A redução da maioridade penal

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Depois de alguns terríveis casos de crimes envolvendo menores, como o da dentista que foi queimada viva por um menor em São Bernardo do Campo, e das declarações do governador do estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, assumindo o apoio a uma mudança na lei de maioridade penal, o assunto parece em voga como nunca antes.

Não demorou muito para que surgissem nas redes sociais os pró e os contra a ideia, como é normal em todo assunto. Aliás, vale o adendo de que hoje em dia parece que todos somos obrigados a ter uma opinião sobre tudo, mesmo sem não entendermos absolutamente nada sobre o assunto. Talvez isso seja assunto para outro artigo. Mas uma opinião pró em especial me surpreendeu: ao assistir ao jornal do SBT pela manhã, me deparei com a rede claramente colocando sua opinião sobre o assunto e pedindo, praticamente, para que a lei fosse mudada e a maioridade penal alterada para 16 anos de idade.

O lobby feito pela empresa do Señor Abravanel me fez pensar bastante nessa questão, afinal de contas, não é comum ver uma emissora de televisão aberta se engajar tanto em um assunto, e o efeito que um veículo de massa como este é capaz de causar pode ser de grandes proporções. Será que há algum interesse de uma emissora de TV em promover esta mudança, ou é uma atitude incentivada pelo puro sensacionalismo? O debate é sempre um bom caminho para a sociedade, mas será que estamos debatendo as coisas certas?

REDUZIR RESOLVE O PROBLEMA?

A minha resposta é: Não. Não vou dizer que sou contra a diminuição da maioridade penal, porém esta discussão me parece não atacar o cerne da questão e se ater apenas aos efeitos, e não nas causas reais da violência.

De que adianta colocar mais pessoas em um sistema carcerário falido como o brasileiro, com superlotações, condições precárias, presídios dominados por facções e, em quase todos os casos, sem nenhum trabalho de recuperação para o infrator?

O menor com certeza voltará às ruas e, ao invés de recuperado e com novas perspectivas para o seu futuro, voltará para o crime, depois da “faculdade” que cursou na cadeia. Um sistema que não recupera e sim especializa o criminoso não pode ser colocado como solução para os problemas.

Os jovens precisam de oportunidades para não voltar ao crime. Todos os criminosos são vítimas. E não estou dizendo que são todos coitadinhos, que deveríamos passar a mão na cabeça deles e dar carinho, mas são vítimas de um sistema que não dá oportunidade a todos de crescerem, vítimas de uma sociedade discriminatória, de uma humanidade cada vez mais consumista e que julga pelas posses. Que prega que se você não tem o carro do ano ou o tablet do ano não é ninguém.

Não é raro ver um adolescente entrar no mundo do crime para poder ter um tênis legal, e assim se sentir parte de algo. Nosso sistema de consumismo exacerbado é um impulso para os jovens infratores. Não que isto sirva de álibi para cometerem massacres, chacinas ou atrocidades e os exima da culpa por tais atos, mas é necessário entender que o problema é muito maior e está muito mais enraizado em nossa sociedade do que parece, e uma simples mudança de maioridade penal não é a solução definitiva. Isto sem citar os que cometem os crimes para ter comida no prato.

Alegar que a diminuição da maioridade penal servirá para deixar os infratores menores com medo e que é uma tendência mundial é errado. A Alemanha, por exemplo, reestabeleceu a maioridade penal para os 18 anos, e o Japão para os 20 anos, segundo a revista Fórum. A tendência mundial para combater os crimes dos menores são com medidas socioeducativas. Você pode argumentar que o Brasil não é a Alemanha ou o Japão, e eu concordo. Mas ao menos creio que estes dados servem para refutar os argumentos daqueles que acreditam que devemos seguir o exemplo de outros países para resolver os nossos problemas.

QUAL A SOLUÇÃO?

Em primeiro lugar, uma lei não deveria se basear em exceções. Diferentemente do que nossa mídia sensacionalista nos mostra, os crimes de homicídio envolvendo adolescentes são minoria, segundo relatório da Unicef de 2007.

A solução não é algo fácil de se implantar e muito menos rápido. E creio que a resposta seja mais do que óbvia: educação. Mas é claro que somente educação não resolve o problema. Oportunidades mais igualitárias, um sistema carcerário mais competente, que não fique nas mãos de facções, que recupere as pessoas que cometeram os crimes, são medidas que podem de fato melhorar a situação da violência vivida no nosso país.

Os jovens podem votar com 16 anos, portanto acho que são sim muito capazes de responderem pelos seus atos. É preciso punir, pois esta é a deturpada noção de justiça que nós temos, faz parte do nosso espírito de vingança. E também sou humano, também ficaria afoito por punição caso algum ente querido meu sofresse qualquer tipo de crime. Mas não nos deixemos levar apenas por este instinto, afinal, o olho por olho só vai deixar todo mundo cego. É preciso pensar racionalmente em soluções inteligentes e eficazes para o mundo em que vivemos.

Se você quer ler mais sobre o assunto, recomendo o ótimo artigo da revista Fórum, disponível no site da revista. Pode ser muito esclarecedor para muitos que estão pensando sobre esta questão.

Como na criação de um filho, punir é preciso, mas isto não funciona como um fim, e sim um meio para, acima de tudo, educar.