Anvil – A História do Anvil

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Quando se tem 15 anos, todo mundo tem uma visão fantasiosa para o futuro. Com essa idade, é fácil se ver no papel de rockstar, jogador de futebol, astronauta, etc. Mas sempre chega a hora em que a realidade bate na porta e te avisa que isso não vai rolar. Pessoas normais ouvem esse aviso, entendem que nenhum moleque do interior vai virar astronauta, e se matriculam no curso de Administração mais próximo de casa. Pessoas normais não se dedicam por 40 anos a um sonho que só elas entendem. Pessoas normais não fazem parte do Anvil.

Anvil – A História do Anvil (subtítulo super útil) mostra em pouco mais de uma hora, dois anos da batalha de Robb Reiner (bateria) e Steve “Lips” Kudlow (guitarra e vocal) contra irmãs, esposas, mães, empregos de adulto, “empresária” incompetente e o mais puro azar.

Aliás, azar pode ser o grande algoz do Anvil. Logo no início do filme, são mostrados pequenos depoimentos de alguns músicos e entre eles, o do Lemmy, do Motörhead me chamou atenção: “se você não estiver no lugar certo e na hora certa nunca irá conseguir”.

E se tem uma banda que não teve esse timing, essa banda é o Anvil. Eles tiveram a “sorte” de serem pioneiros do Thrash e o azar de terem discípulos superiores a eles próprios.

O Anvil tocava Thrash de qualidade quando as pessoas queriam ouvir Whitesnake, Scorpions e Bon Jovi (companheiros do Anvil no Super Rock Festival no Japão em 1984) e, quando as atenções se voltaram para o Thrash, o Anvil simplesmente não era bom o suficiente para figurar ao lado de Metallica, Slayer e Anthrax.

A batalha de Lips e Robb é acima de tudo para provar a eles mesmos que a turnê que realizaram aos 20 anos não foi o ápice de suas vidas, apesar das várias pessoas em volta tentando convencê-los disso. Afinal, como eles viveriam se se conformassem com isso?

E é ai que surge o grande acerto do diretor Sacha Gervasi (roteirista de O Terminal e roadie do Anvil na década de 80) em focar o filme nesses dois amigos teimosos e transformar Anvil – A História do Anvil em um filme sobre pessoas, não sobre uma banda. Seria um crime mesmo deixar o sorriso infantil e abobalhado e o “andar de tropeço” de Lips em segundo plano.

É bonito de ver como o filme cresce a partir dos detalhes da relação entre Robb, Lips e seus familiares e das expectativas do passado e do presente. Nesse sentido, uma cena chave é a visita ao refúgio do baterista Robb Reiner. Em meio a várias pinturas de sua autoria, uma exibe um monumento colossal em homenagem ao Anvil construído em uma praça pública. O choque entre a pintura cheia de esperança e o rosto cansado de Robb é impagável. Por ter esse foco, o filme tem potencial para agradar não só a headbangers e músicos, mas também para chegar a um publico muito mais amplo.

O diretor Gervasi começa mostrando um Lips de 20 anos sorrindo e usando um vibrador como palheta de guitarra (eu não julgo ninguém por atitudes tomadas nos anos 80) na frente de milhares de japoneses e salta para um Lips de 50 anos entregando merenda escolar. E é por isso que ele perdeu um Alfredo no meu conceito. Falta o momento de ruptura. O momento em que eles perceberam que não iriam mais abrir shows do Bon Jovi e que precisavam de empregos normais.

O filme é pesado e triste e, em alguns momentos, você vai sentir até pena desses fracassados (admito que meus olhos tiveram um pico de umidade perto do final). Mas acredito que, assim como eu, você também vai acabar ficando feliz e agradecido por saber que eles ainda estarão tocando por um bom tempo.