Finalmente, delfonauta! Depois de muito esforço, e de uma história que envolveu até um bolo da loja Havan, eu estou com um Xbox Series X. Isso significa que é hora de escrever as análises dos dois exclusivos do console que não rodavam no One, e que já estavam comigo desde antes do lançamento. No futuro próximo, falaremos de Bright Memory, mas vamos começar a cobertura deste elusivo console com a análise The Medium. Então incorpore espíritos, grite saravá e me acompanhe no texto abaixo.
BLOOBER TEAM
A Bloober Team provavelmente é a desenvolvedora mais produtiva da geração passada, tendo lançado dois Layers of Fear, Observer e Blair Witch. Eu joguei e analisei todos esses jogos mas, para ser sincero, não gostei muito de nenhum. Quando de seu lançamento, The Medium também não foi muito bem avaliado, então as expectativas estavam contidas.
Porém, o dinheiro de exclusividade pago pela Microsoft foi extremamente bem empregado. The Medium é o jogo mais ambicioso e “caro” feito pela Bloober Team, o que já era de se esperar. Mas é também o melhor, com uma temática legal e uma boa história. É sem dúvida o primeiro trabalho da Bloober Team que tem potencial de virar uma franquia.
ANÁLISE THE MEDIUM
É fácil te dar uma boa ideia de como é The Medium com uma simples comparação, então vou começar com ela. The Medium lembra muito um Resident Evil 1 sem combate. Ele é mais do que isso, e muito mais legal do que essa pífia comparação pode dar a entender, mas comecemos pelas semelhanças.
Este é um jogo de terror que acontece quase em toda sua totalidade dentro de uma construção (o resort Niwa). O gameplay envolve encontrar portas e passagens bloqueadas e explorar para encontrar formas de abri-las. Eventualmente, aparece um monstro invencível, e você deve navegar em torno dele para alcançar seu objetivo.
ALÉM DE RESIDENT EVIL
The Medium é mais linear do que Resident Evil. Normalmente, para abrir as portas fechadas, você basicamente segue o caminho disponível. Através dele, encontrará o necessário para abrir e, seguindo em frente, eventualmente aparece um atalho que o coloca de volta em frente à passagem fechada, para você poder usar o item.
Eu gosto disso. É uma forma de manter o jogo altamente roteirizado (essencial em uma experiência de terror), mas ainda dar a sensação de exploração, e de que o jogador está fazendo seu próprio caminho – embora na verdade esteja andando por corredores pré-estabelecidos.
Mas o mais legal mesmo de The Medium é sua temática. E isso se estende ao gameplay.
A TEMÁTICA DE THE MEDIUM
Tente conter sua surpresa, mas The Medium conta a história de uma moça que é, veja só, médium. Marianne, a protagonista, vê gente morta. Mais do que isso, ela é capaz de ajudar os presuntos encalhados a passar para o outro lado de forma pacífica. Para refletir isso, boa parte do jogo e cutscenes acontecem em tela dividida, com metade mostrando o mundo físico, e a outra o espiritual.
Mas o mais legal é o tratamento que o jogo dá a essa temática. Normalmente, quando a cultura pop trata de fantasmas, esses são sempre malvados, e isso nunca desceu para mim. Supondo que uma pessoa morta mantenha sua personalidade ao morrer, um fantasma não viraria automaticamente mau. Minha querida mãe, por exemplo, falecida em 2003. Se eu encontrasse o fantasma dela hoje, duvido muito que ela iria querer me fazer mal. Este é um dos motivos pelos quais eu normalmente não me envolvo tanto com filmes de terror sobrenaturais. Eu tenho mais medo de gente viva do que de fantasmas. Esses sim, já provaram muitas vezes que querem e vão me fazer mal.
Tudo isso para dizer que é este o tratamento que a Bloober Team dá para os fantasmas em The Medium. Os poucos fantasmas que você encontra não são maus. A menina da imagem acima, chamada de Sadness (Tristeza) age como uma menina, e Marianne a trata com a mesma naturalidade e carinho que qualquer pessoa normal trataria uma menina. O fato de ela estar presa entre mundos não a tornou má.
