O Capitão Marvel, que não é o da Marvel e sim o da DC, deve ser um dos super-heróis mais conhecidos e menos lidos de todos. Todo mundo conhece a icônica roupa vermelha com o relâmpago no peito e a premissa de que ele é um moleque que, ao falar a palavra mágica Shazam, se transforma no mortal mais poderoso da Terra.
Fora isso, tirando o período de sua criação, nos anos 40 numa editora concorrente (só muitos anos depois a DC adquiriu os direitos sobre o personagem), quando deu uma canseira no Super-Homem em vendas, nunca mais foi tão popular, tendo uma ou outra fase elogiada e uma base de fãs pequena, porém fiel e apaixonada, aonde se incluem figuras ilustres, como o artista Alex Ross (que até assina o prefácio desta edição de luxo em capa dura e papel de qualidade).
Eu me lembro que essa Shazam! & A Sociedade dos Monstros estava com seu lançamento programado no Brasil para alguns anos atrás, inclusive chegando a ter anúncios publicados nas HQs da linha da DC por aqui (se não me falha a memória, estava programada para sair em seu formato original, como uma minissérie em quatro edições). Por algum motivo, no entanto, a Panini desistiu em cima da hora e só no final de 2014 voltou atrás na decisão e a graphic novel finalmente chegou em nossas terras. Antes tarde do que nunca, mas num momento editorial deveras estranho para isso.
Digo isso porque a história de A Sociedade dos Monstros é uma trama de origem pré Novos 52 (o reboot da DC), utilizando os elementos clássicos da mitologia do personagem. Logo, faria sentido ter sido lançada anos atrás. Agora, contudo, o herói foi reintroduzido aos Novos 52 com uma nova origem totalmente diferente (ele agora sequer se chama Capitão Marvel, adotando de vez a alcunha Shazam. Ou seja, ele não pode dizer o próprio nome ou vai ficar se transformando inadvertidamente, o que deve ser um saco na hora de se apresentar para alguém). Assim, isso fica até parecendo a história de um personagem completamente à parte.
De autoria de Jeff Smith, quadrinista que ficou famoso por sua obra autoral Bone, esse é mais um fã de carteirinha do personagem e se propõe neste trabalho a um objetivo bem simples: retomar o clima mais ingênuo, descompromissado e abertamente infantil das HQs de super-heróis de antigamente, das décadas de 40 a 60 (mas sem aquele excesso de recordatórios excessivamente descritivos característicos da época).
Como disse antes, reconta a história de origem do garoto de rua órfão Billy Batson, convocado pelo Mago Shazam para receber os poderes de seu campeão, o Capitão Marvel, e assim combater o mal, aqui na forma do ser extradimensional Sr. Cérebro e sua Sociedade dos Monstros e também do famigerado Dr. Silvana, seu inimigo mais tradicional. Ainda por cima, descobre a existência de uma irmã, Mary, e acaba por partilhar uma fração de seus poderes com ela, transformando-a em Mary Marvel.
O mais legal da trama é a alteração que ele fez na dinâmica Billy Batson/Capitão Marvel. Ao invés de ser a mesma pessoa, ganhando um corpo adulto quando se transforma, Jeff Smith os trata como entidades separadas, transformando assim Billy num hospedeiro para o Capitão. Desta forma, quando a transformação acontece, eles trocam de lugar, embora ambos mantenham as memórias um do outro. Esse novo elemento ficou bem interessante na narrativa.
Outro aspecto bacana da obra é seu traço, bastante cartunesco, que retrata Billy e Mary como crianças bem pequenas e meio cabeçudinhas, contribuindo ainda mais para o aspecto mais infantil do trabalho e dando uma estética bem bacana para a graphic novel no geral.
Como se trata de uma trama de origem fora do cânone e autocontida, com começo, meio e fim, é muito boa tanto para quem não conhece o personagem e gostaria de ter contato com ele quanto para quem só quer ler uma boa graphic novel fechada sem precisar acompanhar um monte de edições mensais.
Assim, Shazam! & A Sociedade dos Monstros, por sua pegada mais ingênua, colorida e simples, funciona muito bem para os fãs do personagem como uma homenagem apaixonada ao Capitão Marvel de uma época mais inocente, bem como uma ótima porta de entrada para começar a doutrinar os pequenos na fina arte das HQs de super-heróis. Diversão descompromissada para adultos saudosistas e crianças dando os primeiros passos nesse universo mágico.
