Beyond a Steel Sky me chamou atenção pelo pedigree de seus criadores. Ele une o diretor e roteirista Charles Cecil, de Broken Sword, com o desenhista de Watchmen, Dave Gibbons. Admito, antes de começar a trabalhar nesta análise Beyond a Steel Sky, eu não tinha ouvido falar dele. E menos ainda da aventura anterior. Pois é, Beyond a Steel Sky é continuação direta de Beneath a Steel Sky, de 1994, e que também uniu Cecil e Gibbons.
Felizmente, a história é facilmente compreensível mesmo para quem não jogou o anterior. Porém, o protagonista Foster vive fazendo referências à outra história. Por exemplo, ele começa falando do “meu amigo Joey”. Depois eu descobri que o tal Joey era um robô, que foi construído por Foster. Depois ainda, fiquei sabendo que existiam dois Joeys, com personalidades bem diferentes. Isso tudo para mim foi revelação, mas o jogo espera que você já saiba de tudo isso antes de iniciar. Então seria interessante ter um vídeo de previously para assistir antes de começar este.
O QUE É BEYOND A STEEL SKY?
Beyond a Steel Sky é uma modernização do clássico adventure point and click. Porém, ele é totalmente diferente do que eu costumo chamar de adventure moderno, aquele estilo da Telltale. Beyond a Steel Sky é mais próximo dos clássicos da Lucasarts, como Sam & Max. Aqui o foco não é nas suas decisões, mas em soluções de quebra-cabeças.
O que o torna mais moderno é que a coisa não acontece em um plano 2D, em que você simplesmente leva um cursor até diversos pontos e clica para ver o que acontece. O que temos aqui é mais próximo de um jogo 3D tradicional, daquele estilo com câmera livre e posicionada nos ombros.
Eu falei da Lucasarts, mas na verdade o mais próximo de jogar Beyond a Steel Sky que eu consigo pensar são aqueles trechos sem combate de Mass Effect. E isso faz toda a diferença. Deixa Beyond a Steel Sky muito mais jogo, e menos diorama interativo, sabe?
Uma das coisas mais legais que videogames nos proporcionam é o turismo virtual, ou seja existirmos em outros mundos. É por isso que eu gosto tanto de walking simulators. Só existir em outro mundo pode ser um prazer, mesmo sem combate. E Beyond a Steel Sky proporciona isso, e acrescenta um sabor de adventure clássico nesse sanduba.
ANÁLISE BEYOND A STEEL SKY
Seu objetivo é apresentado logo na cutscene inicial. Um menino da sua vila é raptado por androides controlando um veículo com patas. Você, no papel do herói Robert Foster, segue a trilha, e vai parar na Union City, uma utopia que, aparentemente, Foster ajudou a construir no jogo anterior.
E utópica Union City realmente é. Todos os cidadãos têm acesso a roupa, casa, comida, entretenimento e cuidados de saúde. Assim, são livres para viver como bem entenderem, tendo todas suas necessidades supridas. Não há uma moeda, mas há um tal de Qdos, um sistema de pontos que recompensa boas ações, trabalho e outras atividades consideradas produtivas. Quanto mais Qdos tiver, mais conforto a pessoa recebe. É um sistema interessante, que lembra as origens do capitalismo como teoria (quem mais contribuir com a sociedade, recebe mais dinheiro). Claro, todos sabemos o caminho horrível que o capitalismo seguiu, e se você já leu/assistiu/jogou qualquer história desse tipo deve estar imaginando que tem caroço nesse angu.
Como Foster, você terá a oportunidade de explorar a cidade, conhecer vários cidadãos, usufruir de seus benefícios e, claro, resolver uma cacetada de quebra-cabeças.
ANÁLISE BEYOND A STEEL SKY E UMA CACETADA DE QUEBRA-CABEÇAS
Os desafios vão desde o tradicional “pega um bagulho aqui e usa ali” dos adventures clássicos a um joguinho de hacker bem interessante, onde você pode embaralhar as funções de máquinas próximas.
