Quanto maior a expectativa, maior a queda. E, estimado leitor, minhas expectativas para Tunic eram altíssimas. Meses atrás, eu joguei a demo e amei. Tipo muitão, manja? Já na demo, percebi que a dificuldade poderia vir a ser um problema, já que ele já demonstrava seguir a pentelha moda do “quanto mais difícil melhor”. Mas ainda queria jogar. Meninos, eu vi. Ou melhor, eu joguei. E agora vou te contar tudo na minha análise Tunic.

ANÁLISE TUNIC

Tunic causa uma excelente primeira impressão. O visual, as músicas, as animações e os controles beiram a perfeição. A coisa é tão boa, e tão fofa, que parece obra da Nintendo. Digo mais, ele lembra muito especificamente o remake de Link’s Awakening.

Análise Tunic, Tunic, Finji, Delfos
Coisa mais linda, né? Parece um diorama.

Aliás, Tunic já seria impressionante se fosse um jogo da Nintendo. Saber que foi feito quase em sua totalidade por uma única pessoa, Andrew Shouldice, deixa difícil não admirar as habilidades dele. A única coisa negativa da parte técnica é que o personagem se movimenta mais rápido do que a câmera, chegando inclusive a sair da tela ocasionalmente. Era um problema comum no passado dos games, que não costuma mais rolar hoje, mas felizmente é a única falta de polimento que eu reparei aqui.

A coisa é tão bonita, e a animação da raposinha é tão fofinha, que você vai passar seus primeiros minutos com Tunic com um sorrisão no rosto. Até mesmo quando descobri que seu primeiro objetivo é tocar dois sinos em cantos opostos do mundo, eu optei por não deixar o fato de ser ABSOLUTAMENTE A MESMA COISA QUE DARK SOULS me desanimar.

ACESSIBILIDADE

Outra coisa que ajudou ainda mais na primeira impressão do jogo final é que ele traz algo que nenhum outro clone de Dark Souls traz: opções de acessibilidade. Todos esses jogos copiam a dificuldade alta e fazem questão de elitizar a experiência – “só quem é bom o suficiente para o meu jogo pode se divertir com ele”. Tunic é difícil pra caramba. Muito mais do que Dark Souls, inclusive. Mas ele traz essa opção que muda tudo.

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No Fail Mode, meu camaradinha!

Nosso colega Andrew não quis usar recursos para tunar outras dificuldades. Ele queria um jogo difícil como o inferno e fez isso. Mas sabendo que isso faria com que a maior parte das pessoas não conseguisse jogar, colocou esse comprometimento de “desligar a morte”. Eu sinceramente preferia opções de dificuldade tradicionais, mas dar opção de “desligar a morte” é algo que não dá trabalho nenhum para o desenvolvedor. E, para ser sincero, é absolutamente o único motivo pelo qual Tunic não levou um zero redondo.

Eu amei o demo, e antecipei que a dificuldade estragaria o jogo para mim. Ao saber que ele tinha um “No Fail Mode“, deu uma senhora animada. Finalmente ia poder jogar um soulsborne podendo curtir absolutamente tudo que adoro no gênero, sem me preocupar em ficar morrendo repetidas vezes. Você sabe, esses jogos são muito mais do que APENAS a dificuldade, embora os fãs e os próprios devs achem que tudo se resuma a ela. Mas não deu, cara. Jogar Tunic foi um suplício.

ANÁLISE TUNIC: VOLTANDO A SER CRIANÇA

Antes de começar a listar os problemas, vou falar de algo que originalmente gostei. Tunic tenta restaurar a sensação de uma infância nos anos 90, em que pegávamos os manuais importados, pirávamos nas figuras, mas só entendíamos algumas palavras do texto. Assim:

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Uma página do manual de Tunic representa como as crianças não estadunidenses ou japonesas dos anos 90 enxergavam os manuais de Super NES.

É charmoso, né? As páginas do manual são colecionáveis no jogo, e fazem o papel de tutoriais não muito claros. Mas olhe a figura acima com atenção e você conseguirá ver coisas como o caminho para os dois sinos. Eu joguei toda a primeira metade do jogo – a parte dos sinos – meio perdido, mas sem olhar guias, confiando na minha intuição e no que conseguia entender do manual. Coleguinha, foi legal, sabe? Dava uma experiência diferente, em um jogo que não apresenta nada de novo que Dark SoulsZelda não tenham feito antes.

Mas depois dos sinos, travei feio. Aliás, antes disso teria parado de jogar, se não fosse possível desligar a morte. Quando cheguei no chefe do segundo sino, meus ataques quase não tiravam vida dele. Eu sinceramente só passei porque desliguei a morte e fiquei martelando o botão por uns dez minutos até ele cair. Daí travei, e fui procurar um guia lá nas internets.

O GUIA DAS INTERNETS

Assisti a um vídeo que mostrava para onde ir depois dos sinos, e daí vi que o jogador em questão conseguia subir de nível nos altares/fogueiras. Fiquei “como diabos ele faz isso? A única interação possível com o altar é apertar o A para salvar!”. Uma das páginas do manual que encontrei dizia que os dentes aumentam ataque, a estátua de raposinha aumenta a defesa, etc. Eu tinha um montão deles no inventário, e achava que simplesmente carregá-los subiria meu nível.

Quando vi o vídeo, eu sinceramente tive que fazer uma busca por “como subir de nível em Tunic“, acredita? Sabe como? Apertando LB na frente do save. Você se aproxima do save e aparece um A enorme, então é a única coisa que você pensa em apertar. E eu joguei metade do jogo no nível inicial por causa disso – só conseguindo avançar por causa do “no fail” e de muita paciência para matar inimigos quase imortais.

