A polêmica de Duke Nukem Forever

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Jornalismo é uma coisa engraçada. Geralmente, o número de coisas realmente importantes que ocorrem nas áreas de entretenimento e cultura é bem baixo, mas quando menos esperamos, algo polêmico surge. No meu caso, geralmente isso acontece através de um e-mail do Corrales.

Pois bem, foi nesta quinta-feira pela manhã que eu recebi um e-mail do chefe intitulado de “Notícia bombástica”. Ao ler, pensei um holy shit super alto e já comecei a me empolgar com a possibilidade deste texto dissertando sobre a coisa maluca que li ali.

Sabe Duke Nukem Forever, aquele jogo que um monte de gente estava esperando há mais de uma década? Pois bem, como você já deve saber, ele recebeu péssimas críticas de vários sites influentes, como o Gamespot, IGN, Joystiq, entre outros. E aí vem a bomba: a empresa de relações públicas responsável, a The Redner Group, postou um tweet ameaçando os jornalistas que falaram mal do jogo, onde dizia que não enviariam mais produtos para serem resenhados. A mensagem do Twitter, deletada, foi esta aqui:

“too many went too far with their reviews… we r reviewing who gets games next time and who doesn’t based on today’s venom.”

Em português:

“Muitos foram longe demais em suas resenhas. Estamos revendo quem vai receber games da próxima vez baseados no veneno de hoje”.

Holy shit, delfonauta. Nesta nossa sociedade, existem algumas coisas que não se deve dizer publicamente, porque elas vão trazer problemas, por mais que sejam verdadeiras. Que várias assessorias de imprensa/relações públicas fazem esse tipo de coisa ou, ainda pior, anunciam no site desde que as resenhas sejam favoráveis, todo mundo sabe, porém falar algo deste tipo é um choque. Esse tipo de coisa levanta várias questões. Primeiro, vamos ver as consequências diretas disso.

COM GRANDES EMPRESAS, VÊM GRANDES RESPONSABILIDADES

O tweet foi escrito pelo próprio presidente da empresa, Jim Redner, o que já era esperado, já que ninguém de hierarquia menor faria isso sem perder a cabeça (no sentido literal). Para deixar isso mais claro, devo dizer que eu adoraria revelar os nomes reais do Torquemada e do Evil Rainbow a você, delfonauta. Porém, toda vez que tento, o Corrales me censura. Por exemplo: o Torquemada é o CENSURADO e o Evil Rainbow é o CENSURADO. Assim, a única forma real de descobrir quem eles são é se juntar ao DELFOS como delfiano.

O poder está nas mãos do dono e, se ele errar em alguma decisão dessas, ele que vai ter que consertar a confusão. E Jim Redner até tentou, com um enorme pedido de desculpas, que até parece sincero. Digo, ele com certeza percebeu a – não tem outra palavra – cagada que fez.

Resultado: o The Redner Group foi demitido pela 2k Games, mesmo com o pedido de desculpas formal e as mensagens de apaziguamento no Twitter. Holy shit!

O QUE LEVOU A EMPRESA A FAZER ISSO

Empresas de relações públicas e assessorias de imprensa são responsáveis por cuidar da imagem de produtos ou empresas, além da divulgação delas. Portanto, é até previsível que esse tipo de coisa aconteça. O Corrales até comentou que a The Redner Group pode ter pedido desculpas, mas mantido a lista negra para retaliação posterior. Bem, não deu certo, porque eles foram demitidos.

De qualquer forma, o presidente Jim Redner disse o seguinte sobre seu tweet:

“I made a major error in judgment. I acted out of pure emotion without any thought to what I was saying. It is with a sad heart that I come to you now asking that you forgive me. (…) My response was a juvenile act on my part. I know better and my emotion got the best of me. I have worked very hard on this project. I want it to succeed. I just got upset and acted out.”

Em português:

“Cometi um grande erro de julgamento. Agi através de pura emoção, sem pensar no que estava dizendo. É com o coração triste que agora peço para vocês me perdoarem. (…) Minha resposta foi um ato juvenil. Eu sei que não deveria fazer isso, mas fui levado pela emoção. Trabalhei muito neste projeto. Eu quero que dê dê certo. Eu só fiquei chateado e exagerei”.

