Dark Souls com samurais. Assim era descrito o primeiro Nioh antes de seu lançamento. E, de fato, o jogo seguia todas as regras de level design do clássico da From Software. Mas o combate? Meu amigo, essa é a diferença entre influência e cópia. As batalhas de Nioh seriam diferentes se Souls não existisse, mas eles sem dúvida criaram algo novo. E agora chegou a hora da nossa análise Nioh 2, uma continuação mais do mesmo, mas que mantém a majestade.
ANÁLISE NIOH 2
Se você jogou Nioh, a lista de novidades é bem pequena. Os gráficos são praticamente iguais, a jogabilidade idem. Tem alguns novos tipos de armas, e uma nova habilidade chamada Burst Counter. Esta é um contra-ataque utilizado para se defender de movimentos inimigos telegrafados com um brilho vermelho. Quando usada apropriadamente, deixa o meliante vulnerável. É útil, mas não diria que é um game changer.
Talvez a principal novidade seja o fato de que o protagonista é meio yokai. Isso possibilita uma espécie de modo berserk, em que você vira um monstro invencível por alguns segundos. É uma ótima apelação para tirar os últimos pontos de vida dos chefes mais difíceis.
Outra novidade que vem com isso é que você pode absorver habilidades de todos os inimigos quando eles dropam algo chamado soul core. Algumas dessas habilidades são extremamente poderosas e também ajudam bastante nas lutas mais cascudas. Mas antes de falar da dificuldade, vamos voltar ao básico.
NIOH 2: O BÁSICO
Quase tudo que você espera de um clone de Dark Souls está em Nioh 2. As fases são enormes e cheias de atalhos. Os checkpoints são altares, onde você pode fazer upgrades e recuperar seus recursos, mas eles ressuscitam os inimigos genéricos. Morrer dropa sua amrita (almas/XP) e você deve voltar ao lugar de sua morte para recuperá-la. Atacar diminui uma barra que se recupera em alguns segundos, o que significa que você não pode sair atacando feito um doido. E aí chegamos às diferenças.
Acontece que a barra de ki, o equivalente em Nioh à stamina de Souls, fica branca por alguns segundos antes de ser consumida. Aperte R1 no momento apropriado, e você a recupera. Assim, com timing e habilidade, é possível atacar bastante antes de “cansar” e precisar se recuperar. Porém, se sua barra de ki esvaziar, você ficará imóvel por alguns segundos. O lado bom é que o mesmo vale para seus inimigos.
COMBATE ÚNICO
Pode parecer algo pequeno, mas isso faz toda a diferença. Dark Souls tem um combate cadenciado, do tipo ataque e se afaste. Nioh é extremamente rápido e agressivo. Mais até do que Bloodborne. Outra diferença são as posturas. Cada arma tem três formas de ataque, com combos e golpes específicos: baixa, média e alta.
Elas funcionam sempre da mesma forma. A postura baixa é rápida e fraca. A alta é forte e lenta. A média é, veja só, equilibrada. Daí cada arma funciona diferente. Duas espadas, por exemplo, são armas rápidas e fracas, o que significa que é bastante viável usar a postura alta. Já um machadão é lento e forte, o que torna a postura alta perigosa demais, apesar do dano considerável. Isso tudo torna o combate de Nioh único. Mais do que isso, ele é simplesmente fantástico. A Team Ninja sempre mandou bem no combate, de Ninja Gaiden a Dead or Alive, mas Nioh realmente merece estar entre os melhores.
Outra diferença enorme entre este e sua fonte de inspiração é que Nioh 2, assim como o primeiro, é um jogo de fases. Você literalmente escolhe cada capítulo no mapa. As fases em si são enormes e labirínticas. Mas são totalmente independentes umas das outras. Na verdade, considerando quão intricadas elas são, isso acaba servindo como um ponto fraco do jogo, mesmo eu sendo um grande fã do modelo de fases.
