Jogadores, jogadores – Desvendando a dança das cadeiras da RED Canids

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O delfonauta médio deve ter ficado um pouco cabreiro com o título dessa matéria, e não é à toa. Afinal, se o DELFOS é um site de jornalismo parcial-reflexivo que não publica notícias, porque estaria falando de algo tão banal como contratações de jogadores profissionais? Bem, é porque não estamos falando de uma situação banal, mas sim de algo muito, muito maior.

E quando digo “algo maior”, me refiro a todo o contexto que envolveu essas contratações. Tanto a situação daRED Canidsquanto os próprios nomes envolvidos são exemplos perfeitos das dificuldades que existem no cenário profissional brasileiro de League of Legends, e analisar esses problemas acaba sendo tão importante quanto louvar as conquistas. Mas, antes de mais nada, vamos botar os pingos nos i’s e contar o que aconteceu.

A REESTRUTURAÇÃO DA RED CANIDS

A RED Canids terminou o split do CBLOL de maneira desastrosa. Os dois principais problemas foram a desconexão do time com Ayel, jogador da rota do topo, e a adaptação lenta de YoDa, que jogava originalmente na rota do meio e, quando entrou na equipe, foi transferido para a selva e passou a jogar como caçador. As deficiências individuais e conjuntas quase levaram a equipe a ser rebaixada, mas eles conseguiram se manter após a providencial chegada do estoniano Beansu,que substituiuAyel na rota superior nas duas últimas partidas.

Pois eis que as duas novas contratações da RED Canids foram Zantins, também jogador da rota do topo, e Danagorn, caçador de ofício. Oficialmente, tanto um quanto outro chegaram para compor a reserva do time, mas isso não impede que os torcedores tenham dúvidas sobre quem serão os titulares que jogarão o próximosplit do CBLOL, e o motivo disso é muito simples: estamos falando de uma cena onde o futuro de jogadores profissionais é absolutamente incerto.

AS DESVENTURAS DE UM JOGADOR PROFISSIONAL

A realidade de um jogador profissional de League of Legends no Brasil é instável, pois não apenas ser um pro-player é algo para poucos, mas se manter com relativo sucesso também é. Afinal, estamos falando de um cenário com um número limitadíssimo de equipes, e estar em um time profissional não diz muita coisa a longo prazo – sempre há a real possibilidade de não continuar nele e de não conseguir ingressar em outro depois.

Se somarmos a isso o fato de que praticamente todos os jogadores profissionais são jovens e muitas vezes abrem mão de iniciar carreiras tradicionais para se dedicar ao eSport, não é difícil perceber o resultado final: é raríssimo encontrar alguém que consiga vislumbrar um futuro sólido no cenário. Talvez o melhor – e único – exemplo seja o do jogador brTT, que conseguiu emplacar a sua própria marca e, mesmo já alcançando seus 25 anos, ainda faz muito sucesso no meio.

E eu ter destacado o fato de brTT ter passado dos 25 anos não é à toa. No último CBLOL, somente três jogadores estavam nessa faixa de idade, e apenas um desses três atuava como titular em sua equipe: brTT, 25, era reserva na paiN; Eryon, com 27, era reserva na RED Canids; e o único titular, com 24 anos e jogando pela KaBuM, era… Danagorn!

UMA MUDANÇA DE PARADIGMAS

A chegada de Danagorn na RED Canids é muito, muito interessante. Se fosse em qualquer outro time, eu diria que ele realmente só foi chamado para compor a reserva, exatamente como aconteceu com Eryon. No entanto, estamos falando de um time que teve seu caçador posto em xeque diversas vezes ao longo do split passado do CBLOL, e que agora traz um jogador que sempre jogou na selva.

O fato de Danagorn ser um caçador de ofício e não um jogador da rota do meio improvisado na selva (como YoDa é) já seria um fator a favor daquele, mas também temos que considerar que ele já está chegando na casa dos 25 anos que eu citei lá em cima. E isso, para mim, é ainda mais positivo: estamos falando de um jogador claramente mais experiente que YoDa.

Agora, imagine comigo: YoDa, um pro-player jovem que ainda está se afirmando na selva, disputando vaga com Danagorn, um caçador mais velho e que joga em sua zona de conforto. Caso Danagorn consiga a vaga, seria um caso real em que a experiência foi decisiva, bem como seria o primeiro passo para estabelecer um eventual paradigma da importância de jogadores mais velhos em equipes profissionais.

