Veja só, a Hermione está fazendo papéis de crescidinha. Ela até arranja um trabalho neste filme. Aliás, o trabalho é a pegada da história, e a empresa em questão dá até nome ao longa.

O Círculo é uma empresa de tecnologia enorme, que visa acabar com a privacidade. Eles não são tão vilanescos quanto você pode pensar. Tipo, o Tom Hanks em nenhum momento faz aquele movimento com as mãos como o senhor Burns ou o Michel Temer. O ponto deles é que se a nuvem souber onde todos estão a qualquer momento, cada pessoa seria responsabilizada pelos seus atos. Não haveria assaltos, assassinatos ou qualquer tipo de violência, pois tudo ficaria registrado.

Além disso, há um certo lado romântico, de que as coisas belas e impressionantes que as pessoas vejam em viagens e passeios ficarão para sempre registradas e serão compartilhadas com qualquer um que quiser ver. “Sharing is caring”, é o lema da empresa, mas algo me diz que o Metallica discorda disso em princípio.

Mae (a protagonista Emma Watson), até concorda com a ideia. Concorda tanto, aliás, que ela aceita carregar uma câmera todo o tempo e transmitir tudo na internet. “Total transparência”, é como eles chamam esta jogada de marketing, que é impossível não remeter a O Show de Truman.

Aliás, talvez aí esteja o ponto fraco da coisa. Toda essa discussão de privacidade já foi feita no cinema várias vezes antes e, em alguns casos, como no supracitado filme com Jim Carrey, melhor. E por favor não use contra mim o fato de eu ter elogiado um longa estrelado pelo Jim Carrey.

Sim, aqui rola uma atualizada. É impossível não lembrar de empresas como Facebook e Google, que são as mais próximas contrapartes do Círculo na vida real. Já somos hoje vigiados o tempo todo. Há câmeras em todos os lugares, e muitos desses vídeos são transmitidos na internet. Coisas como o Google Maps e GPSs deixaram de ser uma fantasia/pesadelo e se tornaram realidade.

Como filme, O Círculo até funciona, embora ele não pareça ter muito propósito para existir. A história é interessante, mas não termina em um lugar consideravelmente diferente do que começou. No final das contas, é apenas a jornada da nossa amiga Hermione para aprender a lidar com aquilo que a maioria de nós vem lutando para aceitar nas últimas décadas:

“A privacidade é um privilégio de poucos, se é que alguém realmente a tem.”

O Círculo conta uma história neste cenário, que alguns podem chamar de exagerado, mas eu diria que é a realidade. Se não a atual, vai pelo menos ser realidade em um futuro bem próximo. E tudo indica que a humanidade está disposta a abrir mão da privacidade pelos benefícios que isso traz. Já fez check-in no Facebook hoje?

REVER GERAL
Nota:
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Carlos Eduardo Corrales
Editor-chefe. Fundou o DELFOS em 2004 e habita mais frequentemente as seções de cinema, games e música. Trabalha com a palavra escrita e com fotografia. É o autor dos livros infantis "Pimpa e o Homem do Sono" e "O Shorts Que Queria Ser Chapéu", ambos disponíveis nas livrarias. Já teve seus artigos publicados em veículos como o Kotaku Brasil e a Mundo Estranho Games. Formado em jornalismo (PUC-SP) e publicidade (ESPM).
o-circulo-parece-uma-versao-para-cinema-de-watch-dogsTítulo original: The Circle<br> País: EUA / Emirados Árabes<br> Ano: 2017<br> Distribuidora: Imagem<br> Diretor: James Ponsoldt<br> Roteiro: James Ponsoldt e Dave Eggers<br> Elenco: Emma Watson, Tom Hanks, Bill Paxton e Patton Oswalt.<br>