Tom Clancy’s Ghost Recon Breakpoint é um jogo sem identidade. É simplesmente a coisa mais corporativa já lançada em formato de videogame. Você sabe que eu gosto de fazer paralelos com o mundo da música. Pois, infelizmente, esse jogo – que pode ser chamado sem receio de “produto” – é tão insípido e sem raison d’être quanto uma boy band.
GHOST RECON BREAKPOINT, DO TOM CLANCY
Eu gosto da Ubisoft. Muito, aliás. Eu escrevi análises para quase tudo que eles lançaram desde, sei lá, 2010. E consigo contar nos dedos quantos desses jogos eu não gostei. Talvez o único tenha sido, justamente, o antecessor desse, Ghost Recon Wildlands.
Eu não curti Wildlands pelo mesmo motivo de Mafia 3. São jogos quase sem campanha, em que você deve ficar repetindo as mesmas atividades secundárias até ter acesso ao final. Breakpoint resolve esse problema. Esse é um mundo aberto mais tradicional, com missões de história e sidemissions roteirizadas e que apresentam alguma variedade de objetivos.Infelizmente, o design delas é bem fraco. As missões seguem uma fórmula bem clara, que envolve entrar em um lugar protegido, matar geral, salvar alguém, e daí escoltar essa pessoa até o esconderijo.
Depois do tiroteio, você sempre deve falar com o seu objetivo, mas o jogo só deixa fazer isso caso ele reconheça que você não está em conflito. E muitas vezes isso só acontece minutos depois de você ter matado o último inimigo. Fast travel sofre com a mesma limitação/bug.Algumas vezes a pessoa a ser salva estará machucada e deve ser carregada, limitando consideravelmente seus movimentos e suas opções de defesa.
E aí começam os problemas. Ao contrário da maioria dos jogos da Ubisoft, a movimentação aqui é um suplício. Até andar é difícil, com o personagem ficando preso em qualquer relevo do cenário. Mas o pior é que o mundo é todo montanhoso. Assim, caso você esteja de carro, invariavelmente seu objetivo estará do outro lado de uma montanha. E o GPS não mostra o caminho.Isso torna não apenas recomendável, mas literalmente essencial, arranjar um helicóptero. E a verdade é que nem é tão difícil encontrar um, mas ocasionalmente só haverá veículos de terra por perto.
Isso torna o jogo chato, mas não é por isso que eu disse o quanto ele é corporativo. Ghost Recon Breakpoint é, literalmente…
ESTA GERAÇÃO RESUMIDA EM UM JOGO
Temos aqui um loot shooter RPG de mundo aberto recheado de microtransações (que originalmente vendia até skill points). Se a geração passada é lembrada por seus jogos de ação cheios de adrenalina roteirizada, esta sem dúvida ficará marcada por essa curiosa mistura de Diablo com Witcher 3 que domina totalmente o mercado de AAAs nos últimos anos. Esse jogo é a quintessência desta geração, mas consegue misturar absolutamente todas essas características em algo totalmente sem alma, que parece ter sido feito por executivos, não por criativos.
A marca Tom Clancy, goste você ou não dela, implica um certo grau de realismo. Transformar isso em um loot shooter é totalmente sem sentido. Por que uma metralhadora tem poder 150 e outra tem 12? E outra, sabe qual é a graça de um loot shooter? O absurdo. Em Destiny, você pode pegar armas que queimam seus alvos por dentro, em Borderlands 3 tem algumas que gemem quando são recarregadas. Não dá para colocar essas brincadeiras em um jogo do Tom Clancy.Basicamente, eu equipei minha personagem com um sniper e uma metralhadora e só trocava por outras para aumentar minhas estatísticas. O pior é pensar que a própria Ubisoft já tem um loot shooter com a marca Tom Clancy. Para que outro? Far Cry e Assassin’s Creed também estão indo por essa linha.
Ubisoft já foi sinônimo de qualidade. E ela tinha dezenas de marcas fortes e diferentes. Tínhamos os jogos do Tom Clancy, tínhamos Prince of Persia, Assassin’s Creed, Far Cry. Volte no tempo e você vai se lembrar que essa foi a empresa que nos deu o inovador Flashback.Atualmente, “um jogo da Ubisoft” significa algo de alto orçamento, bonito, bem-feito. Mas também significa que vai ser um RPG de mundo aberto cheio de loot (e estou ignorando as sempre presentes microtransações para “economia de tempo”). E tudo bem eles fazerem um, ou dois, ou até três RPGs de mundo aberto cheios de loot. Mas quando todos os jogos são exatamente iguais, mudando apenas a ambientação, o público vai se cansar. Já se cansou, aliás.
A LUZ NO FIM DO TÚNEL
As coisas talvez estejam melhorando. Recentemente, a empresa reconheceu publicamente o problema. Ao mesmo tempo, ela adiou todos os outros jogos em produção no momento. Para muitos, isso significou que os próximos jogos estavam sendo criados para serem iguais a todos os outros lançados nesta geração, e agora serão replanejados. Quem sabe não vejamos novamente a Ubisoft criativa, como foi até a geração passada? Como fã do que a empresa fez pelos games em suas décadas de história, tenho esperanças de que “um jogo da Ubisoft” volte a significar apenas um selo de qualidade, e não uma simples repetição de mecânicas dos lançamentos anteriores.