Esta matéria faz parte da nossa cobertura especial de Wasteland 3Leia também: IntroduçãoParte 1: Primeiras impressõesParte 2: Atire primeiro, pergunte depois.

Quando não estiver matando e morrendo em Wasteland 3, você estará explorando. E acredite, há muito a ser descoberto nas paisagens frias do Colorado. Conhecer e interagir com personagens, aceitar missões, descobrir localidades e navegar pelo mundo são tarefas que te deixarão ocupado por dezenas de horas, e correspondem à maior parte do gameplay.

A dinâmica geralmente envolve ir até uma localidade, realizar as missões que houver por ali e retornar ao QG para reabastecer seus suprimentos, comprar melhorias e receber novas missões. Depois, voltamos para a estrada e reiniciamos o processo. Ainda que pareça repetitivo (ou justamente por isso), não demora para esse ciclo se tornar viciante. Você vai sempre querer jogar só mais uma horinha para descobrir o que existe naquele ponto de interrogação do outro lado do mapa.

COLORADO SPRINGS

A primeira área realmente aberta do jogo a que temos acesso é Colorado Springs. Ela funciona quase como um HUB, conectando áreas menores que podem ser alcançadas a pé (e por meio de algumas telas de loading). Assim que entro na cidade, me deparo com um pelourinho erigido no meio da praça principal.

Supostos criminosos estão expostos ali, despidos e amarrados e deixados para morrer no frio. Cidadãos gritam xingando os condenados, que gritam de volta xingando os cidadãos. Um magistrado que coordena as execuções me diz que, de vez em quando, amputa os membros congelados para que os prisioneiros vivam (e sofram) por mais tempo. Alguns Dorseys que nos atacaram no início do jogo estão sendo processados aqui.

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Do alto do tablado, estátuas do Patriarca observam as execuções.

Prostrada junto ao pelourinho, uma mulher nos diz que seu filho foi condenado injustamente e nos pede para salvá-lo. Conversando com o moleque, Austin, descobrimos sua história: ele estava morrendo de fome e ganhou comida dos Dorseys para quebrar umas janelas e distrair a polícia.

Negociamos com o magistrado Silas para pagar 200 “Colorado dollars”, a moeda do jogo (que poderia se chamar dollorados), para libertar Austin e assumir a responsabilidade por ele. O garoto parece boa gente, afinal de contas, e quem sabe possamos usá-lo no futuro – nem que seja como bucha de canhão. Sua mãe nos agradece, e nossa fama entre o povo de Colorado Springs cresce um tiquinho (há um medidor de fama para cada facção do game, que diminui ou aumenta conforme as decisões que tomamos em relação a elas).

JUNTANDO A GALERA

Pessoas que você encontra e ajuda pelo caminho, como o garoto Austin, podem ser recrutadas. Algumas delas se tornarão jogáveis, enquanto outras servirão de staff no Quartel-General dos Rangers. Conheci um sujeito chamado Masato que, em troca de uns Cup-Noodles, aceitou servir como cozinheiro na base. E uma curadora em Colorado Springs sem um museu para administrar. A meu convite, ela construiu o seu próprio em uma sala vazia do QG, e continua trabalhando para torná-lo cada vez mais completo.

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Um monumento à Major Prasad, morta na introdução do game.

Se você bem se lembra, uma das primeiras missões dadas pelo jogo era encontrar uma galera para gerenciar sua base. Pois eu demorei umas 20 horas para encontrar essas quatro ou cinco pessoas – a curadora do museu e o carinha dos noodles eram opcionais, portanto não estavam nessa lista. Mas tudo aconteceu organicamente. Entre receber essa missão e concluí-la, vi praticamente tudo o que Colorado Springs tinha para oferecer. Conversei com geral, fiz inimizades, firmei alianças e cortei cabeças. Quando meu log de missões por ali já tinha se esvaziado, achei que era hora de meter o pé.

Foi então que o jogo realmente começou.

O KODIAK

Colorado Springs é apenas uma cidade no mapa. Para sair dela, precisei subir a bordo do Kodiak: um veículo militar transformado em tanque de guerra. É com ele que você navega pelo mundo, dirigindo para onde quiser e acessando novas localidades. O controle é simples e responsivo, e um grande avanço em relação a Wasteland 2. No jogo anterior, ao circular entre uma região e outra, víamos apenas o distintivo dos Rangers cruzando o deserto. Tudo bem que ele simbolizava todo o grupo, como se estivéssemos caminhando a pé, mas era necessário um tremendo esforço imaginativo para comprar a ideia.

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Era assim em Wasteland 2.
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Ficou assim em Wasteland 3.

Agora, você dirige um veículo pica. Com muito poder de fogo e um jeitão Mad Max, o Kodiak às vezes é tudo o que existe entre você e a derrota certa – seja durante o combate ou desafiando os perigos do mapa. E quem for muito cruel ou apenas ruim de braço pode até atropelar animais com ele, transformando cervos serelepes em manchas grudentas no asfalto.

