Hannibal – A Origem do Mal

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Ah, os vilões. O que seria da arte de contar histórias (independente da técnica utilizada para isso) se não fosse por eles? Dependendo da personalidade do público, um bom vilão pode ser odiado ou adorado, mas ninguém passa incólume por eles. No filme Hook, quando está prestes a ser derrotado, o Capitão Gancho vira para Peter Pan e diz: “Afinal, o que seria do mundo sem o Capitão Gancho?”. Eu acrescento a essa pergunta muitos outros vilões além do pirata pedófilo. O que seria do mundo sem Darth Vader, Drácula, o Doutor Destino, o Fantasma da Ópera, o Coringa, Magneto (um dos melhores personagens da literatura, na minha opinião) e, é claro, de Hannibal Lecter? E eu respondo: o mundo seria muito menos mágico e divertido. É claro que o delfonauta já deve saber que, dos dois grupos de públicos citados acima, eu pertenço àqueles que são entusiastas dos vilões e piro o cabeção quando um deles é algo além de “um simples cara mau que vai ser derrotado no final”.

O motivo para essa introdução também é óbvio, já que esta é a resenha do filme Hannibal – A Origem do Mal (títulos rimados soam horríveis), que visa contar o passado do canibal de gostos refinados preferido de todos os cinéfilos. E olha só que estranho: este é um filme bom, mas seria ainda melhor se não fosse um filme do Hannibal Lecter.

Para começar, fazer um longa sobre o personagem sem Anthony Hopkins é uma decisão estranha, já que o ator está tão marcado no papel quanto o canibal está na sua pele. Para piorar, pegaram um péssimo ator para fazer o Hannibal jovem (Gaspard Ulliel) que, além de tudo, parece mais o Crispin Glover (o George McFly) do que o Mr. Hopkins (isso sem falar naquele buraco assustador que ele tem na bochecha esquerda, que dá mais medo que as perebas do Ewan McGregor). Por fim, apesar de ter algumas referências ao famoso vilão que conhecemos, este é basicamente um filme de vingança bem normal. Para dizer a verdade, é até um pouco semelhante demais ao mais recente longa do Justiceiro, desde que, é claro, Frank Castle tivesse o hábito de comer as bochechas de suas vítimas.

Tudo começa quando Hannibal era um garotinho com uma fofa irmãzinha, em plena Segunda Guerra. Sua família é morta e ele é obrigado a cuidar da mina até que um bando de nazistas aparece e come a menina (no sentido digestivo da coisa). Pronto, oito anos depois, Lecter já é grandinho e vai morar com a sua deliciosa (no sentido sexual da coisa) titia (Gong Li, que está aqui só pra gente ter alguma coisa bonita para olhar e tentar esquecer do buraco na bochecha do protagonista que vinha nos traumatizando há tanto tempo). Mas é claro, como diria a sinopse de um bom Testosterona Total: “Eles comeram a sua irmã. E agora ele quer vingança!”. Logo, ele começa a alternar sua vida entre caçar, torturar, matar e comer (no sentido mastigatório) aqueles que ingeriram sua maninha querida e comer (no sentido horizontal) a sua tia. Ah, isso é que é vida, hein?

Como você pode ver, é um filme bem genérico, bem diferente dos anteriores da franquia, que eram mais intrigantes (e mais violentos, para ser sincero). E, de forma alguma, Hannibal pode ser considerado o vilão deste filme. A não ser, é claro, que você ache que o Justiceiro é o vilão do seu. Eu não acho.

De qualquer forma, poucas coisas são mais doces que a vingança. Existem três formas de violência cinematográfica. Ela pode ser bela e estilizada, gratuita e explícita ou, simplesmente, ser justificada dentro do contexto de uma história. No primeiro tipo, você reage falando “Uau!”. No segundo, falando “Irgh!”. E no terceiro, falando “Hell, yeah, bitch!”. Esse é o gênero utilizado nesse filme. A cada cena de tortura ou a qualquer sinal de que os verdadeiros vilões da película vão pagar pelos seus pecados, você vai vibrar junto e aí está o poder da história, seja o protagonista o Hannibal Lecter ou qualquer outro.

Infelizmente, ele não se propõe a ir até o final na vingança e vou citar aqui uma cena. Fique avisado que aqui terá um spoiler, então se não quiser saber, pule esse parágrafo. Ainda aqui? Beleza então, você foi avisado. Em determinado momento, Hannibal encontra um dos nazistas e descobre que ele tem uma filhinha. “U-hu!”, exclamei, “olho por olho, dente por dente! O cara matou a menininha e agora vai ter a sua própria menininha morta! Hell, yeah!”. Infelizmente, como todos nós sabemos, o cinema estadunidense não tem coragem de matar crianças (e, se matam, não mostram a morte) e só aí o filme já perdeu muito da moral que estava tendo comigo até o momento. Na minha opinião, era melhor que o nazista nem tivesse uma filha, já que a morte dela seria proibida.

Eu não recomendaria Hannibal – A Origem do Mal para grandes fãs do canibal mais famoso do cinema, mas para fãs de um suspense mais genérico e, principalmente, para aqueles que, como o Rezek, adoram uma vingança sádica. Aqueles que adoram o personagem podem se decepcionar um pouco, tanto com o ator, como com o tratamento clichê dado a ele pelo roteiro genérico. E, nesse ponto, este é um triste fim (ou seria um triste começo?) para um dos grandes vilões da história do cinema.

Curiosidades:
– É extremamente engraçado ver a dificuldade que a pessoa que traduziu o filme teve com o verbo eat (comer). Para evitar confusões sexuais (ao invés de aproveitá-las para fazer piadinhas infames, como fiz acima), traduziram-no como “devorar”, o que é algo muito mais violento e animalesco do que o que os personagens realmente fazem no filme. Mas fazer o quê? Se colocassem uma frase como “você comeu minha irmã!”, sem dúvida ia gerar risadinhas das pessoas mais imaturas da platéia.

– A frase que usei na chamada de capa desta resenha, “Grosseria é contagiosa, minha querida”, é proferida por Hannibal quando ele justifica seu primeiro assassinato para sua tia. Eu achei um bom motivo. Grosseria realmente é contagiosa, e essa epidemia está se espalhando cada vez mais, sobretudo no nosso país. 😉

– Por falar em grosseria, eu tive o desprazer de encontrar novamente a Vadia das Trevas nesta cabine. Felizmente, agora que eu sei de seu maléfico plano de perturbar os cinéfilos, posso sentar longe dela. De qualquer forma, se eu dominasse o mundo, ela seria proibida de entrar novamente em qualquer cinema. Ou de se aproximar a mais de 100 km de onde quer que eu esteja.

– Provavelmente o tópico acima vai ajudar você a entender porque eu gosto tanto de vilões como o Magneto ou o Doutor Destino.

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