O Besouro Verde

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Dois anos atrás, nós aqui do DELFOS entrevistamos o diretor Michel Gondry. Na entrevista, ele não poupou palavras e falou super mal dos filmes de produtor, dizendo que não era arte, que fazia pipi na foto de quem fazia e outras gentilezas. Confira por si mesmo clicando aqui.

Até eu, que concordo com essa opinião, achei que ele estava sendo um pouco radical. E veja só, o sujeito traiu suas próprias palavras não um montão de anos depois, mas no seu fuckin’ próximo filme! E foi logo com O Besouro Verde, definição de filme de produtor, pois os engravatados estavam tentando realizá-lo há mais de uma década e, por isso, já passou na mão de mais gente do que mina bêbada que cai no sono numa balada. Que feio, senhor Gondry!

A maioria de nós ouviu falar do personagem Besouro Verde por dois motivos. O primeiro, que é meu caso, é por causa das notícias relacionadas a esse filme, que remetem inclusive ao período negro na história da humanidade em que o DELFOS sequer existia ainda. O segundo é porque o sidekick do personagem, o Kato, foi interpretado na TV por ninguém menos que Bruce Lee.

À primeira vista, este filme é uma versão bem-humorada do Batman. O protagonista é herdeiro de uma fortuna, então se junta a um empregado para lutar contra o crime. À segunda vista, vemos que ele é igualzinho ao Batman Barriguinha da TV.

E ele começa bem! Logo de cara, temos um prédio explodindo e, meu amigo, prédios explodindo em Imax ficam uma maravilha, chegando até a compensar a tosqueira do 3D convertido (de 3D mesmo, só os créditos finais – bem bonitos, por sinal).

Ele já me ganhou com o prédio explodindo, mas depois continuou super divertido, engraçado e com um visual pra lá de legal. Daí, finalmente veio a primeira cena de ação, com Kato (Jay Chou) chutando uns traseiros criminosos com efeitos de cores que lembram games como Mirror’s Edge.

Aliás, essa cena deve ser a cena de porrada mais bonita desde Matrix. E logo em seguida vem uma igualmente tremendona perseguição de carros. Foi tão empolgante que tive que levantar da cadeira, erguer os braços e gritar “POWER BAZUCA!”.

Infelizmente, minha empolgação não foi o suficiente para materializar uma munição sobre minhas mãos, então, sob os olhares indignados dos meus colegas críticos de cinema, fui obrigado a sentar e continuar assistindo ao filme em silêncio.

Nesse ponto, eu estava certo que O Besouro Verde levaria o orgulhoso Selo Delfiano Supremo e as vozes da minha cabeça estavam colhendo apostas para um bolão que visava acertar em qual posição dos meus melhores do ano ele estaria. E daí em diante, o besouro escorregou colina abaixo.

Lembro um episódio de It’s Always Sunny in Philadelphia, onde eles dizem que odeiam mulheres em filmes de ação, pois elas são inúteis e sempre estragam tudo. Isso nunca foi tão verdade quanto aqui, meu amigo delfonauta. Acontece que Cameron Diaz não só é inútil, como é o pivô do declínio total do filme.

Acredita que os roteiristas Seth Rogen e Evan Goldberg (que escreveram o legalzudo Superbad) resolveram me enfiar uma clichezenta lição de amizade em um filme de ação? Além de ela estar completamente fora de lugar (até em comédias melosas esse artifício imbecil fica fora de lugar), o estopim da briga é uma mulher! Em um filme sobre uma dupla de super-heróis, os dois brigam por causa de uma fuckin’ mulher! Bata na minha bunda e me chame de Shirley, isso não se faz!

E fica pior! Na dupla em questão, O Besouro Verde é mais inútil do que o Prince of Persia naquele jogo em que a sidekick faz tudo. O Kato inventa, luta, planeja, enfim… O sidekick faz tudo e o herói mesmo é apenas o alívio cômico. E sabe o que ele resolve fazer na hora que briga com o parceiro? Sair na porrada com ele. Sim, sair na porrada com o sujeito que ele viu em várias ocasiões bater em mais de dez caboclos ao mesmo tempo sem sofrer nenhum arranhão. Esse é o Chewbacca e isso não faz sentido.

Se eu já estava meio de cara com o Michel Gondry fazendo um filme de produtor depois de reclamar tanto na entrevista, esse foi o momento em que eu perdi completamente o respeito pelo filme e por todos os envolvidos. Dessa forma, até tentei, mas não consegui aproveitar sequer os poucos bons momentos que viriam depois disso.

Mais decepcionante ainda é que a maldita lição de amizade costuma vir no início do terceiro ato, lá pelos 75% do longa, mas aqui deram uma adiantada e ela vem lá pelos 50%, logo que eles de fato começam a ser O Besouro Verde e seu ajudante sem nome. Ou seja, sequer conseguimos aproveitar algumas boas cenas de ação antes de os dois começarem a agir como crianças mimadas.

E é uma pena, pois o início do filme é realmente legal e é por ele, e APENAS por ele que a nota que você vê nesta resenha ainda está acima de um filme nada. Ação e humor combinam como ruivas e bacon, mas colocar lição de amizade no meio? Faça-me o favor! Talvez seja melhor Seth Rogen e Evan Goldberg continuarem roteirizando apenas suas comédias Sessão da Tarde e deixarem filmes de ação para homens de verdade.