Sim, é possível que a chegada de Danagorn seja mesmo apenas para compor a reserva e fazer aquela troca de figurinhas com YoDa, para que ele consiga crescer como jogador e se afirmar na posição. Isso, inclusive, poderia até criar um outro paradigma – o de que a presença de jogadores mais velhos na reserva serviria para possibilitar uma evolução maior para os titulares. No entanto, dada a já falada instabilidade do cenário que afeta principalmente jogadores mais velhos, não me espantaria se Danagorn entrasse de fato para disputar a vaga e tentar se manter como profissional por mais tempo

E A CHEGADA DE ZANTINS NA ROTA DO TOPO?

Na rota superior a história é um pouco diferente. Como eu disse, a equipe da RED Canids teve sérios problemas com Ayel ao longo do split, e foi necessário a chegada de Beansu, jogador estoniano, para que a queda fosse evitada. Vendo as partidas de Beansu, ficou claro que ele era um pro-player de qualidade inquestionável, e eu estava bastante curioso para saber como seria o seu desenvolvimento na temporada seguinte. Oras, se ele jogou bem mesmo caindo de pára-quedas, como seria sua performance durante um campeonato completo?

Pois eis que Beansu retornou ao seu país e não continuará na line-up da RED Canids. Não há dúvidas de que esse fator foi importante para a contratação de Zantins, mas a situação ganha outros contornos quando lembramos que Beansu não era o único estrangeiro na equipe. Antes dele, o francês Dioud já ocupava uma vaga no time titular, tendo sido, inclusive, o primeiro atleta estrangeiro de eSport a obter visto de trabalho como cyber-atleta, ainda em 2015.

AS DIFICULDADES DOS ESTRANGEIROS

Ao analisarmos as contratações de jogadores estrangeiros que aconteceram ao longo da história do CBLOL, fica bem claro que o caso de Dioud é exceção. Em comum, podemos destacar que a chegada de pro-players, sejam europeus ou asiáticos, sempre eleva o nível das equipes de uma maneira geral, mas o fato é que Dioud foi o único que conseguiu se manter em solo brasileiro, superando barreiras burocráticas e circunstanciais.

Por exemplo, SuNo, Lactea, Olleh e Winged, algumas das maiores contratações estrangeiras da história do CBLOL, não conseguiram se manter por mais de um semestre em suas equipes por não terem seu visto de trabalho liberados, o que por si só já é um problemão – que só foi superado com a chegada de Dioud. E, mesmo depois dele, nem Beansu e nem Tierwulf conseguiram emplacar e se manter no cenário competitivo brasileiro.

O foco aqui é perceber que, se temos problemas para estabelecer cyber-atletas nacionais, tudo fica ainda mais complexo quando se trata de estrangeiros. A perspectiva de instabilidade daqui contrasta deveras com a situação muito mais segura que existe nos cenários asiático, europeu e norte-americano, por exemplo.

Foi necessário um encontro de vários fatores para que Dioud conseguisse construir o nome sólido que possui hoje – cair nas graças da torcida, possuir um estilo de jogo que se encaixa bem no padrão brasileiro e ter um espírito vencedor são só alguns deles -, e ver que dependemos de situações atípicas para que um pro-player de outro país consiga se manter aqui é um problema que não deve ser ignorado.

BARREIRAS QUE DEVEM SER SUPERADAS

O legal de ver a ascensão de um eSport é que podemos acompanhar de perto todas as dificuldades e percalços pelos quais se passa para que seja possível conseguir um lugar ao sol. Mais legal ainda é perceber que por trás de momentos banais como simples contratações podemos perceber situações muito mais profundas, e que é a partir de análises como essas que a evolução chegará.

As possibilidades que a chegada de Danagorn e Zantins trazem para a RED Canids serão postas à prova nos próximos campeonatos, e cabe a nós esperar para ver. No entanto, o certo é que a comunidade de League of Legends torce para que, de uma forma ou de outra, a dança das cadeiras do CBLOL não diminua – apenas cresça e permita que cada vez mais pessoas participem.

CURIOSIDADES

– Um dos vídeos que me inspirou a escrever a respeito e trata do mesmo assunto de forma excelente foi o Pistológico #05. Para quem não conhece, o Schaeppi é um dos casters mais famosos do CBLOL. Ele foi o narrador da final do CBLOL 2016 e agora está com essa série, saindo tanto no seu canal do Youtube quanto no portal MyCNB. Recomendadíssimo para você que quer entender um pouco mais do cenário brasileiro de League of Legends e de eSports de maneira geral.

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