Enquanto acelera pela estrada, talvez você seja abordado por um grupo de sapos mutantes, ou caia na emboscada de bandidos biônicos. Nessas ocasiões, se tiver as habilidades certas, você consegue simplesmente desviar e seguir em frente. Se não tiver, pode ser obrigado a descer do carro e lutar. Também dá para achar comerciantes e vasculhar depósitos em busca de loot, pra não dizer que só encontramos desgraça pelo caminho.

MAIS DO QUE UMA LATARIA BONITA

O Kodiak vem com um radinho de fábrica. Através dele ouvimos transmissões (algumas do Patriarca em pessoa), recebemos chamados e pedidos de socorro, informações da base e, de vez em quando, rola até uma musiquinha:

Certas áreas do mapa estão bloqueadas por diferentes níveis de radiação. Para atravessá-las, precisamos reforçar o chassi do Kodiak, e para isso servem os mecânicos na garagem do QG. Também podemos comprar outras melhorias, como novas armas e morteiros, além de várias opções de customização – que englobam desde enfeites de capô até buzinas personalizadas.

Em alguns combates, o poder de fogo do Kodiak fica disponível (por controle remoto, tipo o batmóvel do Arkham Knight). Nessas lutas, você pode controlar o tanque como se fosse um personagem. Na primeira vez em que usei o Kodiak durante um tiroteio, me confundi com os botões e, em vez de atirar, ordenei ao carro que avançasse. Meu engano resultou em vários dos meus personagens atropelados, no veículo destruído e num incêndio que só foi se dissipar após o fim da batalha.

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Se morrer, não dirija.

Mas foi a única vez. No restante do jogo, manejei o Kodiak numa boa (com poucos atropelamentos, como na vida real). E contar com sua artilharia pesada salvou minha bunda algumas vezes.

LIBERDADE RIMA COM…

Você é livre para explorar o mapa como bem entender. As missões costumam te apontar uma direção (geralmente uma cidade ou vilarejo), mas você decide quando ir até lá e quantas paradas fazer pelo caminho. Ao chegar no destino, é comum passar uns 15 ou 20 minutos fazendo o reconhecimento da área, conversando com os residentes (se eles quiserem conversa) e coletando objetivos para aumentar seu log.

Tenho preguiça de servir de motoboy em RPGs. Sabe aquele negócio de leva e traz, estilo Assassin’s Creed? Pois bem: ficar indo e voltando de uma ponta a outra do mapa não faz meu tipo. E nem o de Wasteland 3. A maioria das missões que coletei em uma cidade ou acampamento puderam ser resolvidas ali mesmo, sem que eu tivesse que sair da área. Isso facilita muito para quem prefere resolver o que há para ser resolvido e somente então partir para o próximo cenário (tipo eu).

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O Scotchmo chegou de repente na nossa base. Sabe como? Nem ele.

Existem exceções, claro, mas nunca me peguei indo até uma localidade apenas para entregar um objeto ou conversar com alguém pela enésima vez. Esse tipo de tarefa está mesclado ao progresso natural do jogo. Em dado momento, por exemplo, surgiu um blade runner caçador de androides batendo na porta do QG. Ele me deu a missão de abater replicantes sintéticos pelo mundo e lhe trazer suas cabeças. Seria frustrante ter que viajar até um ponto isolado do mapa toda vez que eu matasse um androide apenas para coletar a recompensa. Mas a base é um lugar que visitamos com frequência, e o sujeito está sempre esperando por nós logo na entrada – nem precisa desviar o trajeto.

…FACILIDADE!

Ao concluir uma certa missão, imaginei que seria obrigado a voltar por todo o caminho apenas para resgatar meu pagamento. Isso me obrigaria a atravessar o cenário, esperar por uma tela de loading e depois andar mais um bocado para encontrar a figura que negociou comigo. Mas a recompensa (um robozinho) veio até mim assim que a missão acabou, me poupando de bater perna desnecessariamente.

Em outro momento, atravessei sucessivas áreas para atender a um chamado, indo cada vez mais para dentro do mapa. Estava a pé, pois o Kodiak tinha ficado na entrada, umas três áreas antes. Chegando ao fim do caminho e concluindo a missão, imaginei que teria de percorrer o trajeto inteiro na direção contrária, o que seria um porre. Mas o jogo simplesmente mandou um fade-out e me transportou direto para o Kodiak, lá no início da fase – economizando preciosos minutos do meu tempo. Queria que mais jogos tivessem essa abordagem amigável, em vez de inflar sua duração com groselhas de vaivém.

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O primeiro Scorpitron a gente nunca esquece.

Raramente encontrei uma missão que me parecesse desnecessária ou supérflua. E mesmo quando isso aconteceu, foi possível ignorá-la e me ater ao que de fato eu queria fazer. Wasteland 3 deixa você no comando de seu próprio destino. Prefere explorar sem objetivo? Você pode. Quer seguir na missão principal, atendo-se a nada mais que o necessário? Feito. E o que acha de matar todo mundo, ignorando as consequências? Manda bala.