PAI ADOTIVO
Aliás, antes de você entrar no resort Niwa, o jogo começa com o funeral de Jack, pai adotivo de Marianne. Seu primeiro objetivo é preparar o presunto para o funeral e lidar com o luto propriamente dito. Mas é claro que o fantasma de Jack aparece, e tem uma última conversa com Marianne.
Eles trocam palavras gentis, se despedem, e Marianne ajuda o fantasma a ir para o outro mundo em paz. É uma cena bonita e tocante. Ela tem a função narrativa de apresentar os poderes de Marianne para o jogador, mas acaba emocionando, especialmente aqueles que, como eu, já perderam pessoas queridas. Marianne até fala que muitas pessoas (onde me incluo) adorariam ter a oportunidade de uma última conversa com um familiar que passou pela transição.
Uma coisa que pode parecer pequena, mas me incomodou, é que The Medium, mais do que a imensa maioria dos jogos, poderia ter uma protagonista diferente. Não me refiro a etnias. Até que nisso a cultura pop é bem variada. Mas considerando que este não é um jogo de ação, poderiam ter saído do clichê da protagonista bonita e gostosa. Ela poderia ser gorda, ser idosa. Enfim, muitas coisas poderiam fazer a Marianne ser mais interessante do que a tradicional “modelo” que estrela em absolutamente toda história que é criada.
A TEMÁTICA APLICADA AO GAMEPLAY
Mas é claro, estamos falando de um videogame. E essa sacada de “entre dois mundos” é exatamente o motivo pelo qual The Medium não está disponível para Xbox One. Ele precisa da velocidade do SSD para poder alternar o gameplay instantaneamente entre as duas dimensões – um truque que, aparentemente, o vindouro Ratchet & Clank também vai usar. Além disso, boa parte do jogo rola em tela dividida, onde você precisa abrir um obstáculo de um lado para conseguir progredir em ambos.
A coisa funciona bem no gameplay, ainda que o jogo tenha alguns problemas técnicos pentelhos. Ele travou várias vezes durante a minha campanha, especialmente quando eu voltava para o painel do console e depois retomava a jogatina. Luzes apareciam em uma das duas metades da tela – e não são luzes planejadas, era um tilt mesmo.
Também é comum texturas e detalhes aparecerem tarde demais, especialmente quando você alterna entre os mundos. Isso é algo que eu achei que teria sido resolvido na geração atual, mas já vi acontecer no PS5. Em The Medium, realmente distrai, e mostra que mesmo o SSD do Series X não é rápido o suficiente para este jogo. Vamos ver como o Ratchet vai se sair nisso.
NEMESIS
E, claro, tem os pontos de perigo, que são bem pontuais. Isso é um aspecto no qual a Bloober Team mandou muito bem. É possível morrer no jogo, o que deixa o jogador tenso por não saber o que vem a seguir. Mas também não é um esconde-esconde o tempo todo, o que faz com que games como Remothered e Outlast 2 fiquem chatos e arrastados.
Ele usa duas mecânicas para quando você está sendo stalkeado. No mundo dos espíritos, a coisa é mais tradicional. Você vê o monstro e ele te vê, então é necessário passar escondido.
Já no mundo dos vivos, o monstro aparece camuflado, estilo Predador. Nesses casos ele não te vê, ele te sente. Então dá para passar bem do lado dele, desde que esteja segurando a respiração. É bacana, exige táticas diferentes para cada caso, e traz variação a um tipo de gameplay que em geral não agrada muita gente.
Dentre todos os jogos de pega-pega e esconde-esconde que poparam nos últimos anos, eu diria que The Medium tem um dos melhores timings, melhor até do que o tremendão Soma.
TERMINANDO A ANÁLISE THE MEDIUM
Dado o histórico da Bloober Team, eu realmente não esperava gostar tanto de The Medium. No final das contas, acabou sendo uma daquelas campanhas que eu não queria que terminasse, o que anda raro no mundo dos games cada vez mais longos.
Escrever esta análise The Medium foi uma excelente estreia para meu novo e brilhante Xbox Series X, e é sem dúvida o melhor jogo já feito pela Bloober Team. A ponto de que, pela primeira vez na carreira deles, estou animado para ver o que vão aprontar agora.