Serra Pelada

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Heitor Dhalia é um dos novos cineastas brasileiros de obra mais interessante de se acompanhar, sempre fugindo daquele lugar comum temático que infesta o cinema nacional. Nina (2004), O Cheiro do Ralo (2006) e À Deriva (2009) são todos muito bons. Após ser mais um a quebrar a cara em Hollywood, com o fraco 12 Horas (2012), voltou para a terra pátria para lançar seu novo filme.

Estou falando de Serra Pelada, claro, seu quinto longa, e que se passa durante um período de frenesi da história brasileira. Para quem não era nascido ou desconhece o contexto histórico, vale uma recapitulação.

Na virada dos anos 1970 para 80, é descoberto ouro numa região no sul do Pará. Logo, qualquer um a fim de enriquecer começou a colar lá para garimpar a chamada Serra Pelada. A princípio, chegaram dezenas de pessoas, depois viraram centenas, e por fim milhares. Contabiliza-se que no auge dessa verdadeira febre do ouro, o lugar chegou a ter 80 mil pessoas esburacando o chão.

80 mil homens seminus, sujos, suados e barbudos no maior festival da salsicha do mundo, visto que mulheres não eram permitidas na região do garimpo (bem como bebida e armas de fogo). Poderia ser uma visão tirada diretamente do Inferno de Dante. Já Zack Snyder preferiria chamar uma coisa assim de 300.

Mas enfim, Joaquim e Juliano (Júlio Andrade e Juliano Cazarré) são dois amigos de infância de São Paulo que partem juntos para Naked Saw para se juntar a esse contingente e tentar enriquecer da noite para o dia.

À medida que seu trabalho vai rendendo frutos e eles ganham mais prestígio lá dentro, Juliano não demora a ir para o lado negro da Força, completamente corrompido pelo dinheiro fácil, pelo poder e pela absoluta falta de lei no local, o que torna este filme uma espécie de faroeste caboclo (hah, sacou? Porque já tem um filme com este nome… Eu sou tão perspicaz!).

O longa é uma verdadeira superprodução de época, com figurinos, músicas, veículos, orelhões e tudo mais saídos diretamente dos anos 80. Também conta com inúmeros figurantes nas tomadas mais abertas do garimpo, para dar uma noção da loucura que foi a época.

Heitor Dhalia, cujos filmes anteriores eram de escopo e orçamento bem mais modestos, se sai muito bem no comando de um longa de maior escala. A trama em si (quase um Scarface na lama) pode não ser exatamente muito criativa, mas os diálogos são bons e todos os atores estão bem.

Agora, o ponto alto do filme, é preciso dizer, chama-se Wagner Moura. Após dar uma passeada no futuro em Elysium, ele volta para o passado como um dos figurões locais do garimpo, com o engraçado nome de Lindo Rico. E se só esse nome já causa risadas, espere ele entrar em cena. É simplesmente hilário o que ele faz, com um personagem que é praticamente um oposto do Capitão Nascimento, um completo escroque.

É uma pena que ele apareça tão pouco. São basicamente duas cenas focadas nele, pois o ator estava com a agenda cheia e não pôde pegar um papel maior. Repito: uma pena, pois o personagem poderia facilmente ser um dos protagonistas, tão bom o trabalho do ator.

Serra Pelada é um bom filme, uma competente história sobre ambição e a gradual perda de moral e civilidade que viver em condições subumanas e sem qualquer tipo de ordem provoca, causada em conjunto com a vontade de enriquecer a qualquer custo. Um drama com toques de faroeste e Wagner Moura destruindo num papel que merecia mais destaque. Se você gosta dessas características, o filme é mais do que recomendável.

REVER GERAL
Nota
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Carlos Cyrino
Formado em cinema (FAAP) e jornalismo (PUC-SP), também é escritor com um romance publicado (Espaços Desabitados, 2010) e muitos outros na gaveta esperando pela luz do dia. Além disso, trabalha com audiovisual. Adora filmes, HQs, livros e rock da vertente mais alternativa. Fez parte do DELFOS de 2005 a 2019.
serra-peladaPaís: Brasil<br> Ano: 2013<br> Gênero: Drama<br> Roteiro: Heitor Dhalia e Vera Egito<br> Elenco: Juliano Cazarré, Júlio Andrade, Sophie Charlotte, Matheus Nachtergaele e Wagner Moura.<br> Diretor: Heitor Dhalia<br> Distribuidor: Warner<br>