Angra no Rio de Janeiro (1/6/2014)

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Poucas coisas são tão animadoras quando ir ao show de uma de suas bandas preferidas. E quando você vê que a banda está em um bom momento, aí a empolgação toma realmente conta de você. Pois era bem assim que eu estava no último domingo, horas antes do show do Angra. Depois de colocar as mãos no DVD da banda e ver a transformação que Fabio Lione, vocalista do Rhapsody of Fire, provocou na trupe, mal podia esperar para poder prestigiar o quinteto de metal melódico brasileiro.

Pois foi debaixo dos famosos Arcos da Lapa e de um frio atípico para os padrões cariocas (onde até no inverno faz calor) que eu aguardei para adentrar as dependências do Circo Voador, onde o show aconteceria. Talvez, para quem não conhece a Lapa, possa parecer extremamente legal estar debaixo dos Arcos esperando, mas devo dar o aviso de que não é lá uma boa experiência. Não mesmo.

Provavelmente o fato de estar frio só piorou as coisas por tornar o ambiente mais soturno, mas uma Lapa deserta onde as únicas pessoas que você vê (além dos fãs na fila, claro) são moradores de rua e uns poucos policiais à paisana faz você repensar um pouco a vida e as coisas que realmente importam. Não sou um “jovem morador do Leblon da novela das 9” que não conhece a realidade, mas choques sociais são sempre experiências marcantes.

ANGRA OU GUNS N’ ROSES?

Após uma longa hora de atraso para a abertura dos portões, meu cunhado e a irmã dele e eu adentramos o Circo e fomos para a parte de cima da casa. Para quem não sabe, o Circo Voador é composto pelo palco, pela pista e uma arquibancada, que foi onde nós ficamos. Lá teríamos uma ótima visão do palco e um conforto que não é muito comum para shows de metal, mas que ainda assim não deixa de ser bom.

Tudo teria sido ótimo se o show não tivesse atrasado quase uma hora. E digo quase uma hora porque, de acordo com o horário que a produtora divulgou no evento do Facebook, o show começaria às 20h, mas no ingresso a informação era a de que seria às 19h30. E é claro que a plateia também estava impaciente, pois após 40 minutos de atraso as vaias começaram. Bom, se foi uma hora ou uma hora e meia de atraso, tanto faz, porque a minha paciência já tinha ficado lá nos Arcos devido à demora para a abertura dos portões.

E eis que, exatamente às 20h50, as luzes apagaram e… Começou a tocar Back in Black, do AC/DC. É verdade que essa foi a música escolhida pela banda para preparar o show e funcionar como “introdução”, mas mesmo assim as vaias ecoaram mais uma vez pelo Circo Voador. E quando a música acabou, aí sim o show daria seu início, com a mesma introdução do DVD e de quebra a mesma música, a gloriosa…

ANGELS CRY

A primeira diferença – e por sinal a mais gritante – entre o show do DVD e o show do Circo Voador foi de fato a equalização das guitarras. Enquanto no DVD as guitarras têm um som excessivamente fraco e sem peso, no Circo Voador elas estavam tão potentes quanto deveriam ser, e é óbvio que isso fez a entrada da banda ser sensacional.

Mas algo estava fazendo falta. A banda inteira estava no palco, menos Fabio Lione. Angels Cry é uma música que tem uma longa introdução, então era de praxe que Lione entrasse instantes antes de começar a cantar para causar histeria. Porém, foi se aproximando o momento de Lione entrar na música e nada de ele aparecer. A essa altura eu já me perguntava onde estaria o italiano, até que a sua voz começou a ecoar pelos falantes e o canhão de luz apontou para a plateia… E não é que Lione estava lá na arquibancada? O vocalista estava a menos de três metros de mim, e é claro que tanto eu quanto o público fomos à loucura.

A primeira parte do show seguiu o setlist do DVD, então após Angels Cry tivemos Nothing to Say, Waiting Silence, Time e Lisbon. Esse início do show confirmou algumas percepções que eu já havia tido ao ver o DVD. A banda está de fato mais leve, com mais alegria de tocar. Sim, esse é apenas o primeiro show que eu vejo com Lione, mas eu já assisti a outros três shows quando a banda ainda contava com Edu Falaschi, e a performance de domingo deixou bem claro que a banda está muito mais à vontade e ganhou um novo gás com a entrada de Lione.