Isso porque dá um enorme trabalho abrir todos os atalhos e “resolver” cada uma das fases. Porém, assim que você mata o chefe e volta para o mapa, se entrar de novo na fase, ela estará totalmente fechada. Em Dark Souls, você sabe, uma vez que os caminhos sejam abertos, eles continuam abertos para sempre. Isso me deixa bastante desanimado para revisitar as fases, mesmo que Nioh 2 seja claramente pensado para ser jogado repetidas vezes.
UM SÉRIO PROBLEMA DE SIDEMISSIONS
Isso nos leva ao principal problema de Nioh 2: a quantidade de sidemissions ou, como ele chama, sub missions. Ao terminar cada fase, de três a cinco sub missões serão abertas. Nioh 2 tem 20 fases de história, mas tem 53 – cincöenta e fuckin‘ três – sub missões. É um absurdo. E o que torna isso realmente grave é que elas não são opcionais: o jogo espera que você faça todas para estar no nível apropriado exigido por cada missão de história.
Nota: originalmente as fases erroneamente demonstravam ser de um nível mais baixo, o que dava a impressão de você eventualmente ficar overleveled. Isso foi corrigido em um patch e atualmente, mesmo fazendo todas as sub missões, eu entrei em algumas fases com nível abaixo do recomendado.
O que torna as sub missões tão pentelhas é que elas são muito repetitivas. Em geral, elas envolvem simplesmente um repeteco de missões de história. Você entra e sai em pontos diferentes do mapa, mas o cenário é o mesmo. Ou seja, são totalmente desnecessárias, servindo apenas para prolongar o tempo de um jogo já bastante longo. Algumas chegam a repetir até mesmo mapas e chefes que estavam no primeiro jogo.
Algumas outras submissões são apenas duelos contra outros samurais ou repetecos de chefes. Outras, ainda, são apenas uma sequência de arenas de combate. Essas funcionam melhor, pois são mais rápidas e dão menos “trabalho”. Essas arenas de combate também são especialmente divertidas caso você esteja jogando multiplayer.
É PERIGOSO IR SOZINHO
O multiplayer é outra coisa que foi incrivelmente melhorada em relação a Dark Souls. Sempre que você estiver em um altar, pode oferecer até dois copos para chamar dois jogadores para te ajudar. Em Dark Souls, você chama um jogador específico que colocou um sinal na fase em que você está, o que gera muitos erros de conexão. Aqui quem estiver a fim de ajudar alguém em sua campanha pode apenas clicar em random encounters e esperar ser conectado.
O lado ruim é que é muito mais fácil conseguir ajuda nas primeiras fases do que nas últimas. Isso porque você só pode ajudar em uma fase pela qual já tenha passado. Nioh 2 é difícil e punitivo, então muita gente fica pelo caminho. Isso torna bastante difícil conseguir uma ajuda online perto do final do jogo.
Felizmente, além desse auxílio “ao vivo”, todo mundo pode colocar “discípulos” pelo cenário. Estes são representados por túmulos azuis, que podem ser revividos com uma oferta de dois a cinco copos. Estes fantasmas vêm com o mesmo equipamento do jogador que os deixou, e traz benefícios a eles. No seu jogo, eles são controlados pela IA. Apesar de serem mais “caros” e menos úteis do que um jogador real, ajudam bastante na impossibilidade destes. Simplesmente ter um outro alvo para os chefes é uma tremenda colher de chá, tornando mais fácil recuar e se curar, antes de voltar à ofensiva.
NPCS
Tem também uma grande quantidade de momentos de história em que você é acompanhado por um NPC, que dá a mesma ajuda. São pontos específicos, mas na prática é uma ajuda de graça. Felizmente, apesar de você ter que pagar com copos para ter a ajuda dos discípulos, os copos são bastante comuns. Sempre que um jogador morre, um túmulo vermelho fica no ponto da sua morte. Você pode invocar estes fantasmas e, ao vencê-los – o que não é muito difícil – pode ganhar até três copos. Assim, durante toda minha campanha, eu usei os copos tranquilamente, sem medo de ficar sem, ao contrário do que costuma acontecer com Dark Souls, em que chamar ajuda é caríssimo.
