O filme Viagem ao Centro da Terra fez algo que considero bem legal e válido para uma adaptação de um livro clássico. Assim como o jogo Dante’s Inferno, ele pega a obra original, mais especificamente a ideia e as descrições ali contidas, para contar uma nova história. Mais que isso, ele responde a pergunta: e se um romance de fantasia não fosse fantasioso, mas verídico?
O mais legal é que o filme se deu bem. Viagem ao Centro da Terra é um Sessão da Tarde despretensioso e pra lá de divertido. Tão divertido, aliás, que muito me surpreendeu quando as pessoas começaram a se referir a ele como uma bomba. Não, embora seja totalmente comercial, está muito longe dos Pinguins do Papai ou de qualquer filme com Jack Black.
Mas devo dizer que, até hoje, gostei de absolutamente tudo relacionado a Júlio Verne com que tive contato. Sejam adaptações diretas ou inspiradas por ele, as histórias criadas pelo escritor francês são exatamente as coisas que eu gostava de ler quando era criança. E ainda gosto! =]
Já essa sequência de Viagem ao Centro da Terra me dividiu. Ela era potencialmente divertida, mas também era potencialmente uma bomba, já que o único do elenco original que voltou foi o sem sal Josh Hutcherson. A boa notícia é que, apesar de Viagem 2 ser totalmente independente do filme anterior, não é uma bomba. Longe disso.
Depois de uma abertura bem fraquinha, a história engrena quando o personagem de Josh resolve decifrar, ao lado do seu padrasto The Rock, uma mensagem criptografada que ele acredita ser de seu avô (Michael Caine). Pouco depois, eles estão com as coordenadas de uma Ilha Misteriosa que foi descrita não apenas por Júlio Verne no livro homônimo, mas também em Viagens de Gulliver e em A Ilha do Tesouro. É claro que eles vão até lá, né? Vai dizer que você não iria?
A partir daí, o filme é pura diversão descompromissada. Na ilha, eles encontram referências mitólogicas e coisas de vários outros livros de fantasia e ficção científica, não apenas do Júlio Verne. Obviamente, eles também se envolverão em perigos, perseguições, caça ao tesouro e tudo mais que histórias como essa costumam ter.
Se você não sabe quais são as “histórias como essa” a que me refiro, pense em coisas como Goonies, Up, Uncharted, ou Indiana Jones. Você sabe, pessoas normais que têm acesso a algo místico ou mitológico pelo qual a humanidade vem procurando há séculos. Ora, tem como não gostar disso? É cinema em sua forma mais clássica!
O visual, aliás, é exemplar. Duvido que você não saia da sessão querendo ter um elefantinho de estimação ou com vontade de voar nas costas peludinhas de uma abelha gigante. E tudo isso é tratado com o devido destaque. É comum o filme parar apenas para te mostrar planos longos com o cenário da ilha enquanto uma música à John Williams toca de fundo. Viagem 2 é mágico, especialmente se você conseguir assisti-lo com os olhos de uma criança.
Se não conseguir, no entanto, pode acabar voltando aqui para fazer um desses comentários malas comparando a nota de dois filmes totalmente diferentes, resenhados por pessoas diferentes, e questionando a credibilidade do site pela opinião do resenhista não bater com a sua. É inegável, Viagem 2 tem defeitos. Alguns deles graves, do mesmo tipo que eu normalmente costumo meter o pau furiosamente por aqui.
Sim, é uma obra totalmente comercial, sem nenhuma motivação artística. Como tal, tem várias cenas repetidas e vários momentos que você sabe o que e quando vai acontecer. O roteiro não inova em nada, mas é amarradinho e não dá pontos sem nó. Uma frase aparentemente sem importância pode virar um plot point um tempo depois. Se ousasse mais, criasse mais, a nota seria consideravelmente maior.
Incomodou-me, especialmente, o tal do vulcão de ouro, algo que poderia render cenas muito legais se bem aproveitado mas, da forma que está, acaba sendo apenas uma desculpa para separar os personagens quando alguns deles não tinham mais espaço na história.
Mas aí que está, a falta de criatividade e ousadia já são esperadas em um filme feito única e exclusivamente para tirar seu dinheiro. E aí entra a diferença entre uma deliciosa diversão para sábado à tarde e uma porcaria de incentivar o suicídio. Felizmente, este pende para o primeiro.
De forma alguma tem o mesmo valor artístico de um Up e não vai marcar a sétima arte como Indiana Jones, mas se você gosta de aventuras como essas, despretensiosas e engraçadas, a diversão é garantida. É possível fazer filmes de criança sem ser tão triste e adulto quanto os da Pixar e sem ser retardado como os com o Jack Black. Viagem 2 consegue ficar nesse sweet spot difícil de alcançar.
Se você tem crianças na família, não interessa se são seus filhos, sobrinhos ou simplesmente moleques que você sequestrou na fila de ingressos, leve-os para o cinema, compre pipoca, ative seu sense of wonder e prepare-se para uma tarde de sábado bastante agradável. E depois do cinema, sugiro uma pizza de quatro queijos.
CURIOSIDADE:
– O livro A Ilha Misteriosa de Júlio Verne não é uma sequência para Viagem ao Centro da Terra, mas para os livros 20.000 Léguas Submarinas e Os Filhos do Capitão Grant.