É muito estranho escrever uma crítica A Fera sabendo de antemão que nada terá a ver com A Bela e a Fera. Entre tantas reimaginações, que incluem não apenas filmes, mas até discos conceituais de heavy metal, a palavra Fera só costuma ser usada em títulos de obras que visam remeter à fábula clássica. Mas não hoje. Não com Idris Elba. Esta Fera vai se arrepender de ter nascido!
CRÍTICA A FERA
A Fera é um filme de terror claustrofóbico e ao ar livre. O gênero anda em voga ultimamente, e tem gerado excelentes lançamentos. Aqui acompanhamos uma família em um safari. Temos o pai (Idris Elba) e suas duas filhas, além de um amigo nativo da região, que pilota o jipe. A ideia era ver uns bichinhos fofinhos, mas não tão de perto. Afinal, quando chega perto demais, a natureza deixa de ser fofa e se torna perigosa.
Este é o predicado da família, que fica presa em um jipe quebrado, sendo caçada por um leão despirocado. Sinceramente, eu tenho certeza que já assisti a um filme igualzinho (família presa em um jipe com um leão caçando eles), mas não lembro o nome. Felizmente, no gênero “terror claustrofóbico”, a originalidade da situação não é tão importante quanto a atmosfera opressiva. E isso me leva a meu grande elogio.
A EXCELENTE DIREÇÃO DE BALTASAR KORMÁKUR
Eu não reconheci o diretor Baltasar Kormákur de nome, mas a julgar pela sua página no IMDB, ele tem uma carreira já bem prolífica. E certamente vou me lembrar deste nome complicado, já que a direção do sujeito é de longe a melhor qualidade de A Fera, a ponto de quase valer a pena assistir só por causa disso.
Hollywood costuma exagerar nos cortes rápidos, e eu vivo reclamando disso aqui. A direção que eu gosto normalmente envolve planos longos e movimentos de câmera espertos. E não me lembro de ter visto este estilo em um filme como este antes.
A Fera tem cortes, claro. Mas praticamente todas as cenas que o leão ataca são planos sequências bem longos, o que deixa tudo ainda mais tenso e, sinceramente, impressionante. Uma cena padrão do filme é a câmera ficar dentro do carro com a família, e ficar se movendo para acompanhar o movimento do leão enquanto ele ataca, sobe no teto ou tenta entrar pela janela.
É muito tenso, e muito estiloso. Suponho que o leão seja totalmente feito em CG, mas mesmo assim este tipo de cena não parece fácil de ser filmada. É necessário um enorme planejamento, excelentes atuações (afinal, sem cortes, não pode errar), um bom cinegrafista e muita habilidade de todos os envolvidos. A Fera tem as melhores cenas de ataque de um bicho perigoso que eu me lembro de ter visto.
MAS O ROTEIRO…
O problema é que A Fera, antes de qualquer outra coisa, é um filme de diretor. E sim, a direção é excelente. Mas vamos ao cinema, no final das contas, para ver histórias. E A Fera não peca apenas na falta de originalidade de sua premissa, mas especialmente na criação e desenvolvimento de personagens.
Eu não sei você, mas algumas coisas que Hollywood vive repetindo já me cansaram pelo menos dez anos atrás. Caso em pauta: personagens com daddy issues. As filhas do Idris Elba o consideram um pai ausente e fazem questão de lembrá-lo disso DURANTE os ataques do leão. Ridículo.
Outra artimanha bem comum é fazer com que um dos personagens seja médico. É uma muleta que permite ter poucos personagens, e machucá-los, porém mantê-los vivos. Afinal, tem um médico na história que está lá para cuidar das vítimas e estender suas vidas. E isso já deu também. A Fera seria muito mais empolgante se tivesse como personagens principais o Mark Zuckerberg e um grupo de influencers. Ou seja, a nata da inutilidade humana.
Então é uma pena que A Fera não tenha tido o mesmo cuidado do escritor que recebeu do diretor, pois isso poderia torná-lo realmente especial. No final das contas, a direção é suficientemente interessante e o filme suficientemente tenso para valer a sessão. Mas é uma pena que um dos seus pilares criativos seja tão forte enquanto o outro é tão fraco.