Nota: A coluna Pensamentos Delfonautas é o espaço para o público do DELFOS manifestar suas opiniões e pensamentos sobre os mais variados assuntos. Apesar de os textos passarem pela mesma edição que qualquer texto delfiano, as opiniões apresentadas aqui não precisam necessariamente representar a opinião de ninguém da equipe oficial. Qualquer delfonauta tem total liberdade para usar este espaço para desenvolver sua própria reflexão. Se você quer escrever um ou mais números para essa coluna, basta ler este manual e, se você concordar com os termos e tiver algo interessante a dizer, pode mandar ver. Inclusive, textos fazendo um contraponto a este ou a qualquer outro publicado no site são muito bem-vindos.
Salvem, amigos delfianos e delfonautas, machos e fêmeas. Após muito refletir, resolvi contribuir com a coluna “Pensamentos Delfonautas”, falando de um tema que me irrita muito, pelos reflexos (majoritariamente negativos, na minha opinião) no mundo do entretenimento e na nossa vida diária: o culto à mediocridade.
Nas últimas décadas, houve um crescimento nada desprezível do número de veículos de comunicação (jornais do formato tablóide, revistas, programas de televisão e sites) voltados para o mundo das celebridades. Até este ponto, nenhum problema. Afinal, se você gosta de um determinado ator ou curte um músico, nada mais natural que você tenha um certo interesse no desenvolvimento do seu trabalho, em sua vida profissional e, em alguns casos, na sua vida pessoal, certo?
Como diria um personagem do Jô Soares (da época em que ele fazia humor e ainda tinha graça), “é aí que mora o perigo”. A indústria de fofocas dá uma atenção totalmente sem fundamentos e desproporcionada a fatos medíocres e corriqueiros apenas porque eles ocorrem na vida de pessoas famosas. Um bom exemplo disso são as fotos que saem nas Contigo! e Flash da vida de atores da Globo caminhando no calçadão de Ipanema ou mesmo se banhando no mar. Oras, estamos falando, neste caso, do Rio de Janeiro. Todos os dias, milhares de cidadãos cariocas fazem sua caminhada no calçadão de Ipanema e/ou se banham no mar. Será que realmente é preciso fazer um auê e tirar fotos da Luana Piovani, por exemplo, apenas porque a moça resolveu fazer algo que seus concidadãos fazem todos os dias?
É essa a minha primeira reclamação contra a mídia especializada em fofocas: essa atenção superdimensionada concedida a fatos corriqueiros ou, como me referi acima, absolutamente medíocres, que simplesmente não são dignos de menção, ganhando notoriedade apenas por serem protagonizados por pessoas famosas.
Essa característica seria até perdoável, se ela não fosse responsável pelo culto à mediocridade que dá título a este texto. Culto à mediocridade, na minha opinião, é a atenção desmedida dada pela mídia a pessoas que, ao contrário de músicos, atores, diretores (de cinema, teatro ou TV), escritores, poetas e outras categorias do mundo das artes e do entretenimento, simplesmente não contribuem em nada para nenhum desses mundos. Estão na mídia por razões ridículas e se aproveitam da futilidade da mídia de fofocas para permanecerem em cena.
O melhor exemplo disso é Paris Hilton. A herdeira da milionária rede de hotéis Hilton tem uma notoriedade absurda na mídia (até mesmo em veículos de comunicação que supostamente deveriam ser sérios, como as revistas semanais Veja, IstoÉ e Época). Tudo o que a moça faz é cercado de um auê descomunal.
E o que a senhorita Hilton faz? Ela não é uma cantora, não é uma musicista, não é diretora ou produtora, não é atriz, não é nem uma empresária bem-sucedida. Em outras palavras: não é ninguém. Ou melhor, não é ninguém de relevância, que acrescente algo à vida das pessoas.
É simplesmente a herdeira de uma rede multimilionária de hotéis, construída pelo bisavô, o milionário Conrad Hilton. E é por isso que a midía de fofocas acha que ela merece alguma atenção: pelo simples fato de já ter vindo ao mundo com uma poupança milionária.
Alguém poderia dizer que eu estou é com dor de cotovelo pela ótima vida da senhorita Hilton, e que ela não tem culpa de ter nascido em berço esplêndido. Mas a minha bronca não se deve a ela ter bilhões para desfrutar – mas sim ao fato de ela incentivar todo esse interesse estúpido por sua vida, apenas pelo prazer de se manter em evidência.
Vejamos: a moça gravou um filme pornográfico caseiro com um ex-namorado que “misteriosamente” foi parar na internet. “Misteriosamente” porque a moça não se mostrou muito ofendida com esta invasão à sua privacidade, ao contrário de, por exemplo, Meg White. Pelo contrário: lançou o dito vídeo em DVD!
Pouco depois, um diretor de cinema a chamou para estrelar o filme Casa de Cera. E por que a chamou? A moça não tinha experiência anterior alguma em dramaturgia, enquanto em Hollywood o que não falta são aspirantes a atrizes que dariam um braço – ou outra parte do corpo (sim, isso foi uma referência nada sutil ao teste do sofá) – por uma chance de estrelar um filme, especialmente quando falamos de um remake de um clássico do terror. A srta. Hilton não estrelou o filme por ser uma boa atriz, ou ao menos por ter algum potencial dramático para ser desenvolvido. Foi convidada apenas para atrair alguma atenção para a película – não, eu não a vi, e não a verei: me recuso a ver um filme que tenha Paris Hilton em seu elenco. Algum tempo depois, a moça ainda lançou uma marca de perfumes e um disco. Que venderam bem, aliás, mas não por qualquer qualidade – apenas pelo fato de terem o nome da herdeira por trás deles.
O que é mais incrível: apesar de não fazer nada de relevante, enfiar constantemente o pé na jaca (e no processo arrastar muita gente, como demonstram Britney Spears e Lindsay Lohan), ficar em evidência por causa de coisas do tipo “criei um método para avaliar se a pessoa pode ser minha amiga” (não estou brincando! Quem duvidar, procure sobre isso na internet), a loira ainda consegue ter fãs! Sim, fãs! E a troco de um vídeo pornô caseiro, um perfume, um disco que é a vergonha da música Pop e de um filme de terror! Há pessoas que a admiram, tendo-a como exemplo de beleza e elegância! A primeira parte posso até entender, já que há um insuportável culto à magreza feminina, mas no meu conceito de elegância (que inclui, além do modo de se vestir, a forma de agir de uma pessoa), fofocas não se encaixam nesse quesito.
Essa é uma das piores características da nossa sociedade: o interesse desmedido de certas pessoas por pseudocelebridades que, conscientes ou inconscientes de sua mediocridade, alimentam essa adoração doentia com fofocas e mais fofocas. No Brasil, o maior sintoma disso é o Big Brother, que, já não bastasse ficar no ar por três meses tentando nos fazer acreditar que o que acontece na famigerada casa é do nosso interesse (e convence muita gente), ainda gera várias pseudocelebridades que nos atormentam por meses com fofocas de sua vida pós-BBB.
O que está acontecendo com as pessoas? Não deveríamos admirar quem tem talento, quem faz coisas relevantes? Por que diabos um disco da Paris Hilton vende? Por que um livro do Milton Hatoum, um escritor amazonense de grande talento, vende menos que um da Bruna Surfistinha? Há algo de muito errado quando coisas como essas acontecem com freqüência.