessoas divertidas e peitos no telão. É, acho que podemos dizer que foi um bom show. 😉

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