Lembra do filme Em Algum Lugar do Passado, de 1980, recentemente lançado em DVD no Brasil, com Christopher “Super-Homem” Reeve e Jane Seymour, em que o protagonista volta no tempo para encontrar o amor de sua vida? Não, antes que passe pela cabeça de alguém, para isso ele não dá voltas ao redor da terra, voando com sua capa vermelha. Não confunda! O que acontece é uma viagem ao passado, tornada possível através de um estado mental de hipnose em que ele mesmo condicionava seu cérebro de que o ano em questão era 1912 e não o ano em que na verdade estava.
Lembrou? Então, o que acontece com Jack Starks (Adrien Brody, de A Vila, em interpretação memorável), neste thriller produzido por Steven Soderbergh e George Clooney (que participaram de Doze Homens e Outro Segredo), é algo parecido, só que ao contrário, pois ao invés de ir para um passado em que ele sequer tinha nascido, como fez Richard Collier (Reeve) no drama romântico dirigido por Jeannot Szwarc, o soldado americano Starks faz viagens para um futuro no qual ele já morreu e, enquanto, no presente, ele procura descobrir o porquê dessas suas viagens no tempo, quando está no futuro, tenta também saber as causas de sua morte. Parece um pouco confuso? Calma que você já vai entender.
Tudo começa em 1991, na Guerra do Golfo, quando ele leva um tiro na cabeça e, após se recuperar, volta à sua cidade natal. Lá, Starks começa a sofrer lapsos de memória e, quando dá por si, está internado em um hospício. Pois é, Starks foi acusado do homicídio de um policial, o que fez com que constatassem sua insanidade.
No manicômio, ele vira uma das cobaias do Dr. Thomas Becker (Kris Kristofferson), que costuma prendê-lo na tal camisa de força que dá titulo ao filme e colocá-lo em uma gaveta de necrotério, nos subsolos do local, para ver se ele “melhora” com isso.
É na solidão e na escuridão desta gaveta claustrofóbica, completamente imobilizado, que Jack Starks começa a “abrir” sua mente e consegue viajar para o ano 2007. Entretanto, ele não está preso no mesmo lugar no futuro. Lá, ele está livre o suficiente para conhecer Jackie Price (Keira Knightley, de Rei Arthur, bela e interessante como sempre), moça que conhecera criança em 1991 e pela qual acaba se apaixonando. Através de Jackie, ele descobre que morrera quatro dias depois do dia em que fez sua primeira viagem, ou seja, tem somente quatro dias de vida. A partir daí, seja no presente, com a ajuda da Dra. Lorenson (Jennifer Jason-Leigh) ou no futuro, Jack passa a procurar os motivos pelo qual morreu para, quem sabe assim, conseguir evitar o seu fim precoce.
Ainda confuso? Bom, no início é bem confuso sim e demora a fazer sentido, mas aos poucos as coisas vão se encaixando e o que se tem ao final é um ótimo suspense, apesar da premissa bastante maluca. É muito interessante observar como a atuação realista de todo o elenco, em especial dos coadjuvantes Kristofferson e Leigh, dá uma inusitada credibilidade ao filme, chegando até a causar um certo incômodo no espectador que, em pouco tempo de projeção, já comprou este enredo mirabolante e está roendo as unhas.
Não dá para deixar de citar a boa interpretação de Daniel Craig (de Nem tudo é o que Parece), que faz, sem maiores problemas, um dos loucos do hospício e há também as participações de Steven Mackintosh (o Winston de Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes) como o Dr. Hopkins e de Brad Renfro (de O Aprendiz), em uma pequena e quase despercebida aparição. A fotografia de Peter Deming também agrada. Aliás, este pode ser considerado um de seus trabalhos notáveis (para quem não sabe, este diretor de fotografia nascido no Líbano já trabalhou para David Lynch em Cidade dos Sonhos e Sam Raimi, o diretor de Homem-Aranha 2, em Evil Dead 2, além de ter contribuído também na trilogia Pânico, de Wes Craven, cuja última empreitada, o nojento Amaldiçoados, você confere aqui)
É realmente uma pena que este longa-metragem do britânico John Maybury, que tem também como pontos fortes a montagem ágil, a trilha sonora aflitiva composta por Brian Eno e um ótimo clima, tenha tudo para passar despercebido do grande público, pois é um cinema estadunidense de entretenimento e de qualidade, diferente dos “filmes nada” (cuja explicação você leu na resenha de Aprendendo a Mentir) sobre os quais você lê com freqüência aqui no DELFOS e que, lamentavelmente, ficam um bom tempo nos cinemas e ainda faturam na bilheteria. É uma obra que provoca sensações e faz pensar, o que, por si só, mesmo sem esta equipe de qualidade, já valeria o ingresso. Infelizmente, você não vai ter oportunidade de assistir na tela grande, pois este é um lançamento direto no DVD, que sai aqui no Brasil este mês. Alugue, pois vale a pena.