Ao longo dos últimos meses, eu fui aos poucos jogando todos os Doom clássicos. Comecei com Doom 64, que veio de brinde junto com a nossa cópia de review de Doom Eternal. Em uma promoção da Xbox Live, peguei os outros três: Doom, Doom II e Doom 3. Eu já achei que eles tinham um ótimo preço cheio, e na promoção que peguei, faturei toda a coleção por cerca de 10 reais. Foi um ótimo negócio, pois já há um bom tempo queria jogar todos esses jogos.
Na minha infância/adolescência, quando Doom saiu para PCs, eu os joguei bastante, mas nunca cheguei ao fim. Sempre tive a impressão que eles eram longos e difíceis demais. Com os ports mais recentes, minha ideia era jogar coop de sofá com um amigo, mas a pandemia impediu esse encontro de acontecer. Eu acabei jogando sozinho, e a sensação de jogá-los depois de adulto é muito diferente da que tinha antes. Hoje vou elaborar isso.
ÓTIMOS PORTS DOS DOOM CLÁSSICOS
Antes de começar a falar sobre os jogos individuais, gostaria de elogiar o excelente trabalho de ports feitos pela Nerve Software em Doom e Doom II. Aparentemente, quando os ports saíram, eles precisavam melhorar muito. Quando eu comprei, um tempo depois, já achei o trabalho excelente. Dava para ativar os cheats pelo menu, seleção de fases liberada desde o início, e tinha a possibilidade de baixar mods/add-ons curados – o que na prática aumenta cada jogo de 30 fases para centenas.
Um desses mods disponíveis gratuitamente, Rekkr, é praticamente um novo jogo, com gráficos, inimigos e armas diferentes. São cerca de 40 fases inéditas, em uma ambientação viking. Eu ainda não joguei esse mod, mas pretendo fazê-lo um dia.
Entre a compra e eu de fato pegá-los para jogar, eles melhoraram ainda mais, com suporte a widescreen e outros mimos. Hoje, eu diria que os dois Doom mais clássicos estão perto da perfeição. A única coisa que falta neles, de verdade, é a possibilidade de jogar online, uma omissão considerável, uma vez que os originais estiveram entre os primeiros a suportar uma campanha cooperativa inteira através da internet.
OS PORTS DE DOOM 64 E DOOM 3
Doom 64 me pareceu mais básico. Ele traz fases extras, e através de passwords, dá para liberar um menu de cheats. Mas eu diria que ele me impressionou menos do que os dois primeiros, até porque o jogo é inferior, mas falaremos disso mais para frente.
Por fim, Doom 3 é literalmente só um port da versão BFG lançada para Xbox 360/PS3. Tem a possibilidade de usar a lanterna a qualquer momento, tem um ou dois autosaves em cada fase, e roda a 4K/60fps (o que é ótimo). Porém, não tem nem o mais básico dos mimos, como uma seleção de fases. É curioso que seja a adaptação mais simples dentre as quatro.
Agora vamos falar de cada um dos jogos, um a um, e das minhas experiências com eles.
DOOM E EU
Eu comecei a curtir Doom com a versão capada lançada para 32X (tinha menos fases, não tinha saves, e gráficos e sons eram bem inferiores ao original). Justamente por ele não ter saves, eu nunca consegui terminá-lo lá. Joguei pra caramba, mas perder uma vida significava perder todas as armas, o que literalmente tornava impossível continuar. Ah, e eu tinha muito medo do jogo.
Quando tive acesso aos jogos no PC, também os joguei bastante. Joguei mais Doom II. Cheguei a jogar via internet com um amigo ao longo de muitos dias, mas nunca chegamos de fato ao final da campanha. Eu tinha a sensação que ela não terminava nunca.
DOOM (1993)
Jogar Doom em 2020, na versão de Xbox One, foi um enorme prazer. Hoje ele não me dá medo, e eu o vejo muito mais como uma homenagem a capas de heavy metal do que como uma experiência de terror. O gameplay é simplesmente uma delícia. A combinação do seu visual pixelado, da violência e do excelente design de som dão ao gameplay uma literal crocância que poucos games possuem. Usar a escopeta para matar Pinkys e Imps é uma sensação única.
