Like a Dragon Infinite Wealth talvez seja o Like a Dragon mais diferente que já joguei. E consegue a façanha de fazer isso sendo absolutamente mais Yakuza. Muito disso se deve ao novo mapa do Havaí, que é simplesmente enorme. Tão grande, aliás, que agora você pode se movimentar de um canto a outro com patinete.
Além disso, esta é uma história que une os dois protagonistas da série, Ichiban Kasuga e Kazuma Kiryu. Embora Ichiban seja o de facto protagonista, Kazuma é muito importante, tem capítulos dedicados a ele e muito destaque na narrativa. E mais, as lutas em geral são do tradicional combate por turnos, mas Kazuma-chan tem um especial que permite atacar em tempo real, como na época de outrora. Introdução feita, é hora de mergulharmos mais fundo nas cristalinas águas havaianas.
ICHIBAN KASUGA
Como todos os Yakuza/Like a Dragon antes dele, Infinite Wealth é, acima de tudo, uma história. E vou dizer, por mais que eu goste muito do Kazuma, acredito que neste momento estou gostando mais do Ichiban. Os dois são pessoas absolutamente boas, mas Kazuma é fechado e sisudão. Ichiban é quase seu oposto. Um patetão brincalhão e ingênuo, muitas vezes mais do que deveria para seu próprio bem.
Ichiban confia e se afeiçoa a pessoas tão rapidamente que em vários momentos do jogo personagens que você pensa serem amigos o traem. E ele é o primeiro a entender e perdoar os traidores quando estes explicam seus motivos. Ichiban Kasuga é um bobão, mas é um bobão inspirador. Incapaz de cometer qualquer tipo de maldade ou sacanagem, e rápido para perdoar e retomar a amizade. A raça humana ganharia muito se todos nós fôssemos como ele.
KAZUMA KIRYU
Mas Kazuma também é bastante inspirador. A série vem meio que tentando se livrar dele desde Yakuza 6, mas o cara é popular demais entre os fãs. Ele não é ingênuo como o Ichiban, mas é um cara absurdamente honrado e do bem. Fechadão e sisudo, Infinite Wealth continua a tradição de dar uma despedida a ele a cada novo jogo.
Não vou dar spoilers aqui, mas muitas coisas que acontecem ou que são elaboradas relativamente rápido, dão a entender que esta pode ser sua última aventura. Além disso, quando você o controla diretamente, nos capítulos dedicados a ele, há um tipo de colecionável dedicado a lembrar de momentos importantes da sua história. Tem até toda uma corrente de sidemissions que envolve ajudar o sujeito a ver pessoas queridas do passado que acham que ele morreu.
Eu já joguei vários Yakuza, mas não todos, e mesmo assim me emocionei bastante com o carinho dedicado ao passado da série e ao personagem. Se você tem tanto ou mais experiência com Like a Dragon quanto eu, há de se emocionar também.
A HISTÓRIA DE LIKE A DRAGON INFINITE WEALTH
Eu adoro as histórias de Like A Dragon, mas tenho sérios problemas com suas narrativas. Fico muito incomodado com cutscenes longas demais para elaborar pontos da história que absolutamente não precisam de tanto tempo. Elas são tão longas, aliás, que é comum o Xbox ativar o screensaver durante elas.
O “ranking” das cutscenes, em que algumas são filme em CG lindíssimos, outras envolvem texto e personagens estáticos e várias estão no meio termo também me incomoda. Em Infinite Wealth, sinto que há muito menos cutscenes em qualidade máxima, mas as que envolvem apenas texto são também muito mais raras no decorrer da história principal. As sidemissions, no entanto, são na maioria apenas escritas, com pouquíssimos momentos realmente falados.
Fazendo a história, a maioria das cenas é falada, mas não são muito interessantes de assistir. Em geral tem um grupo de personagens em círculo movendo as bocas, sem muita interpretação facial ou corporal. Diante da absurda duração do jogo, mesmo levando em conta apenas a campanha principal, você vai acabar adiantando alguns diálogos apertando o botão depois de ter lido as legendas, mesmo que os personagens ainda não tenham acabado de falar. Boa notícia, Like a Dragon Infinite Wealth está totalmente legendado em português, com um trabalho muito superior ao que vimos em Yakuza Like a Dragon. Aqui até os nomes dos inimigos foram traduzidos, por exemplo.
