God of War: Ascension

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O delfonauta de longa data deve se lembrar quão ansioso eu estava por God of War III, e ao mesmo tempo o quanto ele me decepcionou.

God of War: Ascension foi lançado semana passada diante de uma expectativa bem mais baixa. A impressão que dava é que nem a própria Sony acreditava na sua campanha, uma vez que toda a divulgação foi focada apenas no multiplayer. Ainda assim, trata-se de um novo God of War, então é óbvio que fãs da série, grupo no qual me incluo, dariam um jeito de botar suas espartanas mãos no jogo o quanto antes.

PRIMEIRAS IMPRESSÕES

As primeiras impressões do jogo infelizmente não foram nada boas. Diante dos esforços da indústria de games em se igualar à pirataria no quesito qualidade, God of War: Ascension não traz manual, nem nenhum material de leitura.

A versão lançada no Brasil, no entanto, traz um online pass que, além do acesso ao multiplayer, libera também alguns mimos para este modo, além de um tema dinâmico para o PS3 e, o mais legal, a trilha sonora completa do jogo em MP3 (e sim, pode ser copiada para o seu computador, iPods e afins). Estes brindes digitais lá fora fazem parte da edição de colecionador, mas aqui foram incluídos em qualquer versão oficial brasileira (aquelas com a caixinha em português).

As más impressões continuam ao colocar o disco no PS3, pois ele imediatamente pede duas atualizações obrigatórias, uma delas com mais de 100 mb. Considerando que o jogo saiu na terça, dia 12 de março, e eu comecei a jogar na quarta, 13, definitivamente não é um bom sinal que ele necessitou de dois consertos desse tamanho em tão pouco tempo. Isso além do inconveniente de ter que esperar um download tão grande antes de jogar, especialmente na PSN, onde cada transferência internética leva cinco vezes mais do que em qualquer outro equipamento da sua casa.

Eu sei que uma das atualizações era apenas para mudar o nome do troféu “bros before hos” para “bros before foes”, porque consideraram o primeiro ofensivo para as mulheres. Claro, o Kratos esmagar a cabeça de uma mulher com a bota não tem problema nenhum, mas uma expressão bastante conhecida da língua inglesa é ofensiva. A outra atualização, que tinha mais de 100 mb, eu não consegui descobrir o que fazia.

TRADIÇÕES QUEBRADAS

God of War: Ascension não teve medo de quebrar tradições e características dos outros jogos da série, e algumas das mudanças foram positivas, outras não. Neste último grupo, por exemplo, temos aquele “começo sem loadings” onde, tal qual os gibis de Watchmen, a tela título era também a primeira cena da história, e o jogo começava sem transição nenhuma ao escolher “New Game”. Aqui, rola um tradicional (e bastante longo) loading.

No lado positivo, finalmente aboliram os saves manuais. O terceiro jogo já tinha colocado autosaves, mas ele sempre salvava apenas os últimos checkpoints, e os manuais serviam para você guardar cenas que poderia querer jogar de novo. Aqui, temos um muito bem-vindo chapter select.

A maior mudança, no entanto, foi o combate. Os combos tradicionais de Kratos estão bastante diferentes. O combo do botão quadrado está mais curto e rápido. Conforme você esbofeteia seus desafetos, vai enchendo uma barra de raiva e, quando ela estiver no máximo, o combo automaticamente se torna o tradicional, presente em todos os outros jogos da série, além de você poder usar habilidades especiais de cada um dos quatro principais deuses da franquia (Ares, Zeus, Hades e Poseidon).

Achei isso bastante interessante, especialmente do ponto de vista narrativo. Afinal, este é o jogo que se passa antes na história do Ghost of Sparta. Aqui, Kratos ainda não estava em “rage mode” permanente como ficaria em breve. Ele chega até a sorrir em determinado momento.

Isso também veio com uma decepção, no entanto. Em todos os jogos anteriores da série, acredito que todos os jogadores tinham como primeiro objetivo upgradear as blades of chaos até o ponto em que você ganhava o eficientíssimo combo do botão triângulo.

Eu fui aqui com essa mentalidade, e finalmente quando juntei a experiência necessária para o upgrade que me prometia o “combo triângulo”, constatei que ele não funcionava. Fui checar a lista de movimentos e qual não foi minha surpresa ao perceber que aquele combo tradicional funcionaria apenas quando a barra de raiva estivesse cheia.

