Clássicos – Aladdin

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Quem acompanha o DELFOS sabe que eu sou um grande fã da Disney. Trata-se de uma das poucas empresas cujo perfeccionismo técnico realmente me impressiona, seja na qualidade de imagem e som, atuações, música, enfim… Seus desenhos sempre beiram a perfeição. Uma pena que, em alguns casos, como em Nem que a Vaca Tussa (veja no final desta resenha, link para várias críticas a desenhos da Disney), abram mão do mais importante: a história. Mas não foi sempre assim. Há cerca de 10 anos, a Disney vinha de um período de grandes sucessos que incluiu clássicos como A Bela e a Fera (que foi até indicado ao Oscar de melhor filme), O Rei Leão, A Pequena Sereia e este, que considero o melhor de todos os seus desenhos: Aladdin.

Para quem não conhece a história, vamos àquela sinopse básica: princesa infeliz porque é obrigada a casar com um príncipe. Conselheiro do sultão quer mais poder. Pobretão sonha em ficar rico e, para piorar, se apaixona pela princesa. Acaba encontrando uma lâmpada mágica onde mora um gênio maluco que promete conceder três desejos ao menino. E é isso. Como tenho certeza que você já conhecia a história, não tem porque me alongar na dita-cuja.

Mas se a história é tão clichê, o que torna Aladdin tão tremendão? Elementar, caro delfonauta. Na verdade, vários pontos contribuem para isso. Para começar, vamos pelo aspecto técnico: Aladdin marca o primeiro desenho da Disney a fazer experimentações em CGI. Agora sobre o mais importante: esse é simplesmente o desenho mais engraçado e divertido feito pela casa do Mickey. Já o assisti mais de 10 vezes e ainda rio alto com algumas cenas. Essa graça se deve principalmente a seus personagens e à linguagem cartunesca utilizada na animação. É tudo bem semelhante àqueles desenhos malucos da Warner ou até mesmo àquele humor maravilhoso de clássicos do Monty Python. Aliás, pelo que sei, esta foi a única incursão bem-sucedida da empresa estadunidense nesta linguagem cartunesca, pois seus desenhos sempre tiveram um pé na realidade bem forte. Um exemplo é O Rei Leão que, embora tenha leões falantes e coisas do tipo, são visualmente bem parecidos com leões reais, não têm o visual maluquinho do macaco Abu, por exemplo.

Quanto aos personagens, quase todos aqui servem de alívio cômico. Logo no começo do filme, vemos o cruel vilão Jafar (Jonathan Freeman) e seu sidekick, o papagaio Iago (em uma interpretação divertidíssima de Gilbert Gottfried). Enquanto Jafar é frio e calculista, Iago é seu perfeito oposto: histérico e estressado, ainda tem que fingir ser um papagaio comum na frente dos outros. Seu humor é complementado pelo gentil e ingênuo Sultão (Douglas Seale), que já é engraçado até no visual (o cara parece um ovo – mais um exemplo do visual cartunesco tão raro em longas da Disney). O Sultão está sempre presenteando Iago com bolachas. O problema é que Iago ODEIA bolachas. A cena onde Iago amarra o Sultão e fica enfiando bolachas goela abaixo do nosso amigo oval é uma das mais divertidas. Assim como nos filmes do Monty Python, algumas das melhores piadas podem ser encontradas nos detalhes. É o caso da parte onde Iago bate a cabeça e, ao invés de ver estrelas, vê um monte de sultãozinhos voando e falando “bolacha, bolacha, bolacha”.

Ainda no início do filme, temos boa parte do humor a cargo do macaquinho Abu (Frank Welker), que não fala nada, mas é muito expressivo e divertido. Aladdin (Scott Weinger) e Abu formam uma dupla humorística naquela linha R2-D2 e C3PO (leia resenha de Star Wars – Episódio III) ou Jay e Silent Bob, ou seja, enquanto um não fala nada e é super expressivo, o outro fala até demais e não tem tanta graça.

Mas por mais que o início do filme seja legal, ele engrena de vez lá pelos seus 30 minutos, quando o Gênio e o Tapete Mágico entram na história. O Tapete não tem braços, pernas ou rosto e mesmo assim é extremamente expressivo. É engraçadíssimo como podemos perceber quando ele está alegre, com vergonha, enfim. Um ótimo trabalho dos animadores. Finalmente, chegamos ao Gênio, o preferido de todo mundo. Em uma interpretação magistral de Robin Williams (leia resenha do outro filme onde ele fez dublagem, Robôs), ele é aquele tipo de personagem absurdamente pentelho (tipo o Pernalonga), mas é justamente aí que reside sua graça.

