A visão que Zack Snyder tem do universo DC é bem diferente da minha e aparentemente bem diferente também da de milhões de outros fãs. Vide as reações fortes a O Homem de Aço e Batman vs Superman. Logo, quem não curtiu o direcionamento que o cara deu a esses longas já ficou imediatamente com um pé atrás para Liga da Justiça, também capitaneado por ele.
Bom, a primeira aventura que une os grandes medalhões da editora ainda tem muito do estilo e, sobretudo, do visual de Snyder, mas parece que o cara acabou fazendo algumas concessões. Ou ao menos foi obrigado a fazer. Como resultado, o filme é surpreendentemente bom (confesso que estava esperando algo ruim), ainda que, como Batman vs Superman, tenha muitos problemas.
TODOS JUNTOS AGORA
A história você já sabe: Lobo da Estepe e um séquito de parademônios vêm à Terra atrás de três Caixas Maternas que estão em nosso planeta. Ele pretende usá-las para detonar nosso mundo deixando-o mais ao gosto de Apokolips.
Para enfrentar essa ameaça que pode significar o fim de tudo, Batman e Mulher-Maravilha precisam recrutar outros meta-humanos para ajudá-los a rechaçar esse grande perigo. E assim nasce a Liga da Justiça, em sua versão cinematográfica.
O longa parece ter seguido a cartilha de Mulher-Maravilha de se focar no simples, pois assim as chances de errar são menores. O filme da Liga é uma aventura auto-contida com começo, meio e fim, sem pontas soltas, dando apenas indícios do que pode vir no futuro, mas sem prometer nada.
Nesse sentido, ele é uma aventura redonda. Segue um roteiro padrão desse tipo de história. Logo, se não ganha pontos por originalidade, joga a “responsa” nos ombros de seus protagonistas. E eles entregam. O filme é totalmente focado nos heróis que compõem a Liga.
É TIPO UMA BATCAVERNA
Um dos acertos do filme, e algo que me preocupava, é a forma como os personagens seriam introduzidos. E isso é feito de maneira simples, prática e bastante funcional. Nada de flashbacks contando origens, eles já estão todos estabelecidos, e você fica sabendo de detalhes de seu passado através de diálogos que movem a trama para frente. Manja aquele diálogo entre o Peter Parker e o Ned em Homem-Aranha: De Volta ao Lar onde ele responde as perguntas do amigo a respeito de como ele virou um super-herói? Então, há vários pequenos diálogos assim aqui e isso é bom.
Todos eles possuem um bom tempo de tela e suas personalidades são bem desenvolvidas. Claro, Batman, Superman e Mulher-Maravilha você já conhece bem. Os estreantes são bem apresentados nesse sentido.
O Flash é o alívio cômico e seu poder é o mais vistoso e bonito na telona (ainda que seu uniforme seja bem feio). Em determinado momento ele até explica que seus padrões de pensamento também são diferentes, algo que infelizmente não é explorado aqui, mas que poderia muito ser melhor desenvolvido em um filme solo. E eu acho difícil de acreditar que um personagem tão conhecido e querido como o Flash ainda não tenha um filme só seu. A DC/Warner continua dormindo no ponto.
O Aquaman também funciona muito bem. Claramente inspirado na fase do Peter David nas HQs, com o personagem cabeludo, barbudo e mais marrento, ficou bem longe da visão “super-herói inútil” que as pessoas costumam ter dele. Virou a força-bruta da turma. Ainda que, óbvio, as piadinhas sobre ele falar com peixes estejam presentes.
ENGRAÇADO VOCÊ ME CONSIDERAR O MONSTRO
Contudo, quem destoa é o Cyborg. Sejamos francos, ele não é um personagem do nível da Liga da Justiça. A DC começou a empurrá-lo como um dos sete medalhões a partir do reboot dos Novos 52 (escanteando o Caçador de Marte no processo) porque eles precisam de um personagem negro de destaque.
