Adeus, Orkut

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Uns dias atrás, surgiu em um grupo de amigos meus do Whatsapp uma conversa sobre um relato polêmico que um colega nosso (que não faz parte do grupo) contou na nossa cambaleante comunidade do Orkut.

O tal relato era uma revelação bombástica sobre alguns membros da comunidade. O problema é que a revelação era ao mesmo tempo absurda e muito bem contada, o que fez nós não sabermos se era verdade ou não. No meio da discussão, um destes amigos diz “eu ainda acho que é mentira. Acho que o fulano só quis fechar o Orkut com chave de ouro”. E foi aí que eu me lembrei que o fatídico dia está por vir.

Isso mesmo, o Orkut, a rede social que virou febre no Brasil entre os anos de 2005 e 2010, vai fechar suas portas hoje. Assim que percebi isso, fui tomado por aquela sensação esquisita que sempre sinto quando recebo a notícia de que aquele parente bem velhinho e debilitado finalmente se foi. Não é uma sensação alegre, nem de longe, mas também não é aquela dor desesperadora de uma morte repentina. Acho que é mais saudade e aceitação do que alegria ou tristeza.

Talvez você possa estar achando meio absurdo eu comparar algo tão etéreo quanto uma rede social com a vida de uma pessoa. Mas é que as comunidades do Orkut significaram muito, muito mesmo para mim. Quem me conhece hoje pode pensar que eu sou um veterano da internet discada, mas a verdade é que eu só fui ter acesso diário à rede mundial de computadores em 2005 e as comunidades do Orkut foram minha primeira casa no mundo virtual.

A maioria das pessoas, pelo menos aqui no Brasil, usa redes sociais para publicar fotos, compartilhar imagens idiotas e, basicamente, ficar próximo de quem conhece ou arranjar um par romântico. Mas eu sempre as usei para discutir ideias, expressar opiniões, debater e, através disto, fazer amigos com interesses parecidos com os meus, mesmo que nossas ideias nem sempre batam. O que, a meu ver, é o intuito verdadeiro das redes sociais: conhecer gente nova e interessante, que acrescente algo.

Não sei dizer ao certo porque eu comecei a frequentar os fóruns das comunidades. Talvez eu realmente estivesse me sentindo sozinho lá na fazenda, onde eu não tinha nenhum amigo que partilhasse a mesma paixão por games, quadrinhos e principalmente heavy metal. Talvez eu estivesse destinado a isto. Ou talvez eu estivesse apenas entediado. Só sei que foi lá, naquelas paredes virtuais pintadas de roxo e azul-calcinha, que descobri como funcionava este mundo muito louco chamado de interwebs. Mas o que mais me marcou mesmo foram os amigos que fiz lá.

Alguns eu fiz porque tínhamos interesses em comum e, com a convivência, passamos a falar de assuntos cotidianos e a confiar uns nos outros e lá se vão quase 10 anos de conversas diárias com essas pessoas. Outros eu fiz porque não tínhamos nada em comum e depois de várias flamewars (discussões gigantes sobre um tema que não levavam a lugar nenhum, pelo menos não na hora) vimos como um aprendia com o outro e aí surgiu a camaradagem.

Teve até uma turminha de fakes que iam na comunidade Eu Odeio Pagode (sim, eu sei que você estava lá, não esconda), xingar os roqueiros de lá e louvar o pagodão. O mais engraçado é que na maioria das vezes esses “pagodeiros” tinham argumentos melhores, mais coesos e mais engraçados que a maioria dos roqueiros de lá. E aí quando eu comecei a me apegar a eles, a ponto de trocarmos MSNs, descobri que todos eles na verdade eram tão ou mais roqueiros quanto eu. Eles só estavam lá pra tentar fazer as pessoas verem que não é porque alguém tem um gosto diferente do seu que ele é inferior. E enquanto não conseguiam isso, usavam seu conhecimento pra tirar uma com a cara dos mais fanáticos. “Você só pode falar mal do que você entende”, eles me disseram. Uma lição que vou levar para o resto da vida.

Lembro-me que, antes de começar a usar a internet, achava que essa história de amizade virtual era besteira. E olha só eu aqui hoje, escrevendo para pessoas do Brasil inteiro em um site que conheci através de um cara de uma comunidade, com pessoas que até pouco tempo atrás também só tinha contato pela net também.

Então eu queria dizer obrigado, Orkut. Obrigado por todos os amigos que fiz em seus domínios, cuja amizade continua até hoje, e pelos encontros pintudos que organizo com alguns deles anualmente. Obrigado pelas discussões épicas que você me proporcionou, aumentando meu senso crítico. Obrigado pelas madrugadas de conversa fiada, debates filosóficos, histórias sem noção e lamentação amorosa. Obrigado pelos depoimentos que meus amigos me enviavam quando estavam bêbados. Pelo dia em que o pessoal de uma das comus conseguiu fazer o post de número 69.000 no tópico de chat. Pela vez em que eu e meus amigos estávamos no ócio e resolvemos entrar no chat de azaração do Uol só para causar. Obrigado a seja lá quem for que colocou a minha foto, que ilustra esta matéria, no Pérolas do Orkut, dando-me 15 minutos de fama e alguns bons amigos.

Obrigado também pelas comunidades que eu não participava muito, mas sempre adorei o conteúdo genial, como os contos bizarros da Traumas de Adolescência e as notícias estapafúrdias da “Anão Vestido de Palhaço Mata 8”. Obrigado pelas imensas piadas relacionadas ao Chuck Norris, pelos personagens como o Guardião Universal, Lindomar, o Sub-Zero Brasileiro, cabo Ulisses Soares Batista (vulgo cabo USB) e tantos outros.

Enfim, obrigado por tudo, Orkut. Acredite ou não, você marcou minha vida para sempre. A gente se vê por aí. Ah, e não se preocupe. Apesar de todas as piadas dignas do Zorra Total, teorias da conspiração envolvendo a política brasileira e fotos de ostentação, comida e selfies (Odin, como eu odeio essa palavra), conheci bastante gente legal nos grupos do Facebook também. É só saber procurar.

Do seu amigo, Lucas Fernandes Corrêa.