Sem dúvida, o personagem mais cartunesco do desenho é o Gênio. Praticamente em todas as suas cenas ele faz alguma referência a elementos da cultura Pop. O cara imita tremendões como Schwarzenegger, Jack Nicholson ou Robert DeNiro em cenas clássicas de suas carreiras e faz até citações a outros desenhos da Disney. É o caso do momento em que Aladdin diz que vai livrá-lo da maldição e ele se transforma no Pinóquio ou da cena em que ele tira o caranguejo de A Pequena Sereia do livro de receitas ao som de Under the Sea ou mesmo do momento em que ele veste um daqueles tradicionais chapéus do Pateta que todo mundo que já foi à Disney tem. A dublagem em português é ótima, mas infelizmente, boa parte de suas piadas ficam perdidas na adaptação feita para a tradução, principalmente nas músicas, que apelam sem dó para o velho truque clássico dos tradutores preguiçosos que têm mania de transferir o verbo para o final da frase para rimar, mesmo que isso fique horrível. Afinal, o que importa é acabar logo o trabalho, não fazer algo com qualidade. Por causa disso, se tiver possibilidade, assista ao filme em inglês sem legendas ou com as legendas também na língua de Shakespeare.

Aladdin também conta com uma trilha sonora marcante, das quais as duas mais legais são interpretadas pelo Gênio. A Friend Like Me é sua música de apresentação. Um Jazz divertidíssimo e com um tremendo show de animação. É simplesmente impossível não se divertir enquanto o Gênio usa seus poderes mágicos à exaustão, criando mulheres, animais, dançarinos, comida e as mais bizarras e engraçadas situações enquanto os confusos Aladdin e Abu ficam olhando com cara de ponto de interrogação. Simplesmente um dos melhores momentos de todos os desenhos Disney. Sua outra música, Prince Ali, é ainda mais legal, porém a animação não é tudo isso. É a música que apresenta os efeitos do primeiro pedido de Aladdin (tornar-se um príncipe) e sua grande chegada ao palácio do Sultão para pedir a mão da princesa Jasmine (Linda Larkin). Completamente pomposa, bem do jeito que eu gosto, conta com corais assaz marcantes e um refrão daqueles bem pegajosos.

Mas não são só as duas canções cantadas pelo Gênio que são legais. Tirando as mini-reprises, a trilha ainda conta com mais duas músicas tremendonas e uma que nem precisava estar lá. A desnecessária é Arabian Nights, a abertura do filme, que é legal, mas muito inferior ao restante. Já das legais, a primeira delas, One Jump Ahead, é a apresentação de Aladdin que, por algum daqueles motivos bizarros que só acontecem em desenhos, decide cantar uma música enquanto foge dos guardas que o perseguem por ter roubado um pão.

Por fim, temos a tradicional balada, a famosona e vencedora do Oscar A Whole New World, que considero não apenas uma das baladas mais legais dos desenhos da Disney, como também a cena mais romântica de todas. Desde criança sonhava em voar. Sonhava em ter asas, em pilotar aviões e, é claro, em ter meu próprio tapete mágico. Pois então, Aladdin tem seu tapete mágico e leva Jasmine para uma volta ao mundo, passando por alguns dos países que mais tenho vontade de conhecer, como Egito, Grécia e Japão. Imagina que gostoso sair voando ao redor do mundo em um tapete mágico com aquela pessoa que você ama enquanto os dois cantam uma bela canção. Admito que já tentei recriar essa cena muitas vezes. Como não tenho acesso a um tapete que voa, faço o que posso e tento engatar um dueto do nada quando estou em situações românticas. Por algum motivo bizarro, as minas nunca me acompanham e sempre ficam me olhando com cara de “Vixe, ele endoidou”. Por que será? 🙂

Essa cena tem apenas um problema: quando os dois passam pelo Egito, encontram um indivíduo esculpindo o nariz da Esfinge. O cara se assusta com o casal e, ao se distrair, quebra o nariz da sua escultura. Isso é um absurdo, já que, como todo mundo sabe, quem quebrou o nariz da Esfinge foi Obelix. Está tudo muito bem documentado lá no livro Asterix e Cleópatra, oras.