Só que eles já têm um e ele se chama John Stewart. Ele funcionava muito bem no desenho da Liga e é realmente um personagem forte e bacana. Só que, como Hal Jordan é o Lanterna Verde mais popular, optaram por promover o Cyborg, que sempre funcionou muito bem nos Novos Titãs, mas que na Liga me pareceu algo forçado demais.
Enfim, no filme ele é o personagem com a maior carga dramática, por conta de sua origem e visual meio homem, meio máquina. Logo, é o cara mais atormentado, mais estilo “DC segundo Zack Snyder“, ainda que mais para frente até ele assuma um tom mais leve.
Isso pode ser considerado tanto uma mexida de Joss Whedon (que deu um tapa no roteiro e cuidou das refilmagens depois que Snyder teve de se afastar devido ao suicídio de sua filha), como um desenvolvimento natural do próprio personagem. Afinal, a convivência com os outros super-seres pode tê-lo ajudado a aceitar a si mesmo.
Visualmente, também não curti, pois ele parece muito fake. Acho que o problema é que sua armadura é muito poluída, cheia de reentrâncias e detalhes. Se tivesse um visual mais clean e simples, acho que teria ficado mais natural.
OLHA, LÁ NO CÉU!
A forma como o Superman foi integrado na história foi outra coisa que para mim funcionou bem, ainda que seja um assunto que não convém contar aqui para não estragar a experiência de ninguém. Só acho estranho que continuem batendo na tecla de que ele é o símbolo da esperança quando neste novo universo cinematográfico DC ele jamais chegou perto disso. Ele sequer estava pronto como o herói que todos conhecemos quando empacotou. Mas vá lá, finge que eu acredito…
Outro ponto positivo da película é que ela jamais passa a sensação de ser uma história remendada. Não dá para saber o que era a visão original de Zack Snyder e o que foi escrito e rodado por Joss Whedon. Logo, ele mantém bem essa unidade. É algo coeso. Visualmente, é aquela coisa mais escura e lavada típica do Snyder, mas ele tem sim um clima mais leve (e mais piadinhas) que o distanciam bem de Batman vs Superman, por exemplo. E também tem alguns easter eggs para o pessoal ficar de olho.
BORN TO BE WIIIIIILD… OPA, LOBO DA ESTEPE ERRADO
Para mim, o grande ponto fraco do filme responde por Lobo da Estepe. Para começar, é um vilão do qual o grande público que não consome gibis nunca ouviu falar. E ainda por cima, visualmente ele é um desastre completo.
Seu design é bastante genérico e o maior dos pecados: é inexplicável ele ter sido feito totalmente digital, num dos CGIs mais toscos dos últimos anos. Ele é um humanóide, caramba! Poderia muito bem ter sido feito com maquiagem e apenas ter seu tamanho aumentado por computador. Toda vez que há um close no rosto dele e ele começa a falar, fica com aquele visual emborrachado, com os músculos faciais que parecem se mover em câmera lenta.
Some o péssimo visual (ainda que o resto dos efeitos digitais não estejam tão exagerados e artificiais quanto parecia nos trailers) do vilão com o fato de ser uma invasão alienígena bem genérica e você fica com a sensação de que a Liga não precisava ser formada para derrotar esse Zé Mané.
Tivesse o grupo se juntado para combater uma ameaça realmente apocalíptica (coff, Darkseid!, coff) e aí sim o filme poderia realmente ter sido o evento épico que deveria. Foi um baita erro não apresentar a equipe combatendo um desafio à altura. Essa coisa de guardar o melhor para uma próxima oportunidade às vezes não compensa.
SERÁ QUE DEU LIGA?
Enfim, mesmo com os erros, Liga da Justiça ainda resulta numa boa aventura, uma apresentação digna do maior grupo de super-heróis da DC e com potencial para melhorar bastante em eventuais continuações. Não é o evento arrasa-quarteirões que todos esperávamos, mas dá um caldo. No que diz respeito ao claudicante universo cinematográfico DC, já conta como algo positivo.
CURIOSIDADE:
– Há duas cenas pós-créditos. A primeira é divertidinha e uma situação comum das HQs e a segunda eu achei sensacional. Não saia da sala apressado.
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