O jogo é tão flexível que ele tem até um final feito especialmente para os cheaters.

DUNGEONS & DOLLS

Existem muitas dungeons espalhadas pelo mundo: desde bunkers sobrevivencialistas infestados de máquinas até cavernas geladas com vermes gigantes. Há laboratórios subterrâneos, acampamentos de canibais e ruínas ocupadas por bestas radioativas. Entrar em uma dessas áreas nos deixa na ponta dos pés, pois nunca sabemos o que haverá por lá. Mas a recompensa costuma valer a pena.

Falando em recompensa, há um monte de “Bonecas Assustadoras” para se encontrar pelo mapa. Elas ficam bem escondidas e, quando coletadas, concedem bônus vitalícios para todo o time (como aumento de percepção, resistência a dano crítico ou um incremento na iniciativa). As bonequinhas são um charme. Elas atendem por nomes como Fuckin’ Fred, Maneater Maury e Nervous Nancy, e cada uma vem acompanhada de uma descrição diferente. A da Maneater Maury, por exemplo, é algo como: “Seu pai dizia que tinha muitos filhos, por isso ela comeu seus irmãozinhos”. E as outras são tão boas quanto!

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Quem vai na frente?

UMA DUBLAGEM DE CAIR O QUEIXO

Em Wasteland 2, pouquíssimos personagens tinham voz. A maior parte dos diálogos envolvia apenas ler o texto e imaginar por conta própria a prosódia do indivíduo. Mas não aqui. Em Wasteland 3, todos os personagens, sejam eles meros figurantes, de grande porte ou coadjuvantes, são dublados. E que trabalho de dublagem!

Em uma entrevista, Brian Fargo disse que quase 40 horas de diálogo foram gravadas para o game. Isso é mais que a duração total de muitos jogos single-player. E a inXile está de parabéns! Essa é talvez a melhor dublagem que vi em um jogo recentemente. Há idiossincrasias na fala, sotaques e pausas enigmáticas. Há muito palavrão, gírias e afetações. Mas também existem locutores polidos e até mesmo um NPC que só fala em latim.

Os dubladores conseguem passar toda a carga emocional necessária para o momento. Há gente que transmite nervosismo e medo pelo timbre da voz. Outros que soam como verdadeiros psicopatas. Há androides que tentarão enganá-lo imitando a voz de uma criança, e mineradores com a saúde debilitada que tossem sangue a cada palavra.

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E existe o jornaleiro, sempre noticiando as mudanças mais importantes que você provocou no mundo.

O jogo deve uma parcela considerável de sua atmosfera a esse excelente trabalho de dublagem. Não fosse por isso, aquela menininha devorando seus próprios parentes e brincando com seus intestinos não seria tão chocante. Poderia ser apenas um modelo, indistinto e pouco definido na tela, acompanhado de um texto. Mas são as risadas da garotinha, inocentes e delirantes, que te acertam em cheio e provocam repulsa. Ela ri e oferece a você um naco de carne, e continua rindo mesmo quando você recusa o petisco e vai embora.

♪ AUMENTA O SOM ♫

Ainda no departamento sonoro, chama atenção a qualidade da trilha. Existem as faixas incidentais, criadas por Mark Morgan, que dão o tom dos combates e da exploração. Elas não chegam a se destacar, mas servem bem ao que se propõem. E existem as canções, que são covers feitos especialmente para o jogo. A responsável por essa parte da trilha sonora é Mary Ramos, que há quase três décadas atua como supervisora musical nos filmes do Tarantino.

Entre as canções, destacam-se clássicos como a bíblica Down in the Valley to Pray, a versão psychobilly de Monster Mash e o hino patriótico Battle Hymn of the Republic. As músicas tocam somente em ocasiões especiais. Pode ser num combate importante, ao dirigir o Kodiak pelas rodovias congeladas ou quando entramos num ambiente novo. E sempre que tocam, elas dão um gostinho especial para a situação. Minha favorita é essa aqui:

Assim como nos filmes de Quentin, a música cria um contraponto à violência e tensão mostradas na tela. Predomina o gênero folk, com violões e vocais graves, e não foram poucas as vezes em que me peguei parando de jogar somente para curtir o som. Pessoalmente, eu gostaria de me envolver em mais tiroteios musicados e de uma variedade maior de faixas. Ou mesmo poder selecionar entre diferentes estações de rádio ao pilotar o Kodiak. Quem sabe em um vindouro Wasteland 4?

PROBLEMAS À FRENTE

Mas nem tudo são rosas e belas nuvens de cogumelo em Wasteland 3. Acredito que eu esteja com umas 30 ou 35 horas de jogo até agora (é uma pena essa informação não ser exibida em lugar nenhum). E muito desse tempo foi passado enfrentando problemas técnicos que, se não arruinaram a experiência, com certeza tentaram. É sobre eles que conversaremos no próximo texto.

Se bugs e crashes não me impedirem, nos vemos na Parte 4!