Também vale a pena citar algumas curiosidades. Por exemplo: o desenho conta com duas homenagens a um dos meus filmes preferidos: De Volta Para o Futuro. Uma delas é a cena onde os guardas que estão perseguindo Aladdin caem no estrume, repetindo a tradicional punição de Biff Tannen. A outra é aquela na qual o Aladdin se joga do terraço da princesa para ressurgir momentos depois em cima do tapete mágico, referência a quando a mesma coisa acontece na parte dois do filme de Robert Zemeckis, substituindo o tapete por um carro voador e Aladdin pelo Marty McFly. Outra curiosidade relacionada: inicialmente, Aladdin seria fisicamente baseado no Michael J. Fox (astro do De Volta Para o Futuro). Porém, sua cara de garoto não combinava com a aparência “mulherão” de Jasmine, então decidiram refazer o personagem principal para ficar parecido com o Tom Cruise.

A versão em DVD traz também algumas versões demo de músicas novas. Uma delas (Proud of Your Boy) chegou até a ser gravada profissionalmente por um daqueles American Idols. Nenhuma delas, contudo, chega aos pés das quatro supracitadas, estando, se tanto, no nível de Arabian Nights.

Aladdin fez um sucesso tão estrondoso nos idos de 92 que gerou uma série de TV baseada no filme. Também acabaram fazendo duas continuações feitas para home-video, que eu ainda não tive oportunidade de assistir. Contudo, embora tenha gostado de O Rei Leão 3, a Disney tem fama de arruinar seus maiores clássicos em continuações, então se você se interessar, aproxime-se com cuidado.

Como era praxe nos desenhos da Disney lançados na época, Aladdin também teve uma carreira nos games. O que o diferenciou dos outros foi o fato de as duas principais plataformas da época (Mega Drive e Super Nintendo) terem recebidos dois jogos completamente diferentes, feitos por duas fabricantes concorrentes. E, curiosamente, invertiam as características tradicionais dos consoles. A versão do Mega, por exemplo, dava um banho na do Super em gráficos e sons, o que dificilmente acontecia, já que o console da Nintendo era tecnicamente superior (embora eu sempre tenha sido uma das três pessoas que gostava mais da Sega).

O Super Nintendo ganhou sua versão pelas mãos da tremendona Capcom, que tinha bastante experiência em jogos de luta (são delas as franquias Street Fighter e Final Fight) e depois viria a desenvolver outra franquia de muito sucesso (Resident Evil). Seu jogo era o típico game fofo, na linha de Super Mario. O jogador controla Aladdin em fases lineares e cheias de pulos, tendo como principal ataque pular na cabeça dos inimigos. O grande barato dessa versão é que Abu acompanhava o jogador e sempre fazia coisas engraçadas, como nos combates com os chefes, onde ele ficava com cara de mau dando socos no ar. Uma vantagem em relação à versão do Mega é que a história seguia fielmente o filme, sem contar que a batalha final contra Jafar era emocionante. E ainda tinha aquela fase dentro da lâmpada do Gênio, que era assaz divertida.

Já a versão do Mega foi desenvolvida pela experiente Virgin, que fazia quase todos os jogos baseados em desenhos Disney na época. Além dos gráficos e sons superiores, não era um jogo na linha Super Mario, mas de ação. Aladdin tinha uma espada e saía por aí destruindo todo mundo. Tinha algumas fases bem emocionantes, como a fuga no Tapete Mágico e a bônus, onde o jogador podia controlar Abu. Apesar de bem diferentes, os dois jogos eram bem legais e, de certa forma se completavam. Fãs do filme têm obrigação de conhecer os dois.

Jogos, continuações, séries de TV, muitos prêmios e 15 anos depois, Aladdin ainda traz consigo toda a mágica que tinha quando eu, uma criança, fui assisti-lo no cinema pela primeira vez. É não apenas um dos meus desenhos preferidos, mas também um dos longas de que mais gosto e que mais marcaram a minha vida. Merece ser colocado ao lado de clássicos eternos da casa do Mickey, como Branca de Neve e os Sete Anões, Fantasia, Cinderela e tantos outros que vêm marcando, não apenas a minha geração e a sua, como também a dos nossos pais e, se bobear, até a dos nossos avôs. Se você não conhece, corra atrás. Se já assistiu, assista de novo. Afinal, nós “nunca tivemos um amigo assim”.

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