E o level design, meu amigo! Isso era algo que me incomodava na infância. Admito que agora, macaco velho, eu cheguei a buscar algumas soluções na internet (o que não era fácil nos anos 90), mas o primeiro Doom é bem mais direto do que o segundo. Em geral, eu conseguia passar pelas fases sem nem precisar abrir o mapa.
Também gosto muito da sua estrutura. Doom originalmente foi lançado via shareware, com o primeiro episódio grátis (cada episódio tem oito fases e uma secreta) e dois a serem vendidos separadamente. Nesta versão mais nova, ele traz também o quarto episódio, que originalmente saiu em Ultimate Doom (os dois episódios enormes de Final Doom também estão disponíveis gratuitamente via mods/add-ons).
DOOM É O JOGO MENOS CANSATIVO E DINÂMICO DA SÉRIE
Eu acho isso perfeito, pois faz com que Doom/Ultimate Doom seja, na prática, quatro jogos menores e quase independentes. Nessa minha campanha em 2020, eu jogava um episódio até o fim, terminava, e voltava outro dia para o próximo. Dividir o jogo em partes de oito/nove fases aumenta a sensação de progresso, até porque os oito capítulos são mostrados em um mapinha entre fases que mostra quanto falta para acabar. Isso evita aquela frustração que do segundo jogo, com suas mais de 30 fases, quando eu sentia que o jogo não avançava, e parecia não acabar nunca.
Depois de jogar os quatro episódios padrão, ainda baixei e joguei o add-on Sigil. Esse mod foi feito em 2019 por John Romero, um dos criadores do Doom, e serve como um intermediário entre Doom e Doom II. E é excelente, de fato parecendo um episódio perdido do primeiro jogo.
Com essa nova jogada do início ao fim do primeiro Doom, ele se tornou meu preferido da série clássica, passando o Doom 3, que ocupou esse espaço desde 2004.
DOOM II – HELL ON EARTH (1994)
Daí veio Doom II. Ele é muito parecido com o primeiro. Traz os mesmos gráficos, inimigos e armas. Tem uns meliantes novos e a única adição ao arsenal é uma extremamente clássica: a poderosíssima Super Shotgun.
A Super Shotgun torna o combate ainda melhor. Isso porque ela mata quase todos os inimigos com apenas um tiro se você estiver pertinho deles. Pinkys, Imps e vários outros são simplesmente estilhaçados por ela à queima roupa. As exceções são os mais poderosos, como os Barons of Hell, contra quem você normalmente não usaria a escopeta mesmo.
Onde o jogo mais mudou foi no level design. Se o original me surpreendeu por quão diretas são suas fases, Doom II ressuscitou minhas memórias mais fortes dos jogos clássicos, em que eu ficava perdido, sem saber para onde ir. Coisas que originalmente eram segredos, como paredes “ativáveis” que se abriam liberando novas áreas, aqui são parte da progressão normal da fase. E se não tem absolutamente nada que diferencia aquele pedaço da parede do resto, por que você ativaria ela?
Além disso, Doom II investe mais em uma mecânica que eu acho chatinha: os botões que afetam um pedaço da fase por alguns segundos. No primeiro, a maioria dos botões, ao serem apertados, mudam a fase permanentemente, permitindo exploração com calma. No segundo, você precisa apertar e descobrir o que ele modificou – e chegar até lá – antes de ele desativar. Isso é especialmente grave na área da Terra (mapas 12 a 20), onde o level design fica demasiado complicado e obtuso.
Some isso ao fato de que ele tem trinta fases seguidas, sem divisão por episódios clara ou qualquer mapinha de progressão, e ele se torna um jogo bem mais cansativo do que o original. Ele até tem capítulos no espaço, na Terra e no Inferno, mas não são claramente divididos como o primeiro.
NO REST FOR THE LIVING (2010)
Assim como o primeiro com Sigil, Doom II tem um add-on mais oficial. Chamado No Rest For the Living, trata-se de um episódio de oito fases e uma secreta, criado pela Nerve Software em 2010, para o lançamento do jogo no Xbox 360.
