E chegamos ao final da minha trilogia de crônicas sobre como foi jogar Mass Effect em 2021. A trilogia original foi lançada em 2007, 2010 e 2012. Assim, a maior parte dos fãs da série jogou essa história ao longo de cinco anos. Minha experiência com a Legendary Edition, lançada em 2021, foi diferente. Cerca de um mês se passou entre o momento que rodei Mass Effect pela primeira vez e quando coloquei um ponto final na história em Mass Effect 3. Pois é, enquanto a maioria estava curtindo as férias de julho, eu estava arriscando minha vida para salvar o universo.
MASS EFFECT 3 EM 2021
A evolução dessa série é incrível. Mass Effect 1 me incomodou especialmente pela falta de qualidade de vida. E a Bioware melhorou muito os jogos nesse aspecto. Exemplo simples: para salvar o jogo no primeiro, era necessário entrar no menu e ficar esperando ele terminar de salvar. No segundo, também era necessário salvar pelo menu, mas clicar em salvar retornava ao gameplay e o salvamento era feito em segundo plano. Em Mass Effect 3, basta apertar o touch pad a qualquer momento. Perfeito!
Aliás, tudo que a série tinha que era perda de tempo foi eliminado. Os minigames de hackear portas, que ocupavam uma boa parte da campanha em Mass Effect 2 foram totalmente cortados. Escanear planetas em busca de upgrades também ficou de fora e não fez falta nenhuma. Ainda dá para escanear planetas, mas só onde você sabe que há algo, e apenas uma vez, em geral para cumprir sidemissions.
PORÉM, ENTRETANTO, TODAVIA…
Tecnicamente, Mass Effect 3 é melhor do que o 2 em todos os aspectos. Porém, a parte criativa é mais complicada. Mass Effect 2 era um jogo com pequenas histórias independentes, quase uma campanha totalmente composta de sidemissions. Mass Effect 3 melhora isso, contando uma única história que vai evoluindo conforme você avança. O problema é que o level design é muito menos inspirado.
Os cenários são mais repetitivos, o timing é muito pior – com muito mais falação e menos ação – e, especialmente, os objetivos são chatinhos. Mass Effect 3 é cheio daqueles objetivos comuns em jogos cooperativos, do tipo “proteja um NPC enquanto ele abre uma porta”, manja?
Curiosamente, as fases mais interessantes são as dos DLCs, que são melhores em tudo, do timing ao gameplay. Aqui elas acontecem antes do fim da história, então não é um problema jogá-las assim que são destravadas. Porém, elas não são identificadas como DLC. Aconteceu comigo de entrar em uma missão na Citadel que eu esperava que fosse uma sidemission curtinha, e no final das contas era o maior dos DLCs. Eu fiquei preso na história dele por duas ou três tardes, sem poder voltar à história principal. A duração do DLC não é o problema, mas eu gostaria de saber que estava entrando em uma longa história paralela da qual não poderia sair antes de concluir.
SIDEMISSIONS A RODO
Também incomoda a quantidade de sidemissions. Boa parte delas envolve encontrar um planeta específico e escaneá-lo. O chato é que o jogo não te diz qual planeta é ou quando ele vai aparecer no mapa. Mesmo as sidemissions mais tradicionais costumam ser bem chatinhas, sem acrescentar nada à história ou ao gameplay.
A quantidade de missões que você acumula, e o fato de que elas não são mostradas no mapa, deixa impossível cumprir todas sem um guia. Para piorar, se você não cumprir uma missão no momento certo (algumas ficam travadas depois de determinado ponto da história), elas ficam no seu quest log para sempre, ao invés de serem marcadas como “fail“.
Isso é uma diferença enorme para o segundo que, embora seja quase totalmente composto de fases que poderiam ser sidemissions, é bom o tempo todo, sem gordura ou missões que não deveriam existir.
MASS EFFECT 3 E O MEU CORAÇÃO PARTIDO
Eu gostei dos rumos da minha história. Consegui passar pela famosa “missão suicida” sem perder nenhum coleguinha, e quem morreu na minha campanha, até onde consigo perceber, era inevitável (RIP, Mordin e Thane!). Porém, como na vida real, minha vida amorosa ficou muito distante do que eu gostaria.
Em Mass Effect 1 eu peguei a Liara. No segundo, peguei o Thane. No começo de Mass Effect 3, a Liara perguntou se eu queria continuar com ela, e eu disse que sim. Porém, pouco depois o Thane reapareceu dizendo que iria morrer e eu tive a oportunidade de uma última bimbada. Poxa, não se nega uma bimbada a um homem morrendo.
Nos jogos anteriores, se você flertar com todo mundo, chega uma hora em que eles te avisam para você escolher um. Imaginei que aqui seria igual, então não pensei duas vezes antes de dar uns amassos no Thane pela última vez.
Depois de um bom tempo, quando fui falar com a Liara, ela me falou, sem cutscene nem nada, que sabia do que eu fiz com Thane. Simples assim, ela acabou comigo, sem nenhum aviso prévio e sem possibilidade de eu fazer nada para reconquistá-la. Achei um final tão sem cerimônia e tão repentino – especialmente para um romance que foi mantido ao longo de três jogos – que eu tive dificuldade de aceitar, e passei o resto do jogo falando com ela e levando-a em missões esperando que tivesse chance de terminar o jogo com ela. Isso não aconteceu.