O lado ruim é que, igual a Souls, se sua visita morrer, ela não volta mais. E se o host morrer, a visita falha também, e ambos são separados. Isso é bem frustrante. Afinal, é comum você ficar um bom tempo esperando receber dois visitantes, morrer no chefe por uma bobeirinha e ficar novamente sozinho – e sem os copos. Uma opção para tentar de novo com os mesmos parceiros seria muito bem vinda.
Uma última forma de multiplayer envolve fases à la carte, onde você é juntado com outros dois samurais para vencer uma missão ou sub missão juntos, desde o início. Este modo de jogo é totalmente diferente. Todos os jogadores têm as mesmas possibilidades (na campanha, apenas o host pode abrir portas e baús) e, principalmente, é possível reviver os coleguinhas. Isso torna um jogo difícil e punitivo bem mais agradável e divertido. Há uma barra de vida, que é diminuída sempre que alguém bater as botas e, se for esvaziada, todo o progresso é perdido. Mas ainda assim este modo de jogo é bem mais light e aprazível do que a campanha. Só que, você adivinhou, só dá para jogar nele fases que você já venceu no modo história.
HISTÓRIA
Nioh 2 é uma prequência de Nioh. Ele traz uma reimaginação fantasiosa da história do Japão, e dessa vez você não joga com um personagem histórico, mas cria seu próprio herói.
As cutscenes são lindíssimas e extremamente estilosas. Na história de Nioh, cada soldado tem um espírito guardião, representado por um animal. Isso causa imagens muito belas. Sempre que um espírito aparecia, eu tirava uma foto, de tão bonitas que ficavam essas imagens. É uma pena que estes fantasmas não apareçam mais frequentemente no gameplay. Algo na linha de Astral Chain deixaria Nioh ainda mais especial.
Narrativamente, no entanto, eu tive problemas com a história. É difícil entender exatamente o que está rolando além do básico. Há mortes e mudanças de lado que poderiam – e deveriam – ser melhor desenvolvidas.
Também há sérios problemas de tom. A história de Nioh é contada com um jeito de fábula. Ela é bem humorada e traz vários personagens e momentos bonitinhos.
Não chega a ser infantil, mas a ideia é ser divertida e descompromissada. Lembrou-me algo como Dragon Ball. Porém, algumas das músicas, especialmente de combate, parecem saídas de Dead Space. E este definitivamente não é um jogo de terror! Isso é refletido nas fases, que acontecem quase sempre de noite (o que já era um problema no primeiro). Isso faria mais sentido em um jogo de ninjas, mas nem Ninja Gaiden tinha uma fascinação tão grande com cenários escuros. E convenhamos, quando você pensa em Japão, o que vem à mente é aquele sol vermelhão e brilhante, que eles até colocaram na bandeira. Não à toa, as melhores fases do jogo acontecem sob esta iluminação.
DUELOS SAMURAIS
Além disso, o combate de Nioh realmente brilha nas lutas entre humanos. Os yokai funcionam de forma bem diferente, e lutar contra eles é bem menos empolgante. Um chefe humano, por exemplo, é basicamente um duelo entre samurais, e me empolgava bem mais do que um monstrengo enorme.
A própria história envolve basicamente uma guerra entre humanos pelo poder e unificação do Japão. Os yokai aparecem na história mais ou menos como os animais de uma floresta. Tipo, eles estão no meio do caminho, e são perigosos. Porém, só começam a ter importância na história mesmo perto do final, quando soldados humanos se tornam realmente raros. E lembra que eu reclamei das fases repetidas nas sub missões? Acredita que a última fase de história é repetida? Pois é.