Não vejo problemas em mudarem o combo, como fizeram com o “quadrado”, mas considero um grande erro que o triângulo dê apenas um golpe isolado (o mesmo que inicia o combo no God of War III), sem a possibilidade de emendar outros golpes em seguida. Isso deixa o combate menos dinâmico e mais travado, especialmente porque é bem difícil encher a barra de raiva e ela se esvazia em poucos segundos. Na prática, isso tornou a jogabilidade das lutas bem mais repetitiva, pois agora o jogador fica apenas martelando o quadrado, sem variar os golpes e combos.

FALANDO EM MUDANÇAS

Outra modificação legal feita no combate é a possibilidade de pegar armas dos inimigos nos chãos. Essas armas, que são usadas com o “círculo”, se encaixam bem nos combos do “quadrado” e dão a God of War: Ascension um quê de beat’em up old-school, na linha Double Dragon.

Existem cinco armas, e eu gostei bastante de três delas. A espada é a melhor para combos, o porrete joga seus inimigos longe, e o escudo permite atacar e defender ao mesmo tempo, mais ou menos como aquela lança do jogo de PSP, Ghost of Sparta. Tem também duas armas de longo alcance, mas essas eu não achei tão legal, especialmente porque elas têm limite de munição.

E é bom que essas armas secundárias existam, pois sem elas, você passaria o jogo inteiro com as fiéis blades of chaos. As modificações na sua arma principal são feitas pelos poderes dos deuses. Se você tiver o poder de Ares ativado, terá aquele mesmo power-up do Ghost of Sparta, uma explosão que acontece segundos depois do fim do seu combo e que imobiliza os inimigos. Zeus te dá o poder de eletrocutar os inimigos, Poseidon congela e Hades chama mãos gigantes na melhor tradição Bayonetta.

O deus selecionado também afeta seus combos e os golpes especiais (aqueles que você faz segurando L1 e apertando quadrado ou triângulo). O do Ares é o tradicional, cujos combos e especiais lembram os jogos anteriores (e, portanto, é o melhor). Os outros imitam armas que você carregou nos outros games da série. Os golpes de Hades, por exemplo, são praticamente iguais aos daquela arma que você arranca dele em God of War III, enquanto os de Zeus lembram bastante aquela que Hefesto construiu no mesmo jogo.

Isso tudo significa que o poder dos deuses afeta bem menos o jogo do que pode parecer à primeira vista, uma vez que não há novidades ou golpes novos em nenhum deles. A diferença, no entanto, é a mágica. O deus ativo é o que vai determinar a mágica, e elas são bem legais, especialmente a de Zeus, que provavelmente é a mais eficiente de toda a série.

Há um lado negativo, no entanto. Para liberar cada uma das mágicas, com exceção da de Ares, que já vem liberada, você precisa upgradear cada um dos deuses ao nível máximo. Isso foi uma decisão bem estranha dos desenvolvedores, pois na prática, o jogador fica praticamente o jogo inteiro limitado a usar apenas a mágica do Ares. Eu, pelo menos, só comecei a subir o nível dos deuses depois de maximizar as blades of chaos, e essa é caríssima. Assim, só fui ver a última mágica pertinho do final do jogo, e não a aproveitei tanto quanto gostaria. Então minha dica para você é dar prioridade para o poder de Zeus, e só depois voltar à arma principal.

COMBATE É COISA PARA FRACOS

Curiosamente, embora tenhamos falado até aqui do lado porrada do jogo, God of War: Ascension não é focado no combate. Nesse ponto, ele remete um pouco mais aos dois primeiros jogos, onde havia mais puzzles e exploração. Eu já comentei aqui antes que God of War III era muito rápido, te empurrando de deus para deus, sem muito espaço para “jogo” no meio.

Ascension corrige isso, trazendo maior variedade de cenários, mais puzzles e mais áreas de plataforma. Em outras palavras, tem mais gameplay, é mais jogo do que seu antecessor. É também mais ciente do que está acontecendo em outros gêneros e jogos de sucesso (lembra da referência a Bayonetta que fiz há pouco?).

Exemplo: não temos mais aquelas paredes que Kratos ia escalando com o uso de suas espadas. No lugar disso, temos beiradas luminosas, que Kratos usa para escalar paredes e montanhas, exatamente como em Uncharted. Aliás, há uma referência a Uncharted até mesmo em um dos troféus. Chega a ser curioso ver uma franquia que influenciou tanto o mundo dos games sendo influenciada por outros.

