Uma Noite de Crime: Anarquia

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Na resenha do primeiro Uma Noite de Crime, falei que se tratava de uma ideia boa demais para ser utilizada apenas num suspense de baixo orçamento. Pois graças ao sucesso do longa, que viabilizou esta continuação, o diretor e roteirista James DeMonaco parece não só ter lido minha resenha, como concordado com ela. Afinal, Uma Noite de Crime: Anarquia, faz exatamente o que eu desejava naquela crítica: expande a história.

Dessa vez sai o suspense e entra um longa centrado na ação com um orçamento claramente mais polpudo (embora ainda assim bastante barato para os padrões estadunidenses, apenas nove milhões de Bill Clintons). E agora, ao invés de se passar em um ambiente só, dentro de uma casa, ele rola nas ruas da cidade durante o período de mais um expurgo anual, colocando de vez em primeiro plano essa premissa tão legal da noite de crimes.

Para quem não se lembra ou não viu o anterior, é o seguinte: uma vez por ano, durante 12 horas, os cidadãos dos EUA são liberados para cometer todos os tipos de crimes, como forma de expurgar seus instintos primitivos e dessa forma passar os outros 364 dias do ano vivendo numa boa em uma sociedade quase perfeita. Só participa quem quer (quem não quer fica trancado em casa esperando a noite passar) e durante esse período, serviços de emergência como bombeiros, ambulâncias e polícia são suspensos, transformando as ruas num salve-se quem puder de pura anarquia.

Somos apresentados a um sujeito que está se preparando para matar um alvo específico; mãe e filha que têm seu prédio de renda baixa invadido por uma milícia e um casal de não participantes que tem seu carro sabotado e fica a pé no pior momento possível, caçados por uma gangue. O caminho de todos eles vai se cruzar e o único cara que realmente está lá fora porque quer (Frank Grillo, o Ossos Cruzados de Capitão América 2: O Soldado Invernal) vai acabar virando o protetor do resto.

Muito bem filmado e com várias boas cenas de ação mostrando a violência na medida certa, forte mas sem ser chocante e sem exagerar, também consegue manter o clima de tensão do primeiro filme, agora de forma diferente. A cada esquina pode haver alguém querendo matá-los, fora o pessoal que já está atrás deles normalmente.

Também apresenta vários elementos possíveis dentro da noite do expurgo, mostrando um monte de opções de desgraças e até coisas que podem ser mais bem abordadas e desenvolvidas em eventuais longas posteriores. Desde uma “limpeza” dos indesejados (os mais pobres), passando por gente que se dispõe a servir de vítima por dinheiro e até coisas mais ao estilo O Albergue.

Porém, por mais legal que seja essa expansão da trama e esse vislumbre de várias possibilidades, novamente o longa evita uma discussão mais filosófica, preferindo uma pegada de puro entretenimento descompromissado. Tudo bem, não há nenhum problema com isso, só acho que poderia ficar ainda mais legal se optasse por aliar ambos os lados.

Seja como for, também não evita alguns clichês do estilo, alguns deles mais batidos que andar para frente, tipo a galerinha se livrar de um grande perigo no último segundo com um deus ex machina safado. São coisas que poderiam ser facilmente limadas ou ao menos melhoradas com um roteiro melhor construído. Essas escorregadas não chegam a estragar a experiência, mas arranham um pouco do brilho.

Ainda assim, a película é bem superior à média do gênero recente e, graças a essa expansão dos elementos da mitologia da franquia, se torna ainda mais bacana ao apresentar essas novas características, deixando o longa mais divertido e interessante. Desta forma, por ser de um gênero completamente diferente e realmente se utilizando de mais ferramentas possíveis da história, é uma continuação daquelas que possuem mesmo um propósito e uma razão de existir além de ser apenas mais do mesmo só para arrancar mais uns caraminguás do público.

Quem gostou do primeiro filme certamente vai apreciar este aqui também. E até aqueles que não o acharam grande coisa, graças à mudança de estilo e ao maior desenvolvimento da história têm mais chances de curtir Uma Noite de Crime: Anarquia. Vale uma sessão.

CURIOSIDADE:

– Segundo o IMDb, o terceiro filme da série, novamente escrito e dirigido por James DeMonaco, já está em pré-produção, com estreia prevista para 2015. Caramba, um filme por ano, tornando essa a franquia mais rápida no gatilho desde Jogos Mortais.

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Nota
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Carlos Cyrino
Formado em cinema (FAAP) e jornalismo (PUC-SP), também é escritor com um romance publicado (Espaços Desabitados, 2010) e muitos outros na gaveta esperando pela luz do dia. Além disso, trabalha com audiovisual. Adora filmes, HQs, livros e rock da vertente mais alternativa. Fez parte do DELFOS de 2005 a 2019.
uma-noite-de-crime-anarquiaPaís: EUA/França<br> Ano: 2014<br> Gênero: Ação<br> Duração: 103 minutos<br> Roteiro: James DeMonaco<br> Elenco: Frank Grillo, Carmen Ejogo, Zach Gilford, Kiele Sanchez, Zoë Soul, Justina Machado e Michael K. Williams.<br> Diretor: James DeMonaco<br> Distribuidor: H2O Films e Universal<br>