Ao contrário de Sigil, eu não gostei dele. Ele se aproveita do fato de ter sido feito para versões mais modernas do jogo para fazer coisas que originalmente não eram possíveis. Isso se reflete, especialmente, na quantidade de inimigos. Os mapas de No Rest For The Living colocam o jogador contra exércitos de centenas de demônios AO MESMO TEMPO.
Por um lado, isso o aproxima de jogos bacanas, como Serious Sam. Por outro, a jogabilidade de Doom II não foi criada para isso. Suas armas não são apropriadas contra exércitos, então ocasionalmente você fica sem munição e se vê obrigado a fugir. Simplesmente não combina.
DOOM 64 (1997)
Doom 64 foi desenvolvido pela Midway exclusivamente para o Nintendo 64. É a ovelha negra da série, e o mais diferente de todos. Doom 64 assumiu de vez o terror. As músicas são todas lentas e atmosféricas, e os gráficos foram refeitos.
O jogo é mais escuro, mais difícil, e o gameplay é bem mais lento e focado em puzzles e segredos. Se eu já acho os level designs de Doom II obtusos, aqui a coisa é ainda mais absurda. Eu precisava de guias para praticamente todas as fases, e foi o único da série que eu senti necessidade de ativar invencibilidade nos cheats para conseguir terminar.
Isso não significa que ele seja ruim, mas é bem diferente. Se Doom e Doom II são um álbum do Iron Maiden, Doom 64 é o filme O Exorcista. Eu gostei de ter jogado, mas foi o que menos me divertiu. Ele traz alguns pontos de história e de gameplay que seriam aproveitados posteriormente, em especial em Doom Eternal. Isso mostra que, apesar de ser quase sempre esquecido, ele é considerado pelos criadores parte da lore oficial de Doom.
O fato de ter sido o primeiro dos quatro que eu joguei em 2020 me desanimou para o que tinha pela frente. Para você ter uma ideia, eu joguei Doom 64 ao longo de alguns meses, uma ou duas fases por vez. Já Doom e Doom II eu joguei do início ao fim em cerca de uma semana cada um. Eles simplesmente me divertiram mais.
DOOM 3 (2004)
Aqui a franquia evoluiu de forma que, na época do lançamento, me pareceu natural, mas hoje vejo que Doom 3 é o mais diferente dos seis jogos lançados até o momento.
Doom 3 é um jogo de ação/terror linear com foco na história. Suas fases são basicamente compostas de sequências de corredores cheios de inimigos. Ele tem uma atmosfera caprichada e um clima de terror denso que dá medo até hoje, embora ele tenha ação com mais frequência do que a maioria dos jogos do gênero.
Quando foi lançado, em 2004 – e devidamente resenhado no DELFOS – Doom 3 exigia computadores ridiculamente parrudos. Lembro de, quando tentei rodá-lo na época, ele ser praticamente um slideshow, com cerca de um frame a cada dois segundos. Eu só consegui de fato jogá-lo depois de um senhor upgrade em processador e placa de vídeo.
E daí fiquei incomodado com quão absurdamente escuro ele era. E isso me incomoda até hoje. Originalmente, o jogo foi tunado para ser todo preto. Só era possível enxergar com a lanterna. E, para ativar a lanterna, você precisava guardar sua arma. Ou seja, ou você atacava ou enxergava.
Isso fez com que logo tenha surgido um mod que permitia ativar a lanterninha permanentemente, independente da arma equipada. E foi assim que eu o joguei em 2004. Pode me chamar de estranho, mas eu gosto de enxergar os meus jogos. Especialmente se eu gastei um dinheirão num novo computador para jogá-lo.
Esse aspecto da lanterna foi mexido quando do lançamento da BFG Edition em 2012, a mesma edição disponível para Xbox One/PS4/Switch. Agora dava para ativar a lanterna a qualquer momento, mas ela tinha uma bateria de curta duração. Assim, você precisava apagá-la de vez em quando para que ela recarregasse.