Resumindo, ele diz que reagiu por emoção pura e que estava envolvido demais no projeto. Por isso, queria que desse certo e ficou chateado. Quer saber? Eu acredito nele.

Uma empresa enorme e supostamente profissional nunca deve reagir publicamente retaliando ou ameaçando jornalistas. Ela na verdade fica preocupada com o cliente, e como pode contornar a situação. Parece-me mesmo que Jim perdeu as estribeiras, não que agiu como um super vilão querendo assustar os jornalistas. Ele deveria saber que isso não daria certo.

E AGORA FICA COMPLICADO

Jim Redner disse na mensagem que o problema não eram as notas dadas ao jogo, mas o tom que os resenhistas deram. Segundo ele, alguns jornalistas foram extremamente ofensivos. Se o motivo foram realmente os comentários, isso legitima o não envio posterior de jogos? E a resposta: depende.

Assim como o Corrales comentou neste texto, há um número absurdo de blogueiros e sites que recebem material de divulgação e promovem resenhas. Muitos deles nem são jornalistas. A qualidade do material produzido varia, claro, mas eu concordo que alguém que seja extremamente ofensivo e não entenda a proposta do produto não deve recebê-lo para resenhar.

Acho que o delfonauta deve concordar que as empresas devem defender seus produtos. Todo mundo faz isso. Se você for a uma entrevista de emprego, vai ter que mostrar sua confiança e pintudice, defender suas capacidades e mostrar que você pode prover o serviço que a empresa quer contratar. Algumas até colocam você na frente de outros candidatos para se massacrarem, dizendo suas qualidades e experiências na frente dos outros. Mais egoísta e desrespeitoso, impossível.

Infelizmente, isso ocorre pela absurda competição deste século, que tem origens no neo-liberalismo da década passada. Ou seja: divulgar, confiar cegamente no seu taco e, se preciso, passar por cima de um monte de gente. Tudo isso são necessidades de sobrevivência em alguns casos.

Nas indústrias de entretenimento e cultura, nós percebemos que isso ocorre de maneira muito acentuada. Aliás, o Corrales vive reclamando que a indústria de games está absurdamente arrogante, esquecendo do consumidor final, e eu concordo completamente com ele.

Onde eu quero chegar: algumas indústrias podem ser mais éticas e divulgar corretamente os seus produtos, mas mesmo assim às vezes é necessário realizar algumas dessas “manobras” controversas. Se a resenha é ofensiva, diminui o trabalho de outras pessoas e usa termos chulos, não vejo problemas em não enviar mais material para este pessoal. Alguns até já consideram games como arte (não é o meu caso), o que agrava ainda mais esta situação. É legítimo desmerecer e ofender o artista?

MAS AS RESENHAS FORAM TÃO RUINS A PONTO DE MERECEREM ISSO?

Em alguns casos, sim. Porém, há uma consideração importante. Apesar de algumas resenhas terem sido bastante ofensivas, os jornalistas escreveram desta forma devido à própria postura do jogo. Muitos consideraram o game extremamente ofensivo, com piadas de muito mau gosto (mais até do que se era esperado). Sem falar no ódio pela expectativa frustrada: Duke Nukem Forever está custando U$ 59,90 e teve uma divulgação muito divertida e cheia de ação. Aparentemente, é o contrário do que o jogo oferece.

Agora vamos a algumas frases retiradas das resenhas de todos os citados:

Game Informer (nota 6,75): “ Nothing about it is truly remarkable or to the scale of other genre heavyweights, but it is a fun run when it fires on all cylinders.

Joystiq (nota 2 de 5 estrelas): Every time I died there was between 30 and 45 long seconds of loading, during which I was treated to such helpful hints as the fact that dodging gunfire is good and that enemies sometimes drop weapons. I’m still not sure which words of advice were supposed to be jokes – or if any of them were. Actually, the most fitting piece of strategy to impart would have been “don’t die,” but in all my waiting on those infernal screens that one never appeared.