CASADO POR ACIDENTE
E daí a Especialista Traynor pediu para tomar um banho no meu chuveiro. “Por que não?”, pensei, e falei “vai fundo”. Só que daí, durante o banho, sem input meu, a minha Shepard invadiu o banheiro e pegou a Traynor. E a partir daí, elas começaram a se chamar de “namoradas”, sem que eu tivesse nada a dizer sobre o relacionamento. Literalmente, minha Shepard se casou só porque eu deixei uma sem-chuveiro tomar um banho no meu banheiro! E assim, eu terminei o jogo casado com a personagem mais sem graça da trilogia. Cuén!
Eu não gostei do destino amoroso da minha Shepard e fiquei especialmente frustrado pelo meu romance com a Liara ter sido encerrado de forma tão repentina. Poxa, desde quando pular a cerca acaba com um relacionamento longo?
Apesar disso, eu gostei muito mesmo do final da história com Thane. Eu adorei o personagem desde sua primeira aparição em Mass Effect 2. Ele logo conta que estava morrendo, e mesmo assim eu resolvi seguir em frente com o romance. Em Mass Effect 3, a doença finalmente o alcança.
RIP, THANE!
Nada é mais romântico do que um relacionamento que termina em morte prematura. E o fato do Thane e da Shepard saberem que ele ia morrer desde o início do relacionamento torna tudo ainda mais trágico e belo. Se a Bioware não mandou bem ao terminar meu namoro com a Liara, eles realmente se superaram na morte de Thane.
E ainda depois que ele morre, no DLC da Citadel, ele deixa algumas mensagens póstumas em vídeo que fizeram a minha Shepard chorar. E eu também. O relacionamento com Thane foi um dos grandes destaques da minha história, sem dúvida.
DESIGN DOS ALIENÍGENAS
E já que estamos falando dos meus relacionamentos amorosos, gostaria de falar um pouco do design dos alienígenas. Quando cheguei na Citadel no primeiro jogo, achei tudo muito legal. Porém, depois de três jogos, fiquei um pouco frustrado com a pouca diversidade no universo de Mass Effect.
Em especial, me incomodou como quase todos os personagens são humanoides. Esguios e magros. A Bioware poderia ter pirado mais nesse aspecto. Os formatos dos corpos poderiam ser mais diferentes, ter mais ou menos membros, ter o rosto na barriga, ou mesmo ter olhos nos pés e boca no ombro. Se a vida na terra tem animais como ornitorrincos, peixes e centopeias, imagina quão diferentes seriam as criaturas de outros mundos… Duvido que todas as civilizações fossem compostas por humanoides.
O PONTO FINAL DE MASS EFFECT 3
Apesar dos problemas supracitados, eu gostei muito de ter jogado Mass Effect em 2021. Quando terminei o primeiro, eu sinceramente não esperava que a série fosse ocupar um lugar tão forte no meu coração. É muito impressionante tudo que foi feito, a complexidade das relações alienígenas no universo do jogo e, especialmente, como decisões tomadas no primeiro jogo continuam afetando situações que acontecem no terceiro, lançado cinco anos depois. Mass Effect é uma aula de construção de universo e planejamento de franquia.
E talvez eu esteja errado mas, ao contrário dos jogos da Telltale e suas ilusões de escolha, eu senti que aqui realmente minha história foi minha. Poxa, eu sei que o Wrex e o Kaidan poderiam ter morrido no primeiro jogo, e a importância que eles têm nos games seguintes é enorme. Fico até pensando quão diferente seria a história se, ao invés de ter salvado Kaidan lá no começo da aventura, tivesse salvado Ashley. Será que os diálogos com Ashley no terceiro seriam os mesmos que os com Kaidan? Ou será que seriam totalmente diferentes? E se eu tivesse perdido vários companheiros importantes na missão suicida? Não consigo imaginar a história de Mass Effect 3 sem Mordin ou Garrus, por exemplo?
FIRST PARTY VS. THIRD PARTY
Isso tudo é muito impressionante. Eu sinceramente não acho que vou jogar a trilogia Mass Effect de novo no futuro para tomar decisões diferentes. Eles simplesmente exigem tempo demais e eu prefiro investir esse tempo em algo totalmente novo (mesmo que seja no Mass Effect Andromeda, que eu realmente fiquei interessado em conhecer). Mas a curiosidade de ser uma Shepard babaca e deixar geral morrer existe, pelo menos para ver quão diferente seria meu jogo.
Mais do que tudo, sinto falta de quando as grandes publishers, como a EA, a Activision ou a Ubisoft lançavam este tipo de experiência narrativa premium, sem encher os jogos com microtransações, atualizações frequentes e outras pentelhações modernas. Em 2007, experiências como Mass Effect e, por exemplo, Uncharted, não eram tão distantes. Hoje em dia, há um enorme abismo de qualidade entre um first party como The Last of Us Part II e um Star Wars Battlefront II ou qualquer lançamento third party monetizado à exaustão.
Torço para que jogos como Star Wars Jedi: Fallen Order e o vindouro remake de Dead Space sejam um sinal de que voltaremos a ver mais jogos de alto orçamento focados em narrativa e espetáculo. Sem dúvida há um espaço para isso, que nunca foi embora. É só ver o sucesso que a Capcom vem fazendo ultimamente lançando exatamente isso. Dancemos a este potencial futuro glorioso!