Mesmo após tantas décadas de carreira, Stephen King continua um autor muito prolífico, lançando praticamente um novo trabalho por ano (sem contar reedições, contos e por aí vai). Natural, portanto, que sua produção mais recente não tenha mais o mesmo nível de qualidade de sua época áurea, do final dos anos 1970 até os 90.
Mas ele continua escrevendo bem o suficiente para manter o interesse. É isso o mínimo que espero de sua produção mais nova. Só que de vez em quando o velho mestre ainda consegue surpreender, e este foi o caso com Outsider, que fisga o leitor desde a sinopse.
Em uma cidadezinha, um menino é assassinado e violentado sexualmente com requintes de extrema barbárie. Todas as evidências, além do relato de testemunhas, apontam para um sujeito muito querido no local, treinador do time de beisebol infantil e cidadão aparentemente acima de qualquer suspeita.
O detetive encarregado do caso decide humilhar o sujeito prendendo-o no meio de um jogo, na frente da esposa, das filhas e de 1500 espectadores. A vida do sujeito e da família estaria destruída só por esse fato, sem contar, claro, o crime hediondo. Mas é aí que a trama se complica.
OUTSIDER
O cara jura de pés juntos que sequer estava na cidade quando o crime aconteceu. E ele tem como provar. Ele viajou com outras pessoas que corroboram o álibi, também possui evidências físicas (digitais, por exemplo) de que estava em outra cidade, e a cereja do bolo: há imagens gravadas dele que provam que, de fato, ele estava em outro município.
Como pode então haver tantas evidências que apontam tanto para sua inocência quanto para sua culpa? Aí, só mesmo lendo para saber, mas essa trama de “como é que pode?” fisga desde as primeiras frases e deixa a curiosidade em alta durante quase toda a leitura. Fazia tempo que eu não lia um livro de King que me deixava tão grudado nas páginas, com aquela vontade de continuar lendo, mesmo tendo de parar pelo dia.
O começo, contado de forma praticamente procedural, dando todos os meandros da investigação que levou à prisão do cara, também ajuda a diferenciar dando uma estética mais interessante à condução da trama.
A qual, como na maioria de seus trabalhos, possui um elemento sobrenatural, só que a grande força é mesmo a narrativa praticamente policial do começo. Admito que, pra lá da metade, quando ele se torna mais Stephen King clássico, apesar de não chegar a esfriar, não tem mais a mesma força do começo. Mas ainda assim prende a atenção.
E lá pela metade ainda tive uma surpresa que achei bem bacana. É o tipo de coisa que não dá para falar muito para não estragar a experiência de ninguém, mas vale dizer que o universo de King, como os iniciados bem sabem, é interligado. E fiquemos por isso mesmo.
Com essa surpresa, mais a forma como ele conta a história – como um CSI literário –, me diverti muito lendo este livro, mais do que na leitura da maioria de seu material recente, mesmo que o terço final descambe, tanto em forma quanto conteúdo, para uma história mais típica do mestre do terror.
Seja como for, Outsider superou muito minhas expectativas. Eu só não o recomendo para leitores iniciantes porque é preciso saber um pouco do universo literário do escritor para desfrutá-lo plenamente. Mas, para os já iniciados, principalmente aqueles que conhecem seus trabalhos mais recentes, vale muito a pena.