Clicar em um item ou personagem te dá uma lista de opções. São aquelas tradicionais do gênero, tipo pegar, falar, olhar, etc. Quando aparece a opção “Inventário”, como na imagem acima, é possível usar um item naquele lugar. Felizmente, o jogo realça automaticamente itens que podem ser usados ali, ainda que muitas vezes escolher um deles só faça Foster comentar “eu não posso usar isso aqui”.
HACKEANDO A ANÁLISE BEYOND A STEEL SKY
O hackeamento é bem mais complicado. Ou melhor, é fácil de entender, mas difícil de resolver. Por exemplo, uma porta é programada para abrir só para quem tem um nível de Qdos alto. Daí você aciona seu equipamento e troca a função, fazendo com que ela abra para quem tem nível baixo e feche para nível alto. Sacou?
A coisa é quase sempre mais complicada, no entanto. As máquinas costumam se mover e ter funções que são intercambiáveis com funções específicas de outras. Assim, você precisa atrair a que tem a função que deseja para a que tem a função que você quer substituir. Em alguns casos, você precisa passar de uma máquina para outra até chegar no objetivo final. Sim, tem puzzles bem complexos nesse jogo.
Quão complexos, você pergunta? Olha, ele durou cerca de dez horas para mim. Porém, eu aproveitei o fato de ele ter saído há mais de um ano para computadores e consultava guias com frequência. Se tivesse que solucionar tudo por conta própria, imagino que teria potencial de ter passado umas 30 horas nesse mundo. Mas teriam sido horas bem menos prazerosas.
CADÊ POLIMENTO?
Dito isso, eu gostei muito do jogo. Gostei da história, do mundo e do visual. Mas mesmo tendo saído há mais de um ano para computadores, precisa de mais polimento. Por exemplo:
Uma coisa que acontece direto, literalmente a toda hora, é que você está conversando com alguém. Daí um NPC se aproxima e fica tentando te atravessar, ou então para no meio da conversa, bloqueando a câmera. A imagem acima é um exemplo, mas eu tirei dezenas de screenshots com isso acontecendo na minha campanha.
Outra coisa é que os NPCs e as máquinas se movem. E a interface do jogo é lenta. Você precisa se aproximar do alvo, apertar X (no PS4), e daí selecionar qual opção deseja antes de dar a ação. Dar um ítem para outro personagem, por exemplo, é enervante, pois na maioria das vezes o sujeito simplesmente sai andando – o que fecha o seu menu – antes de você chegar no que queria dar a ele.
Esses pequenos probleminhas técnicos se acumulam de tal forma que afetam consideravelmente a diversão. Eu recomendaria Beyond a Steel Sky com muito mais veemência se ele funcionasse direito.
MAS TAMBÉM TEM A HISTÓRIA
A história também tem alguns problemas relativamente graves, especialmente em um jogo tão focado no roteiro. Exemplo sem spoiler: tem um momento em que você recebe uma mensagem dizendo para ir ao lugar X no horário Y. Você vai lá e, embora isso faça a história andar, nunca é revelado quem mandou a mensagem. O fato de os aliados que você encontra lá te atacarem assim que te encontram demonstra que não foram eles que te chamaram.
Outro problema ainda mais grave é que você eventualmente encontra o moleque que está procurando, mas nunca é elaborado porque ele foi raptado. Pelo menos não de forma convincente. Mesmo sua motivação em destruir essa cidade utópica parece vazia, pouco desenvolvida. Eu simplesmente não queria fazê-lo quando chegou a hora.
Assim, Beyond a Steel Sky foi uma experiência bem agradável para mim. Mas eu não diria que ela foi especialmente satisfatória. O jogo e sua história são crus demais, ambos carecem de um maior desenvolvimento. E sabe aquilo que eu costumo falar de, quando eu termino, eu penso que alguns jogos foram uma grande aventura? Aqui foi meio o contrário. Embora eu tenha curtido viver nessa cidade, sinto que a explorei pouco, falei com poucos personagens. Enfim, não aconteceu muita coisa nas minhas dez horas com ele.
Beyond a Steel Sky funciona melhor, portanto, como um turismo virtual, mais do que como uma história completa e satisfatória. E não, ele não termina em cliffhanger nem nada do tipo. Só precisava de um pouco mais de polimento mesmo.