Brody Dalle – Diploid Love

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Para um gênero tão caracteristicamente adolescente, é impressionante a quantidade de grandes expoentes do Punk Rock que conseguem se manter relevantes e ficar cada vez mais interessantes com o tempo. De Henry Rollins a Greg Graffin e Patti Smith, não faltam exemplos de artistas punk que só subiram seus níveis conforme as décadas foram passando.

E isso não se limita apenas ao aspecto musical. Com a maturidade, eles também vão se tornando mais “sábios”, mais sensatos, e provam que é possível entrar na vida adulta mantendo suas convicções, sem repetir os erros e atitudes contra os quais eles se rebelavam na juventude. A chegada de filhos é um dos fatores mais importantes dessa “transformação”, e já foi inclusive o tema de um ótimo documentário chamado The Other F Word, em que gente como Jim Lindberg (do Pennywise), Fat Mike (do NOFX) e Flea (do Red Hot Chili Peppers) contam como é a experiência de criar um filho quando você sempre se opôs à ideia de autoridade. É bastante interessante.

Brody Dalle é outro membro desta turma. Ela fez parte de um monte de bandas quando adolescente, mas estourou realmente no finalzinho dos anos 90, como a inconfundível voz do The Distillers. Depois de três álbuns icônicos, a banda terminou e, mais tarde, ela criou o Spinnerette, um projeto paralelo igualmente enérgico, mas com uma sonoridade mais polida e influências mais abrangentes.

Sua trajetória foi cheia de turbulências que parecem ter permeado os temas de seus trabalhos – desde a infância conturbada na Austrália e o relacionamento traumático com Tim Armstrong ao vício em drogas e depressão –, mas apesar disso, a moça sempre preferiu manter sua vida pessoal o mais distante possível de sua música. Parece que só agora, aos trinta e cinco anos, num casamento muito mais saudável com o lendário Josh Homme e com um casal de filhos, Brody encontrou a hora certa de lançar um disco sob seu próprio nome e cantar abertamente sobre sua própria vida.

E apesar desse climão introspectivo, o álbum é cheio de convidados ilustres, como Nick Valensi, do The Strokes, Emily Kokal do Warpaint e Michael Shuman, do Queens of the Stone Age. Já em Rat Race, por exemplo, temos o produtor e parceiro de longa data Alain Johannes contribuindo no trompete, que fez a diferença numa faixa que poderia ter ficado esquecível. Já a seguinte, Underworld, tem uma veia mexicana provida pela participação de uma banda chamada El Mariachi Bronx.

Don’t Wanna Mess With Me é mais grudentinha e pop, e segundo a própria Brody, é para crianças que precisam enfrentar seus bullies. Dressed in Dreams, uma das minhas preferidas, é uma baladinha sobre resistir aos momentos difíceis e sobreviver para ver os dias melhores. E rolou até uma versão ao vivo mais fofa dela para o NPR:

Carry On tem um tema parecido, mas traz também um piano muito gostoso e uma batidinha meio New Order que caiu muito bem. E logo depois vem Meet the Foetus/Oh the Joy, que sozinha já valeria o álbum inteiro. Ela vem em duas partes: a primeira traz a temática de maternidade que inspirou o nome do álbum, e não ficaria destoante na trilha sonora de um filme sci-fi pós-apocalíptico. E depois, vem uma outro épica que tem Shirley Manson, do Garbage, como convidada.

Depois dessa verdadeira carta de amor aos pimpolhos, vem a mais amarga e dark Don’t Need Your Love, em que Brody fala ao pai que a abandonou na infância. De todas as muitas experimentações que ela fez neste álbum, o vocal desta faixa foi a que menos me agradou. No entanto, ela é salva pelo extremamente fofo momento em que se ouve as risadas da prole brincando.

Nas duas últimas faixas, Blood In Gutters e Parties for Prostitutes, Brody também mostra outras nuances de sua potentíssima voz, mas dessa vez dá mais certo. A primeira tem um ótimo refrão, e a segunda encerra com o momento mais ácido do álbum, disfarçado numa baladinha meio eletrônica que parece influenciada pelo Depeche Mode.

Como as comparações são inevitáveis, o Diploid Love realmente não tem o peso do The Distillers e nem é tão “fácil de ouvir” quanto o Spinnerette, mas ele é definitivamente outro passo adiante para Brody. Depois de tanto tempo sem lançar nada, este álbum mostra que ela continua evoluindo, e é bom perceber o quão otimista e confiante ela soa nesta nova fase, especialmente para quem a conheceu berrando as letras sombrias do Sing Sing Death House e do Coral Fang. Minha admiração por ela, que já vem de muito, muito tempo, também só faz crescer.