E é fato que Fabio Lione entrou como uma luva para a banda – basta avaliar a partir da perspectiva certa. Lione não veio para emular as músicas antigas, mas sim para acrescentar o máximo à banda. Como eu disse na resenha do DVD, ele não faz os agudos de Andre Matos ou mesmo de Edu Falaschi (seus agudos, à primeira vista, são extremamente estranhos), mas imprime a sua própria personalidade, tanto nas músicas quanto no próprio show. O fato é que, no palco, Lione tem uma presença invejável, sabendo controlar o público com uma perfeição que só músicos experientes têm.

MÚSICAS DEPRESSIVAS E CRIANÇAS ITALIANAS

O show seguiu com Millenium Sun, uma música que, para a minha surpresa, funcionou muito bem no show. Ela não é uma das minhas favoritas do álbum Rebirth (apesar de ter sido a primeiro música do Angra que eu ouvi) e por isso eu não esperava muito dela ao vivo, mas a verdade é que foi uma grata surpresa e serviu para me mostrar o quanto uma boa iluminação é importante para um show – pois este foi um dos fatores que deu a essa música uma grandiosidade que eu não imaginava.

Após ela, houve uma pequena pausa, onde Fabio Lione conversou um pouco com o público e fez algumas brincadeiras. Ao longo do show eu tive a impressão de que a plateia estava pouco receptiva, e ver o vocalista constantemente fazendo brincadeiras e tentando estimular as pessoas interagirem mais de certa forma ratificou a minha impressão.

Lione, neste momento, fez aquele clássico jogo de cantar alguma coisa e mandar a plateia repetir, ao melhor estilo Freddie Mercury. Porém, a brincadeira acabou terminando com Fabio Lione cantando ópera, o que fez os presentes irem à loucura e gritarem ensandecidamente. Para se ter uma ideia do nível de agitação, a plateia gritou mais nesse momento do que no anúncio de Carry On.

Essa ópera, contudo, não estava lá à toa. Ela serviu de ponte para a vinda daquela que foi, para mim, a melhor música do show: Winds of Destination. Todas as nuances dessa música, todo o seu peso, sua velocidade e até o seu momento mais intimista alcançaram um nível exponencial durante a performance da banda. Sem dúvida, “reviver” esta e outras músicas do disco Temple of Shadows após a entrada de Fabio foi a melhor escolha da banda, pois elas ganharam, ao vivo, vida nova na voz do italiano.

Após Winds of Destination, o show se seguiu com Gentle Change, que Lione dedicou a sua filha Aurora. Eu não sei bem por que ele dedicou uma música tão depressiva à filha, mas o importante é que esta foi outra performance sensacional, pois é provavelmente a música da “fase Andre” que melhor se encaixa no estilo do vocalista. Até o sotaque italiano dele deixa a música mais legal!

Depois disso, veio a vez de Rafael Bittencourt assumir os vocais e executar Make Believe e The Voice Commanding You. Eu já sabia da qualidade da performance da primeira desde que assisti ao DVD, mas conferir ele cantando Make Believe foi também uma ótima experiência. A banda, nos outros shows, convidava um vocalista para cantar nessa música, mas no Rio quem cantou foi mesmo Rafael. O guitarrista tem se mostrado muito à vontade com o posto de “frontman substituto”, e ao que parece ele pretende investir nesse posto. Bem, melhor para nós.

Depois foi a vez do solo de bateria de Ricardo Confessori, e aí eu resolvi conversar, pois não há nada mais chato do que momentos-solo no meio do show – que são necessários à banda, mas para o público são chatos da mesma forma. E já que estamos falando do baterista, é importante frisar a quantidade de deslizes cometidos por ele neste show. Não foram raras as vezes em que ele escorregou e cometeu uma quantidade expressiva de erros no show. Não houve nenhum erro grotesco a ponto de comprometer a performance da banda como um todo, mas este não me pareceu o mesmo Ricardo Confessori da época áurea do Shaman.

Não foi, porém, só o fato de Rafael cantar Make Believe que tornou este show atípico em comparação ao resto da turnê. Foi no Circo Voador que a banda decidiu tocar uma música que eles já vinham preparando há algum tempo, segundo o próprio Lione: a música em questão era Still of the Night, do Whitesnake, que nas mãos do Angra não ficou devendo nada à original. Você pode dizer que os estilos são completamente diferentes – e são – mas a verdade é que às vezes um cover pode surpreender.

Outro motivo para este show ter sido atípico foi o fato de que não houve o momento acústico que nas outras cidades ocorreu. O guitarrista Kiko Loureiro mais tarde explicaria que isso foi devido ao fato de um violão ter sumido no aeroporto, “em um dos nossos aeroportos ‘padrão-FIFA'”, como disse o próprio. Por isso, não só não houve a Late Redemption – que eu aguardava ansiosamente e por isso foi um belo balde de água fria – como não ouve a versão acústica de Carry On.

