J. Edgar

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É, delfonauta. Não adianta. Eu não consigo gostar dos filmes dirigidos por Clint Eastwood e isso nada tem a ver com as habilidades do cara como cineasta, mas simplesmente uma diferença de estilos. Seus filmes são todos oscarizáveis e God Bless America demais para mim. Não estou nem julgando a qualidade deles aqui. Para fazer uma analogia com o mundo da música, é mais fácil eu gostar de um CD fraco do Gamma Ray do que de um álbum excelente da Shakira, entende?

O meu amigo leitor provavelmente já ouviu falar de J. Edgar Hoover, mas nem todos sabem quem foi ele. Bom, ele foi diretor do FBI durante muitos anos e principal responsável pelo respeito do qual o órgão usufrui hoje em dia. Ele também impulsionou o avanço da criminologia e a perícia para busca de provas. A identificação por impressões digitais, por exemplo, só começou a ser usada no trabalho de polícia por insistência dele. Basicamente, o cara foi o Batman da vida real.

Infelizmente, o filme não o mostra colocando uma cueca do lado de fora das calças e saindo pelas ruas de Gotham para acabar com o crime (dica para os cineastas lendo isso: J. Edgar: Superhero). Claro, temos criminosos e investigações, mas o foco do filme não é nisso, mas na busca de Hoover por adulação da sociedade estadunidense e em conflitos relacionados à sua homossexualidade não assumida.

Já falei bastante aqui sobre meu desgosto por cinebiografias, inclusive com uma análise mais técnica do gênero na resenha de Runaways. Sugiro que você a leia para essa fazer mais sentido. E como todos seus congêneres, J. Edgar segue todas essas cartilhas à risca. Convenhamos, conflitos relacionados à homossexualidade já foram mais usados no cinema oscarizável do que zumbis, helicópteros explodindo ou zumbis em helicópteros explodindo. E isso é uma pena.

Mas a narrativa e a história em si o torna quase indistinguível de um O Aviador, inclusive com o fato de que ele parece não chegar a lugar nenhum. Afinal, a vida não faz arco dramático. Claro, vemos a revitalização do FBI, mas isso acontece relativamente no início, e depois disso o filme se perde bastante.

Toda a cartilha está aqui, desde os conflitos até o final com uma narração poética e uma trilha levada ao piano, visando fazer o espectador chorar. O problema é que isso não dá certo comigo. Eu choro pra caramba no cinema, mas para um filme conseguir a façanha de roubar minhas preciosas e salgadas lágrimas, precisa sair do lugar comum e fazer algo realmente artístico e inesquecível. E criatividade não é exatamente o ponto forte de filmes feitos para ganhar Oscar ou de cinebiografias.

A narrativa e o tema também não ajuda os estrangeiros que não são particularmente interessados na história dos EUA. O filme alterna duas narrativas, uma com o sujeito já velho, ditando suas memórias, e outra em flashback, que são as memórias em si. Em ambas, a história cobre muitos anos, mas não temos nenhuma indicação clara disso além da mudança de visual de personagens. Especialmente nos flashbacks, acrescentaria muito ao filme se ele nos falasse o ano. Ou vai dizer que você sabe em quais décadas o Hoover foi diretor do órgão?

Presidentes iam e vinham, e ele continuava lá, mas a gente mal sabe quais são os presidentes com quem ele está conversando, a não ser que você seja muito bom na fisionomia dos presidentes estadunidenses de décadas atrás. Nem todos têm rostos tão conhecidos quanto o Kennedy ou o Nixon, você sabe.

De forma alguma, no entanto, pense que J. Edgar é uma porcaria. Longe disso. Clint Eastwood sabe como filmar uma bela cena, ainda que eu não goste de sua escolha de gêneros. Seria legal ver suas habilidades aplicadas a filmes diferentes, mais criativos e pessoais do que simplesmente uma busca vazia por um careca dourado.

Assim, se você gosta de filmes como as cinebiografias supracitadas, J. Edgar pode te agradar. Dentro do gênero, ele não se destaca nem positiva nem negativamente. É só mais uma cinebiografia de um personagem que, tal qual Howard Hughes, é bastante conhecido e importante na história dos EUA, mas que não desfruta da mesma popularidade no Brasil.

E eu estou esperando algum delfonauta se manifestar para dirigir J. Edgar: Superhero. Essa é uma ideia para Selo Delfiano Supremo, hein? =]