Temos até influência clara de jogos mais antigos (além do já citado Double Dragon). Por exemplo, nas fases em DELFOS (sim, nosso site influenciou tanto a Santa Monica que eles incluíram vários capítulos em nossa homenagem), você usa cobras enormes como forma de transporte. Jogadores da época do Nintendinho com certeza vão lembrar do clássico Battletoads.

Esses momentos de escalada e movimentação talvez sejam os melhores do jogo, especialmente pela sua beleza visual e sonora. E falando nisso…

HOLY FUCK! QUE JOGO LINDO!

Não deve ser surpresa para ninguém, mas God of War: Ascension é lindo demais. Seus cenários voltam a ser bem mais variados e coloridos novamente, com várias fases durante o dia, estátuas enormes (um dos melhores momentos, na estátua de Apolo, chega a ser inesquecível) e cenários extremamente detalhados. Os personagens estão tão perfeitos que, se não chega ao fotorrealismo, pelo menos parecem esculturas ou action figures.

A trilha sonora acompanha a qualidade. Além de alguns temas já conhecidos dos jogos anteriores, praticamente todas as novas músicas são épicas e marcantes, e algumas têm um delicioso tempero oriental ou africano. É muito legal estar em uma batalha barulhenta, porrando alguns monstros enormes, daí você finalmente os vence, a música dá um crescendo absurdo, e logo em seguida diminui, como se tivesse terminado naturalmente. A partir daí, fica um silêncio total, onde você ouve apenas o barulho do vento ou os cantos dos pássaros, pelo menos até a próxima batalha, quando a epicidade volta com tudo. Ascension é um deleite para os olhos e ouvidos, como sempre foi característico da série. Mas há um porém. Um grande porém.

BUGS

Infelizmente, a impressão que eu tive ao ver o tal patch de 100 mb se confirmou. God of War: Ascension é o jogo mais quebrado desde Assassin’s Creed III.

Alguns deles são apenas inconvenientes. O som, por exemplo, costuma sumir por um ou dois segundos de tempos em tempos. Outros são mais graves. God of War: Ascension travou três vezes no decorrer da minha campanha, e em todas elas, ao reiniciar, o PS3 acusou um erro grave e pediu para reconstruir o sistema de arquivos. E não parece que é coisa da máquina, pois isso aconteceu APENAS com ele, mesmo eu tendo jogado outros jogos neste período.

Também teve um momento, após receber o troféu “Round and Round”, que eu não conseguia avançar. Eu voltei, andei bastante sem saber o que fazer por todo o cenário liberado, até que desisti e fui ver online, e nos vídeos havia um sinal de que uma pilastra deveria ser derrubada. Porém, o sinal não aparecia no meu jogo, e não adiantava apertar R1 perto dela que nada acontecia. Também não adiantou reiniciar o videogame. Tive que voltar ao início do capítulo. Isso aconteceu depois de cerca de duas horas de jogo, e eu perdi cerca de uma hora refazendo a fase em questão, pois não só o capítulo é longo, isso acontece perto do final dele.

Também tem um momento próximo ao final do jogo, o “Trial of Archimedes”, que não é bem um bug, mas é uma parte bem mal planejada. Trata-se da tradicional “15 minute fight scene”, que sempre acontece perto do final de um God of War. Aqui são três grupos dos inimigos mais fortes do jogo que você tem que vencer, sem checkpoints ou recuperação de energia. O salto de dificuldade é absurdo.

Para você ter uma ideia, eu cheguei até aí sem absolutamente nenhuma dificuldade, e aí o negócio ficou tão frustrante que eu considerei parar de jogar. Acabei passando após três tentativas, mas estava realmente a ponto de desistir. Isso porque é uma luta que pode demorar mais de meia hora, e perder meia hora de jogo por causa de uma morte é algo que um adulto com outras obrigações não pode fazer. Checkpoints entre cada grupo resolveria, e aparentemente a Santa Monica está trabalhando num patch para isso, então eu até sugiro que você espere, caso também não possa gastar mais de uma hora da sua vida em um único checkpoint.

A questão no Trial of Archimedes não é nem a dificuldade, mas a punição para a morte, e a diferença em comparação ao resto do jogo. Inclusive, o chefe final, que vem logo em seguida, pareceu tão absurdamente fácil após este trecho que admito que até fiquei um pouco decepcionado.

MULTIPLAYER

Finalmente chegamos à principal parte do jogo, segundo a divulgação. E, infelizmente, ela também é quebrada. Para você ter uma ideia, fui testar o multiplayer no domingo à noite. Fiquei das 19 às 20h30 no matchmaking, e consegui jogar apenas três partidas.