MAMA, JUST KILLED A MAN
A história começa bem de leve, mostrando como andam a vida dos heróis do anterior depois da Grande Dissolução da Yakuza. Porém, um dos capitães diz para Ichiban que sua mãe está no Havaí, e arranja uma passagem. Chegando lá, ele descobre que ela está desaparecida e todas as gangues locais estão procurando por ela.
O fato de boa parte do jogo ser no Havaí (embora também existam os mapas de Yokohama e Kamurocho) permite vermos algo difícil na cultura pop: a visão que outros países têm dos EUA. Ver os EUA como os estanhos é algo muito legal, embora diria que falta um pouco de capricho na seleção de atores. O Bryce, por exemplo, nativo do Havaí, fala japonês perfeitamente. Porém, quando fala em inglês é sinceramente difícil de perceber qual idioma está falando. Isso se estende a vários outros personagens que falam em japonês e inglês. Alguns parecem até ter atores diferentes dependendo do idioma (como o policial que leva a turma para o Distrito Cinco).
ANÁLISE LIKE A DRAGON INFINITE WEALTH
Narrativamente, a série Yakuza costuma ser lembrada como “uma história principal dramática, com substórias deliciosamente bobas”. Em Infinite Wealth, há uma intersecção bem forte entre os dois mundos. Até porque Ichiban é mais brincalhão do que Kazuma, tem muito humor, e muita coisa boba na história. Eu sinceramente amo isso. A cutscene em que Ichiban acorda peladão numa praia do Havaí, que você provavelmente já viu antes do lançamento, por exemplo, é um bom exemplo do humor bobinho que faz parte da campanha principal.
Há uma infinidade de personagens jogáveis, cada um com sua classe exclusiva. Mas há também uma gama enorme de profissões genéricas, que podem ser equipados em qualquer um. Por exemplo, a classe Detetive, do Adachi, não acho muito divertida. Por outro lado, eu posso transformá-lo em um Samurai, uma classe focada em distribuir muito dano. Como Adachi é fortão, isso se encaixa de forma perfeita nele.
O fato de o combate ser em turnos também permite mais humor. Tem um monte de golpes extremamente bobos. A classe Aquanauta, por exemplo, envolve ataques envolvendo pranchas de surfe. Um golpe especialmente útil tira uma água viva do bolso e joga no desafeto, causando dano de eletricidade. E o especial da classe envolve literalmente o ataque de golfinhos. Devido ao humor e bobeira generalizada que rola em todas as lutas, até gosto mais do combate em turnos de Like a Dragon do que do em tempo real da época em que a série se chamava Yakuza. Mas há um grande porém.
LEVEL UP
Agora Like A Dragon é totalmente um JRPG, com tudo que isso envolve. Para muita gente, isso é legal. Para mim, traz uma miríade de microgerenciamento que sinceramente me deixa infeliz. Eu costumava jogar Yakuza basicamente fazendo a história, ignorando boa parte do conteúdo extra. Afinal, as campanhas em si sempre foram longas demais para mim. Em sua versão JRPG, isso não é mais possível.
Níveis são importantíssimos para você conseguir vencer as lutas. É aquela coisa, se você não tem o nível recomendado, não adianta jogar bem, não vai conseguir passar. E o jogo exige um aumento de níveis mais alto do que sua história proporciona. É comum você se deparar com a entrada de uma fase de ação estando dois ou três níveis abaixo do recomendado, o que a torna impossível.