“Mas ei, ali em cima você disse que anunciaram a Carry On“. Pois é, delfonauta, tivemos Carry On. Depois de Still of the Night, Lione disse que estava na hora de tocar uma música emblemática – e disse assim, em português mesmo. Ele ainda disse (dessa vez em inglês) que era uma música que, mesmo que o Angra tenha mais de vinte anos de carreira, as pessoas falam dela como se fosse a única da banda.

E então, após a alfinetada – mais do que certa, por sinal – do vocalista, a banda tocou Carry On, o que, obviamente, dispensa comentários. A única falta que eu senti foi da faixa de introdução Unfinished Allegro que, assim como as outras faixas de introdução da banda, sempre aumenta as expectativas e faz com que as músicas que vêm em seguida fiquem ainda mais épicas.

COMO ESTRAGAR UM SHOW EM DEZ MINUTOS

Em seguida a banda tocou ainda Acid Rain, No Pain for the Dead e Spread Your Fire. A primeira e a última são as novidades no setlist em relação ao DVD, e, como a grande maioria das músicas da “fase Edu”, ficaram ótimas na voz do vocalista novo. Mas o que merece destaque é, de fato, o que aconteceu depois. Vou explicar.

A banda, em um momento de descontração, trocou os instrumentos entre si. E aí, de forma ainda mais descontraída, trouxe para o palco diversos fãs que, pelo que eu vi, estavam entre a grade e o palco e possuíam crachás. Então a banda ficou uns bons dez minutos conversando com a plateia, e nesse meio tempo eles agradeceram à equipe técnica, o Kiko explicou a história dos violões e até anunciou que era aniversário de uma das fãs que estava em cima do palco. Neste ínterim, o baixista Felipe Andreoli, que havia pego a guitarra, tocou riffs clássicos do Heavy Metal de forma completamente aleatória, mas que ainda assim foi bem divertido – ainda mais porque, quando ele tocou o riff de Painkiller, Fabio Lione pegou o microfone e cantou a música. (Você conseguem imaginar o Lione cantando Painkiller? Não? Então, eu vi isso acontecer. =P)

É claro, a banda explicou o motivo da bagunça: O baterista Ricardo Confessori está deixando a banda, e aquilo era uma comemoração. E, para comemorar, eles iriam tocar Back in Black. Eles tocaram Back in Black, o problema foi que ninguém cantou. O microfone, ao invés de ficar com Confessori – como foi anunciado – ficou passeando entre as pessoas que estavam no palco, e a maior parte não queria cantar, o que fez com que a música praticamente inteira ficasse só no instrumental. Detalhe: quando deram o microfone para o Confessori, ele não quis cantar (!!!).

Pois bem, a minha opinião? Essa foi a maior falta de respeito que a banda cometeu em todo o show, e acabou custando um Alfredo e o Selo Delfiano Supremo que ela com certeza receberia. Neste momento, a minha visão de fã que havia pago para assistir a um show foi a de que a banda estava tentando promover o seu meet and greet, que eles vendem para todos os shows da tour. Não há nenhum problema em querer vender o próprio peixe, o problema é você fazer isso passando por cima do outro peixe que você vende.

Acho ótimo querer tornar a experiência do meet and greet mais interessante para quem compra, mas é desrespeitoso com quem pagou para assistir ao show utilizar o tempo deste assim. Deve ter sido super legal para quem subiu ao palco poder interagir com os músicos, mas para quem estava assistindo não foi tão bom assim. A impressão que eu tive era de que a banda estava me dizendo “eu não me importo com você que pagou só o show, eles aqui em cima pagaram show e o meet and greet“, e isso apenas me lembrava das quase duas horas de atraso no inicio… Bem, depois dessa parte, o show ainda teve as performances de Rebirth e Nova Era, que ficaram muito boas.

GATE XIII

A impressão final é que a banda, finalmente, está nos trilhos de novo. O futuro parece mais promissor, pois Fabio Lione se encaixou como uma luva na proposta atual da banda e parece estar se divertindo bastante, o que mostra que coisa boa vem aí. Porém, apesar dos pecados cometidos neste show, a minha empolgação com a banda aumentou ainda mais e mal posso esperar para ver o que virá em breve. E fique ligado, pois a banda já vai começar a gravar o novo álbum.