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E aí, o que você responde? Tunic é extremamente obtuso!

E foi assim que o que estava gostando de Tunic, o fato de ele te guiar de forma sutil, se tornou raiva. A partir daí, eu passei a empacar a cada objetivo, só conseguindo avançar pela perigosa combinação de guias de internet e de no fail mode.

SUBIR DE NÍVEL MELHOROU? PIOR QUE NÃO!

Eu já joguei muito game nessa vida, e acho que você também. Mas sinceramente não me lembro de nenhum outro jogo em que cheguei até a metade dele sem sequer saber da possibilidade de subir de nível, ou como fazê-lo. E sim, a natureza de como Tunic ensina, com manuais entrópicos que devem ser coletados antes de consultados, pode muito bem significar que esse tutorial estava em uma página que não encontrei. Ou que não consegui interpretar. Mas é um grande erro uma mecânica tão essencial para progredir estar escondida e você precisar do monstro Google para descobrir.

Por que não, ao se aproximar do altar, mostrar o prompt de A e de LB? Assim o jogador saberia que pode apertar os dois e ver o que acontece com cada um. O fato de ter gente fazendo essa busca, a ponto de que há dezenas de matérias ensinando, mostra que não foi um problema que rolou só comigo. A essa altura eu já estava de saco cheio de vários truquinhos que Tunic não parava de repetir. Por exemplo isso.

KD EU?

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Tá vendo a sombra da raposinha? Continue lendo.

Tá vendo a sombra da raposinha? Tem uma escada invisível na frente dela. Isso aparece quando você entra numa passagem obstruída pela câmera. Outros jogos parecidos, como Death’s Door, giram a câmera para mostrar o que você encontrou, e usam isso para esconder segredos. Tunic é mais obtuso. Ele esconde o caminho da história nessas passagens.

Isso já é ruim, semelhante aos chãos que você tem que bombardear em Super Metroid por adivinhação. Aqui, uma vez que você encontra a passagem, não significa que você achou o segredo. Como não dá para ver o caminho, você vai tateando a parede em todas as direções para encontrar onde é possível avançar. No caso da imagem acima, há uma escada em algum ponto da passagem. Você precisa adivinhar isso, adivinhar onde ela está, andar até lá e apertar A para interagir e subir a escada. Só assim você avança a história. Meu amigo, existe obtuso, e existe Tunic. Fala sério!

NOSSA ANÁLISE TUNIC NÃO É OBTUSA, É DIRETA!

E isso enche o saco porque não é uma ou duas vezes que acontece. Sem exagerar, 20% do caminho vital da campanha, você vai fazer atrás de uma parede. A insistência nisso já estava me irritando quando eu sabia para onde ir. Quando comecei a usar guias para encontrar essas passagens secretas necessárias, eu sinceramente já estava a fim de parar de jogar. Mas continuei. Por você. Perdi o meu tempo para poupar o seu. Sim, pode me agradecer assinando o DELFOS no Padrim.

Tem muitos jogos com sérios problemas técnicos. Games que seriam legais, mas que os desenvolvedores não tiveram o talento, o tempo ou o orçamento necessário para fazê-los apropriadamente. Não é o caso de Tunic. Este é um jogo lindo e tecnicamente perfeito, que claramente foi feito com muito carinho. Ele é como deseja ser, é plenamente realizado. Mas suas decisões criativas atrapalham a experiência a ponto de querer desistir de jogar mesmo desligando a morte.

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Mas Tunic é lindo demais! Olha essa iluminação!

Quer outro exemplo de decisão tosca? Tunic usa o estilo de Dark Souls, de você ter poções de cura que são recarregadas no checkpoint. Até aí tudo bem. Porém, no último terço do jogo, os ataques dos inimigos – e inclua aí o último chefe – não tiram vida. Eles DIMINUEM A SUA FUCKIN’ BARRA DE VIDA! Ou seja, você continua com a barra cheia, mas ela vai ficando cada vez menor, tornando sua poção inútil. Daí, quando a vida chega no ponto mínimo, ativa a famigerada “tela vermelha da quase morte”. E se você estiver com o modo no fail ligado, não vai morrer. Mas vai ter que aguentar a tela piscando em vermelho até achar um save – o que, na tradição From Software, pode demorar MUITO!

DESLIGANDO A MORTE DA ANÁLISE TUNIC

Simplesmente não dá! Jogos como Elden Ring, ReturnalSifu seriam sensacionais simplesmente se tivessem a opção de “desligar a morte” e não mudassem mais nada. Tunic parecia ser o mesmo caso. Porém, ele toma tantas decisões criativas erradas que chega a dar pena. Não é simplesmente o ingrediente especial do chef José Marques. O jogo é inteiro o ingrediente especial, mas em uma embalagem bonitinha. Ora, com gráficos e personagens tão bonitos quanto esses, fazer você ficar boa parte do jogo vendo uma sombra e sem enxergar o caminho não é simplesmente errado: é injustificável.

O curioso é que o jogo está com uma excelente média no Metacritic. Sinceramente me dá a sensação de que os críticos jogaram a primeira hora do jogo, e com isso se limitaram às impressões iniciais – que são ótimas mesmo.

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Tunic está no Gamepass. E, embora eu DE FORMA ALGUMA recomende que você compre, se tem acesso ao serviço, vale jogar. A primeira impressão é tão boa que provavelmente você vai se divertir pelo menos no início da campanha. E, quando ficar chato, pode apenas parar. Afinal, não estará jogando a trabalho. Mas ei, volta aqui para me contar o que achou. Faz tempo que ninguém me manda ouvir pagode!