O Vampiro Lestat – As Crônicas Vampirescas

0

Foi na década de noventa, a meu ver, que as primeiras grandes adaptações – e também algumas das melhores até então – de um livro para as telonas foram feitas. Aconteceu primeiro com Drácula de Bram Stoker (1992) e, dois anos depois, uma verdadeira obra-prima da literatura seguiu o exemplo do vampiro-mor. E o sucesso foi imediato e absoluto.

Não importa se você assistiu por causa do elenco nada modesto, onde os senhores Pitt e Cruise formavam a liga principal, ou se porque a trama era tão surpreendentemente boa, mas a questão é que você assistiu, e gostou. Ainda se perguntando de que diabos estaria eu falando? Ora essa, do que mais poderia ser, eu me pergunto? Estou falando de Entrevista com o Vampiro, meu caro e desatento delfonauta. Adaptado do belíssimo livro homônimo da Anne Rice que, mesclando erotismo ao terror sobrenatural dos sugadores de sangue, criou a mais bela história de vampiros da modernidade – tirando o chapéu apenas para o monstrinho de Bram Stoker, claro. No entanto, foi com O Vampiro Lestat que a tia Anne se consolidou de vez no mercado como uma das mais adoradas escritoras góticas da atualidade. E eis que surge a questão: A continuação da história de nosso carismático Lestat faz jus ao que vimos (ou lemos) em sua primeira aparição? Temos um grande e sorridente “não” como resposta! Então, correndo o risco de ser recompensado com um olho roxo, deixe-me elaborar um pouco essa análise.

Estamos falando aqui de um livro, ao mesmo tempo, diferente e idêntico ao seu antecessor. Tecnicamente, Anne Rice é a mesma que conhecemos e de quem gostamos tanto – com tudo aquilo que fez de Entrevista com o Vampiro uma ótima aquisição (então não perca tempo e faça esse ótimo investimento aqui, e também o que tirou parte de seu brilho. Assim como o anterior, este novo capítulo das Crônicas Vampirescas se dá em uma narrativa lenta e maçante e, infelizmente, essa é uma característica que parece ter sido terrivelmente acentuada ao invés de corrigida.

Lestat tem muito a contar em sua fantástica autobiografia e ele o faz de tal maneira que ler o livro se torna também um desafio para manter o interesse intacto. A narrativa, no entanto, não é o único aspecto falho a ser iluminado pelos impiedosos holofotes delfianos. É apenas o ponto de partida para uma corrida que vai se tornando cada vez mais decepcionante.

Tanto na obra de 1976 como no filme de 1994, Lestat era, definitivamente, um personagem fascinante e entusiástico, que arrancou suspiros com a atuação de Tom Cruise e cativou o público em geral, tanto como um vilão excepcional, quanto como um personagem que retratava uma juventude cética, indomável e revoltosa. Tamanha foi a aceitação do público diante do personagem, que o mesmo ganhou o seu próprio livro e, por muitas outras vezes, foi presenteado com o papel principal de várias outras histórias dentro das crônicas de Anne Rice. Entretanto, o Lestat de Lioncourt, tão sombrio e desumano, que afligia ainda mais o sensível Louis, passou por uma drástica transformação e é representado nessa seqüência como o próprio Louis foi em seu tempo: uma figura melancólica, moralista e perdida. De fato, em parte, esses três adjetivos também seriam perfeitamente apropriados para descrever o livro em si.

O romance é narrado em primeira pessoa, na forma de uma autobiografia, iniciando com o despertar de Lestat nos anos 80, após meio século de hibernação. Tudo se passa mais uma vez na França pré-revolução. Rico em melodramas e clichês, O Vampiro Lestat nos conduz de volta às origens do protagonista, quando ainda humano em um mundo aristocrático e, de lá, através dos séculos em uma cruzada em busca de auto-conhecimento e significado para a sua vida sem sentido. A partir de sua transformação, ou como o próprio Lestat colocaria, a partir do momento em que recebeu o Dom das Trevas, o vampiro se torna uma espécie de detetive, farejando pistas que o levarão ao elo perdido dos vampiros, que é o que?

Oscilando entre presente e passado, temos aqui uma oportunidade de nos aprofundar sobre a maior criação de Anne Rice, descobrindo os segredos sobre seu passado e acompanhando-o no presente, quando, aborrecido por ver em uma livraria uma edição à venda de Entrevista com o Vampiro, Lestat decide seguir os passos de Louis e escrever ele também, a sua própria história. Mas Lestat vai mais longe e manda de vez o código de silêncio dos vampiros para o diabo, tornando-se uma estrela de uma banda de Rock e anunciando ao mundo a existência das criaturas das trevas.

O Vampiro Lestat não é de todo ruim, é apenas cansativo e, em certos aspectos, decepcionante. Lestat não é o mesmo e a mudança não foi para melhor. Há quem diga que este é o melhor livro das crônicas, e há quem diga que é o pior. Acho que não é nenhuma surpresa que defendo o segundo grupo, certo? Contudo, apesar de todas as falhas, o romance ainda é recomendável – especialmente para aqueles que leram seu antecessor e gostaram. Afinal, Lestat é a grande criação de Anne Rice, reaparece em grande parte de seus romances e é dono de uma história que vale a pena ser ouvida (ou, nesse caso, lida). Afinal, passado (não sem algum esforço) os primeiros momentos, o livro se torna menos monótono e mais intrigante.

O Vampiro Lestat não é um livro tão surpreendente como Entrevista com o Vampiro foi. Tampouco será a melhor aventura que você terá em seu acervo, mas ainda assim diverte, sacia a curiosidade e cumpre seu papel como seqüência e prelúdio para outras histórias. Se isso não lhe parece motivo o bastante para gastar cinqüenta pratas com ele, lembre que não há muitas opções na literatura envolvendo as criaturas das trevas e, das poucas existentes, Anne Rice ainda é a melhor.

Galeria

Galeria

Galeria