X-Men: Apocalipse

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Para fins de honestidade, devo dizer que não me empolguei com a aventura anterior dos mutantes no cinema, Dias de um Futuro Esquecido. Até comentei com o Corrales antes da cabine de X-Men: Apocalipse começar que, embora eu goste do Bryan Singer, achava que sua volta à franquia não foi uma boa.

Se Primeira Classe havia conferido um novo frescor (e uniformes coloridos) à série, quando Singer voltou, ele imediatamente retomou o tom mais escuro e sério dos primeiros filmes. Assim, parecia que o novo sopro de vida injetado por Matthew Vaughn havia sido passageiro. Após o término de Apocalipse, contudo, tive de dar o braço a torcer: Singer mandou muito bem, fazendo deste o melhor x-filme dirigido por ele. Me diverti muito mais do que esperava.

EN SABAH NUR

Desta vez os X-Men têm de se unir para combater a ameaça de Apocalipse. Considerado o primeiro mutante do mundo, ele desperta após milênios de hibernação e deseja remodelar o mundo à sua imagem, para isso removendo dele os mais fracos e indesejáveis.

Para atingir este objetivo ele conta com a ajuda de seus quatro cavaleiros (Anjo, Tempestade, Psylocke e Magneto), a quem ele dá ainda mais poder do que eles já possuíam naturalmente. Charles Xavier, Mística e uma nova fornada de mutantes adolescentes (Ciclope, Jean Grey e Noturno são reapresentados) terão de evitar a destruição do mundo.

O que mais chama a atenção é que de todos os filmes dos X-Men, este é o mais grandioso, o mais exagerado, aquele que mais deixa a velha discussão dos “temidos e odiados” de lado e mais se assemelha a um megaevento das HQs com destruição em larga escala e um vilão ultrapoderoso.

Acho que é a primeira vez que os X-Men do cinema enfrentam um oponente que não sai de suas próprias fileiras ou não seja recrutado pelo Magneto. Pela primeira vez há uma terceira força para causar o conflito, um vilão que é realmente mau, e isso ajuda a dar um sopro novo para a coisa.

AÇÃO EM LARGA ESCALA

Apesar do visual do Apocalipse não ser tão legal quanto o de sua contraparte em quadrinhos (ainda me lembro das comparações com Ivan Ooze, do filme dos Power Rangers, quando saíram as primeiras fotos), o vilão entrega o que promete. Ele tem uma extensa gama de poderes (existe até uma explicação para seu vasto arsenal de habilidades) e sua apresentação, logo na cena de abertura do filme, é bem tremendona, já dando a ideia de que o escopo desta produção é bem maior do que suas aventuras anteriores. A trilha sonora épica e os grandes planos abertos cheios de efeitos especiais dessa sequência ressaltam isso ainda mais.

Singer também explora bem os poderes de cada mutante, coisa que ele sempre fez com competência, mas aqui parece mais inspirado. Magneto finalmente cria aquela espécie de bolha magnética que o envolve quando ele flutua nos quadrinhos, só para citar um exemplo dessas pequenas coisas que os fãs das HQs vão gostar de pescar. Aliás, o mestre do magnetismo nunca esteve tão poderoso e tão raivoso. Afinal, é apenas depois de sofrer uma tragédia pessoal que ele resolve aceitar a oferta do vilão e se tornar um de seus novos cavaleiros.

Mercúrio novamente ganha uma cena só para ele, nos moldes de Dias de um Futuro Esquecido, porém ainda mais longa e mais elaborada. É tão boa a forma como o diretor explora suas habilidades e até sua personalidade que imediatamente pensei em duas coisas enquanto assistia. A primeira, que Joss Whedon não soube como explorar a sua versão do personagem em Vingadores: Era de Ultron. A segunda: que a DC come muita bola (como sempre) ao não fazer um filme do Flash, herói com as mesmas possibilidades imagéticas e melhor personagem que o filho de Magneto.

Vale também uma menção honrosa para a Psylocke. Ela não tem grande importância para a trama e nem muito tempo de tela, mas certamente leva o troféu de “melhor transposição de um uniforme e visual como um todo das HQs para as telas”. Está tão idêntica aos gibis que parece mesmo ter saltado direto das páginas. E certamente vai fazer a alegria da molecada mais jovem, se é que você me entende.

Todos os mutantes mostrados, de ambos os lados do conflito, estão bem legais (o Noturno parece tanto mesmo uma versão mais jovem de sua versão de X-Men 2 que o ator Kodi Smit-McPhee até fala igual ao Alan Cumming), há alguns outros personagens conhecidos em participações menores para efeitos de easter eggs e a presença destes está na medida certa, sem exageros como já aconteceu em outras ocasiões.

Aliás, o longa até apresenta alguns inesperados momentos mais leves, quando rola até um golpe baixo divertidão desferido contra X-Men: O Confronto Final. E a interação dos alunos adolescentes da Escola Xavier, em vários momentos, principalmente nos de lazer da galerinha, me lembrou até de coisas como a animação X-Men: Evolution.