RPG
Eu gosto muito desse tipo de ambientação japonesa. Samurais, ninjas e afins funcionam muito bem em games. Porém, a existência de monstros nesses jogos sempre foi uma reclamação minha, de Ninja Gaiden a Sekiro. Eu sei, os desenvolvedores colocam monstros para deixar o combate mais variado, aumentar as possibilidades de inimigos visualmente e mecanicamente. Eu entendo isso, mas ainda espero um bom hack and slash japonês que seja composto basicamente de duelos e batalhas. Quem sabe não consigo isso com Ghost of Tsushima?
Nioh 2 é um jogo difícil por design, e ele começa absurdamente difícil. O primeiro inimigo real (tirando os fodders pequenos que abrem o jogo) serve para ensinar o burst counter, e me matou uma dezena de vezes. Admito que fiquei bem desanimado de ele já ter começado tão frustrante. Porém, ele foi aos poucos ficando mais controlável. Nunca fácil, entenda, mas também nunca tão frustrante ou repetitivo quanto Dark Souls.
Acontece que o lado RPG dele é muito forte e elaborado. Você tem, literalmente, centenas de ferramentas para sobreviver. De magias que recuperam vida a shurikens e talismans que colocam danos elementais na sua arma.
LOOT
Eu sinceramente terminei Nioh sem usar dezenas das ferramentas que estão à minha disposição. Eu simplesmente não tenho saco para aprender a usar tantas coisas, criar loadouts diferentes e alternar entre eles de acordo com a situação. Talvez se tivesse mergulhado de cabeça nessas opções, ele tivesse sido ainda mais fácil.
As ferramentas são fáceis de ignorar ou escolher quais usar. O que realmente me encheu o saco foi a quantidade de loot. Isso já era um problema no original, e continua sendo aqui. Existem nove tipos de armas diferentes em Nioh 2. Porém, sempre que você termina uma fase, vai ter dúzias de literalmente a mesma arma, apenas com diferenças estatísticas. Isso obriga você a passar um bom tempo no inventário entre as missões, procurando qual das 15 foices que acabou de pegar é a melhor.
Eu sei que tem gente que gosta disso, mas eu realmente gostaria que Nioh funcionasse mais como Ninja Gaiden: existem nove tipos de armas, mas elas têm danos fixos. Você alterna entre elas nos momentos apropriados, não de acordo com a que tiver as melhores estatísticas aleatórias naquele momento. E isso, claro, também afeta todas as peças da sua armadura. É incrível e deprimente pensar como Nioh 2 seria ainda melhor sem isso e sem as sub missions.
INIMIGOS
Por fim, ele também tem alguns inimigos bem chatinhos, como uma espécie de sereia que é difícil de acertar e que te mata com facilidade.
Alguns, que já eram pentelhos no primeiro Nioh, retornam aqui, como o pássaro Tengu. Os chefes, por outro lado, são bem melhores, tanto em design quanto em mecânicas. Mesmo nos raros casos em que você tem que lutar contra mais de um ao mesmo tempo, a coisa nunca parece tão injusta e desequilibrada.
Outro problema é a quantidade de armadilhas. É bem comum você estar explorando e um inimigo te agarrar do nada, fazendo um enorme dano. Se você não estiver com a vida cheia, dá para morrer sem ter nenhum sinal de aviso. É literalmente o tipo de influência de Dark Souls que já está mais do que na hora de deixarmos morrer.
Dito tudo isso, e eu realmente falei muito hoje, Nioh é um excelente jogo. Já tinha essa opinião do primeiro, e o segundo a consolidou: este é o melhor clone de Dark Souls, exatamente por tentar trilhar um caminho próprio, ainda que repita várias das fórmulas da From Software. Se a ideia de um Dark Souls com samurais te agrada, ou se você simplesmente é um fã do gênero, esta é uma compra essencial.