LIKE A DRAGON INFINITE WEALTH E O GRINDING
Da primeira vez, tentei ir mesmo assim, mas sofri muito para terminar. A partir daí, comecei a me ver obrigado a fazer grinding. Inicialmente tentei fazer isso com as sidemissions, mas me surpreendi com o fato de elas não darem XP. Então precisei usar e abusar do modo roguelike, uma espécie de dungeon aleatório que você pode fazer repetidas vezes só pra upar e ganhar itens. Eu conseguia subir cerca de um nível a cada 30 minutos neste dungeon, então se precisasse subir dois níveis, ia literalmente perder uma hora de vida numa atividade que não me divertia nem um pouco.
Eu sinceramente fiquei com vontade de ter o jogo na versão PC e, através do WeMod, poder subir de nível simplesmente apertando F5, ou algo assim. Entendo quem gosta do grinding, mas eu não gosto, e gostaria de ter opção de deixar os inimigos sempre no meu nível, como alguns outros RPGs fazem. Assim nunca ficaria nem underleveled nem overleveled, e é nestes momentos que o combate detona.
LIKE A DRAGON INFINITE WEALTH E OS LEVEL UPS ADICIONAIS
Mas tem mais. O nível do personagem é só uma das coisas que você precisa subir. Tem níveis de armas e de equipamentos. Níveis de relacionamento entre os heróis. Níveis de cada classe para cada personagem, separadamente. Absolutamente nada disso é opcional.
Like a Dragon Infinite Wealth tem um monte de atividades secundárias bacanas, como as sidemissions, fliperamas e jogos japoneses. Mas nada disso dá XP. Para subir o nível, você precisa lutar ou ficar andando pelo mapa conversando com os colegas. Pior, precisa encontrar lojas específicas que vendam o equipamento que você precisa no nível necessário para progredir. É muito microgerenciamento para o meu gosto. E eu sinceramente preferia fazer as sidemissions do que qualquer uma dessas coisas.
CONTEÚDO OPCIONAL, MAS NEM TANTO
E daí tem toda uma gama de atividades MUITO elaboradas, que são opcionais, mas nem tanto. Especialmente, existem duas atividades que poderiam ser jogos independentes. Tem uma paródia de Pokemon chamada Sujimon e uma de Animal Crossing, chamada Ilha Dondoko.
A primeira não exige muito tempo se não quiser interagir com ela. Porém, a paródia de Animal Crossing prende você ali por literalmente 90 minutos. Se você gosta desses jogos, deve ser ótimo, mas eu sinceramente odeio. Não quero passar horas limpando lixo e fazendo trabalho manual para ganhar dinheiro e melhorar a ilha dos outros. Sinceramente, isso não se encaixa nem na história do Ichiban. Por mais ingênuo que ele seja, é meio ridículo um resort chegar em você e falar “ei, trabalha pra mim fazendo coisas manuais e chatas. Daí com o dinheiro que eu te pagar, você reinveste na minha própria ilha, já que este dinheiro não pode ser usado fora daqui”.
MUITO TEMPO, TEMPO QUE NÃO TENHO
Like a Dragon Infinite Wealth exige muito tempo. Eu não fiz a maior parte das atividades opcionais além das necessárias e mesmo precisei jogar mais de um mês, tipo quatro a cinco horas todo dia. É sinceramente absurda a quantidade de tempo que ele pede do jogador.
As cutscenes são mais longas do que o necessário, mas o principal pra mim foi ele exigir grinding e interação com atividades opcionais na qual você não tem interesse. E isso apenas para poder continuar com o que eu de fato queria fazer. Em muitos aspectos, Like a Dragon Infinite Wealth é o melhor dos Yakuzas, mas o desrespeito que ele tem com nosso tempo é tão grande que acaba prejudicando consideravelmente a experiência.
Eu costumo optar por jogar no PC games que são difíceis demais. No caso de futuros Like a Dragon, talvez eu opte por esta plataforma simplesmente para poder pular estas atividades que não me interessam forçando level ups. É o tipo de coisa que deveria de fato ser opcional, como sempre foi. Ao tornar obrigatório, enfraquece o jogo, pois a gente precisa jogar tempo fora. E este é meu veredito. Like a Dragon Infinite Wealth é muito bom em seu jogo principal. Mas ao tornar atividades secundárias obrigatórias, acaba custando muito tempo para chegar na parte boa.