Superdeuses

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Se você gosta de quadrinhos, muito provavelmente conhece Grant Morrison. Ele é o sujeito capaz de escrever coisas geniais como Batman: Asilo Arkham, Grandes Astros Superman, sua passagem pela LJA e pelos Novos X-Men e, mais recentemente, em Action Comics nos chamados Novos 52, o reboot da DC.

Em igual proporção, também tem a propensão de viajar na maionese e escrever coisas que só ele entende, como Os Sete Soldados da Vitória, Crise Final e grande parte de sua passagem pelas histórias do Batman, dentre outras. Devo dizer que acho todas essas tramas onde o escocês baba colorido grandes porcarias. Por isso, sempre o considerei um escritor irregular, de extremos: quando é bom, nunca é menos que excelente. Quando é ruim, sai de baixo.

Eis então que ele resolve escrever um livro falando sobre o gênero de HQs do qual ele tanto gosta e com o qual trabalha: o de super-heróis. Esta é a proposta de Superdeuses, fazer uma análise, segundo seu ponto de vista, deste estilo tão amado e da indústria em geral.

Ele divide o livro em quatro partes: as eras de ouro, prata, das trevas (a partir dos anos 1970, quando as histórias começaram a ficar mais adultas) e renascença (as HQs mais atuais, a partir dos anos 90). E faz uma detalhada análise de cada uma delas, pegando os principais personagens (da Marvel, DC ou de outras editoras) e expondo seu ponto de vista e sua interpretação sobre eles, passando pelo que representam e pelo momento histórico em que estavam inseridos.

Sendo um sujeito muito peculiar, visto a maioria das coisas que escreve na ficção, é óbvio que aqui não seria diferente, e muitas de suas análises vêm carregadas das mesmas opiniões bem particulares que tanto fizeram sua fama como roteirista. E o pior é que elas são extremamente bem fundamentadas e fazem todo o sentido. Você pode até não concordar com várias delas, mas não dá para negar que elas são bem fundamentadas.

Entre um estudo e outro sobre o gênero, encaixa trechos mais biográficos, falando um pouco de sua vida, desde a infância, quando adquiriu o amor pelos quadrinhos, passando por várias fases de sua história pessoal. Claro que, num livro a respeito de HQs, ele se foca mais em suas experiências profissionais, contando vários “causos” de seus trabalhos na indústria estadunidense. Mas isso não quer dizer que ele não fale de coisas mais pessoais também.

Seu lado mais ousado está bem representado aqui, com ele falando abertamente de seu passado punk, suas experiências com o ocultismo e suas crenças pessoais. A passagem onde ele descreve sua visão espiritual completamente surrealista sofrida em Katmandu é impagável e praticamente já vale o livro.

Sem falar que causa mais um efeito positivo. Depois de ler este livro, eu finalmente compreendi porque ele faz aquelas histórias mais viajandonas. Continuo não gostando delas, mas pelo menos agora sei que não é algo gratuito e completamente sem sentido. Passei a simpatizar bem mais com Morrison após ler este livro.

Gostei de praticamente todas as análises dele a respeito dos heróis e dos períodos apresentados. A descrição dele da época de ouro da Image Comics, em particular, é ótima: a versão em quadrinhos da cocaína. E as passagens biográficas ajudam a conhecer melhor o autor, suas referências, seu processo criativo e as ideias com que costuma trabalhar. Joga uma boa e diferente luz sobre sua própria obra.

Superdeuses é um prato cheio para os fãs do careca escocês e é daqueles trabalhos capazes de converter quem não vai com a cara dele. Sem contar que é uma leitura muito prazerosa. Para todos que gostam de histórias em quadrinhos de super-heróis no geral, é não menos que obrigatório.