Parece que depois que eu publiquei aquele texto sobre “como curtir filmes B“, tivemos vários novos lançamentos com esse estilo. Bom, porque eu tenho várias desculpas para ficar linkando para o texto. Já leu, aliás? E é bom também porque eu sou um grande fã de filmes B. Especialmente em casos como este, em que temos uma produção de alto orçamento, que usa e abusa da estética que foi criada exatamente para contornar a falta de dinheiro. Quer saber mais? Então só vem, que essa é nossa crítica Não Não Olhe.

CRÍTICA NÃO NÃO OLHE!

Não! Não Olhe! é o novo longa de Jordan Peele, o famoso comediante que se tornou famoso diretor de filmes de terror. São dele os queridinhos recentes do gênero Corra! e Nós. Mas você já deve saber disso. Afinal, Peele foi bem sucedido no que muitos tentaram e falharam: em ser um “auteur” de filmes de terror.

Sinopse então: aqui acompanhamos dois irmãos (Daniel KaluuyaKeke Palmer). Eles moram e trabalham em uma fazenda que acreditam estar sendo vigiada por um disco voador. Como os visitantes aparecem com frequência, nossos novos amigos resolvem fazer o que ninguém fez antes: uma filmagem profissional da espaçonave, digna de ser mostrada na Oprah. Será que eles vão conseguir?

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A comparação/cutucada que fiz acima com o Shyamalan não foi por acaso. Não! Não Olhe! tem muito de Sinais. Demora muito para você ver aonde o longa quer chegar. Demora mais ainda para dar qualquer sinal de medo ou acontecer qualquer coisa digna de nota. E sua narrativa usa e abusa do “dito pelo não dito”.

NÃO NÃO OLHE OS SINAIS!

Eu não diria que este é um filme “de viradinha” como os do Shyamalan. Mas admito que ele me surpreendeu bastante e positivamente na sua segunda metade. O que parecia ser um Sinais mais bem filmado se tornou algo mais especial, mais interessante e menos clichê.

Aliás, isso me leva a comentar o título nacional. Já tinha achado Não! Não Olhe! uma tradução terrível do original. E duas exclamações no mesmo título é de quebrar nosso SEO, por isso em partes desta resenha eu simplesmente comi os pontos do título. Porém, antes de qualquer coisa, este título nacional é um spoiler do tamanho de um monstro, que revela muito mais sobre o filme do que deveria. E o mais curioso é quão pouco revelador é o título original “Nope“. É ao mesmo tempo engraçado e misterioso, e poderia ser traduzido no Brasil como “Necas”, “De Jeito Nenhum” ou simplesmente “Não”.

ENGRAÇADO E MISTERIOSO

Por combinar tão bem com o filme, o título original é fantástico. Não Não Olhe (olha eu comendo as exclamações aí!) não é um terrir, mas tem cenas que claramente foram criadas para arrancar sorrisos. A primeira cena de medo, por exemplo, me causou uma sensação nova – algo raríssimo no cinema – por ter me deixado com medo ao mesmo tempo que deu vontade de rir.

Outro momento que merece destaque aqui é a cena do macaco, especialmente em um momento que é extremamente claustrofóbico e assustador. Quando este momento passou, eu fiquei boquiaberto, tanto pelo medo causado quanto pela forma extremamente criativa da filmagem. Jordan Peele sem dúvida é um diretor muito talentoso.

Crítica Não Não Olhe, Não! Não Olhe!, Não Não Olhe, Crítica Não! Não Olhe!, Jordan Peele, DelfosA ARMADILHA DOS FILMES B

Porém, ele não é tão bom de narrativa quanto de estilo ou criatividade. Não! Não Olhe! homenageia filmes B, mas acaba caindo na armadilha que eles evitavam por simples falta de orçamento: mostrar demais.

Por limitações orçamentárias, os filmes B do passado falavam muito mostrando pouco. E Não! Não Olhe! segue essa linha. Até que simplesmente a abandona. O último terço do filme, onde provavelmente se concentra o grosso do que foi gasto em pós-produção, vira um espetáculo de Hollywood, cheio de efeitos especiais impressionantes, mas que peca em dar uma conclusão satisfatória ou mesmo apropriada para o que veio antes.

CRÍTICA NÃO NÃO OLHE: PERDIDO EM LOST

É mais ou menos como aconteceu com Lost, a série de TVPeele é muito bem sucedido em criar um mistério e uma atmosfera opressora. E daí, na hora de revelar, de mostrar mesmo, acaba se perdendo, especialmente no roteiro. Muito disso se deve às expectativas que o espectador (rá!) cria naturalmente quando é apresentado a mistérios. Mas muito se deve a um roteiro fraco e a uma mudança de gênero.

Coisas que acontecem nesse final, como o destino do cinegrafista, simplesmente não fazem sentido. Parece estar no filme apenas para ser engraçado. E até é, mas este não é Corra que a Polícia Vem Aí!. Aqui a história deve ter prioridade sobre a piada. E não faz sentido aquele personagem fazer aquilo naquele momento.

Isso fez com que eu saísse da sessão um tanto dividido. Eu gostei muito de Não Não Olhe. Certamente é o que mais gostei da ainda curta filmografia do Jordão Peludo. Mas o ato final decepcionou, e fez com que saísse com um gosto amargo do cinema. Tipo não é o tipo de decepção que estraga tudo que veio antes, e justifica não assistir ao filme. Mas na tentativa de responder tudo, mostrar tudo, acaba caindo no clichê Hollywoodiano que evitou tão bem durante os primeiros dois atos.