IGN (nota: 5,5): Duke still has the maturity of a twelve year old boy, objectifying women whenever possible, and barking out movie quotes with voice actor Jon St. John’s bassy cadence. He’s unapologetically vulgar, which is good for a few nostalgic laughs as he again kills aliens to save the world.

Gamespot (nota: 3): Every attempt the game makes to be “adult” comes across as pathetic. You find nudie magazines here and there, but the naked women you ogle are so pixelated, you might as well be looking at the latest issue of Lego Playboy. (…) Given its storied development history, you might be inclined to grab a copy of this train wreck. Avoid the temptation.

Destructoid (nota: 2): Duke himself is an incapable fighter. I’d go as far as to call him a pussy. (…) Certain players may kid themselves into thinking the game will get better. The next level may look like crap and play just as badly. (…) It’s a game with an odious personality, one that could only endear itself to the sociopathic and mentally maladjusted..

Algumas das frases (em especial do Destructoid) foram realmente ofensivas. Se é justificável devido ao estilo grosseiro do jogo, isso já são outros quinhentos, mas eu diria que é possível escrever como o jogo é ruim sem ter que disparar tantas ofensas em uma resenha.

DUKE NUKEM FOREVER É TÃO RUIM ASSIM?

Bem, para o jogo causar um estrago tão grande, deve haver alguma sustância nas críticas. Após ler essas resenhas, ouvir podcasts, ver vídeos de gameplay e beber um pouco de café, mesmo sem ter jogado, posso dizer: as críticas têm procedência, sim.

A maioria cita que os puzzles são constantes e chatos. Eles poderiam ser divertidos, mas como são longos demais, atrapalham no que seria realmente legal: ação frenética com piadas bobas e situações estúpidas, como um Testosterona Total nos games (o que todo mundo esperava). Alguns até gostaram disso, mas a maioria, não.

Outro problema bastante apontado é que o jogo usa muita metalinguagem tirando sarro de outros jogos ou de si mesmo. Por exemplo, em um momento ele tira sarro do Master Chief, de Halo. Mas em Duke Nukem Forever, você só pode carregar duas armas por vez e sua vida regenera automaticamente – artifícios popularizados pelo próprio Halo. Em outro, Duke fala algo do tipo “Odeio puzzles da Valve”, quando ele precisa resolver um puzzle no estilo da Valve. E ainda, segundo o Gamespot, ele fala que o final é uma porcaria, quando realmente é uma porcaria.

Além disso, temos o fator ofensa. Uma das primeiras coisas a se fazer no jogo é pegar um cocô de uma privada. Todo mundo odeia piada escatológica. É nojento. Em outro, tão bizarro quanto, Duke chega em uma sala que está cheia de mulheres gemendo de dor, porque os aliens fizeram filhos com elas. Uma das resenhas diz que os aliens estão… hã… inseminando as mulheres com seus instrumentos. Não sei se procede, mas se sim, eca!

Outros criticaram que o jogo tem gráficos e frame rate ruins, e mesmo assim demora de 30 a 45 segundos para fazer um loading entre as fases ou quando Duke morre. É, complicado.

CONCLUSÕES

Este rolo todo levanta, mais uma vez, uma discussão sobre os limites da atividade jornalística e de relações públicas. São duas atividades legítimas que têm princípios éticos e interesses diferentes, mas nem por isso um dos dois está sempre com a razão.

É condenável a tentativa de controle de uma empresa ao enviar material apenas para veículos que falem bem dos seus produtos, porém eu também não acho apropriados os termos ofensivos usados em algumas das resenhas citadas.

A The Redner Group errou feio e mostrou a falta de profissionalismo da empresa, porque havia uma outra alternativa: fazer um tweet com respeito às críticas, mas não concordando com os termos ofensivos usados. Ela poderia expor também que o personagem Duke não é para ser amado ou levado a sério, e que a proposta do jogo é diferente do que os jornalistas pensaram em um primeiro momento. Havia outras formas de ter lidado com tudo, tanto para a empresa quanto para os jornalistas.

EXTRAS:

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