Existem três modos de jogo competitivos. Deathmatch (para quatro ou oito jogadores), Team Deathmatch (para quatro ou oito jogadores e Capture The Flag. Ao selecionar um modo de jogo, ele começa a busca, e não demora para achar jogadores. Porém, o sistema parece ter algum problema que não permite que os jogos comecem. Ele enche a sala, divide os times e começa uma contagem de 30 segundos. E daí, no final da contagem, ele reseta tudo. Não é que perdeu a conexão, pois todos os jogadores continuam na sala, simplesmente parece que o jogo não consegue começar.

Depois de perder uns quarenta minutos tentando escolher um modo de jogo, e torcendo para ele começar, resolvi ir no Quick Match e ver se rolava. O mesmo erro voltou a acontecer, mas eventualmente, uns 15/20 minutos depois, uma partida começou. Dessa forma, consegui testar o Deathmatch e o Team Deathmatch, infelizmente apenas nas suas versões menores, para quatro jogadores. E devo dizer, me diverti bastante.

A maioria das lutas acontece em cenários clássicos da franquia, como o deserto das almas perdidas ou o labirinto de Dédalo, e o combate é bem diferente do single player, mas é igualmente brutal e emocionante. É divertidíssimo finalizar um jogador com um brutal kill e durante as lutas, armas, itens e baús vão aparecendo no cenário. Próximo ao final da partida, um inimigo grande também costuma aparecer. Nas minhas três partidas, eu vi um cérbero e um ciclope dando as caras, mas a partida terminou antes de nós conseguirmos matar eles. No entanto, eu consegui subir no Ciclope por alguns segundos e controlá-lo para fazer miséria com os outros jogadores. Rá, Corrales esmaga homenzinhos!

Há também um modo cooperativo, onde dois jogadores se aliam em uma batalha com limite de tempo para ver quantos monstros conseguem matar. Este modo funciona perfeitamente, e eu consegui iniciar uma partida em poucos minutos sempre que tentei, mas achei muito menos divertido do que os mata-matas.

Infelizmente, por causa desse problema no sistema do jogo, não consegui testar o Capture the Flag até o encerramento desse texto, e também não cheguei a jogar em alguns dos mapas mais hypeados pela Sony (o mapa é escolhido aleatoriamente), como aquele que tem um titã ao fundo.

Em geral, quando funciona, gostei bastante do multiplayer. Espero que seja lá qual for o problema que impede as partidas de começarem seja resolvido logo, pois eu estou bem animado para sapatear na cabeça de outros jogadores. O triste é ver que o foco da Santa Monica foi totalmente para o multiplayer (como fica claro nos vídeos de making of que acompanham o jogo), e mesmo assim eles deixaram um problema tão grande passar.

CONCLUSÃO

God of War: Ascension traz bastante coisa nova para a série, mas nem todas as novidades são boas. A maior variação de gameplay e cenários é bem vinda, mas a reciclagem de golpes das armas antigas dá sensação de falta de criatividade e de esgotamento da franquia.

O multiplayer, por outro lado, é muito legal, mas tem algum problema sério que o impede de funcionar. No quesito mitológico, os dois primeiros ainda têm o clima mais correto para a mitologia grega, o que dá a sensação de que os dois primeiros diretores (David Jaffe e Cory Barlog, respectivamente) realmente gostavam do assunto, enquanto para os outros é apenas um trabalho.

A história é a mais fraca da série, até porque os personagens que aparecem aqui são a raspa do tacho da mitologia grega. Afinal, o Kratos já fez a rapa em todo o resto. Ainda assim, o jogo ainda é bastante divertido. É daqueles que você não quer que acabe e, quando termina, já tem vontade de começar de novo. Embora esteja longe de ser meu jogo de PS3 preferido, acredito que vai ser um dos que eu vou jogar mais vezes. E, se você é fã da franquia, provavelmente também vai.

CURIOSIDADES

God of War: Ascension está disponível no Brasil por R$150,00, mas em algumas lojas, se você pagar por boleto, pode sair o mesmo preço dos States. Aproveite e compre aqui.

– Há dublagem e legendas em português brasileiro no jogo, mas não posso falar sobre a qualidade de tradução e atuação delas, pois preferi jogar em inglês mesmo.

– Pela primeira vez na série, não há aqui um minigame sexual.

– O demo liberado na PSN deve ter uns 15 a 20% do jogo, então se você já resolveu comprar, evite-o para ter mais surpresas no seu brinquedo novo.

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