Coletiva Rebobine, Por Favor: Michel Gondry

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Se você é um cabeça de mamão, provavelmente não sabe quem é Michel Gondry. Então esse parágrafo é para você, seu cabeça de mamão. O cara dirigiu o tremendão Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças, Rebobine, Por Favor, que estréia essa semana e vários videoclipes conhecidos de artistas como a Björk.

Antes de começar as perguntas, a tradutora solicitou que Michel Gondry fizesse uma introdução. Ele disse que preferia começar com as questões, pois estava despreparado para falar. Aliás, o sujeito estava com a maior cara de sono e tem um sotaque francês tão forte que deixava sinceramente difícil entendê-lo. Admito que nunca usei tanto o trabalho de um tradutor como fiz aqui.

A idéia para a exposição surgiu 25 anos atrás, em Paris. Nessa época, os multiplexes malvados estavam deixando os simpáticos cineminhas de bairro vazios e Miguel Gondria achou interessante a idéia de fechar um deles para fazer filmes em comunidade. Quando ficassem prontos, cobrariam uma pequena taxa para as pessoas assistirem e assim financiariam os seguintes. A idéia não foi para frente, pelo menos não até agora, quando acabou virando um longa e uma exposição.

Gondry também fala sobre o surgimento da idéia do filme. Quando ele comprou o box de Planeta dos Macacos, percebeu que o orçamento diminuía a cada filme, sendo o último quase um filminho independente. Naquela época, uma seqüência tinha 85% do budget anterior. Hoje é o contrário, mas esse fato fez ele imaginar quão engraçado seria refilmar longas famosos com orçamento zero.

O que será que ele acha da tecnologia atual, que permite que qualquer um faça filmes no celular? “O que importa é a criatividade. Teve uma época onde qualidade técnica era importante. Hoje você assiste numa janelinha do YouTube com o resto da tela preenchido por propagandas. Não sei como é no Brasil, mas nos EUA e em Paris, tudo é feito para você não sair de casa. E é importante sair. Essa é uma das idéias dessa exposição, estimular contatos e relações. É importante controlar o que você vê na mídia, para não acabar controlado por ela. Na minha casa, videogames são proibidos e a TV só serve para assistir a DVDs”, responde nosso amigo.

Uma outra moça pergunta por que ele não usa efeitos especiais. Ele diz que no começo usava bastante, mas depois acabou indo pelo caminho inverso. Para ele, efeitos digitais não são tão viscerais quanto os efeitos práticos, e isso fica bem claro em filmes de fantasmas, que nunca funcionam bem em CG. Com blue screen, as pessoas não se sentem no filme, muitas vezes dá até para perceber que os atores não estão nem na mesma sala. Além disso, quem assiste sente que pode fazer aquele filme na sua casa. Com CG, ninguém tem essa impressão. Ele diz ter assistido a uma adaptação de quadrinhos que tinha duas horas de história e uma hora de efeitos especiais (seria O Cavaleiro das Trevas?). O problema é que usar apenas efeitos práticos encarece o filme. Em Brilho Eterno, por exemplo, o diretor se viu obrigado a alterar algumas cenas por problemas de orçamento. As idéias de Miguel Gôndola começam em um ponto, um desafio que ele quer vencer ou algo que quer fazer. As histórias surgem só depois, em torno disso.

Um momento fanboy veio a seguir: um caboclo foi falando que é diretor de propaganda e que Gondry foi uma grande inspiração para ele, assim como para muitos outros diretores de comerciais. Como ele vê essa inspiração e, especialmente, o que acha quando vê uma idéia sua em um comercial? A resposta do nosso entrevistado vai ganhar um parágrafo só para ela.

“Isso não me deixa feliz. Tenho problemas éticos com propaganda. É legal inspirar pessoas, mas elas deveriam criar suas próprias coisas. Influência não é bom. Estimulação é”.

E Hollywood? Está rolando algum flerte aí? “Hollywood não me apetece. Algumas coisas eu chego a desprezar. Eu gosto de comédias como De Volta Para o Futuro e Caça-Fantasmas, mas Hollywood só me procura para tentar agregar coolness para um projeto ruim. Se as pessoas me vêem como um cara cool, não sei de onde elas tiraram isso”.

Próximos projetos: “estou fazendo uma animação 2D com o meu filho. O roteiro será de Daniel Clowes, que escreveu a HQ Ghost World. Também estou acompanhando um ônibus escolar no Bronx por seis meses e o resultado será a história de um filme. É engraçado perceber que, quanto mais crianças estão no ônibus, menos agem como elas mesmas. Tenho vários projetos no momento, mas não sei qual deles vai ser o próximo”.

Voltando a falar da exposição, Michel diz que assistiu cerca de metade dos filmes feitos pelo público em Nova Iorque. Porém, é contra qualquer tipo de competição e dizer se um é melhor que o outro, pois isso destrói o propósito da coisa toda.

Michel Gondry termina a entrevista – e eu termino esta matéria – com uma frase bizarra: “para mim, atores são coisas estranhas, alienígenas fora da nossa realidade, que fingem ser como nós”. Então tá.

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