AS MESMAS INCONSISTÊNCIAS DE SEMPRE

Embora o filme tenha me surpreendido positivamente, isso não quer dizer que ele não tenha lá os seus problemas. Na verdade, tem alguns. Para começar, há o velho problema da continuidade. O longa anterior, que deveria ligar a primeira trilogia à Primeira Classe, falhou nesse quesito.

Este aqui sequer tenta dar alguma liga. Como o Corrales costuma dizer: nisto, os X-Men cinematográficos são bem fiéis à fonte. Afinal, sua cronologia é tão confusa quanto a dos gibis. Contra fatos não há argumentos. Fica claro que os envolvidos não estão mais nem aí para isso. Então o melhor a fazer nesse caso é esquecer as muitas inconsistências cronológicas que assim você vai curtir muito mais.

O Corrales também acha que há muitas “sementes”, como ele diz, plantadas desde Primeira Classe que acabam não sendo utilizadas, o que ele considera um desperdício de possíveis caminhos. Eu confesso que minha memória dos x-filmes não é tão boa assim, então não me lembro dessas situações. Logo, é algo que não me incomodou, mas acho que vale uma menção, pois pode ser algo que aporrinhe a galera mais ligada nessas pequenas pistas.

O que me incomodou muito mesmo foram duas coisas em particular. A primeira, a passagem do tempo. O anterior se passava em 1973. Este acontece exatos dez anos depois. Embora seja legal a ambientação nos anos 1980 (em determinado momento Jean Grey usa uma jaqueta com ombreiras!), os personagens simplesmente não envelheceram!

Seria algo fácil de se resolver com um pouco de maquiagem, mas ignoraram esse pequeno fato e estão todos com a mesma cara de dez anos atrás. Caramba, ficou impossível comprar a ideia de que se passa uma década entre um filme e outro se não há nenhuma mudança física nos personagens. Especialmente nos mais jovens, como o Mercúrio, isso fica ainda mais feio.

A outra coisa é bem específica, mas para mim é um baita erro de construção de personagem. Magneto jamais se casaria com uma humana após ele professar seu ódio pelas pessoas comuns. Ele pode até se esconder no meio deles para fins de sobrevivência, mas nunca ficar com alguém que ele considera inferior. Sei que isso é algo que até existe nos quadrinhos, mas se não me engano foi antes de ele manifestar seus poderes mutantes e antes de ter sua doutrina pessoal de ódio à humanidade formada. Da forma como é apresentado no filme, é praticamente como se um racista se casasse com alguém do grupo de minoria pelo qual professa seu preconceito.

CONCLUINDO

Embora essas coisas não me tenham descido, não foram o suficiente para me tirar do clima divertido do filme. Realmente este longa foi uma surpresa para mim. Particularmente, não sou um ferrenho apreciador da franquia dos mutantes. Assisti a todos, gosto de muitos (vale ressaltar a importância histórica do primeiro, que provou que uma adaptação de uma grande marca das HQs poderia ser rentável), mas não estão entre os meus favoritos. Eu vou ver todos quando são lançados, mas não perco o sono esperando a estreia.

Talvez por não ser um admirador fervoroso, o impacto do longa tenha sido maior. Só sei que foi somente assistindo a X-Men: Apocalipse que tive pela primeira vez a impressão de estar vendo algo mais próximo aos quadrinhos mutantes e menos aos primeiros longas mais sérios do Bryan Singer. Creio que quem já gosta da franquia não vai se decepcionar. E aqueles que não curtem tanto assim têm grandes chances de apreciar mais esta sexta incursão dos mutantes pelas telonas. Excelente diversão.

CURIOSIDADE:

– Assim como em Wolverine: Imortal e Dias de um Futuro Esquecido, há uma cena depois dos créditos finais, então não vá embora antes deles acabarem.

LEIA MAIS SOBRE OS X-FILMES:

X-Men: O Confronto Final – Muitos mutantes e muita história para pouco filme.

X-Men Origens: Wolverine – Tudo errado no primeiro filme solo do carcaju.

X-Men: Primeira Classe – Um novo começo.

Wolverine: Imortal – No Japão e sem fator de cura.

X-Men: Dias de um Futuro Esquecido – O encontro de gerações.

Coletiva X-Men: Dias de um Futuro Esquecido: Patrick Stewart e James McAvoy – Os Professores Xavier passaram pelo Brasil.

Deadpool – O mercenário falastrão ganha o filme que merecia.

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Nota
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Carlos Cyrino
Formado em cinema (FAAP) e jornalismo (PUC-SP), também é escritor com um romance publicado (Espaços Desabitados, 2010) e muitos outros na gaveta esperando pela luz do dia. Além disso, trabalha com audiovisual. Adora filmes, HQs, livros e rock da vertente mais alternativa. Fez parte do DELFOS de 2005 a 2019.
x-men-apocalipsePaís: EUA<br> Ano: 2016<br> Gênero: Ação/Ficção Científica<br> Duração: 144 minutos<br> Roteiro: Simon Kinberg<br> Elenco: James McAvoy, Michael Fassbender, Jennifer Lawrence, Nicholas Hoult, Oscar Isaac, Rose Byrne, Evan Peters, Sophie Turner, Tye Sheridan, Lucas Till, Kodi Smit-McPhee e Olivia Munn.<br> Diretor: Bryan Singer<br> Distribuidor: Fox<br>