A influência de Doom 3 na indústria e nos jogos de terror foi enorme. Jogos ótimos e de sucesso, como Dead Space, são praticamente covers dele, tanto em level design e visual, quanto na própria temática e ambientação.
DOOM 3 EM 2021
Eu estava bem empolgado para jogar Doom 3 novamente. Inclusive, foi o primeiro game que joguei do início ao fim em 2021. Lembro de, quando o joguei em 2013, ter achado que ele envelheceu muito bem, e continuava um jogo impressionante e bonito.
Em 2021, os gráficos já mostram sinais de envelhecimento, mas ele ainda é muito bem feito e impressiona em vários aspectos. Ele também ainda é muito escuro. Para você ter uma ideia, eu aumentei o brilho no máximo que ele permitia e ainda tive que ajustar minha TV para torná-lo aceitável. E mesmo assim, tinha vários momentos em que a imagem ficava totalmente preta.
Depois de jogar os antigões, o gameplay já não me pareceu tão gostoso. Ele carece da crocância de Doom e Doom II, até porque aqui a ideia é gerar medo, não empolgação.
Eu também o achei longo demais. Eu passei pelas 27 fases da campanha principal em 11 horas (e fiquei chateado porque tem um troféu para terminar em menos de dez horas). Então não é assim tão longo. Porém, são fases demais, com muito pouca variação de cenário. A coisa se torna cansativa.
As fases do Inferno e as cavernas no fim do jogo são variações bem-vindas, mas são cerca de quatro fases entre 27 que são praticamente iguais. Nesta jogada em 2021, o jogo me empolgou muito no início, graças ao fantástico build up no início da campanha, mas foi esfriando consideravelmente. Depois de cerca de cinco horas, já estava pronto para que ele acabasse.
O DLC Resurrection of Evil, incluído nessa versão, tem um timing melhor, com maior variação de fases em bem menos tempo.
De qualquer forma, o jogo é ótimo, ainda que fique mais saboroso sendo jogado algumas fases por vez. Doom 3 é, em 2021, o meu segundo Doom clássico preferido.
MEU RANKING DE DOOM
E já que falei isso, termino aqui com meu ranking de Dooms clássicos:
4 – Doom 64
3 – Doom II
2 – Doom 3
1 – Doom (1993)
Dito isso, todos valem muito a pena. Doom é uma franquia importantíssima na evolução dos jogos de ação em primeira pessoa. Eu os considero jogos essenciais para qualquer um que curta o gênero, e por isso mesmo não ter jogado os dois primeiros até o fim sempre foi uma mancha no meu currículo. Essa mancha agora foi apagada. Mais algumas estrelinhas douradas e eu já posso solicitar minha carteirinha gamer.
Todos os Doom analisados aqui estão disponíveis para Xbox One (roda no Series), PS4 (roda no PS5) e Switch.
A série “… de cabeça fria” envolve voltarmos a vivenciar algo antigo e que às vezes até já resenhamos aqui no DELFOS com a cabeça fria e com nossas experiências atuais. Se você gostou, mostre pra gente fazendo comentários e compartilhando, pois nos esforçaremos para fazer muitas outras.
MAIS DA SÉRIE “… DE CABEÇA FRIA”:
- God of War de cabeça fria
- The Turn of the Lights de cabeça fria
- Dead Space de cabeça fria
- Devil May Cry de cabeça fria
- Castlevania: Lords of Shadow de cabeça fria
- Vanquish de cabeça fria: um dos melhores jogos de tiro
- Bayonetta de cabeça fria: bringing sexy back
- Super Mario Galaxy de cabeça fria: que maravilha de jogo!
- Super Mario 64 de cabeça fria: a definição de valor histórico
- Super Mario Sunshine de cabeça fria: até o jogo ruim do Mario é tremendão!
- Super Mario Odyssey de cabeça fria: o melhor dos melhores
- Double Dragon Neon de cabeça fria: batendo cabeça e batendo em cabeças!
MAIS SOBRE DOOM:
Análise Doom Eternal: The Ancient Gods – Part One, o DLC de história